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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

KÁTIA KABANOVÁ – Teatro de São Carlos, Lisboa, Janeiro de 2011

Finalmente um bom espectáculo no São Carlos. Estávamos a precisar!



Kátìa Kabanová é uma ópera com música e libretto de Leoš Janáčec que relata a história de uma mulher infeliz no seu casamento com Tichon, um marido negligente. Vive oprimida pela sogra, Kabanicha, uma viúva possessiva e arrogante. Durante a ausência de Tichon, em viagem, envolve-se com Boris, uma paixão anterior, reprimida. Quando o marido regressa, Kátia confessa que o traiu e, à pergunta de Kabanicha, revela o nome do amante. Foge no meio de uma tempestade e lamenta a confissão. Boris encontra-a e diz-lhe que foi expulso e vai partir para a Sibéria mas não a pode levar consigo. A impossibilidade de viver o amor proibido leva-a ao suicídio, lançando-se ao Volga. Tichon culpa a mãe pelo sucedido mas ela mantém uma atitude indiferente.



A ópera de Janáčec está impregnada de trechos musicais de assinalável beleza e grande intensidade dramática. A encenação, moderna e simples, de David Alden, foi eficaz sem deslumbrar. O palco esteve bastante vazio, mas não fomos colocados face a perplexidades incompreensíveis ou disparates inqualificáveis, como vinha acontecendo no São Carlos nos últimos tempos.







(Fotografias da mesma produção na English National Opera)

Julia Jones assinou, para mim, a melhor direcção musical que lhe ouvi no São Carlos e a Orquestra Sinfónica Portuguesa esteve à altura da exigência da obra, proporcionando-nos uma grande interpretação da partitura.

Ausrine Stundyte, soprano lituano, foi uma Kátia Kabanova de qualidade. Se esteve bem no primeiro acto, melhorou no segundo e foi excelente no terceiro. Cenicamente irrepreensível, interpretou com dramatismo assinalável a personagem. A voz, não sendo bonita, é robusta, potente e, apesar de tender para a estridência nos agudos, esteve sempre segura. Quando a ouvi na Dona Branca achei o timbre algo rude, mas hoje tal não foi tão evidente. Esteve muito bem.

Tichon foi interpretado pelo tenor alemão Hans Georg Priese. O papel não é grande mas deu boa conta dele. A voz é bem audível e o timbre agradável. A presença em palco também foi digna de registo positivo.

Boris foi interpretado pelo tenor alemão Arnold Bezuyen. Voz forte mas sem cor nem agudos interessantes, nem a capacidade dramática necessária à personagem.

Dagmar Pečkova, meio-soprano checo, foi uma Kabanicha muito aquém das minhas expectativas. Já ouvira anteriormente esta cantora na Gulbenkian, em recital e, na altura, deixou-me deveras impressionado pela qualidade da sua interpretação. Hoje foi diferente, não esteve à altura da personagem e foi uma sombra do que ouvira no passado. Mantém um timbre interessante mas a voz foi pequena, sem potência e, não raras vezes, completamente abafada pela orquestra.

Os restantes intérpretes estiveram globalmente bem. Salientaria a boa interpretação do baixo islandês Magnus Baldvinsson no papel do comerciante Dikoi. O tenor islandês Finnur Bjarnason que interpretou o papel de Kudriach foi muito aplaudido no final mas não entendi a razão dessa distinção dado que a voz era bonita mas pequena e, frequentemente, inaudível.

O público continua zangado com o São Carlos, pois ainda estavam muitos lugares vagos. E não é por desinteresse pela ópera. Se assim fosse, as emissões do Met Live na Gulbenkian, apesar de em “ecran”, não esgotariam todas. O São Carlos tem um passado glorioso que ainda está na memória de muitos e, mesmo mais recentemente, na era Pinamonti, houve grandes espectáculos no nosso único teatro nacional de ópera. É essa qualidade que todos esperam voltar a obter.
O espectáculo de hoje não envergonhou ninguém.

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quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Da Casa Dos Mortos, Leoš Janáček – Fundação Calouste Gulbenkian – 6 de Janeiro 2011



Da Casa Dos Mortos é a última ópera de Leoš Janáček. O libretto procura condensar a obra “Casa Morta” de Dostoievski. Esta, por sua vez, traduz a vivência do autor no seu exílio na Sibéria, cumprindo pena sob acusação de conspiração contra o Estado Russo.

