quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

MARIA STUARDA, Teatro Nacional de São Carlos, Lisboa / Lisbon, Janeiro / January 2020


(review in English below)

Uma Maria Stuarda de luxo no Teatro de São Carlos!

Maria Stuarda, de G Donizetti com libreto de Giuseppe Bardari é baseada na peça Maria Stuart de F. Schiller. O enredo passa-se no período histórico dos Tudor em Inglaterra e é uma das três óperas (Anna Bolena, Maria Stuarda e Roberto Devereux) habitualmente designadas como “as rainhas de Donizetti” pelos papéis primordiais por estas assumidas. A presente é dominada pelo confronto entre as duas rainhas, Elisabetta (Isabel I) e Maria Stuarda, culminando com a decapitação da última.



É uma ópera romântica, onde o compositor caracteriza musicalmente as personagens e seus dramas. (A primeira grande ópera romântica de Donizetti, Anna Bolena, fora escrita 4 anos antes, em 1830). É musicalmente de uma beleza inegável, fruto da expressão de todos os conflitos entre as principais personagens. Foi censurada pela forma como representava as rainhas, nomeadamente pela expressão ultrajante como Maria Stuarda acusa Elisabetta (Figlia impura di Bolena parli tu di disonore? Meretrice indigna, oscena, in te cade il mio rossone. Profanato è il soglio inglese, vil bastarda, das tui piè!) no confronto directo das duas (que na vida real nunca aconteceu), uma das componentes de maior impacto da ópera.

(programa de sala da récita de 1985 no Teatro de São Carlos)

Para os apreciadores do estilo, como é o meu caso, é um pitéu musical. Exige pelo menos três cantores de grande qualidade e foi o que aconteceu.

Mas comecemos pela encenação de Andrea de Rosa, com cenografia de Sergio Tramonti, figurinos lindíssimos de Ursula Patzak e magnífico desenho de luz de Pasquale Mari. É uma produção do Teatro dell’Opera de Roma.
É muito clássica, minimalista, muito bonita, com um excelente guarda roupa, boa iluminação, a direcção de atores a privilegiar o canto e a colocar os cantores sempre em palco. Sem exorbitâncias. Simples, direta, eficaz e muito agradável. Como devia ser sempre. Várias partes são notáveis, nomeadamente o parque do castelo de Fotheringay onde Maria Stuarda está presa e o final da ópera com o carrasco em fundo. É a demonstração que, com muito poucos adereços, se conseguem fazer encenações de grande qualidade.



O Coro do Teatro Nacional de São Carlos e a Orquestra Sinfónica Portuguesa estiveram muito bem. A direcção musical esteve a cargo do maestro Fabrizio Maria Carminati.



Em relação aos cantores, uma maravilha! Todos excelentes, jovens, vozes fantásticas e actores exímios.

A mezzo italiana Alessandra Volpe foi uma Elisabetta impressionante, sempre com bom volume e projeção, timbre bonito, boa presença, numa interpretação por vezes contida mas muito eficaz. Foram marcantes os duetos com o Leicester e a confrontação com a Stuart.



Leonardo Cortellazzi foi um óptimo Leicester tanto na interpretação vocal como cénica. É um tenor italiano excelente, com presença forte, tem um timbre muito bonito e a voz sempre com volume e afinada. Fantástico. O dueto no 1º acto com a Elisabetta Era d'amor l'immagine  foi um dos momentos mais marcantes da interpretação, mas esteve sempre ao mais alto nível.





A Maria Stuarda da soprano russa Ekaterina Bakanova foi fabulosa. A cantora tem uma figura óptima, magra e alta, algo frágil, mas uma voz impressionante. Timbre magnífico, projecção imponente, sem estridências, registo agudo notável e interpretação muito emotiva. Foi suave e muito lírica na abertura quando recorda a sua liberdade e felicidade em França (Ah! nebe che lieve per l’aria aggiri), comovente quando pede ao Talbot para a ouvir em confissão  (Quando di luce rosea)  e arrasadora quer na famosa aria Deh! Tu di un umile preghiera, quer no final Di un cor che more. Um luxo!






Nos papeis secundários a qualidade do canto e da interpretação não destoou, foram também óptimos os barítonos Luís Rodrigues (Talbot)



e Christian Luján (Cecil),



 e a soprano Rita Marques (Anna Kennedy).




