sábado, 26 de janeiro de 2013

Paul McCreesh na Fundação Gulbenkian, 25 de Janeiro de 2013


(Review in English below)

Paul McCreesh, maestro titular da FCG a partir da próxima temporada, dirigiu a "sua" orquestra num programa variado que incluía a muito esperada interpretação do Requiem de Mozart.


A primeira composição ouvida foi a Sinfonia n.º 8, em Si menor, D.759, "Incompleta", composta por Franz Schubert em 1822. A sua composição foi abandonada em 1823 (apesar de o compositor ter esboçado os restantes dois andamentos) e teve a sua estreia em 1865, 37 anos após a morte do compositor. Embora inacabada, a obra revela elementos dramáticos do período romântico, mantendo-se uma peça frequentemente interpretada e que nos foi apresentada com qualidade.

Seguiu-se música sacra de Igor Stravinsky: Missa. Foi composta entre 1844 e 48 e teve estreia em Milão. Baseada em textos bíblicos católicos, esta obra surge num período em que o compositor já vivia nos Estados Unidos e passava por um novo momento criativo e de particular interesse na obra de Mozart. A obra reforça a originalidade da composição do russo e é de extremo interesse no panorama da música sacra do século XX. Foi composta para coro e orquestra de sopros e a sua interpretação foi regular.

O Requiem em Ré menor, K. 626, de Wolfgang Amadeus Mozart, foi composto em 1791, ano em que o compositor viria a falecer. Esta obra é de uma genialidade ímpar, reveladora da inspiração sobrenatral de um compositor que apenas pecou por ter falecido com apenas 35 anos, privando-nos da sua música gloriosa. A sua obra é reveladora de um talento sem igual e o seu Requiem é (e sempre será) o maior marco da música sacra da humanidade. A irrefutabilidade de Deus pode ser argumentada com esta composição, porque é muito provável que seja a sua voz que se ouve.
Mozart concluiu a Sequentia do Requiem com Lacrimosa. A partir daí, apenas deixou esboços para a conclusão de toda a obra, havendo vários compositores que tiveram a "ousadia" de concluir o trabalho do Mestre. A mais conhecida é a de Franz Süssmayr, mas Paul McCreesh optou pela de Robert Levin e justifica-se: " A versão do Requiem de Mozart que hoje melhor conhecemos é de Franz Süssmayr. Não há dúvida de que este compositor era próximo de Mozart, mas numa análise mais cuidadosa, percebemos que o seu trabalho de conclusão é desajeitado no que diz respeito à estrutura composicional e à orquestração. Durante pelo menos um quarto de século os estudiosos disponibilizaram várias conclusões alternativas, baseadas no autógrafo incompleto de Mozart, nos seus esboços, nas cópias sobreviventes, na sua técnica de composição e na sua orquestração original. A versão desta noite, de Robert Levin, é, na minha opinião, a mais bem sucedida até hoje. Em Levin encontramos não só uma mente musicológica brilhante, mas também uma apurada compreensão do estilo mozartiano a partir do seu trabalho como intérprete do pianoforte. Mais percetível para o ouvinte será uma extensa fuga no fim do Lacrimosa (sobre um tema sugerido por Mozart) e substanciais rearranjos do material musical no Lacrimosa, no Sanctus e no Benedictus. A orquestração parece respirar num espírito mais próximo das outras obras de Mozart".



No meu entender, foi uma das minhas maiores desilusões na FCG. O Introitus, Kyrie e toda a Sequentia foram interpretados por Paul McCreesh a uma velocidade alucinante, nada melodiosa ou dramática. Os solistas não estiveram bem: o soprano (Susan Gritton) apresentou-se com uma voz áspera, dificuldades na projecção e dicção; o meio-soprano (Monia Groop) tinha uma voz agradável e teve uma interpretação muito condicionada; o tenor (Andrew Staples) foi o melhor elemento solista com um timbre adequado; e o barítono (Jonathan Lemalu) não tem voz para o papel: o seu Tuba mirum foi péssimo. O coro, sobretudo os elementos femininos, tiveram dificuldades nos agudos e creio ter visto a sua interpretação muito diminuída por uma velocidade inacreditável. Quando começou a Lacrimosa pensei que ia melhorar, mas não. E aqui surge Robert Levin: o Amen final da Sequentia perde em beleza e poder; o Sanctus é menorizado; o Lux aeterna e Cum sanctis tuis são cópias do Introitus e Kyrie. Mozart, nesta versão, foi antiquado, desdramatizado, chocantemente trivializado. Em conversa com um amigo que trazia o filho de 8 ou 9 anos, ele concluiu: “No final, tive de explicar ao meu filho o que era um Requiem...”. Sem mais comentários.

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(Review in English)

Paul McCreesh, conductor of the FCG Orchestra from next season, drove "his" orchestra in a varied program that included the awaited interpretation of Mozart's Requiem.

The first composition heard was the Symphony no. 8 in B Minor, D.759, "Incomplete", composed by Franz Schubert in 1822. Its composition was abandoned in 1823 (although the composer outlined the remaining two movements) and had its premiere in 1865, 37 years after the composer's death. Although unfinished, the work reveals dramatic elements of the romantic period, keeping often interpreted. It was presented to us with quality.

