(Review in English below)
Giacomo
Puccini (1858-1924)
apresentou pela primeira vez a ópera Tosca
em Roma a 14 de Janeiro de 1900. Esta muito famosa ópera em 3 actos com libreto
de Luigi Illica e Guiseppe Giacosa é das mais queridas no
mundo da ópera e é nela que pontificam árias como Recondita armonia, Tre
sbirri, una carroza, Vissi d’arte
e E luceven le stelle.
A ópera gira em torno do trio formado pela
bela e ciumenta soprano Floria Tosca,
pelo rebelde pintor Mario Cavaradossi
e pelo abominável chefe de polícia Scarpia.
É uma história política que se passa na Roma das ocupações napoleónicas de
1800. E é nessa Roma de medo e crime, de amor e traição, de tortura e tragédia
que se desencadeia um dos mais interessantes dramas da ópera italiana. O
libreto é excepcional na forma como encadeia as cenas e a música é da mais
vibrante e bela que a história da ópera conhece, resultado de um trabalho
inspiradíssimo do maestro italiano Puccini.
Poderão ler uma sinopse aqui.
A encenação de Luc Bondy é uma desilusão.
O primeiro
acto passa-se numa igreja que mais parece um atelier mal arranjado e em construção do que uma igreja romana:
está suja, não tem símbolos religiosos e não tem o peso necessário de uma
igreja católica de Roma. Além disso, tem inúmeras falhas claras que não vão de
encontro às muito precisas indicações cénicas inscritas na pauta. Por exemplo,
a chave que se encontraria debaixo da pia está no cimo de umas frias e
desajeitadas escadas de ferro. E que dizer do tom de comédia que se atribui ao
primeiro acto, sempre à procura de provocar risos na plateia? Esta ópera é
sempre trágica e séria! A postura que atribuem a Tosca também não é a mais
adequada: Tosca é ciumenta e está verdadeiramente zangada, não é uma histérica
de sorriso fácil.
O segundo acto
começa com 3 prostitutas de baixo nível com um aspecto (perdoem a expressão)
badalhoco enroladas com Scarpia. Essa cena de mau gosto tem o seu expoente máximo
no minuto em que uma delas está de rabo espetado com uma lingerie curta à
espera de levar uma mais do que previsível palmada na região glútea... Creio
que a personagem de Scarpia não precisava delas para ser vil e odiável…
O terceiro acto é aquele em que a
encenação menos compromete: os cenários são pobres, frios e feios, mas cumprem
com o que se espera. Em suma, é uma encenação que nada acrescenta de novo em
termos interpretativos, que limita de alguma maneira o verdadeiro carácter das
personagens e que não tem o peso majestático que a tragédia impõe. O Metropolitan
pede e pode mais e melhor do ponto de vista estético.
Quanto às interpretações, penso que a Orquestra do MET dirigida por Riccardo Frizza esteve uns furos abaixo
no que respeita à intensidade, energia e brilho que esta música exige, além de
que, na minha opinião, adoptou um ritmo demasiado rápido. Esteve bem, mas não
deslumbrou.
George
Gagnidze tem uma voz muito
adequada ao papel de Scarpia e esteve bem do ponto de vista do desempenho
vocal. Mas não me cativou interpretativamente, quer vocal, quer cenicamente.
Não me conseguiu criar o asco que intrinsecamente a personagem provoca, talvez
um pouco pela própria encenação, mas, sobretudo, por adoptar uma postura que em
tudo pareceu forçada. Não é definitivamente um Scarpia e nem vibrei com o seu Tre sbirri, una carroza.
Já Roberto
Alagna, apesar de já ter sido mais vibrante do ponto de vista vocal, foi um
Cavaradossi muito convincente. Tem um timbre muito seu, agudos fácies e uma boa
projecção. O seu E luceven le stelle
foi de muito elevada qualidade.
A melhor da récita foi Patricia Racette como Tosca. A sua voz tem um timbre muito bonito e
agradável, mas o seu ponto forte são mesmo as interpretações vocal e cénica.