Um magnífico espectáculo de ópera, para mim o melhor em muitos anos no Teatro de São Carlos.





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MARIA STUARDA, Teatro de São Carlos, Lisbon, January 2020

A luxurious Maria Stuarda at the Teatro São Carlos!

Maria Stuarda, by G Donizetti with libretto by Giuseppe Bardari is based on the play Maria Stuart by F. Schiller. The plot takes place in the historic period of the Tudor dynasty in England and is one of the three operas (Anna Bolena, Maria Stuarda and Roberto Devereux) usually referred to as “the queens of Donizetti” for their primordial roles. The present is dominated by the confrontation between the two queens, Elisabetta and Maria Stuarda, culminating in the beheading of the latter.

Maria Stuarda is a romantic opera, where the composer musically characterizes the members of the plot and their dramas. (The composer's first great romantic opera, Anna Bolena, was written 4 years earlier, in 1830). It is musically undeniably beautiful, the result of the expression of all the conflicts between the main characters. It was censored for the way it represented the queens, namely for the outrageous expression as Maria Stuarda accuses Elisabetta (Figlia impura di Bolena parli tu di disonore? Unworthy, oscena meretrice, in te cade il mio rossone. Profanato is the soglio inglese, vil bastarda, das tui piè!) in the direct confrontation of the two queens (which never happened in real life), one of the most impactful components of opera.

For lovers of style, as is my case, it is a musical delight. It requires three singers of great quality and that's what happened.

But let's start with the direction by Andrea de Rosa, with scenography by Sergio Tramonti, beautiful costumes by Ursula Patzak and magnificent lights by Pasquale Mari. It is a production of the Teatro dell'Opera in Rome.
It is very classic, minimalist, very beautiful, with excellent costumes, good lights, the direction of the actors to privilege the singing and to always put the singers on stage. No exorbitances. Simple, direct, effective and very pleasant. As it should always be. Several parts are notable, namely the Fotheringay castle’s park where Maria Stuarda is imprisoned and the end of the opera with the executioner in the background. It is the proof that, with very few props, it is possible to make high quality productions.

The Choir of the Teatro National de São Carlos and the Portuguese Symphony Orchestra were very good. The musical direction was in charge of the maestro Fabrizio Maria Carminati.

Regarding the singers, a marvel! All excellent, young, fantastic voices and excellent actors.

Italian mezzo Alessandra Volpe was an impressive Elisabetta, always with good volume and projection, beautiful timbre, good presence, in an interpretation sometimes contained but very effective. The duets with Leicester and the confrontation with Stuart were remarkable.

Leonardo Cortellazzi was a great Leicester in both vocal and scenic interpretation. He is an excellent Italian tenor, with a strong presence, has a very beautiful timbre and his voice is always with good volume and in tune. Fantastic. The duet in 1st act with Elisabetta Era d'amor l'immagine was one of the most striking moments of the interpretation, but he was always at the highest level.

Maria Stuarda by Russian soprano Ekaterina Bakanova was fabulous. The singer has an excellent figure, thin and tall, somewhat fragile, but an impressive voice. Magnificent timbre, imposing projection, without stridency, remarkable top register and very emotional interpretation. She was soft and very lyrical in the opening when she recalls her freedom and happiness in France (Ah! Nebe che lieve per l'aria aggiri), moving when she asks Talbot to hear her in confession (Quando di luce rosea) and smaching in the famous aria Deh! Tu di um umile preghiera, and in the end Di un cor che more. A luxury!

In supproting roles, the quality of singing and stage performance did not clash, baritones Luís Rodrigues (Talbot) and Christian Luján (Cecil) were also great, as well as soprano Rita Marques (Anna Kennedy).

A magnificent opera performance, for me the best in many years at Teatro de São Carlos.

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segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

PARSIFAL, Theatre du Capitole, Toulouse, Janeiro / January 2020


Texto de wagner_fanatic

(review in English below)

Um Parsifal impressionante em Toulouse! 

