segunda-feira, 22 de outubro de 2012

OTELLO, METropolitan OPERA, Nova Iorque, Outubro de 2012


 
(review in english below)

Como escrevi no recente comentário à récita que vi em Londres no passado mês de Julho, a penúltima ópera de Verdi, considerada por alguns uma aproximação ao drama wagneriano, foi composta num contínuo musical, em que se esbatem as separações entre arias, ensembles e recitativos. Contudo, o compositor é fiel à tradição operática italiana, alicerçada na sua vasta obra anterior, mantendo árias como o Credo de Iago ou a Ave Maria de Desdemona, mas o andamento orquestral deixa de ser um simples acompanhamento vocal para passar a ser o condutor do drama musical.

A velha encenação de Elijah Moshinsky é clássica, convencional e vistosa. A primeira cena, da tempestade que atinge a frota veneziana vencedora, é imponente vista ao vivo. São também grandiosas as cenas passadas fora ou dentro do castelo de Otello.

Semyon Bychkov ofereceu-nos uma direcção musical competente. Coro e Orquestra do Met estiveram muito bem, como é habitual.


Johan Botha, doente, foi substituído à última hora no papel de Otello pelo tenor russo Avgust Amonov. Apesar de ter uma voz respeitável, esteve aquém da exigência da personagem. Quando a orquestra tocava mais forte deixava de se ouvir e, por vezes, revelou dificuldades no registo agudo. Nos duetos com Iago, as diferenças qualitativas tornavam-se muito evidentes. Os sentimentos de insegurança, ciúme e revolta crescentes pela suspeita da traição de Desdemona foram contidos, vocal e cenicamente. Não nos mostrou um Otello dilacerado, como o papel exige. Em resumo, um cantor ainda sem voz para o Otello.


Desdemona foi interpretada pelo soprano norte americano Renée Fleming, uma cantora “da casa”. Tem uma voz de grande beleza e poder, embora denote algum desgaste. Mas foi muito credível e, no último acto, excelente em emotividade e afinação. Foi uma das melhores interpretações que ouvi a Renée Fleming nos anos mais recentes.





O melhor da noite foi o baixo barítono alemão Falk Struckmann que fez um Iago sensacional. Tem uma voz de timbre muito agradável e invulgar potência (foi uma pena não ter podido assistir ao confronto vocal com Botha). Foi excelente na intriga e no cinismo que a sua personagem encerra. 




Também os cantores dos papéis secundários estiveram num nível muito bom, nomeadamente Renée Tatum como Emilia, Eduardo Valdês como Roderigo, o veteraníssimo James Morris como Ludovico, embaixador veneziano e, sobretudo, o Cassio do tenor americano Michael Fabiano.







Espero que na transmissão do MetLive do próximo fim de semana se possa ouvir Johan Botha.

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OTELLO, Metropolitan Opera, New York, October 2012

As I wrote in a recent reviewon the performance I saw in London last July, the penultimate Verdi opera, considered by some an approximation to the wagnerian drama, was composed in continuous musical, in which the separation between arias, ensembles and recitatives was blurred. However, the composer was faithful to Italian operatic tradition, based on his extensive previous work, keeping arias like Credo by Iago or Ave Maria by Desdemona, but the orchestral tempo ceases to be a simple vocal accompaniment to become the driver of the musical drama.

The old Elijah Moshinsky's staging is classic, conventional and showy. The first scene of the storm hitting the winning Venetian fleet, viewed live, is impressive. Also grandious are the scenes outside or inside Otello’s castle.

Semyon Bychkov offered us a competent musical direction. The Chorus and the Orchestra of the Met were very good, as usual.

Johan Botha, ill, was replaced at the last minute in the role of Otello by Russian tenor Avgust Amonov. Despite having a respectable voice, he was short of the requirement of the character. When the orchestra played forte we could not hear him and, sometimes, he revealed difficulties in the high register. In duet with Iago, the qualitative differences became very evident. The feelings of growing insecurity, jealousy and anger due to the suspicion of Desdemona's betrayal were restrained, vocal and artistically. He failed to show us a torn Otello, as the role requires. In summary, a singer (still) without an adequate voice for Otello.

Desdemona was interpreted by North American soprano Renée Fleming, a singer "of the house." She has a voice of great beauty and power, although denoting some fatigue. But she was very credible and, in the last act, she was excellent in emotion and tune. It was one of the best Renée Fleming’s performances I heard in recent years.

The best of the night was German bass baritone Falk Struckmann who made a sensational Iago. He has a voice with a very pleasant timbre and an unusual power (it was a shame not being able to whear the vocal confront with Botha). He was excellent in intrigue and cynicism that his character demands.

Also the singers of the secondary roles were at a very good level, including Renée Tatum as Emilia, Eduardo Valdes as Roderigo, the veteran James Morris as Ludovico, venetian ambassador, and especially the American tenor Michael Fabiano as Cassio.

I hope in the MetLive transmission of next week we can hear Johan Botha as Otello.

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2 comentários:

  1. Caro Fanático_Um,

    Creio que Botha e Struckman iriam ter um duelo titânico se ambos estivessem estado presentes. Realmente, um tenor sem voz para o papel é sempre mau, mas numa ópera como Otello isso é gravíssimo porque mata a ópera que vive dele e da maldade de Iago.
    Estou a torcer pela recuperação de Botha para Sábado.
    Saudações

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  2. Caro Fanático,
    a crônica excelente como sempre. Ressalto a qualidade técnica da crítica que orienta os seus leitores quanto a escolha das peças que valem a pena...
    Um grande abraço

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