domingo, 13 de março de 2016

IPHIGÉNIE EN TAURIDE, Teatro Nacional de São Carlos (Lisboa), 09/03/2016



Com os habituais agradecimentos, publicamos mais um texto de José António Miranda.

IPHIGÉNIE EN TAURIDE  (Christoph Willibald Gluck)
Ópera em quatro Actos   (1779)
Libreto de Nicolas-François Guillard, segundo a tragédia Ifigénia entre os Tauros, de Eurípides.
Direcção Musical: David Peter Bates
Encenação: James Darrah
Cenografia: Emily MacDonald e Cameron J Mock
Roupas: Chrisi Karvonides-Dushenko
Luzes: Emily MacDonald e Cameron J Mock

Iphigénie: Alexandra Deshorties
Thoas: John Moore
Oreste: William Berger
Pylade: Colin Ainsworth
1ª Sacerdotisa: Sónia Alcobaça
2ª Sacerdotisa: Maria Luísa Tavares
Sacerdote: Carlos Pedro Santos
Um cita: Carlos Silva
Diane: Filipa Louceiro

Orquestra Sinfónica Portuguesa
Coro do Teatro Nacional de São Carlos     Dir: Giovanni Andreoli
Produção: Teatro Nacional de São Carlos (Lisboa)   (2016)

Um simples dispositivo cénico em forma de semi-círculo, delimitado por altas paredes providas de janelas ou despidas, paredes essas segmentadas verticalmente por colunas e em cuja base se dispõem cadeiras como num cadeiral em anfiteatro, permitiu apresentar a ópera de Gluck de um modo solene e austero, plenamente concordante com a também austera gravidade da tragédia que o libreto nos relata.

A colocação no centro do tablado de um altar sacrificial apenas assinalado pela vasta mancha hemática que as sacerdotisas repetidamente lavam, bem como a distribuição do coro pelo referido cadeiral, acentuam o carácter intemporal da narrativa.

Nem sequer seria necessário representar de modo mais ou menos abstracto, como se fez, o grande cenário astral que evolui no fundo sobre o horizonte, para que toda a dimensão simbólica da história surgisse acentuada.

Para tal bastam as roupas, de traça singela e  gama cromática que vai do negro de Thoas ao branco de Diane, com o vermelho de Ifigénia e os tons terra de Pílades e Orestes a destacarem-se contra os cinzentos e azuis dos restantes protagonistas.

E a iluminação, cuja qualidade é francamente superior ao que é habitual ver neste palco, realça singularmente aquela dimensão, introduzindo na solenidade ambiente um marcado traço expressivo.

Para completar este conjunto de intervenções da equipa responsável pela encenação, a coreografia adoptada para cantores e coro é também ela tributária do mesmo desígnio global, singela e discretamente austera.

Não se vê bailado no sentido estrito do termo, não há em todo o caso bailarinos da companhia do teatro (aparentemente a OPART não funciona a este nível), mas nota-se que a vertente expressiva foi particularmente trabalhada ao nível de todos os actores em palco, com particular cuidado nos solistas e no grupo de vítimas do templo.

Sob o ponto de vista interpretativo vocal Alexandra Deshorties destaca-se naturalmente dos restantes protagonistas, mas revelou sob o ponto de vista técnico alguma falta de controlo da emissão fora do registo médio.

O coro, chamado nesta obra a uma importante participação cénica, mostrou na vertente vocal a debilidade resultante da sua condição actual. A orquestra, sob a laboriosa direcção de David Peter Bates foi muito melhor do que seria de esperar no contexto actual.

E portanto, apesar das fragilidades e desacertos existentes, o todo resultou num espectáculo muito agradável, a revelar que a equipa do teatro começa lentamente a arrancar da situação de quase imobilidade que tem vivido nos tempos mais recentes, situação esta que ajudará seguramente a explicar o porquê da sala estar apenas meio cheia nesta noite.


José António Miranda

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