A produção semi-encenada, e com recurso multimédia, apresentada hoje e amanhã, pela Fundação Calouste Gulbenkian, é bem conseguida. Contudo é de difícil assimilação para quem não se sente acusticamente familiar com o estilo de Janáček.

A música de Janáček é perturbante no primeiro acto, evoluindo em ideias melódicas altamente contrastantes, apresentadas com orquestração rude e agressiva. O 2º acto evolui de modo mais lírico e é, sem dúvida o mais envolvente dos três, culminando num acto final em que se fundem ambos os ambientes. O libreto é um relato de diversas histórias pelos prisioneiros, de interesse duvidoso e pouco cativante.

Esa-Pekka Salonen pareceu-me muito seguro no podium, dirigindo uma Orquestra Gulbenkian coesa e, como habitualmente, de qualidade exímia. É evidente o elevado conhecimento deste Maestro sobre a obra, em parte tutorado por Pierre Boulez, tendo já dirigido no Met de Nova York e no Teatro alla Scala em Milão.


Os solistas demonstraram excelente qualidade vocal e interpretativa, destacando-se no seu todo. Muitos deles já tendo participado com Salonen em produções prévias da obra.

A apresentação semi-encenada, em que aparecem de calça e colete pretos, com camisa branca descontraída e alguns adereços particulares, como as cadeiras de palco, resultou muito bem.

A projecção multimédia, da responsabilidade de Kristiina Helin, utiliza projecções do filme documentário Blatnoi mir (realizado por Jouni Hiltunen), bem como de outros (Nosferatu, eine Symphonie dês Grauens de Friedrich Wilhelm Murnau como fundo à peça Kedril e Don Juan; e Lot in Sodom de James Sibley Watson). Cria um enquadramento propositado às passagens cantadas e complementa a qualidade do efeito cénico global.

Não posso dizer que esta minha estreia em Janáček tenha sido excelente mas também não foi completamente desconcertante. Não consegui entrar totalmente na ideia filosófica da obra. Talvez uma visualização da versão encenada de Patrice Chéreau me ajude proximamente a viver de modo diferente esta ópera.

Peço perdão, Sr. Janáček, se não compreendi (para já) a sua visão.




From The House Of The Dead, Leoš Janáček - Calouste Gulbenkian Foundation - January 6th, 2011






From the House Of The Dead is Leoš Janáček the last opera. The libretto attempts to condense the book "Dead House" by Dostoievsky. This, in turn, reflects the experience of the author in his exile in Siberia, serving time due to the charges of conspiracy to the Russian regime.

The semi-staged and multimedia supported production presented today and tomorrow, by the Calouste Gulbenkian Foundation, is well achieved. Yet it is difficult to assimilate for those who do not feel acoustically familiar with the style of Janáček.

Janáček's music is annoying in the first act and evolved into highly contrasting melodic ideas, presented with rude and aggressive orchestration. The 2nd act is more lyrical and is undoubtedly the most engaging of the three, culminating in a final act that fuses both environments. The libretto is an account of several stories by prisoners, of dubious value and little catchy.

Esa-Pekka Salonen seemed very safe on the podium, addressing a cohesive and superb quality Gulbenkian Orchestra. It is evident the Maestro’s high knowledge of the work, in part mentored by Pierre Boulez. He has conducted it previously at the New York Met and at the Teatro alla Scala, Milan.


The soloists revealed excellent vocal and interpretative quality as a whole. Many of them have participated in previous productions of the work also with Salonen.

The semi-staged presented them in black pants and vest, a “relaxed” white shirt and some proper acessoires, like the wooden chairs of the stage.

The Kristiina Helin’s multimedia projection uses excerpts from the documentary film Blatnoi mir (directed by Jouni Hiltunen), as well as others (Nosferatu, eine Symphonie des Grauens Friedrich Wilhelm Murnau as a background to the piece and Kedril Don Juan, and Lot in Sodom by James Sibley Watson). It creates a purposeful framework for the sung passages and complements the overall quality of the scenic effect.

I can not say that my debut in Janáček was excellent but it was not too much confusing. I felt unable to enter the philosophical idea of the work. Perhaps I should have a look at the staged production by Patrice Chéreau and try to embrace this work...

Excuse me, Mr. Janáček, if I could not understand your vision... for now.