Crítica de Ali Hassan Ayache no Blog de Òpera & Ballet
O que pode aquecer a fria noite paulistana? A resposta é fácil, Anna Netrebko. O soprano se apresentou
pelo Mozarteum Brasileiro no dia 06
de Agosto juntamente com o maridão Yusif
Eyvazov na Sala São Paulo.
Ingressos esgotados há semanas e uma disputa feroz pelas doações na porta e
fila da hora são um sinal da enorme reputação do soprano.
É difícil descrever a voz de Anna Netrebko, faltam adjetivos,
tudo que você espera e imagina em uma grande cantora está presente. O lirismo,
a técnica, o colorido dos harmônicos, os pianíssimos e um timbre brilhante,
vivo e ardente. Voz única e especial que encarou árias e duetos complexos nunca
perdendo a qualidade vocal em qualquer registro.
Abre com o dueto Già nella notte densa da
ópera Otello de Verdi. Mostra uma voz madura, caminhando fácil
para soprano spinto, bem diferente da Anna de décadas passadas de
características puramente líricas. Seu repertório evolui de acordo com a idade
e a maturação vocal, o soprano não pula etapas.
Na ária Pace, pace mio Dio da ópera La
Forza del Destino de Verdi coloca credibilidade a personagem em uma
apresentação cênica convincente e uma voz penetrante. O êxtase foi a ária Vissi
d'arte da ópera Tosca de Puccini. Interpretação vocal
arrebatadora em uma voz cravejada de diamantes. A melhor interpretação dessa
ária que vi ao vivo até os dias de hoje.
Além de toda a qualidade vocal e cênica Anna Netrebko
esbanja simpatia com o público. Ser estrela não é ser sisuda, nela sobra
carisma e afeição ao público. Veio ao Brasil no auge vocal e encarou um
repertório complexo chegando a dançar em alguns momentos. Diferente de outras
cantoras que vieram para essas bandas com "noventa anos", cantaram
árias moleza e faturaram uma bolada.
Fechou brilhantemente com a ária O mio bambino caro da
ópera Gianni Schichi de Puccini. Sonhamos em vê-la um dia
cantando uma ópera completa na terra da garoa.
Não dever ser fácil cantar ao lado de tanto talento, Yusif
Eyvazov se esforçou e fez uma apresentação digna ao lado da esposa. Pode ter
empolgado o público, mas não aos entendidos. Escolheu um repertório difícil e
inadequado a sua voz, que sai quase sempre sem brilho nos agudos. O timbre não
tem a fluidez e o peso para cantar a difícil ária Colpito qui m’avete…
Un dì all’azzurro spazio da ópera Andrea Chénier. Era
nítido o enorme esforço para sustentar as notas, Eyvazov não é um tenor
dramático. Conseguiu nos duetos e na canção Granada de
Augustín Lara seus melhores momentos da noite.
Acompanhou os solistas a Orquestra Acadêmica Mozarteum
Brasileiro regida por Jader Bignamini, o convidado conseguiu extrair sonoridade
compatível com as árias e duetos. Alguns solos excessivamente volumosos não
comprometeram a atuação dos solistas.
Mais uma vez fica aqui registrado a falta de educação do
publico. Celulares ligados e pessoas querendo tirar fotos e gravar a
apresentação deram enorme trabalho aos monitores. A constatação é clara, não
são os jovens que desrespeitam essa regra e sim as tiazinhas e vovós, que
geralmente não são frequentadoras assíduas, querendo eternizar esse momento nas
redes sociais. Até entendo que no bis isso ocorra, já que o clima é de
descontração e muitos já estão de pé, mas na apresentação é inadmissível.
Ali Hassan Ayache
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