It was followed by sacred music of Igor Stravinsky: Missa. It was composed between 1844 and 48, and premiered in Milan. Based on Catholic biblical texts, this book comes at a time when the composer was already living in the United States and was on a new creative moment and of particular interest in the works of Mozart. The work reinforces the composing process originality of Russian and is of extreme interest in the panorama of twentieth-century sacred music. It was composed for chorus and wind orchestra and its interpretation was merely regular.

The Requiem in D minor, K. 626, by Wolfgang Amadeus Mozart was composed in 1791, the year in which the composer died. This work is of unparalleled genius, revealing the divine inspiration of a composer who only sinned by having died with only 35 years, depriving us of its glorious music. His work reveals a unique talent and his Requiem is (and always will be) a major landmark of sacred music of humanity. The cogency of God can be reasoned with this composition, because it is very likely to be God’s voice that we hear.
Mozart finished the Requiem with Sequentia - Lacrimosa. From there, just leave blanks for the completion of the entire work. There were several composers who had the "audacity" to complete the Master's work. The best known is that of Franz Süssmayr, but Paul McCreesh opted by Robert Levin’s and justified himself: "The version of Mozart's Requiem which today is better known is that by Franz Süssmayr. Undoubtedly, this composer was close to Mozart, but with a more careful analysis, we realize that his work is of clumsy conclusion with regard to the compositional structure and orchestration. During at least a quarter-century scholars have provided several alternative conclusions based on incomplete autograph of Mozart, in his sketches and surviving copies in its compositional technique and in its original orchestration. Tonight version by Robert Levin is, in my opinion, the most successful to date. Levin his not only a brilliant musicological mind, but also an accurate understanding of the Mozartian style mostly by his work as a pianoforte interpreter. More perceptive listener will be an extensive trail at the end of the Lacrimosa (on a theme suggested by Mozart) and substantial rearrangements of the musical material in the Lacrimosa, the Sanctus and Benedictus. Orchestration seems to breathe a spirit closer to the other works of Mozart. "
In my view, it was one of my biggest disappointments in FCG. The Introitus, Kyrie and Sequentia were all interpreted by Paul McCreesh at a breakneck speed, nothing dramatic or melodious. The soloists were not well: the soprano (Susan Gritton) presented with a gruff voice, bad diction and projection difficulties; the mezzo-soprano (Monia Groop) had a pleasant voice and had a very conditionated interpretation; tenor (Andrew Staples) was the best soloist element with an appropriate timbre; and baritone (Jonathan Lemalu) has no voice for the role: his Tuba Mirum was terrible. The chorus, especially the feminine elements, struggled in the treble and I have seen its interpretation greatly diminished by an unbelievable speed. When Lacrimosa began I thought it would improve, but it does not occur. And here comes Robert Levin: Amen end of the Sequentia loses in beauty and power, the Sanctus is diminished; Lux aeterna and Cum sanctis Tuis are copies of Introitus and Kyrie. Mozart, in this version, was antiquated, less dramatic, shockingly trivialized. In a conversation with a friend who brought his child of 8 or 9 years old, he commented: "In the end, I had to explain to my son what a Requiem is...". No more comments.

5 comentários:

  1. Caro camo_opera,
    Estou fora de Lisboa e foi com grande pena que não pude assistir a uma das minhas obras musicais preferidas. Contudo, pelo que aqui escreve, ainda bem que não ouvi. Este Requiem com tempos acelerados fica, para mim, destituído de toda a sua grandiosidade espiritual, musical e quase sobre(humana). Também já ouvi outros maestros fazerem isso - em suma, destruí-lo!
    Espero que não seja um mau presságio para o que a Orquestra Gulbenkian nos reserva no futuro, dirigida por este maestro com nome feito na praça.

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  2. Foi um concerto perturbante. Gostei muito do Schubert, pareceu-me boa a interpretação da Missa de Stravinsky (obra que desconhecia e que não me entusiasmou muito) e a versão do Requiem soou-me estranha. Pena os solistas terem sido fraquinhos, à excepção do tenor. Mas gostei de muitos momentos: o Rex! Quanto à velocidade estonteante, ainda não percebi se a estranheza que me causou foi boa ou má.

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  3. ESPETACULAR!
    Pude "ouvir" o concerto e as análises críticas e históricas estão brilhantes1
    Um abraço

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  4. Contactei pela primeira vez com McCreesh ontem à noite quando assisti ao concerto de Karita Mattila com a orquestra Gulbenkian e também não fiquei muito bem impressionado. A interpretação de "A morte de Manfred" de Luís de Freitas Branco pareceu-me desvitalizada, desprovida de qualquer espírito interpretativo, quase maquinalmente executada. Espero que as coisas melhorem no futuro!

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    1. Caro Cenayon,
      Não tive oportunidade de ir ouvir o soprano Karita Mattila, com muita pena minha, uma vez que, no ano passado, pude assistir a um excelente concerto.
      Quanto a McCreesh, espero bem que as coisas melhorem, uma vez que aquilo a que assisti e as opiniões (quase generalizada) que tenho ouvido, não me permitem perspectivar o futuro mais risonho. Mas, como ainda está numa fase de adaptação, há que não desmotivar.

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