A encenação de Aurélien Bory começa na abertura com um fundo em pano cinzento claro onde se projectam por trás, várias lâmpadas compridas florescentes / led tipo sabre da Guerra das Estrelas, que começam todas em fila indiana na horizontal e vão formando símbolos e letras ao longo da abertura (significado específico, se tinham, não captei) e terminando na mesma posição como começaram. No centro do palco uma estrutura rectangular tipo rede, 7 por 9 quadrados, com ramos de folhas entrelaçados e que tenta representar a floresta de Monsalvat.
Gurnemanz, os cavaleiros mais novos, Kundry vão-se elevando pelos quadrados e há um jogo de projecção de sombras numa tela posterior branca, côncava. A simulação da chegada de Kundry é com uma luz que se vai mexendo nesta estrutura e projectando o reflexo da folhagem na tela dando a noção da visão que Kundry teria ao se deslocar entre os ramos da Floresta. O bálsamo é uma bola com luz.
Quando chega Amfortas é transportado nos braços de vários homens com máscaras cirúrgicas dando aqui a noção indirecta de cuidadores médicos ao homem com a ferida. Nesta fase, a estrutura retangular já se elevou para trás e deixa Gurnemanz sentado e Amfortas com o seu monólogo nos braços dos homens. Com a saída de Amfortas, volta a baixar a estrutura retangular sobre as cabeças de Gurnemanz e cavaleiros mais novos, cada um ficando como que preso num destes quadrados que a formam.
A narração do Graal tem projecções posteriores na tela, da lança que é a tal luz que refiro na descrição da entrada. Quando há referências a Titurel este aparece vestido de branco e caminha ao longo da tela com um ramo de folhagem na mão, sobre um fundo de sombras da folhagem da floresta. Pouco antes do final da narração de Gurnemanz, Parsifal surge vestido de branco e traz numa mão um pequeno cisne e uma luz na outra e é ele próprio projecta a imagem do cisne na tela de fundo branco onde estão já as sombras dos ramos da floresta.
Quando a música sugere a morte do cisne, Parsifal faz cair o reflexo do cisne no chão e é agarrado e colocado no meio da estrutura rectangular. A projecção da sua sombra é agora o que se vê na tela, sombra enorme mas definida e que demonstra a sua importância nesta fase e, ao mesmo tempo, coloca-o como réu.
A acção desenvolve-se e a estrutura rectangular é retirada para cima não sem antes vários homens vestidos de negro, cada um deles, ficar com um ramo de folhagem em cada mão, deixando a estrutura completamente despida. Estes homens dividem-se em 3 grupos e cada grupo envolve Gurnemanz, Parsifal e Kundry, simulando-os envoltos no mistério da floresta de Monsalvat e estes a afastarem os ramos quando falam ou quando se movem, conseguindo-se assim manter de forma simples mas eficaz e não sem sentido, a noção do local original onde se encontram.
Quando Parsifal se sente a desmaiar ao saber que a sua Mãe morreu, a água que Kundry leva é feita pela projecção de luz de uma lanterna sobre as suas mãos e depois “derramada” sobre a cabeça de Parsifal.
Na cena da transformação, a estrutura rectangular fica vertical e na parte de trás do palco, simbolizando o castelo. Amfortas faz monólogo no mesmo tipo de apoio que já referi. O Graal surge como imagens de reflexo de luz na tela posterior após desaparecimento da estrutura rectangular por cima do palco.



