(review in English below)
A opera Andrea Chénier de Umberto Giordano esteve em cena na Ópera Estatal de Viena, tendo como atractivo principal a
participação de Jonas Kaufmann como protagonista. Os bilhetes esgotaram num
ápice quando a bilheteira abriu online e, no mercado negro, atingiam preços
proibitivos.
A Ópera de Viena
informa (verbalmente e em cartazes) que não se responsabiliza pela venda dos
bilhetes que é feita por dezenas de indivíduos de países de leste, mascarados de
Mozart, que o fazem á volta de todo o teatro. Se paramos para olhar para um
cartaz, esteja ele onde estiver à volta do teatro, somos imediatamente
abordados. Não percebo como isto é permitido, mas é sempre assim.
Depois desta
primeira nota negativa, uma muito positiva. Numa das laterias do teatro está
instalado um écran gigante que transmite em directo muitas das óperas em cena
(foi o caso desta) permitindo a quem não conseguiu comprar bilhetes poder ter
uma ideia do que se passa na sala.
A Anja Harteros,
durante os aplausos, confrontada com a filmagem mesmo atrás da cortina, puxou
operador de câmera para o palco, num momento hilariante.
A velha encenação
de Otto Schenk é muito clássica, kitsch, desinteressante. A
Orquestra da òpera de Viena foi bem dirigida pelo maestro Marco Armiliato que, contudo, não se preocupou excessivamente
com os cantores.
Quanto aos
solistas, alguma heterogeneidade. O barítono Roberto Frontali fez um Carlo Gérard de grande qualidade. A
interpretação cénica foi convincente e a voz é cheia, afinada e sempre bem
projectada.
O Roucher do
barítono Orhan Yildiz cumpriu sem
deslumbrar.
Das
interpretações femininas a Bresi da soprano Ilseyar Khayrullova de voz muito agradável e suave foi interessante
e correcta, a Condessa de Coigny da mezzo Donna
Ellen foi algo agreste e a Madelon da mezzo Zoryana Kushpler foi óptima, com uma voz grave imponente e
excelente presença cénica.
Verdadeiramente
sensacional e, de longe, a melhor da noite foi a soprano Anja Harteros como Maddalena di Coigny. É uma cantora de que muito
gosto e hoje foi, talvez, uma das melhores interpretações que lhe ouvi. A voz é
de uma beleza única e no registo mais agudo é impressionante na qualidade, suavidade
e segurança. Na belíssima ária La mamma
morta quase chegou ao nível divinal da Callas, a minha referencia neste
trecho. Absolutamente fantástica.
Deixo para o fim
o tenor Jonas Kaufmann que, como
sabem os leitores regulares deste blogue, é um dos meus cantores favoritos e
era a grande estrela da noite. Foi uma decepção. Tem uma voz de timbre único,
grave mas com agudos fabulosos e esta característica é intrínseca e manteve-se.
Mas fez um Andrea Chénier sem alma, com pouca entrega na interpretação e
vocalmente deixou-se afogar pela orquestra com frequência. Foi uma pena, mas
admito que também os cantores tenham dias menos bons e este foi, seguramente,
um deles. Ainda assim tinha umas dezenas de pessoas à sua espera na stage door, muitas delas com flores e
outros presentes mas, para decepção de todos e após mais de 1,5 horas de
espera, chegou a informação de que foi o único que saiu por outra porta. Ele lá
saberá porquê...
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ANDREA CHÉNIER,
Vienna Staatsoper, April 2018
Umberto Giordano’s opera Andrea
Chénier was on stage at the Vienna State
Opera, with the main attraction being the participation of Jonas Kaufmann
as the protagonist. Tickets sold out at a glance when the box office opened
online and on the black market hit prohibitive prices.
The Vienna State
Opera reports (verbally and on posters) that it is not responsible for the sale
of the tickets which is made by dozens of Eastern European ndividuals masked as
Mozart from around the theater. If we stop to look at a poster, wherever it is
around the theater, we are immediately approached. I do not understand how this
is allowed, but it is always like this.
