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sexta-feira, 24 de julho de 2015

OTELLO na English National Opera de Londres — Outubro de 2014

(Text in English below)


Confesso que a ideia de ver uma das minhas óperas favoritas cantada em inglês me faz confusão. Ainda assim, aproveitando uma estada em Londres e aguçado pela curiosidade — o wagner-fanatic já vira e comentara positivamente algumas récitas na ENO, nomeadamente uma Parsifal — aproveitei, numa decisão de última hora, para me estrear na English National Opera, palco em que as óperas são sempre apresentadas em inglês.

O Coliseu de Londres é uma sala claramente inferior à da Royal Opera House, não só no que respeita à dimensão, mas, sobretudo, à decoração, estando cheia de elementos romanos, por vezes de gosto mais discutível. Mas é bem imponente. Também o público-alvo parece ser bem diferente: é mais jovem e mais britânico. E notam-se outros pormenores diferenciadores: por exemplo, pode entrar-se a beber um vinho tinto adocicado ou uma cerveja.

Assisti ao Otello de Verdi: para mim uma das mais espectaculares óperas do maestro italiano e cujo libreto baseado na peça de Shakespeare tem interesse poético, dramático e clínico, tendo dado nome a uma perturbação mental — síndrome de Otelo ou delírio de ciúme.


Mas confesso que saí de lá muito surpreendido pela qualidade global tão elevada. A tradução para inglês esteve a cargo de Tom Philips e conseguiu não só manter o conteúdo muito fidedigno, como soube pôr a língua inglesa ao serviço da partitura de Verdi sem deturpar, de modo algum, as linhas melódicas do original italiano.


A encenação foi de David Alden num nova produção co-produzida com a Royal Swedish Opera e o Teatro Real de Madrid. Traz a acção para os anos 40 sem que, todavia, desvirtue demasiado o cenário pós-triunfo bélico do original. Mas nada acrescenta do ponto de vista interpretativo que justifique essa opção. De resto, nada acrescenta em termos cénicos e é até um pouco estática e amorfa. Limita-se a cumprir.

A condução da orquestra esteve a cargo de Edward Gardner e cumpriu bem, sem que todavia tenha sido uma interpretação superlativa: faltou um pouco de tensão dramática.


Stuart Skelton foi um Otello de bom nível. Tem uma voz potente com agudos que saem fáceis e com uma projecção sem défices. Cenicamente é um pouco mais estático, mas cumpriu de forma convincente. Foi, pois, um Otello de muita qualidade.


Iago foi interpretado pelo barítono Jonathan Summers. Tem um timbre bonito e agradável e uma voz com uma técnica muito segura que soube usar para nos transmitir a maldade intrínseca desta personagem negra. Teve, igualmente, uma prestação cénica de nível elevado.


Leah Crocetto foi uma Desdemona vocalmente de nível muito elevado. Tem uma voz com uma potência rara que se fazia ouvir claramente sobre a orquestra e com agudos estratosféricos. Mas também uma subtileza que lhe permitiu brilhar no Salce, salce! (não me recordo do inglês...). Cenicamente, dada a sua evidente obesidade, foi estática e não jogava bem com o texto. Mas isso é um pormenor (passe o paradoxo de grandeza). Vocalmente foi óptima!

Os restantes personagens cumpriram bem com os seus papéis. Cassio foi Allan Clayton. Roderigo foi Peter van Hulle. Ludovico foi Barbaby Rea. Montano foi Charles Johnston. Emilia foi Pamela Helen Stephen.

Apesar de não ter a beleza da versão original italiana, foi uma récita de qualidade elevada e uma experiência interessante que futuramente deixa espaço à repetição.

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(Text in English)

I confess that the idea of seeing one of my favourite operas sung in English makes me confused. Still, enjoying a stay in London and sharpened by curiosity - wagner-fanatic had seen and positively commented some recitals in ENO, including Parsifal - I took in a last minute decision to debut in English National Opera on which operas are always staged in English.

The London Coliseum is a clearly inferior to the Royal Opera House hall, not only regarding size, but above all regarding decoration that is full of Roman elements sometimes being  more debatable. But it is quite imposing. Also the audience seems to be quite different: it is younger and more British. And notice to other differentiating details: for example, you can get in drinking a sweet red wine or beer.

I attended the Verdi's Otello: for me one of the most spectacular operas of Italian master and whose libretto based on Shakespeare's play is poetic, dramatic and of clinical interest had given name to a mental disorder - Othello syndrome or jealousy delusion.

But I confess that got out of there very surprised by such a high overall quality. The English translation was made by Tom Philips and managed to not only keeping content very trusted, but also putting English language in the service of Verdi's score without misrepresent in any way, the melodic lines of the Italian original.

The staging by David Alden in a new co-production produced with the Royal Swedish Opera and the Teatro Real in Madrid brings the action to 40 's without, however, distorts the post-war triumph ambience of the original. But adds nothing to the interpretive point of view to justify this option. Moreover, adds nothing in scenic terms and is even a bit static and amorphous. It merely comply.


Conducting the orchestra was Edward Gardner performing well, but shall not have been a superlative interpretation: missed a bit of dramatic tension.

Stuart Skelton was a good level Otello. He has a powerful voice with highs coming out easily and with a projection without deficits. Scenically was a bit static, but fulfilled convincingly. He was therefore an Otello of high quality.

Iago was interpreted by the baritone Jonathan Summers. He has a beautiful and pleasant tone and a voice with a very safe technique that knew how to use to broadcast on the intrinsic evil of this dark character. Had also a scenic performance of high level.

Leah Crocetto was vocally a very high level  Desdemona . She has a voice with a rare power that was clearly hear above the orchestra and stratospheric highs. But also a subtlety that allowed her to shine in Salce Salce! (I do not remember the English ...). Scenically, given her obvious obesity, was static and did not play well with the text. But that is a detail (passing a paradox of magnitude). Vocally was great!

The remaining characters complied well with their roles. Cassio was Allan Clayton. Roderigo was Peter van Hulle. Ludovico was Barbaby Rea. Montano was Charles Johnston. Emilia was Pamela Helen Stephen.

Despite not having the beauty of the Italian original version, it was a recitation of high quality and interesting experience that leaves room for future repetition.