Tendo começado a Temporada com um Parsifal, terminei-a de
igual modo e tendo o prazer de me estrear na Ópera de Amesterdão.
A sala é óptima. Sendo moderna, todos os locais permitem
aparentemente uma boa visibilidade do palco.
Na entrada existem relógios que
marcam o horário dos intervalos e o final da récita, o ambiente é descontraído
e os snacks são bons e, comparativamente com outras casas de ópera, têm melhor
relação qualidade-preço.
A encenação de Pierre Audi foi extremamente fraca e
desinteressante, não se tendo tornado uma récita má devido à qualidade vocal e
interpretativa dos intervenientes.
O primeiro acto começa num local inóspito com dois rochedos
e uma projeção de luz que torna tudo nele vermelho e que se torna normal quando
se ouve o tema de Parsifal e se antecede a sua entrada em palco. Durante a
abertura vê-se uma criatura negra com os cabelos longos a abandonar o local e
que só no segundo acto se fica a saber ser um dos homens de Klingsor, os quais
Parsifal derrota antes de chegar às mulheres-flor. O cisne é um cisne e cai no
centro do palco após ser atingido pelo jovem. Amfortas aparece literalmente
como a imagem que temos de Jesus Cristo na Cruz, com lençol escondendo os
genitais e em tronco nu, ao que se junta uma faixa branca no tronco, manchada
de sangue, escorrendo o mesmo pelo tronco. A música da transformação leva à
necessidade de cobertura do palco com o pano o que pessoalmente detesto porque
se perde a noção de continuidade. O que aparece depois de corrido o pano é o
inverso dos rochedos com uns suportes em jeito de andaimes de madeira e
manchados de vermelho e onde se encontram os Cavaleiros do Graal. O Graal é
personificado como um lençol que Amfortas desenrola e onde surge, perto do
topo, um jorrar de sangue que vai caindo quase linearmente ao longo do lençol
(talvez este seja o único apontamento interessante da encenação e, mesmo assim,
não por aí além em originalidade).
O segundo acto tem o palco sem nada e lá
desce uma estrutura circular prateada e reflexa. Os fatos das mulheres-flor até
eram esteticamente bonitos, cheios de folhos, mas o resto dependeu sempre
daquilo que os cantores foram capazes de fazer.
No terceiro acto... palco vazio
à excepção de uma estrutura inversa à da estrutura circular do segundo acto, o
que até tem a sua coerência (estrutura circular a significar o reino de
Klingsor e o inverso a representar o mundo oposto do Graal mas em nada
relacionado com o mundo do primeiro acto). No final, os Cavaleiros surgem
vestidos de preto com o símbolo da cruz desenhado na face, na mesma cor, e
Amfortas aparece também vestido de fato negro com a ferida visível por baixo.
Parsifal chega, desce a estrutura circular até meio do palco como que
parcialmente completando o seu inverso e todos parecem desmaiar em êxtase ou
então a morrer (não compreendi a ideia) com um Gurnemanz contemplativo vendo
Parsifal sair de cena.
Não me quero repetir em relação a Christopher Ventris
naquilo que já referi sobre a récita de Barcelona de 2011 mas... está melhor
que nunca. É perfeitamente sentida, vocal e interpretativamente, a transição
entre o Parsifal tolo e o iluminado. A
maneira como sente o que canta e o transmite principalmente no dueto com
Kundry é arrepiante. Sempre uma aposta
ganha sempre que cantar este papel.
Falk Struckmann, habitualmente um Amfortas de qualidade,
estreou-se (penso) como Gurnemanz. É preciso gostar muito da voz deste cantor
para aceitar, por exemplo, o seu Wotan e o mesmo se passa com o seu Gurnemanz.
O modo como articula a linguagem, por vezes, não é musicalmente perfeito e pode
ser ligeiramente incomodativo. Para mim não o é e a sua expressividade foi de
excelente nível. A potencia vocal a ela
associada criaram um Gurnemanz digno e que não foi superior face a uma
encenação conceptualmente pobre.
Petra Lang esteve sublime, fantástica, insuperável,
destacando-se também o dueto com Parsifal. Acho difícil conseguir-se, na
actualidade, ter uma Kundry melhor que a criada aqui por Lang.
Alexander Marco-Buhrmester esteve bem como Amfortas. Voz com
timbre bonito, expressiva embora, em determinadas passagens, pareça algo amorfo
e não conseguir transmitir a emoção correcta do texto.
Mikhail Petrenko, na sua curta intervenção com Titurel e
Klingsor, cumpriu muito bem o papel, mais uma vez sentindo-se alguma falta de
brilhantismo cénico face à encenação.
A direcção de Ivan Fischer e a qualidade da Orquestra
estiveram ao nível do melhor que se pode fazer em Wagner! Excelente!
Se o Don Giovanni de Guth foi um exemplo de como uma
encenação pode elevar os intérpretes e a Ópera, o Parsifal de Audi foi a sua
antítese, valendo sim pelo cantores.
Fica a recomendação da Ópera de Amesterdão que tem uma
temporada 2012-2013 de elevado nível!
PARSIFAL – De Nederlandse Opera - July 8, 2012
Having started the season with a Parsifal, I finished it the
same way and having the pleasure of making my debut at the Amsterdam Opera
House.
The Opera House is great. Being modern, seemingly all sites
allow good visibility of the stage.
At the entrance there are clocks that mark
the time of the intervals and the end of the performance, the atmosphere is
relaxed and the snacks are good and comparable to other Opera Houses, have
better value for money.
The staging of Pierre Audi was extremely weak and
uninteresting, not having made a performance due to poor voice quality and
interpretation of the actors.