O início do 2º acto volta a ver as projecções das lâmpadas compridas mas desta vez na vertical e central do palco. Ao subir a tela vemos um Klingsor vestido de branco, com capa, sentado com a lança na vertical à frente e agarrando-a com as 2 mãos. Só que a mão direita não é do Klingsor mas sim de um duplo deste que está por traz dele, vestido igual. No fundo, no que se desenvolve este duplo é na própria “mão direita” de Klingsor, dado que é ele que vagueia pelo palco, ficando Klingsor estático no centro, e enfeitiça Kundry e “activa” as mulheres flor agarrando-as, elevando-as pela cintura e abanando-as.
As mulheres flor tem vestidos corridos e véus que mais as fazem parecer cadáveres do que flores. Todo o dueto de Parsifal e Kundry é à frente de um paralelepípedo com as dimensões similares à grelha rectangular do 1º acto, ou seja, o símbolo do reverso do mundo do Graal que é o mundo criado por Klingsor. Este paralelepípedo vê impresso por detrás imagens de corpos desnudos de homens e mulheres, enquadrando assim o já sabido mundo carnal de Klingsor.
No 3º acto, não há lâmpadas como no início dos outros actos, mas sim várias sobras de homens com armadura e com lança, vagueando de um lado para o outro, em simbolização do à deriva de Parsifal até voltar a Monsalvat. Gurnemanz, que tal como os cavaleiros, está careca no 1º acto, aparece agora com cabelo, sendo o mesmo válido para os cavaleiros e Amfortas quando mais tarde aparecem. Parsifal, por sua vez, com cabelo no 1º acto e agora careca. O encenador, no meu entendimento, coloca aqui a noção de imortalidade dada pelo Graal, com o crescimento do cabelo a simbolizar o envelhecimento dos cavaleiros e de Amfortas por este não celebrar o ritual, ao passo que Parsifal, iluminado pela lança como extensão sagrada do Graal, atinge essa imortalidade.
Monsalvat é agora um ambiente de palco escuro, ficando novamente com uma estrutura geométrica quadrangular, feita por fios verticais com lampadas que se acendem e apagam em padrões ao longo do acto. A simbolização da água que lava os pés e a cabeça de Parsifal é feita novamente por uma luz de lanterna. Durante a final intervenção vocal de Parsifal, em vez do original toque da lança para curar a ferida de Amfortas (que aqui nunca se define, nunca se vê), este vai como que injectando em Amfortas várias lâmpadas compridas (= várias lanças) até Amfortas se tornar novamente são e caminhar pelo seu pé para fora de palco.
A lança extingue-se assim em Amfortas, Parsifal agarra do chão último um ramo da floresta original, que oferece a Amfortas mas este recusa, saindo de palco. Parece-me que assim se simboliza que agora é a ele que cabe renovar esta Monsalvat, “reflorestar” como estaria no passado (1º acto) mas que será muito mais forte. E sabemos que será mais forte porque desce uma estrutura em grelha do cimo do palco até à base, com alicerces muito mais espessos que a grelha do 1o acto, caindo sobre um Gurnemanz e uma Kundry que com lanternas acesas reforçam a ideia que se sente ao longo de toda a encenação - a luz como símbolo do Poder do Bem (o bálsamo que Kundry traz das Arábias é uma bola luminosa, a água que conforta o desfalecido Parsifal é a luz duma lanterna, a água que o lava antes do baptismo e a água que o baptiza é a luz de uma lanterna, a lança é uma lâmpada, o Graal é um reflexo de luz...) e que é com essa luz, esse poder, que se renovará Monsalvat e o Graal.

Chuva de “boos fáceis” para o encenador no final, altamente injusta, de uma plateia claramente inculta nesta obra, para uma encenação sem controvérsia, com sentido e, sendo diferente, mantendo-se mesmo assim fiel à original de Wagner.



A par com a encenação, o que mais me impressionou foi a Orquestra, dirigida por Frank Beermann. Esta produziu uma sonoridade e dramatismo do mais alto nível, conseguindo algo muitas vezes ausente e que é a clara definição de cada naipe e linha melódica (algumas por vezes abafadas em muitas produções), sem contudo se perder a noção do conjunto. Precisão e lirismo irrepreensíveis.

A expressividade facial e corporal quer de Peter Rose quer de Nikolai Schukoff foram impressionantes, com o baixo a produzir uma representação sólida de Gurnemanz, apesar de alguma bem disfarçada (com clarear de voz e alguns rebuçados mascados) menor saúde vocal muito possivelmente fruto da época invernal, e Schukoff a oferecer um Parsifal expressivo, bem transformado ao longo da récita e com um brilho e resistência vocal de excepção. Foi excelente a sua prestação corporal durante a narração de Kundry sobre a sua Mãe.
Não obstante, não posso deixar de achar que no dueto com Kundry no 2º acto faltou algo... não sei se foi a sua projecção forte, sem harmónicos mais graves, ou alguma linearidade de expressão vocal em algumas passagens mas faltou algo que me agarrasse à cadeira.