Foi extremamente convincente: uma mulher ciumenta, insegura, mas destemida e,
acima de tudo, emotiva. O seu Vissi
d’arte foi muito bom e cresceu do primeiro ao último acto: na sua cena
final, o seu Presto su! Mario! foi arrepiante.
Os restantes intérpretes Richard Bernstein (Angelotti), John
del Carlo (Sacristão), Eduardo
Valdes (Spoletta) e James Courtney
(Sciarrone) cumpriram bem os seus pequenos papéis, sem que, todavia, algum
tenha estado em evidência. Uma palavra para o soprano Seth Ewing-Crystal que foi o Pastor que cantou Io de’ sospiri: a interpretação foi boa, embora não tenha gostado
especialmente do timbre ou da dicção do italiano.
Não posso dizer que tenha saído encantado
desta récita, muito por culpa da encenação pobre de gosto discutível e das
múltiplas gravações disponíveis de absoluta referência desta que é uma das mais
belas, trágicas e tocantes óperas e uma das minhas preferidas.
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(Review in English)
Giacomo Puccini (1858-1924) first presented the opera Tosca in Rome on January 14, 1900. This very famous opera in 3 acts
with libretto by Giuseppe Giacosa
and Luigi Illica is fondest of the
world of opera and have arias as Recondita
armonia, Tre sbirri , una carroza
, Vissi d'arte and E le luceven stelle.
The opera plays out around
the trio formed by beautiful and jealous soprano Floria Tosca, the rebel painter Mario Cavaradossi and the abominable police chief Scarpia. It is a political story set in
the Napoleonic occupation of Rome in 1800. And that Rome of fear and crime,
love and betrayal, torture and tragedy that triggers one of the most popular
dramas of Italian opera. The libretto is exceptional in how chains the scenes
and the music is the most vibrant and beautiful of opera history, as result of
a most inspired work of the Italian maestro Puccini. You can read a synopsis here.
The Luc Bondy staging is disappointing. The first act takes place in a church that looks more like a poorly
arranged and in construction atelier
than a Roman church: it is dirty, has no religious symbols and has not the
required weight of a Catholic church in Rome. Additionally, it has numerous
clear flaws that not meet the very precise scenic indications given in the socre.
For example, the key that would be found under the sink is perched on a cold
and clumsy iron stairs. And what about the tone of comedy of the first act,
always looking to provoke laughter in the audience? This opera is always tragic
and serious! The attitude he attribute to Tosca is also not the most
appropriate: Tosca is jealous and really angry with her lover. She is not a
hysterical and easy smile woman. The second
act begins with 3 prostitutes with bad aspect enrolled with Scarpia. This
scene distasteful has its pinnacle with an entire minute one of them has her
bum with a short lingerie waiting to take a more than likely slap on the
buttock... I think the character of Scarpia did not need them to be vile and
hateful... The third act is one in
which the staging fewer compromises: the scenarios are poor, cold and ugly, but
comply with what is expected. In short, it is a scenario that adds anything new
in terms of interpretation, which limits somewhat the true nature of the
characters and does not have the majestic weight that this tragedy requires.
The Metropolitan may ask for more and better on aesthetic point of view.
As for interpretations, I think
the MET Orchestra conducted by Riccardo Frizza has been few holes
below regarding the intensity, energy and brilliance that this music demands and,
beyond that, in my opinion, director adopted a too fast pace. It was good, but
not dazzling.
George Gagnidze has a voice well suited to the role of Scarpia and did well in terms of
vocal performance. But he do not captivated me interpretively, whether vocal or
scenically. He could not create the disgust that inherently the character causes,
maybe a little by the staging itself, but, above all, by he posture he adopted that
seemed always forced in everything. He is not definitely a Scarpia and he even not
touched me with his Tre sbirri, una
carroza.
