Lucia di Lammermoor, de G
Donizetti, é uma das minhas óperas favoritas do compositor. O libretto
é de Salvatore Cammarano baseado na novela de Sir Walter Scott, The Bride of Lammermoor. Já sobre ela
escrevi aqui,
recuperando agora parte desse texto.
A acção passa-se na Escócia no final do Século XVI. Lord
Henry Ashton (Enrico) quer que a sua irmã Lucy (Lucia) se case com Arthur
Bucklaw (Arturo) para fortalecer politicamente a sua (má) situação familiar.
Mas ela está apaixonada pelo maior inimigo da família, Sir Edgar Ravenswood
(Edgardo). Edgardo tem que ir a França procurar aliados para a Escócia. A
pedido de Lucia o seu amor permanece secreto e trocam anéis. Enrico intercepta
e forja uma carta de Edgardo para provar a Lucia a sua infidelidade e a
convencer a casar com Arturo. Destruída pela situação, Lucia acaba por
concordar e, quando a cerimónia está prestes a iniciar-se, surge Edgardo
reafirmando o seu amor, mas o contrato nupcial já está assinado. Enrico desafia
Edgardo para um duelo. A cerimónia do casamento é interrompida com a notícia de
que Lucia assassinou Arturo. Ela surge ensanguentada e com um punhal na mão,
num estado de loucura, imaginando que se está a casar com Edgardo e, pouco
depois, morre. Edgardo, ao saber da notícia, apunhala-se.
A obra “belcantista” é um dos expoentes máximos do
romantismo operático italiano, contém trechos notáveis e, se bem interpretada
(exige um soprano e um tenor de superior qualidade), proporciona um espectáculo
emocionante. A coloratura é usada em todo o seu esplendor na transmissão dos
estados de alma da protagonista e alguns instrumentos, como a harpa e a flauta,
também evocam a sua nostalgia e dor. Toda a ópera está recheada de trechos
musicais marcantes, merecendo relevo, entre outros, o dueto entre Lucia e
Edgardo no final do 1º Acto Verranno a te
sull’aure, o sexteto do final do 2º Acto Chi mi frena, a famosíssima e longa cena da loucura de Lucia no 3º
Acto Il dolce suono e o recitativo e
ária final de Edgardo Tu che a Dio
spiegasti. Um deleite para os apreciadores do estilo, entre os quais me
incluo.
O maestro Maurizio Benini desiludiu. Houve diversos desencontros na
orquestra e entre a orquestra e os cantores.
A Lucia foi
interpretada pela jovem soprano russa Albina
Shagimuratova. Gostei muito da sua actuação. Tem uma voz poderosa e ágil e
de timbre bonito. A coloratura é marcante. Esteve bem cenicamente, apenas achei
que lhe faltou doçura vocal quando necessário.
Edgardo foi interpretado pelo tenor maltês Joseph Calleja. O timbre é muito
próprio, algo caprino, a afinação irrepreensível e a potência vocal imponente.
Nas notas mais agudas impressiona pela qualidade e aparente facilidade com que
as canta. Cenicamente esteve bem, sobretudo na cena final no cemitério.
Enrico, o vilão da ópera, irmão de Lucia, foi o barítono italiano
Luca Salsi. Foi
talvez a melhor interpretação da noite. Tem uma voz poderosa, de grande beleza,
muito expressiva e versátil. A representação cénica foi também excelente.
Alaistar Miles, baixo inglês, foi um Raimondo de voz muito
decente e com boa prestação cénica.
Matthew Plenk como Arturo, Theodora
Hanslowe como Alisa, e Eduardo
Valdes como Normanno completaram o elenco.
Já assisti ao
vivo a esta produção outras duas vezes, uma com Anna Netrebko, Piotr Beczala,
Marius Kwiecien e Ildar Abdrazakov, e outra com Natalie Dessay, Joseph Calleja,
Ludovic Tézier e Kwangchul Youn. Apesar de ter gostado muito de rever o espectáculo, confesso que a récita
de hoje não superou as outras.
A Metropolitan
Opera de Nova Iorque está entre as minhas catedrais de opera preferidas. Tem o
grande inconveniente de o publico ser pouco selectivo, aplaudindo tudo de igual
modo, independentemente da qualidade mas, sobretudo, aplaudindo compulsivamente
sem deixar terminar a música.
Pela primeira vez
assisti a protestos do publico, não pela actuação dos cantores (não seria, de
todo, justificada), mas pela demora dos intervalos (45 minutos). No segundo
bateram-se palmas ritmadas durante minutos, o que obrigou a alguém da produção
vir a palco pedir desculpa e justificar o atraso pela necessidade de
verificação de que tudo nos cenários estaria em perfeitas condições de
segurança.