Sophie Koch começou sem deslumbrar muito no 1º acto e início do 2º mas abriu vocalmente para uma potente interpretação no dueto com Parsifal, embora com um ar matrona. Conseguiu-se notar algum nervosismo de 1ª vez no papel e por isso aqui estou a dar-lhe esse desconto mas acredito que possa triunfar neste papel com a experiência, tal como tem feito em muitos outros.



O lirismo de Matthias Goerne na sua 1ª intervenção foi sublime, progredindo para uma excelente oferta de contrastes expressivos no monólogo do 1º acto mas aqui pecando pelo facto de os harmónicos da voz serem muito baixos e por vezes como que metralhando o som vocal. No monólogo final voltou a oferecer contrastes vocais correctos para o texto mas um dos problemas é a tessitura da voz, que pelas suas características harmónicas graves, empobrecem e dificultam os agudos.



O Klingsor (Pierre-Yves Pruvot) posicionalmente muito estático, cumpriu com um timbre vocal muito bom.



O Titurel (Julien Veronèse)... perfeito!



Coros excelentes, embora tivesse gostado de ouvir uma maior distância dos coros fora de palco do 1º acto mas talvez não seja fisicamente possível de fazer neste teatro.









PARSIFAL, Theater du Capitol, Toulouse, January 2020

Text by Wagner_fanatic

An impressive Parsifal in Toulouse!

Aurélien Bory's direction begins at the opening with a background in light gray cloth where projecting from behind, several long blossoming lamps / led lights similar to Star Wars, which all start in single file horizontally and form symbols along opening (specific meaning, if they had, I didn't capture) and ending in the same position as they started. In the center of the stage a rectangular structure, 7 by 9 squares, with intertwined leaves and branches that tries to represent the Monsalvat forest.
Gurnemanz, the younger knights, Kundry rise up through the squares and there is a game of casting shadows on a white, concave rear screen. The simulation of Kundry's arrival is with a light that moves in this structure and projects the reflection of the foliage on the screen, giving the notion of the vision that Kundry would have when moving between the branches of the Forest. The balm is a ball with light.
When Amfortas arrives, he is transported in the arms of several men with surgical masks, giving here the indirect notion of medical caregivers to the man with the wound. At this stage, the rectangular structure has already risen behind and leaves Gurnemanz sitting and Amfortas with his monologue in the arms of men. With the departure of Amfortas, he lowered the rectangular structure over the heads of Gurnemanz and younger knights, each one as if trapped in one of these squares that form it.
The narration of the Grail has posterior projections on the screen, of the spear that is the light that I refer to in the description of the entrance. When there are references to Titurel, he appears dressed in white and walks along the screen with a branch of foliage in his hand, against a background of shadows from the forest's foliage. Shortly before the end of Gurnemanz's narration, Parsifal appears dressed in white and carries a small swan and a light in the other and is himself projecting the image of the swan on the white background canvas where the shadows of the branches of the forest are already.
When the music suggests the death of the swan, Parsifal causes the reflection of the swan to fall to the ground and is grabbed and placed in the middle of the rectangular structure. The projection of his shadow is now what is seen on the screen, a huge but defined shadow that demonstrates its importance at this stage and, at the same time, puts him as a defendant.
The action develops and the rectangular structure is lifted upwards without first having several men dressed in black, each of them, with a branch of foliage in each hand, leaving the structure completely naked. These men are divided into 3 groups and each group involves Gurnemanz, Parsifal and Kundry, simulating them wrapped in the mystery of the Monsalvat forest and these moving away from the branches when they speak or when they move, thus being able to keep it simple but effective and not meaningless, the notion of the original place where they are.
When Parsifal feels faint when he learns that his Mother has died, the water that Kundry takes is made by the projection of light from a lantern over his hands and then “poured” over Parsifal's head.
In the transformation scene, the rectangular structure is vertical and at the back of the stage, symbolizing the castle. Amfortas makes a monologue in the same type of support that I have already mentioned. The Grail appears as images of light reflection on the back screen after the rectangular structure above the stage disappears.
The beginning of the 2nd act sees the projections of the long lamps again but this time in the vertical and central stage. When we go up the screen we see a Klingsor dressed in white, with a cape, sitting with the spear vertically in front and grabbing it with both hands. Only the right hand is not from Klingsor, but from a double of the one behind him, dressed the same. Basically, as this double develops, it is in Klingsor's own “right hand”, since it is he who wanders around the stage, with Klingsor static in the center, and bewitches Kundry and “active” the flower women by grabbing them, raising them by the waist and fanning them.
Flower women have flowing dresses and veils that make them look more like corpses than flowers. The entire duet of Parsifal and Kundry is in front of a parallelepiped with dimensions similar to the rectangular grid of the 1st act, that is, the symbol of the reverse of the Grail world, which is the world created by Klingsor. This parallelepiped sees printed behind images of naked bodies of men and women, thus framing Klingsor's already known carnal world.
In the 3rd act, there are no lamps as at the beginning of the other acts, but several leftover men with armor and spear, wandering from side to side, symbolizing the drifting of Parsifal until returning to Monsalvat. Gurnemanz, who like the knights, is bald in the first act, now appears with hair, the same being valid for the knights and Amfortas when they later appear. Parsifal, in turn, with hair in the first act is now bald. The director, in my understanding, puts here the notion of immortality given by the Grail, with the growth of the hair symbolizing the aging of the knights and Amfortas for not celebrating the ritual, whereas Parsifal, illuminated by the spear as a sacred extension of the Grail, reaches that immortality.
Monsalvat is now a dark stage environment, again having a quadrangular geometric structure, made by vertical wires with lamps that turn on and off in patterns throughout the act. The symbolization of the water that washes Parsifal's feet and head is done again by a flashlight. During the final vocal intervention by Parsifal, instead of the original touch of the spear to heal Amfortas' wound (which is never defined here, you never see it), he goes as if injecting several long lamps (= several spears) into Amfortas to Amfortas become healthy again and walk your foot off the stage.
The spear is thus extinguished in Amfortas, Parsifal grabs a branch of the original forest, which he offers to Amfortas but he refuses, leaving the stage. It seems to me that it is symbolized that now it is up to him to renew this Monsalvat, to “reforest” as it would have been in the past (1st act) but that it will be much stronger. And we know it will be stronger because it descends a grid structure from the top of the stage to the base, with foundations much thicker than the grid of the 1st act, falling on a Gurnemanz and a Kundry that with lit lanterns reinforce the idea that one feels when throughout the performance - the light as a symbol of the Power of Good (the balm that Kundry brings from Arabia is a luminous ball, the water that comforts the faint Parsifal is the light of a lantern, the water that washes it before the baptism and the water that baptizes him is the light of a lantern, the spear is a lamp, the Grail is a reflection of light ...) and it is with this light, this power, that Monsalvat and the Grail will be renewed.

