terça-feira, 29 de março de 2016

IL RE PASTORE, Palau de la Música Catalana, Barcelona, Março / March de 2016

(text in English below)

Il Re Pastore, opera composta por W.A. Mozart com 19 anos, foi interpretada em versão concerto, apesar de semi-encenada, no Palau de la Música Catalana em Março de 2016. Fruto dos tempos actuais, programa e legendas disponíveis apenas em catalão.



A interpretação musical esteve a cargo do reputado agrupamento Les Arts Florissants, sob a direcção de William Christie. Foram excelentes.



Também os solistas estiveram globalmente ao mais alto nível.

A soprano Martina Janková, foi Aminta, um pastor herdeiro do trono de Sidon. Foi excepcional. Boa presença cénica, voz belíssima, sempre bem colocada sobre a orquestra e numa afinação perfeita.
Irrepreensível foi a soprano Regula Mühelmann como Elisa, uma pastora enamorada de Aminta. Voz clara, bonita, jovem, com agudos fáceis e de grande qualidade, para além de uma coloratura exímia.



Angela Brower, mezzo, foi Tamiri, princesa de Sidon, responsável por mais uma interpretação de topo. Voz potente, de grande extensão, sem nunca perder qualidade em todos os registos.
O tenor Emiliano Gonzalez Toro cantou o Agenore, nobre de Sidon. Detentor de uma voz de timbre bonito, esteve sempre bem e foi particularmente notável no 2º acto.


Deixei para o fim Rolando Villazón, o tenor que teve o mundo operático a seus pés há poucos anos. Contudo, as escolhas de reportórios errados e a excessiva frequência dos espectáculos foram-lhe fatais. Interpretou Allessandro, rei da Macedónia. Se cenicamente foi muito bom, vocalmente esteve muito aquém dos outros solistas. Teve uma interpretação muito irregular, com várias notas falhadas e frequente perda do controlo vocal. É uma pena mas, mesmo a cantar Mozart, onde tem tido algumas interpretações recentes de qualidade, tal não aconteceu nesta noite.



Tivemos como encore o quinteto final da ópera.

****


IL RE PASTORE, Palau de la Música Catalana, Barcelona, ​​March 2016

Il Re Pastore, opera composed by W. A. ​​Mozart when he was 19 years old, has been interpreted in concert version, although semi-staged at the Palau de la Música Catalana in March 2016. As a result of the current situation, program and subtitles available only in Catalan.

The musical interpretation was in charge of the reputed orchestra Les Arts Florissants, conducted by William Christie. They were excellent.

Also the soloists were globally at the highest level. Soprano Martina Janková was Aminta, a shepherd heir of Sidon's throne. She was exceptional. Good stage presence, gorgeous voice, always over the orchestra and a perfect timbre.
Faultless was soprano Regula Mühelmann as Elisa, one enamored shepherd of Aminta. Clear, beautiful, young,, voice, easy and high notes, as well a a fantastic coloratura.

Angela Brower, mezzo, was Tamiri, Princess of Sidon, responsible for another top interpretation. Powerful voice with great extension, without ever losing quality in all registers.
Tenor Emiliano Gonzalez Toro sang Agenore, a noble from Sidon. He has a beautiful timbred voice, was always well and particularly striking in the 2nd act.

I left for the end Rolando Villazón, the tenor who had the operatic world at his feet a few years ago. However, the wrong choices of repertoires and too many performances were fatal to his voice. He played Allessandro, king of Macedonia. If scenically was very good, vocally he was much worse than other soloists. He had a very ireregular interpretation, with several failed notes and frequent loss of vocal control. It's a shame but even singing Mozart, with which he has had some recent interpretations of quality, that did not happen tonight.

We had as an encore the final quintet of the opera.


****

quarta-feira, 23 de março de 2016

LUCIA DI LAMMERMOOR, METropolitan Opera, Nova Iorque, Março / New York, March 2015


(review in English below) 

Lucia di Lammermoor, de G Donizetti, é uma das minhas óperas favoritas do compositor. O libretto é de Salvatore Cammarano baseado na novela de Sir Walter Scott, The Bride of Lammermoor. Já sobre ela escrevi aqui, recuperando agora parte desse texto.