*****
LUCIA DI LAMMERMOOR, Metropolitan Opera, New York, March
2015
Lucia di Lammermoor
by G Donizetti, is one of my
favorite operas of the composer. The libretto is by Salvatore Cammarano, based on the novel by Sir Walter Scott, The Bride of Lammermoor. I wrote about
this opera here and I recover part of the text.
The action takes place in Scotland at the end of the
sixteenth century. Lord Henry Ashton (Enrico) wants his sister Lucy (Lucia) to
marry Arthur Bucklaw (Arturo) to recover their (bad) family situation. But she
is in love with the greatest enemy of the family, Sir Edgar Ravenswood
(Edgardo). Edgardo has to go to France to seek allies to Scotland. At the request
of Lucia their love remains secret and they exchange rings. Enrico intercepts
and forge a letter from Edgardo to prove Lucia his infidelity and convince her
to marry Arturo. Destroyed by the situation, Lucia ultimately agrees and when
the ceremony is about to begin, Edgardo arrives reaffirming his love, but the
marriage contract is already signed. Enrico challenges Edgardo to a duel. The
wedding ceremony is interrupted by the news that Lucia murdered Arturo. She
appears full of blood and with a dagger in her hand, in a state of madness,
wondering to marry Edgardo and shortly thereafter dies. Edgardo, upon hearing
this news, stabs himself.
This belcanto opera is one of the finest examples of Italian
operatic romanticism, contains remarkable parts and, when properly interpreted
(requires a soprano and a tenor of top quality), provides a thrilling performance.
The coloratura is used in all its splendor in the transmission of states of
mind of the protagonist and some instruments such as the harp and the flute,
also evoke nostalgia and pain. The entire opera is full of remarkable musical
excerpts, including the duet between Lucia and Edgardo at the end of Act 1 Verranno a te sull'aure, the end of the
2nd Act sextet Chi mi Frena, the very
famous and long madness Lucia's scene in the 3rd Act Il dolce suono, and the recitative and final aria of Edgardo Tu che a Dio spiegasti. A delicacy for
lovers of this style, among which I include myself.
I liked the staging of Mary
Zimmerman that is effective. The scenes outdoors were very well staged in a
very appropriate, often gloomy environment. The madness scene, with a big
staircase in the center of the stage, also seemed a good and functional scenic
and aesthetic choice. Ghosts on stage were another interesting option.
Conductor Maurizio
Benini was disappointing. There
have been several mismatches within the orchestra and between the orchestra and
the singers.
Lucia was interpreted by young Russian soprano Albina Shagimuratova. I really enjoyed her
performance. She has a powerful, agile and beautiful voice. The coloratura was
striking. She was also convincing onstage, I just thought she lacked vocal
sweetness when needed.
Edgardo was interpreted by Maltese tenor Joseph Calleja. The timbre is very
personal and he showed an impressive vocal power. The top notes were sung with
high quality and apparent ease. He was well on the stage performance,
especially in the final scene in the cemetery.
Enrico, the opera villain, brother of Lucia, was the Italian
baritone Luca Salsi. He was perhaps
the best singer of the night. He has a powerful voice of great beauty, very
expressive and versatile. The stage performance was also excellent.
Alaistar Miles, English
bass, was a very decent Raimondo with a good performance, both vocal and
scenic.
Matthew Plenk as
Arturo, Theodora Hanslowe as Alisa,
and Eduardo Valdes as Normanno
completed the cast.
I have watched this live production two times before, once
with Anna Netrebko, Piotr Beczala, Marius Kwiecien and Ildar Abdrazakov, and another
with Natalie Dessay, Joseph Calleja, Ludovic Tézier and Kwangchul Youn. Despite
I very much liked to see again this opera tonight, I confess that today´s
performance has not overcome the two others.
The Metropolitan Opera in New York is among my favorite opera
cathedrals. The only drawback is the public being not selective, applauding all
equally, regardless of quality,. But even worse is always applauding before the
music is finished.
For my first time I saw public protests, not to the singers
(which were excellent), but to the delay of intervals (45 minutes). In the
second one, rhythmic clapping for minutes forced someone from to the production
to come to the stage and apologize, justifying the delay by the need to check
that all the scenario equipment would be in perfect safety.
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Era mesmo de uma Lucia assim que eu estava a precisar. Se pudesse escolhia a Netrebko, mas não se pode ambicionar de mais.
ResponderEliminarGostei muito de ler o relato, Fanático_Um, obrigado. Só não percebo como no MET entregam a direcção de orquestra a um incapaz.
Esse público indisciplinado será nova-iorquino, ou turistas árabes e asiáticos ? :D
É mesmo o público americano. Excessivamente simpático para com os artistas que nem os deixa terminar as actuações condignamente!
EliminarRacismos de lado, talvez os americanos possam ser mesmo mais indisciplinados do que os árabes e os asiáticos...
ResponderEliminarVá lá, eu não estendi a culpa a todos, só aos turistas. A figura que os turistas americanos fazem na Europa também é bem conhecida.
EliminarSerá só falta de 'chá', então.