domingo, 8 de julho de 2012

MACBETH, Bayerische Staatsoper, Munique, Março de 2012


(review in english below)

 Macbeth é uma ópera de G.Verdi com libretto de Francesco Maria Piave, segundo Macbeth de Shakespeare.


 O desespero e ferocidade desta ópera fizeram com que ficasse conhecida em Itália como L’ópera senza amore.

Macbeth e Banquo sabem pelas bruxas que o primeiro será rei da Escócia e que o segundo será pai de reis. Lady Macbeth obriga o marido a matar o rei Duncan enquanto dorme. Macduff, um nobre escocês, descobre o assassinato. Macbeth é coroado rei e ordena a morte de Banquo e do seu filho, mas este escapa. Durante um banquete, Macbeth é assombrado por uma visão de Banquo. Macduff junta-se aos escoceses exilados. Macbeth, depois de ouvir novamente as bruxas, decide matar o filho de Banquo e a mulher e filhos de Macduff. Este fica horrorizado quando sabe do assassinato da sua família e jura vingança. Lady Macbeth, sonâmbula, relembra os crimes que ela e o marido cometeram. A sua morte é comunicada a Macbeth que é morto por Macduff.

(fotografia da Bayerische Staatsoper / photo of Bayerische Staatsoper)

A produção de Martin Kusej prometia mais do que realmente aconteceu.
A cortina abre e no palco há uma imensidão de crânios humanos no chão e, a um canto, uma tenda (tipo campismo). Durante a abertura saem da tenda seis crianças e algumas personagens principais, à medida que a música a elas se refere (“leitmotif like”). Por exemplo Lady Macbeth sai manchada de sangue. Voltam a entrar no final da abertura. Achei muito bem conseguido e muito prometedor.
Toda a acção da ópera se passa neste cenário (incluindo a presença constante da tenda) adicionando-se, nas cenas de interior, um grande lustre suspenso no meio do palco. A acção foi transportada para a actualidade.
Mas logo no primeiro acto começam as bizarrias. Os elementos do coro entram e espalham-se por todo o palco, sobre os crânios. A cena é eficaz e enquadrada na consulta às bruxas de Macbeth e Banquo. Contudo, surge, subitamente, um surto de prurido que atinge todo o coro e faz os seus elementos coçarem-se de forma ridícula e despirem-se parcialmente. Segue-se de imediato uma cena em que se juntam aos pares, simulando relações sexuais. No início do 3º acto, aparecem também quase despidos e todos se colocam numa posição como se estivessem a urinar. Pela primeira vez aqui na Bayerische Staatsoper ouvi uma vaia ruidosa em pleno curso musical! A Lady Macbeth numa das cenas aparece em cima do lustre, em equilíbrio instável, que se reflectiu no canto, até ser de lá tirada pelo marido. A cena do sonambulismo é de uma falta de originalidade confrangedora.
Termino com duas notas positivas. A visão do fantasma de Banquo (que Macbeth tem durante a festa) está bem imaginada porque a cabeça dele aparece nas seis crianças que se juntam aos convidados. Macbeth tem uma postura de insegurança crescente ao longo da acção e Lady Macbeth é absolutamente determinada até à cena do sonambulismo e morte.

A direcção musical, algo irregular, foi do maestro grego Teodor Currentzis.

O barítono italiano Franco Vassalo foi um Macbeth convincente. A voz é forte e bonita, sempre audível sobre a orquestra. Cenicamente esteve muito bem, foi um rei inseguro e com medo da própria sombra.


 Lady Macbeth foi cantada pelo soprano russo Tatiana Serjan. A voz é poderosíssima e tem um timbre muito particular. É quase um mezzo, mas sobe aos agudos com facilidade. Contudo, foi dura e faltou-lhe emotividade vocal, sobretudo evidente na cena do sonambulismo. Cenicamente esteve bem, também ajudada pela sua silhueta.


 O baixo alemão Christof Fischesser foi excelente no curto papel de Banquo. Uma voz possante e de grande beleza.

Os tenores foram os elos fracos da noite. O italiano Francesco Demuro fez um Macduff vocalmente frágil. Cantou sempre em esforço, deixava de se ouvir quando a orquestra soava mais forte e, quando cantava notas mais agudas, soava feio e esganiçado. O também italiano Fabrizio Mercurio foi um Malcolm que mal se ouviu.












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MACBETH, Bayerische Staatsoper, Munich, March 2012

Macbeth is an opera by G.Verdi with libretto by Francesco Maria Piave, after Shakespeare’s Macbeth.

The desperation and ferocity of this opera have made it to be known in Italy as L’opera senza amore (the loveless opera).