A acção passa-se na Escócia no final do Século XVI. Lord Henry Ashton (Enrico) quer que a sua irmã Lucy (Lucia) se case com Arthur Bucklaw (Arturo) para fortalecer politicamente a sua (má) situação familiar. Mas ela está apaixonada pelo maior inimigo da família, Sir Edgar Ravenswood (Edgardo). Edgardo tem que ir a França procurar aliados para a Escócia. A pedido de Lucia o seu amor permanece secreto e trocam anéis. Enrico intercepta e forja uma carta de Edgardo para provar a Lucia a sua infidelidade e a convencer a casar com Arturo. Destruída pela situação, Lucia acaba por concordar e, quando a cerimónia está prestes a iniciar-se, surge Edgardo reafirmando o seu amor, mas o contrato nupcial já está assinado. Enrico desafia Edgardo para um duelo. A cerimónia do casamento é interrompida com a notícia de que Lucia assassinou Arturo. Ela surge ensanguentada e com um punhal na mão, num estado de loucura, imaginando que se está a casar com Edgardo e, pouco depois, morre. Edgardo, ao saber da notícia, apunhala-se.


A obra “belcantista” é um dos expoentes máximos do romantismo operático italiano, contém trechos notáveis e, se bem interpretada (exige um soprano e um tenor de superior qualidade), proporciona um espectáculo emocionante. A coloratura é usada em todo o seu esplendor na transmissão dos estados de alma da protagonista e alguns instrumentos, como a harpa e a flauta, também evocam a sua nostalgia e dor. Toda a ópera está recheada de trechos musicais marcantes, merecendo relevo, entre outros, o dueto entre Lucia e Edgardo no final do 1º Acto Verranno a te sull’aure, o sexteto do final do 2º Acto Chi mi frena, a famosíssima e longa cena da loucura de Lucia no 3º Acto Il dolce suono e o recitativo e ária final de Edgardo Tu che a Dio spiegasti. Um deleite para os apreciadores do estilo, entre os quais me incluo.



 A encenação de Mary Zimmerman é de belo efeito e muito do meu agrado. As cenas no exterior foram muito bem conseguidas, num ambiente frequentemente soturno bem apropriado e, a cena da loucura, com a grande escadaria no centro do palco, também me pareceu uma boa e funcional opção cénica e estética. Os fantasmas em palco foram outra opção interessante.




O maestro Maurizio Benini desiludiu. Houve diversos desencontros na orquestra e entre a orquestra e os cantores.



A Lucia foi interpretada pela jovem soprano russa Albina Shagimuratova. Gostei muito da sua actuação. Tem uma voz poderosa e ágil e de timbre bonito. A coloratura é marcante. Esteve bem cenicamente, apenas achei que lhe faltou doçura vocal quando necessário.



Edgardo foi interpretado pelo tenor maltês Joseph Calleja. O timbre é muito próprio, algo caprino, a afinação irrepreensível e a potência vocal imponente. Nas notas mais agudas impressiona pela qualidade e aparente facilidade com que as canta. Cenicamente esteve bem, sobretudo na cena final no cemitério.



Enrico, o vilão da ópera, irmão de Lucia, foi o barítono italiano Luca Salsi. Foi talvez a melhor interpretação da noite. Tem uma voz poderosa, de grande beleza, muito expressiva e versátil. A representação cénica foi também excelente.



Alaistar Miles, baixo inglês, foi um Raimondo de voz muito decente e com boa prestação cénica.



Matthew Plenk como Arturo, Theodora Hanslowe como Alisa, e Eduardo Valdes como Normanno completaram o elenco.



Já assisti ao vivo a esta produção outras duas vezes, uma com Anna Netrebko, Piotr Beczala, Marius Kwiecien e Ildar Abdrazakov, e outra com Natalie Dessay, Joseph Calleja, Ludovic Tézier e Kwangchul Youn. Apesar de ter gostado muito de rever o espectáculo, confesso que a récita de hoje não superou as outras.








A Metropolitan Opera de Nova Iorque está entre as minhas catedrais de opera preferidas. Tem o grande inconveniente de o publico ser pouco selectivo, aplaudindo tudo de igual modo, independentemente da qualidade mas, sobretudo, aplaudindo compulsivamente sem deixar terminar a música.

Pela primeira vez assisti a protestos do publico, não pela actuação dos cantores (não seria, de todo, justificada), mas pela demora dos intervalos (45 minutos). No segundo bateram-se palmas ritmadas durante minutos, o que obrigou a alguém da produção vir a palco pedir desculpa e justificar o atraso pela necessidade de verificação de que tudo nos cenários estaria em perfeitas condições de segurança.