A lot of “easy boos” for the director in the end, highly unfair, from a clearly uncultured audience in this opera, to a staging without controversy, with meaning and, being different, while remaining faithful to Wagner's original.

Along with the staging, what impressed me most was the Orchestra, conducted by Frank Beermann. They produced a sound and drama of the highest level, achieving something often missing and that is the clear definition of each suit and melodic line (sometimes muffled in many productions), without however losing track of the ensemble. Flawless accuracy and lyricism.

The facial and body expressiveness of both Peter Rose and Nikolai Schukoff were impressive, with the bass producing a solid representation of Gurnemanz, although some well disguised (with lightening of the voice and some chewy candies) lower vocal health quite possibly a result of the season winter, and Schukoff to offer an expressive Parsifal, well transformed throughout the performance and with exceptional shine and vocal resistance. His bodily performance was excellent during Kundry's narration about his mother.
Nevertheless, I cannot help thinking that in the duet with Kundry in the 2nd act something was missing ... I don't know if it was his strong projection, without more low harmonics, or some linear expression in some passages but something that grabbed me was missing the chair.

Sophie Koch started without dazzling much in the 1st act and beginning of the 2nd but opened up vocally for a powerful interpretation in the duet with Parsifal, although with a matronly air. It was possible to notice some nervousness from the first time on the role and that is why here I am giving her this discount but I believe she can triumph in this role with experience, as she has done in many others.

The lyricism of Matthias Goerne in his 1st intervention was sublime, progressing to an excellent offer of expressive contrasts in the monologue of the 1st act, but here sinning because the harmonics of the voice are very low and sometimes as if subtracting the vocal sound. In the final monologue he again offered correct vocal contrasts for the text, but one of the problems is the weaving of the voice, which, due to its low harmonic characteristics, impoverishes and makes the top notes difficult.

