Crítica de Ali Hassan Ayache no Blog de Ópera e Ballet
Beleza física nunca foi um dos
atributos do compositor Alexander Von
Zemlinsky e consequentemente a mulherada não o via como um galã ou símbolo
sexual. A rejeição o atraiu para compor "O Anão", baseado no conto de Oscar Wilde (este rejeitado em
sua época por ser homossexual) "O Aniversário da Infanta". O texto é
pra lá de maluco, fala de uma infanta que ganha de presente um anão com problemas
físicos e que nunca se olhou no espelho. O catatau se julga boa pinta e tem a
ousadia de se apaixonar pela infanta. Quando declara seu amor a ela e se olha
no espelho a ficha cai e todos os dramas do mundo desabam sobre suas costas.
Rejeição, indiferença
e intolerância são características inerentes do ser humano desde sua existência
e estão marcadas no libreto. As dores e traumas do personagem central foram
explorados de forma única pela competente direção de Willam Pereira na apresentação do Theatro São Pedro/SP. Sua visão favorece o psicológico, atua na
mente e no imaginário onde os personagens falam através de gestos e expressões.
Cada um a sua maneira está inserido em um contexto social e se mostra de forma
linear.
O cenário de Renata Pati e Karina Machado não tem grandes palácios ou salões nobres, os
figurinos de Olintho Malaquias
mostram o temperamento de cada personagem e a luz de Fabio Retti leva a um casamento das cenas. O branco total do
cenário remete a pureza e a inocência sentimental do Anão, os cubos interagem
movimentando-se e formando cenas imaginárias e o teto é um requinte de cores em
fios que descem como uma chuva de pétalas. Willam Pereira faz um teatro
moderno, antenado com o enredo que através da imaginação leva o espectador à reflexão.
Foge dos clichês atuais onde todos tem que defender as causas dos excluídos,
devem amar os animais de estimação e a natureza.
O problema é que
o diabo mora nos detalhes e esses que se mostram corretos e defensores das
grandes causas sempre tem uma atitude não tão correta ou um pensamento nem
sempre "adequado". Pereira mostra o drama humano e nada é mais
importante que isso. Simplesmente perfeito na sua concepção. Você pode não
gostar dos críticos William, às vezes os críticos gostam de você.
A Orquestra do Theatro São Pedro
comandada por André dos Santos
apresentou sonoridade volumosa e densa, realçando a força da música de
Zemlinsky em prol da delicadeza das notas. O Coro sempre afinado e recheado de
solistas da casa cantou com sonoridade esplendida. Os solistas mostraram
competência para encarar as difíceis passagens: Gustavo Lassen evolui a cada apresentação, voz de baixo com
excelentes graves. Mar Oliveira faz
um Anão denso e dramático cenicamente conciliando um timbre que não é dos mais agradáveis
embora combine com as dores do personagem. A Infanta interpretada por Maria Sole Gallevi cantou com um timbre
delicado e técnica correta, atuação cênica correta e linear.
Mais uma vez o
teatro da Barra Funda traz títulos raros em montagens com roupagem moderna, que
privilegia os cantores da casa e solistas brasileiros de extrema qualidade.
Enquanto isso na Praça Ramos o clima é de poucos amigos, com o titular depondo
em CPIs da Prefeitura Municipal e tendo a quebra de sigilo eletrônico decretada
pela justiça. Quanta diferença!
Ali Hassan Ayache