The first act begins in an inhospitable place with two rocks
and a projection of light that makes it all red and it becomes normal when you
hear the theme of Parsifal and before his entry into the stage. During the ouverture
we see a black creature with long hair leaving the scene and only in the second
act we find out it to be one of the men of Klingsor, which Parsifal defeats
before reaching the flowermaidens. The swan is a swan and falls to the center stage
after being hit by the young fool. Amfortas appears literally as the image we
have of Jesus Christ on the Cross with a white blanket hiding the genitals and naked
torso, along with a white band on the trunk, stained with blood streaming down
the same trunk. The music of the transformation leads to the need to cover the
stage with the cloth which I personally hate because it loses the sense of
continuity. What appears after running the cloth is the inverse of the cliffs
with some woden structure as in construction, stained in red, and where the
Grail Knights stand. The Grail is personified as a sheet that Amfortas unfolds
and where appears, near the top, a gush of blood that falls off almost linearly
along the sheet (perhaps this is the only note of interest of the staging and
even so not as original as expected).
The second act show an empty stage where
a circular structure with silver reflex descends. The suits of the
flowermaidens were aesthetically beautiful, full of frills, but the rest has
always depended on what the singers were able to do.
In the third act... empty
stage with the exception of an inverse structure of the circular structure of
the second act, which even has its consistency (circular structure to mean the
kingdom of Klingsor and the reverse to represent the opposing world of the
Grail but in no way related to the world in the first act...). In the end, the
Knights appear dressed in black with the cross symbol drawn on the face, in the
same color, and Amfortas appears also dressed in a black suit with the wound
visible underneath. Parsifal arrives, the circular structure descends halfway
as partially completing its inverse, and all seem to swoon in ecstasy or to die
(I did not understand the idea) with a contemplative Gurnemanz seing Parsifal
leaving the scene.
I do not want to repeat myself over Christopher Ventris regarding
what I said about the Guth production in Barcelona 2011 but ... he is better
than ever. The transition between the fool Parsifal and the enlightened
Parsifal is perfectly felt in vocal and interpretative way. The way he feels what
he sings and how he can transmit that to us is unbelieveavle, specially when he
sings the duet with Kundry. Always a safe bet when Ventris sings this role.
Falk Struckmann, usually a high quality Amfortas, made his
debut (I think) as Gurnemanz. You must really like the voice of this singer to
accept, for example, his Wotan and the same goes for his Gurnemanz. The way he
articulates the language is sometimes not musically perfect and can be slightly
annoying. For me it is not and his expression was excellent. The vocal power
associated with it have created a dignified Gurnemanz, and that was not higher
due to a conceptually poor staging.
Petra Lang was sublime, fantastic, unbeatable, especially
also in the duet with Parsifal. I find it hard to get nowadays a better Kundry than
the one created here by Lang.
Alexander Marco-Buhrmester was fine as Amfortas. The voice
has a beautiful tone, although he seems dramatically weak and amorphous in some
passages, not being able to convey the correct emotion of the text.
Mikhail Petrenko, in his short appearance as Titurel and Klingsor, fulfilled
the role well, once again leaving us a feeling of lack of more brilliance due
to the staging.
Ivan Fischer and the Orchestra gave us an excelente
performance, with some of the best Wagner you can expect.
If Guth's Don Giovanni was an example of how one staging can
elevate the performers and the opera, The Audi’s Parsifal was its antithesis, worth
due to the singers.
I leave you the recommendation of the Amsterdam Opera House which
has a high level season in 2012-2013!
Texto interessante, elucidativo e fotografias de qualidade, o que tem sido uma constante nos seus escritos. É curioso abrir e fechar a temporada com a mesma ópera. Apesar de os cantores terem sido aquitambém de elevada qualidade, a nova leitura do seu texto sobre o Parsifal de Barcelona é reveladora de como a mesma ópera pode ser verdadeiramente empolgante (Barcelona) ou, "simplesmente", muito boa (Amsterdão).
ResponderEliminarHi Fanatico_Um,
ResponderEliminarI need your help. You know that I do admire the counter tenor Franco Fagioli who at the moment gives his performance in Italy. I'd like to post some press reviews about him.
Would you translate the followings in English? It shouldn't be precise. I'd just like to understand roughly what it is written on.
Thank you in advance, my friend.
"L’Arbace di Franco Fagioli, star di spicco tra i falsettisti odierni, ha palesato una precisione ineccepibile nei passaggi di coloratura insieme a un’omogeneità e una rapidità nel passaggio di registro invidiabile; per contro la sua mimica facciale deformata dallo sforzo canoro andava contro alla piacevolezza (eroticamente connotata) di quella vocalità artificiosa e i recitativi risultavano incomprensibili e infastidenti. Le critiche di chi ebbe la fortuna di ascoltare Farinelli testimoniano un certo impaccio attoriale dell’evirato cantore, filologicamente riproposto da Fagioli, gratificato tuttavia da applausi e grida di gioia alla fine di ogni sua aria (è mancato poco che qualcuno del pubblico martinese gridasse “One God, One Fagioli”)."
@ lotus-eater,
EliminarI will do my best and will post the text on your blog.
Thank you sooo... much for the rapid answer, my friend.
ResponderEliminarNow it's very clear, but I'm a bit upset about this criticism.
In fact they're always trying to find some dust somewhere. This role is written for Farinelli whose voice "Soprano" was, while Fagioli's mezzo. Through youtube I heard Fagioli singing this role. Obviously it is quite high for his vocal position. Nevertheless he's sung with great virtuosity. There's definitely no one who can sing this role so perfect like Fagioli at the moment. The italian critics should rather be happy for that than trying to find some dust. Apropos, the recitative in this opera is not well written. Fagioli can not perform miracles.
Have a good day!