*****


LUCIA DI LAMMERMOOR, Metropolitan Opera, New York, March 2015


Lucia di Lammermoor by G Donizetti, is one of my favorite operas of the composer. The libretto is by Salvatore Cammarano, based on the novel by Sir Walter Scott, The Bride of Lammermoor. I wrote about this opera here and I recover part of the text.

The action takes place in Scotland at the end of the sixteenth century. Lord Henry Ashton (Enrico) wants his sister Lucy (Lucia) to marry Arthur Bucklaw (Arturo) to recover their (bad) family situation. But she is in love with the greatest enemy of the family, Sir Edgar Ravenswood (Edgardo). Edgardo has to go to France to seek allies to Scotland. At the request of Lucia their love remains secret and they exchange rings. Enrico intercepts and forge a letter from Edgardo to prove Lucia his infidelity and convince her to marry Arturo. Destroyed by the situation, Lucia ultimately agrees and when the ceremony is about to begin, Edgardo arrives reaffirming his love, but the marriage contract is already signed. Enrico challenges Edgardo to a duel. The wedding ceremony is interrupted by the news that Lucia murdered Arturo. She appears full of blood and with a dagger in her hand, in a state of madness, wondering to marry Edgardo and shortly thereafter dies. Edgardo, upon hearing this news, stabs himself.

This belcanto opera is one of the finest examples of Italian operatic romanticism, contains remarkable parts and, when properly interpreted (requires a soprano and a tenor of top quality), provides a thrilling performance. The coloratura is used in all its splendor in the transmission of states of mind of the protagonist and some instruments such as the harp and the flute, also evoke nostalgia and pain. The entire opera is full of remarkable musical excerpts, including the duet between Lucia and Edgardo at the end of Act 1 Verranno a te sull'aure, the end of the 2nd Act sextet Chi mi Frena, the very famous and long madness Lucia's scene in the 3rd Act Il dolce suono, and the recitative and final aria of Edgardo Tu che a Dio spiegasti. A delicacy for lovers of this style, among which I include myself.

I liked the staging of Mary Zimmerman that is effective. The scenes outdoors were very well staged in a very appropriate, often gloomy environment. The madness scene, with a big staircase in the center of the stage, also seemed a good and functional scenic and aesthetic choice. Ghosts on stage were another interesting option.

Conductor Maurizio Benini was disappointing. There have been several mismatches within the orchestra and between the orchestra and the singers.

Lucia was interpreted by young Russian soprano Albina Shagimuratova. I really enjoyed her performance. She has a powerful, agile and beautiful voice. The coloratura was striking. She was also convincing onstage, I just thought she lacked vocal sweetness when needed.

Edgardo was interpreted by Maltese tenor Joseph Calleja. The timbre is very personal and he showed an impressive vocal power. The top notes were sung with high quality and apparent ease. He was well on the stage performance, especially in the final scene in the cemetery.

Enrico, the opera villain, brother of Lucia, was the Italian baritone Luca Salsi. He was perhaps the best singer of the night. He has a powerful voice of great beauty, very expressive and versatile. The stage performance was also excellent.

Alaistar Miles, English bass, was a very decent Raimondo with a good performance, both vocal and scenic.

Matthew Plenk as Arturo, Theodora Hanslowe as Alisa, and Eduardo Valdes as Normanno completed the cast.

I have watched this live production two times before, once with Anna Netrebko, Piotr Beczala, Marius Kwiecien and Ildar Abdrazakov, and another with Natalie Dessay, Joseph Calleja, Ludovic Tézier and Kwangchul Youn. Despite I very much liked to see again this opera tonight, I confess that today´s performance has not overcome the two others.

The Metropolitan Opera in New York is among my favorite opera cathedrals. The only drawback is the public being not selective, applauding all equally, regardless of quality,. But even worse is always applauding before the music is finished.

For my first time I saw public protests, not to the singers (which were excellent), but to the delay of intervals (45 minutes). In the second one, rhythmic clapping for minutes forced someone from to the production to come to the stage and apologize, justifying the delay by the need to check that all the scenario equipment would be in perfect safety.