Klingsor (Pierre-Yves Pruvot) positionally very static, fulfilled with a very good vocal timbre.

Titurel (Julien Veronèse) ... perfect!

Excellent choirs, although I would have liked to hear a greater distance from the choirs offstage of the 1st act but it may not be physically possible to do in this theater.


quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

GÖTTERDÄMMERUNG / O CREPÚSCULO DOS DEUSES, Royal Opera House, Novembro / November 2018



 (review in English below)

A última ópera do Anel de Londres foi talvez a melhor. A encenação manteve a linha desinteressante. As Nornas no início vão manipulando as cordas vermelhas do destino já vistas anteriormente, numa abordagem muito convencional.



A sala dos Gibichung está enquadrada por paredes que imitam o Tarnhelm, mas nada mais há digno de nota. Aparecem umas estátuas douradas dos deuses evocados, Freia, Fricka, Froh e Donner.
Na cena de caça, é morto um antílope que é posteriormente desmembrado e distribuído por vários figurantes, mas o animal continua intacto quando sai de cena. O Siegfried, depois de morto pelo Hagen, fica caído no palco, sozinho, e durante a marcha fúnebre nada acontece, para além de o palco recuar um pouco. Depois é totalmente embrulhado em panos brancos e assim permanece num barco.
No final os 3 quadrados que aparecem na base do cenário (onde anteriormente era o Reno) incendeiam-se e as estátuas dos deuses já referidas são içadas por cordas e neles introduzidas. A Brünhilde atira-se às chamas e a ópera termina com ela a ser içada numa estrutura metálica, depois de tudo ser consumido pelo fogo.



A Orquestra esteve quase sempre muito bem, mas achei que a marcha fúnebre, talvez o momento mais belo e solene da ópera, esteve aquém do desejável. Houve algumas entradas tardias dos metais e o andamento imposto pelo Antonio Pappano não foi o melhor. E foi uma pena.



Já o Coro esteve ao mais alto nível. Quanto aos solistas, houve de tudo, desde o aceitável ao transcendental.

As 3 Nornas foram muito uniformes e vocalmente irrepreensíveis (Primeira Norna, Claudia Huckle; Segunda Norna, Irmgard Vilsmaier; Terceira Norna, Lise Davidsen).



Também as 3 Filhas do Reno estiveram muito bem, Lauren Fagan (Woglinde),
Christina Bock (Wellgunde) e Angela Simkin (Flossilde). 



O Siegfried do Stefan Vinke teve boa presença cénica mas foi irregular na linha de canto, alternando períodos em que quase se não ouvia com outros em que cantava muito alto. O 3º acto foi a sua melhor prestação em todo o Anel.



Johannes Martin Kränzle manteve uma óptima actuação como Alberich, embora o papel seja pequeno nesta ópera, mas ainda assim foi suficiente para o encenar de forma ridícula, num barco e com máscara de oxigénio.



Karen Cargill foi uma excelente Waltraute de voz grave e poderosa, e timbre bonito e cativante.



O Gunter do Markus Butter esteve muito aquém do desejável num elenco destes. O desempenho cénico até foi bom, mas o cantor tem uma voz pequena, mal projectada e foi frequentemente afogado pela orquestra.



Também a Emily Magee (Sieglinde na Valquíria) voltou a decepcionar como Gutrune. Muito exuberante em palco mas a voz ouviu-se mal e foi algo monocórdica em toda a actuação.



Fantástico foi o baixo Stephen Milling como Hagen. Voz muito bonita, forte, sempre audível sobre a orquestra e uma presença cénica irrepreensível no papel cínico e malévolo da ópera. O melhor de entre os homens.



Finalmente a Brünhilde da Nina Stemme. Foi excelente nos dois primeiros actos, o diálogo com a Waltraute foi marcante, mas no final da ópera foi arrasadora! Os últimos 20 minutos foram os melhores de todo o Anel. A Stemme esteve ao nível da sua compatriota Birgit Nilsson e cantou com uma intensidade dramática comovente, como raramente se tem oportunidade de ver e ouvir. Não tenho palavras para descrever com fidelidade aqueles momentos transcendentais a que assistimos.