After this
first negative note, a very positive one. On one side of the theater is
installed a giant screen that transmits live many of the operas on the scene
(it was the case of this one) allowing those who could not buy tickets to get
an idea of what is going on in the room.
Anja
Harteros, during the applause, confronted with filming right behind the
curtain, pulled the camera operator to the stage in a hilarious moment.
Otto Schenk's old staging is classic, kitsch,
uninteresting. The Orchestra of the Vienna State Opera was well directed by
maestro Marco Armiliato, who,
however, did not care too much about the singers.
As for the
soloists, some heterogeneity. Baritone Roberto
Frontali was a Carlo Gérard of great quality. The stage interpretation was
convincing and the voice is full, tuned and always well-projected.
Baritone Orhan
Yildiz did not dazzle as Roucher.
From the
female interpretations, Bresi of soprano Ilseyar
Khayrullova sang with a very pleasant, correct and smooth voice, the
Countess of Coigny by mezzo Donna Ellen
was somewhat harsh and Madelon from mezzo Zoryana
Kushpler was excellent, with an imposing low registation and excellent stage
presence.
Truly
sensational and by far the best of the evening was soprano Anja Harteros as Maddalena di Coigny. She is a singer I really like
and today was perhaps one of the best interpretations I heard. The voice is of
a unique beauty and in the highest register she is impressive in quality,
softness. In the beautiful aria La mamma
morta she almost reached the divine level of Callas, my reference in this
area Absolutely fantastic.
I leave to
the end tenor Jonas Kaufmann who, as
the regular readers of this blog know, is one of my favorite singers and was
the great star of the night. He was disappointing. He has a unique voice, with
a strong low register but with fabulous top notes and this characteristic is intrinsic
and maintained. But he interpreted a soulless and underpower Andrea Chénier
vocally drowned by the orchestra often. It was a pity, but I admit that the
singers also have less good days and this was, without a doubt, one of them.
Yet there were dozens of people waiting for him on the stage door, many of them
with flowers and other gifts, but to everyone's disappointment and after more
than 1.5 hours of waiting, the information came that he was the only one who
left by another door. He will know why...
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A récita do Chénier de 26.4 foi fantástica. Ao contrário da sua récita, o Kaufmann esteve muito bem: não tem o brilho do Pavarotti ou do Domingo neste papel, mas teve uns agudos kauffmannianos impecáveis, ouviu-se sempre e esteve lá. Acho que teve azar! A Harteros também foi óptima, mas muito longe da Callas que continua imbatível neste papel. E dá-me ideia que a Netrebko está um bocadinho acima da Harteros, pelo menos na intensidade dramática que consegue. Mas gostei muito, muito dela: voz cristalina, grande e elegante. Quem me surpreendeu foi o Frontali que foi um Gérard fantástico!
ResponderEliminarO Armiliato também excelente, embora por vezes se estique um pouco e não observe os cantores como podia. Fez o mesmo na Butterfly de Madrid que vi na temporada passada com a Jaho/León/Odena. Mas, tirando isso, perfeito!
A encenação é que é das maiores porcarias que o Otto Schenk fez: devia detestar a ópera. Tornou-a insonsa e dá-lhe aquele final ridículo com os amantes abraçados na carroça. Nem parecia que iam para a guilhotina. Se acabasse com uma cena de cama era mais coerente com o que parecia passar-se. Merecia um booooo!
O Kaufmann também não deve ter ficado para autógrafos neste dia. Em menos de 30 min estava com o Armiliato na mesa ao lado da minha num restaurante italiano ali ao lado...
Sorte a sua em ter ouvido o Kaufmann como sempre esperamos. Comigo, apesar das minas elevadas expectativas, não aconteceu. E se o apanhasse na mesa ao lado da minha de um restaurante, não deixaria de lhe dizer que teria esperado melhor! (admito que, consigo, não foi o caso).
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