*****

segunda-feira, 21 de março de 2016

DON QUIXOTE, Theatro de São Pedro, São Paulo, Março de 2016

DON QUIXOTE ABRE TEMPORADA DE ÓPERAS DO THEATRO SÃO PEDRO.

Crítica de Ali Hassan Ayache do blog de Ópera e Ballet:



Toda a força da obra de Jules Massenet está nas melodias encantadoras, foi criticado na sua época por seus pares por ser demasiado popularesco. O sentimentalismo em excesso presente na sua escrita deixou óperas inesquecíveis e que são queridas do grande público e se encontram no repertório dos grandes teatros. "Thais" , "Wherther" e "Manon" são exemplos desse sucesso melódico. Pena não poder dizer o mesmo de "Don Quixote" baseada na obra "Le Chevalier à la Longe Figure" drama em versos de Jacques de Lorrain e não no clássico de Cervantes.
 
"Don Quixote" tem escrita orquestral fraca nos três primeiros atos, consegue força dramática nos dois últimos e o principal, a obra não empolga e carece de força emotiva. O libreto é fraco, um folhetim que desagrada a intelectuais, por conhecerem a obra prima de Cervantes e ao público comum pela simplicidade do enredo. O terceiro ato diviniza o personagem central, ele consegue com a força da reza fazer bandidos durões e implacáveis se comoverem e devolverem as joias roubadas. Nada mais fora da realidade, a cena mais estranha da história da ópera. "Don Quixote" só existe porque um dos maiores baixos de todos os tempos popularizou a ópera. Escrito na medida para o russo Feodor Chaliaplin, este com seu excepcional talento vocal e cênico popularizou o Cavalheiro de Triste Figura na ópera. 

O Theatro São Pedro se especializa em títulos raros de ópera e esse foi mais um deles. Para abrir sua temporada convocou um diretor que passeia pela ópera e por outros gêneros. Jorge Takla não poupou esforços para fazer desse "Don Quixote" uma "Carmen" de Bizet. As danças com sapateado, os figurinos dos coristas e a roupa da solista lembram o ambiente e clima da famosa cigana. Takla consegue criar um clima espanhol bem característico, diferente de diretores que gostam de inventar moda fica no básico. A movimentação dos solistas e coristas correta deu dinâmica a montagem.

Enriqueceu o enredo os belos cenários de Nicolas Boni, gravuras e os famosos moinhos aparecem e identificam de forma fácil a conexão com a história. Os figurinos de Fabio Namatame foram pelo mesmo caminho, corretos e  adequados ao enredo. O desenho de luz de Ney Bonfante  mostra cores e movimentações que dialogam com as cenas.

O que dizer do mezzo-soprano Luisa Francesconi, a moça sempre se apresenta em nível elevado e dessa vez não foi diferente. Sua voz tem o timbre correto, sedutora e cristalina que esbanja na técnica e com um refinamento único. Sua Dulcineia teve uma atuação cênica precisa. O baixo americano Gregory Reinhart fez um Don Quixote constante, do começo ao fim o personagem mostrou o mesmo tipo de atuação cênica e temperamento. Vocalmente esteve à altura do personagem, esbanjou nos graves em uma voz que se mostra extensa. A voz de Eduardo Amir oscilou e balançou em um timbre desagradável.

A Orquestra do Theatro São Pedro mostrou maturidade operística nas mãos do regente Luiz Fernando Malheiro, sonoridade e volume compatível com o tamanho da sala. Sua regência enriqueceu uma obra que peca pela falta de qualidade orquestral. 

Convidada para assistir a ópera no dia 04 de Março e prestigiar o amigo Jorge Takla  a apresentadora Marília Gabriela ficou conversando com um amigo diversas vezes no decorrer do espetáculo, levou um pito de um espectador próximo, fez cara de poucos amigos e sentiu-se inconformada. No teatro de ópera ou em qualquer tipo de teatro cara Marília manda o bom senso que as pessoas assistam o evento e não fiquem conversando. Os que compraram ingresso querem ouvir os cantores e não sua voz.


Ali Hassan Ayache

quinta-feira, 17 de março de 2016

O CREPÚSCULO DOS DEUSES / GÖTTERDÄMMERUNG, Gran Teatro del Liceu, Barcelona, Março / March 2016

(in English below)

O Crepúsculo dos Deuses de R. Wagner foi levado à cena em Março de 2016 no Liceu de Barcelona. A encenação foi de Robert Carsen. Não vi nenhuma das 3 outras óperas deste Anel, pelo que não consigo enquadrar esta última no que se terá passado anteriormente.