Roberto Alagna, despite he had in the past a more vibrant voice, was a very convincing
Cavaradossi. He has a very own timbre, good and easy sharp tone and excellent projection
. His E le luceven stelle was of very
high quality.
The best of the interpreters
was by far Patricia Racette as Tosca.
Her voice has a very beautiful and pleasant timbre, but her strength are the vocal
and scenic interpretation performances. She was extremely convincing: a jealous
woman, insecure, but fearless, and above all, emotional. Her Vissi d'arte was very good and she grew
from the first to the last act: in her final scene, her Presto su! Mario! was creepy .
The remaining interpreters Richard Bernstein (Angelotti), John del Carlo (Sexton), Eduardo Valdes (Spoletta) and James Courtney (Sciarrone) fulfilled
well their small roles, without, however, some have been in evidence. A word to
the soprano Seth Ewing-Crystal who
was the Pastor who sang Io de' sospiri:
the interpretation was good, though I did not especially like his timbre or the
Italian diction.
I can not say that has left
this recitation enchanted, much by fault of the poor staging of questionable
taste and the multiple recordings available of absolute reference of this opera
that is one of the most beautiful, tragic and heartbreaking operas and one of
my favorites.
Assisti a esta produção no Scala em 2012, com outro maestro, outra Tosca e outro Cavaradossi. O Scarpia era o mesmo. A encenação e a cenografia são muito más. A igreja de tão escura que era mais parecia estarmos numa adega que numa Igreja e o dramatismo da procissão para o Te Deum perdeu-se na confusão da cena.
ResponderEliminarScarpia não me parece ser um devasso como o fazem no 2º acto, mas antes um lascivo e hipócrita. O TV dinner em substituição de uma ceia capaz, que mal tinha uma faca suficiente para o assassinato, era quase risível.
Valeram as interpretações e a música.
Também lá estive ontem. Já conhecia esta encenação. É má e quando a vi o início do 2º acto foi ainda pior!
ResponderEliminarNo espectáculo de ontem achei que o Gagnidze fez um Scarpia bom mas aquém dos melhores, o Alagna não comento porque é um cantor de que, de facto, não gosto e a Racette foi uma Tosca muito boa, mas teria sido melhor se tivesse menos 20 anos, menos 20 quilos e se gritasse menos alguns agudos.
A cereja no topo do bolo foram as legendas!! (Não estive no Nariz, por isso foi a novidade e não fui previamente avisado).
As legendas em português são, de facto, de péssima qualidade, além de que tem partes que nem são traduzida. Era de tal maneira que, apesar de conhecer perfeitamente o texto e de não precisar delas, as inúmeras falhas distraíram bastante. A qualidade geral das legendas em inglês era superior. Já n'O Nariz as legendas foram em português do Brasil: a qualidade não foi brilhante, mas como só tinha lido o libretto em inglês e o conto de Gógol em português não quis formar uma opinião definitiva. Não tem nada que ver com o facto de ser em português do Brasil (ainda que, como falante de português continental não goste expressões como grudar ou você), mas sim com a qualidade da tradução.
ResponderEliminarOutra nota relevante são as falhas técnicas frequentes que acontecem no auditório da Culturgest: ainda não percebi se o defeito é da Culturgest ou se é mesmo do ficheiro que o MET fornece para exibição. De qualquer modo, um aspecto a melhorar.
E estou ansioso por que o auditório da Fundação reabra, pois o conforto e, sobretudo!, a qualidade de som é incomparavelmente superior.
Como sempre, o Autor, numa linguagem literária, faz uma apreciação da récita, tendo em conta outras a que já assistiu. Com este método torna credível a objectividade quer dos pontos positivos, quer dos negativos que salienta.
ResponderEliminarO que, porventura faltava no texto inicial sobre a transmissão fica referido no seu comentário, posterior. De facto, à falta de gosto, como refere a propósito do segundo acto, por exemplo, juntam-se as legendas de muito má qualidade.
Quero salientar a crítica mordaz do Autor sempre de nível elevado e com uma acentuação trocista considerável. Parabéns!