A Royal Opera só vendeu bilhetes para o Anel inteiro. No final, o público, maioritariamente conhecedor (um anel completo não é nem para curiosos, nem para amadores, nem para principiantes) brindou a Nina Stemme, e apenas ela, com uma explosão de aplausos que a casa quase veio abaixo. E esta expressão aqui aplica-se literalmente porque a pateada, gigantesca e demorada, é rara e apenas surge quando a coisa é excepcional, ao contrário do que se passa em Portugal (onde é sinal de desagrado). Estive no balcão e o chão literalmente tremeu durante uns largos minutos. Grande Stemme!!


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GÖTTERDÄMMERUNG / THE TWILIGHT OF THE GODS, Royal Opera House, November 2018

The last opera of the Ring of London was perhaps the best. The production kept uninteresting. The Norns at the beginning manipulate the red strings of fate previously seen in a very conventional approach.
The room of the Gibichungs is framed by walls that imitate the Tarnhelm, but nothing else is worth noting. Some golden statues of the evoked gods Freia, Fricka, Froh and Donner appear.
In the hunting scene, an antelope is killed and is later dismembered and distributed by several people, but the animal remains intact when it is removed from the scene. Siegfried, after being killed by Hagen, lies on the stage alone, and during the funeral march nothing happens, in addition to the stage retreating a little. Then he is totally wrapped in white cloths and so stays in a boat.
At the end the three squares that appear at the base of the scene (where previously it was the Rhine) are set fire and the statues of the already mentioned gods are lifted by ropes and introduced in them. Brünhilde throws herself into the flames, and the opera ends with her being hoisted into a metal frame, after everything is consumed by fire.

The Orchestra was almost always very well, but I thought that the funeral march, perhaps the most beautiful and solemn moment of the opera, was far from desirable. There were some late innings of the metals and the tempo imposed by Antonio Pappano was not the best. And it was a pity.

In contrary, the Choir was at the highest level. As for the soloists, there was everything from the acceptable to the transcendental.

The 3 Norns were very uniform and vocally irreproachable (First Norn, Claudia Huckle, Second Norn, Irmgard Vilsmaier, Third Norn, Lise Davidsen).

Also the 3 Daughters of the Rhine were very good, Lauren Fagan (Woglinde),
Christina Bock (Wellgunde) and Angela Simkin (Flossilde).

Stefan Vinke's Siegfried had a good stage presence but was irregular on the singing line, alternating periods when he almost was not listened to others in which he sang very loudly. The 3rd act was his best performance throughout the Ring.

Johannes Martin Kränzle maintained a great performance as Alberich, although the role is small in this opera, but was still enough to stage him ridiculously, in a boat and with an oxygen mask.

Karen Cargill was an excellent Waltraute with a powerful low voice, and a beautiful and captivating timbre.

Markus Butter's Gunter was far from desirable in a cast such as these. The scenic performance was even good, but the singer had a small voice, poorly projected and was often drowned by the orchestra.

Also Emily Magee (Sieglinde in Valkyrie) again disappointed as Gutrune. Very exuberant on stage but the voice was badly heard and was something monoric throughout the performance.

Fantastic was bass Stephen Milling as Hagen. Very beautiful voice, strong, always audible over the orchestra and an irreprehensible stage presence in the cynical and malicious role of the opera. The best singer among men.

Finally Nina Stemme’s Brünhilde. She was excellent in the first two acts, the dialogue with Waltraute was remarkable, but at the end of the opera she was devastating! The last 20 minutes were the best of the entire Ring. Stemme was at the level of her compatriot Birgit Nilsson and sang with dramatic intensity, as we rarely get a chance to see and hear. I have no words to faithfully describe those transcendental moments we have witnessed.

The Royal Opera only sold tickets for the entire Ring. In the end, the mostly knowledgeable audience (a complete ring is neither for the curious, nor for amateurs, nor for beginners) offered Nina Stemme, and only her, with an explosion of applause that the house almost came down. And this expression here applies literally because the gigantic and long foot kick is rare and only comes when the thing is exceptional, unlike what happens in Portugal (where it is a sign of displeasure). I was on the balcony and the floor literally shook for long minutes. Great Stemme!!

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