No início há uma sala desactivada, com parte da mobília empilhada ou tapada e presa com cordas, os fios dourados que traçam o destino que as Nornas tecem, prendendo algumas peças. Aparecem como empregadas domésticas inicialmente a lavar o chão.
Toda a ópera decorre essencialmente em três cenários. Um espaço aberto (o rochedo) onde estão depositados despojos militares, entre eles roupas, armas, capacetes e espadas. É aqui que surgem inicialmente Siegfried (vestido de camuflado) e Brünhilde, e será também neste cenário que ocorrerá o diálogo entre Brünhilde e Waltraute.
O palácio dos Gibichung é uma enorme sala de uma instalação militar com bandeira vermelha com faixa branca a meio e lareira ao fundo e com uma grande secretaria central. Gunther é o militar de mais alta patente e está rodeado por outros. Hagen está vestido à civil. Siegfried quando chega vem desarranjado, ao contrário de todos os militares impecavelmente fardados. Não sabe o que é o agrafador ou o telefone que estão sobre a secretária.
O 1º acto termina no cenário já referido em que Siegfried, transformado pelo elmo em Gunther, procura Brünhilde. Nesta produção é o próprio Gunther que aparece, faz os movimentos bocais como se cantasse, mas quem canta é o Siegfried nos bastidores. A ideia não resulta cenicamente.


No 2º acto, novamente no grande salão militar, Brünhilde chega vestida de noiva, e não é reconhecida por Siegfried, que está com Gutrune, impecavelmente vestida. O coro é um grande grupo de militares, em determinado momento agitando muitas bandeiras idênticas. Aqui o efeito cénico é excelente. As analogias com o nazismo são evidentes, mas a cena poderia passar-se em qualquer outro enquadramento.

O 3º acto abre com as filhas do Reno sujas, a lavarem-se na água de um Reno poluído, com toda a espécie de materiais velhos: pneus, armas, um televisor, rodas empenadas, alguidares, etc. É neste cenário que Siegfried é assassinado por Hagen (com o cabo de uma bandeira) e levado, morto, para a grande secretária do salão militar. Surge Brünhilde mas a cortina desce e ela interpreta em palco o impressionante final sem qualquer suporte visual até à imolação pelo fogo que surge de todos os lados do palco.

A direcção musical, excelente, foi do maestro Josep Pons. A Orquestra Sinfónica e, sobretudo, o Coro do Gran Teatre del Liceu estiveram ao mais alto nível, como raramente se ouvem no Liceu.



Num conjunto de cantores de primeira água, as 3 Nornas (Cristina Faus, Pilar Vásquez, Jacquelyn Wagner) cantaram bem mas foram as que menos impressionaram. Já as 3 Filhas do Reno (Isabel Gaudí, Anna Alàs i Jové, Marina Pinchuk) foram óptimas. 



Alberich foi interpretado de forma banal pelo barítono Oskar Hillebrandt, num papel pequeno. 
A mezzo Michaela Schuster foi uma grande Waltraute, de voz firme, bem colocada e expressão cénica impecável.
 Gutrune foi cantada pela soprano Jacquelyn Wagner. Esteve muito bem e tem uma excelente figura, o que ajudou à personagem. Vocalmente foi uma das menos fortes porque a voz, bonita e lírica, não é encorpada e, ocasionalmente, foi abafada pela orquestra.


O tenor Lance Ryan foi o Siegfried. Cantou bem mas não é o heldentenor que se deseja para a personagem porque lhe falta corpo vocal. Tem figura de Siegfried, cumpre todas as notas, mas há quem o faça de forma mais imponente. Contudo, foi uma boa interpretação.


O Gunther do barítono Samuel Youn foi óptimo. O cantor tem uma voz potente e bem timbrada, muito agradável e afinada. Esteve também muito bem no desempenho cénico.


O baixo Hans-Peter König foi absolutamente fabuloso como Hagen. É o melhor da actualidade neste papel. Voz poderosíssima e de uma beleza invulgar, interpretação absolutamente irrepreensível, cénica e vocal.


E que dizer da Brünhilde do soprano Iréne Theorin? Que foi a melhor da noite? Que foi excelente tanto cénica como vocalmente? Que interpretou a personagem de forma absolutamente impecável e convincente? Que a voz foi imponente e sempre sobre a orquestra? Que na cena da imolação, sozinha em palco, foi comovente e arrasadora? Sim, foi tudo isso! Uma das melhores interpretações que vi e ouvi até hoje da personagem. Fabulosa!



Um Crepúsculo dos Deuses ao mais alto nível no Liceu de Barcelona.








*****


TWILIGHT OF THE GODS / Götterdämmerung, Gran Teatro del Liceu, Barcelona, ​​March 2016

The Twilight of the Gods by R. Wagner was on stage in March 2016 in Liceu de Barcelona. The staging was Robert Carsen. I did not see any of the three previous operas of this ring so I cannot fit in the latter that will have passed before.

At the beginning there is a disabled room, with part of the furniture stacked or covered and secured with ropes, the golden threads with which the Norns trace the destiny (presented as maids initially washing the floor). The whole opera takes place essentially in three scenarios. An open space (the rock) which has deposited military remains, including clothing, weapons, helmets and swords. It is here that initially Siegfried (dressed in camouflaged) and Brünhilde, appear, and will also be in this scenario that the dialogue between Brünhilde and Waltraute will occur.
The Gibichung’s Palace is a huge room of a military set with a red flag with white band in the middle, a fireplace in the background and a large central desk. Gunther is a high-ranking militar and is surrounded by others. Hagen is dressed in civilian clothes. Siegfried arrives deranged, in opposition to all impeccably uniformed military men. He does not know what is the staple or the phone on the desk. The 1st act ends in the scenario mentioned above in which Siegfried, transformed by the helmet in Gunther, looks for Brünhilde. In this production it is Gunther himself that appears, make the mouth movements like singing, but who is singing is Siegfried behind the scenes. The idea does not result well.

In the 2nd act again in the great military hall, Brünhilde arrives dressed as a bride, and is not recognized by Siegfried, who is with an elegantly dressed Gutrune. The choir is a large group of military people, at some point wielding many identical flags. Here the scenic effect is excellent. The analogies with Nazism are evident, but the scene could happen in any other framework.
The 3rd act opens with the dirty daughters of the Rhine washing themselves in the water of a polluted Rhine with all sorts of debris: tires, weapons, a TV, warped wheels, bowls, etc. It is in this scenario that Siegfried is murdered by Hagen (with the handle of a flag) and led, dead, to the large desk military hall. Brünhilde appears but the curtain comes down and she sings in the final stunning immolation scene without any visual support. Finally fire that comes from all sides of the stage.

The excellent musical direction was the conductor Josep Pons. The Symphony Orchestra and, above all, the Gran Teatre del Liceu Choir were at the highest level, as I rarely heard at the Liceu.

The three Norns (Cristina Faus, Pilar Vásquez, Jacquelyn Wagner) sang well but were less impressive than the 3 daughters of the Rhine (Isabel Gaudí, Anna Alàs i Jové, Marina Pinchuk) that were great.

Alberich was interpreted by the baritone Oskar Hillebrandt, in a small banal role. Mezzo Michaela Schuster was a great Waltraute, with a firm voice, well tuned and impeccable scenic expression.

Gutrune was sung by soprano Jacquelyn Wagner. She was very good and has a nice figure, which helped to the character. Vocally she was one of the less impressive because the voice, beautiful and lyrical, is not full-bodied and occasionally was drowned out by the orchestra.

Tenor Lance Ryan was Siegfried. He sang well but is not the heldentenor you want for the character because he lacks vocal potency. He looks like a Siegfried, sings well all the notes, but a more imposing singer would fit better. However, it was a good interpretation.

Baritone Samuel Youn was an impressive Gunther. The singer has a powerful, very nice and refined voice. He was also very good on stage.

Bass Hans-Peter König was absolutely fabulous as Hagen. At present times, he is the best present in thisrole. Powerful and unusually beauty voice. His performance was absolutely irreproachable, scenic and vocal.

And what about soprano Iréne Theorin’s Brünhilde? Was she the best of the night? Was she excellent both scenic as vocally? She played the character absolutely flawless and convincing? Her voice was imposing and always above the orchestra? At the scene of the immolation, alone on stage, was she touching and overwhelming? Yes, it was all! One of the best performances I have ever seen and heard of this Brünhilde. Fabulous!

A Twilight of the Gods at the highest level in the Liceu de Barcelona.


*****