The witches tell Macbeth and Banquo that the first will be king of Scotland and the second will be the father of kings. Lady Macbeth forces her husband to kill King Duncan in his sleep. Macduff, a Scottish nobleman, discovers the murder. Macbeth is crowned king and orders the death of Banquo and his son, but the son escapes. During a banquet, Macbeth is haunted by a vision of Banquo. Macduff joins the Scottish exiles. Macbeth, after hearing the witches again, decides to kill the son of Banquo and Macduff's wife and children. Macduff is horrified when he learns of the murder of his family and vows revenge. Lady Macbeth, sleepwalking, recalls the crimes she and her husband have committed. Her death is reported to Macbeth that is killed by Macduff.

The direction of Martin Kusej promised more than what actually happened.
The curtain opens and on stage there are numerous human skulls on the ground and in a corner, a tent (camping type). During the overture six children and some main characters get out from the tent, as the song refers to them ("leitmotif like "). For example Lady Macbeth appears stained with blood. They re-enter the tent by the end of the overture. I found this stage mouvements very successful and very promising.

All the action of the opera takes place in this scenario (including the constant presence of the tent) adding, in the interior scenes, a large chandelier suspended in the middle of the stage. The action was brought to the present days.

But right from the very first act the bizarre options begin. The members of the chorus enter and spread all over the stage, on the skulls. The scene is effective and in accordance to the consultation with the witches of Macbeth and Banquo. However, there is suddenly an outbreak of pruritus that affects the entire choir. They scratch themsevles in a ridiculous way and undress partially. Immediately follows a scene in which they join in pairs, simulating sexual intercourse. At the beginning of the 3rd act, they also appear almost naked and everyone is in a position as if to urinate. For the first time here at the Bayerische Staatsoper I heard a loud boo during the playing of the music! Lady Macbeth appears in on scene on a chandelier, in unstable equilibrium, which influenced negatively her singing, until she was “rescued” by her husband. The sleepwalking scene has an appalling lack of originality.
I end with two positive notes. The vision of the ghost of Banquo (that Macbeth sees during the party) is well imagined, because his head appears in the six children who join the guests. Macbeth has a progressive behaviour of insecurity along the action and Lady Macbeth, in contrast, is absolutely determined until the sleepwalking scene and her death.

Greek conductor Teodor Currentzis was responsible for an irregular musical direction.

Italian baritone Franco Vassallo was a convincing Macbeth. his voice is strong and beautiful, always audible over the orchestra. Artistically he was very well, as he was an insecure king afraid of his own shadow.

Lady Macbeth was sung by Russian soprano Tatiana Serjan. Her voice is powerful and has a very particular timbre. She's almost a mezzo, but she rises to top notes with ease. However, she was hard and she lacked the vocal emotion, especially evident in the sleepwalking scene. Artistically she was ok,  helped by her figure.

German bass Christof Fischesser was excellent in the short role of Banquo. He has a powerful voice of great beauty.

The tenors were the weak links in the night. Italian Francesco Demuro  was a vocally weak Macduff. He sang always in effort and was not heard when the orchestra sounded stronger. When he sang top notes, the sound was ugly and shrill.
Italian Fabrizio Mercúrio, as Malcolm, was a barely heard.
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4 comentários:

  1. A BSO tem umas encenações que, parecendo modernas, acabam por ir um bocadinho no mesmo sentido, ou estou enganada? Pode-se fazer apostas sobre quando vão aparecer os nus, e se vêm a propósito ou não.

    Mesmo assim, quem me dera poder lá ir sempre.

    Já agora, em Outubro está programada uma Tosca com o Kaufmann e a Tatiana Serjean com que eu ando a sonhar: não se pode ter tudo mas ainda não desisti.

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    1. A BSO é também uma das minhas casas de ópera preferidas, mas estou de acordo consigo Gi em relação às encenações. É sempre uma caixinha de surpresas. Quando as novidades fazem sentido, nada a dizer, mas o que acontece mais frequentemente é que o não fazem. Este Macbeth é disso um exemplo perfeito. As fotografias disponíveis (como a que coloquei com os inúmeros cranios) até faziam crer que veríamos uma encenação interessante, mas o surto de prurido e o urinar colectivos, entre outros, foram totalmente gratuitos e disparatados! Acho que é também a falta de iamginação dos encenadores que os leva a estas opções.

      Desejo-lhe muita sorte para a Tosca, nomeadamente no que respeita ao Kaufmann (que ele não cancele o que, infelizmente, tem sido muito comum nos dois últimos anos). É, talvez, o melhor Cavaradossi no activo.

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  2. Macbeth has always been a favorite. I am familiar with L’opera senza amore. Despite the unfortunate weak tenors, I believe I would have loved it.

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  3. Apesar de ainda não ter conseguido lá ir, por aquilo que nos tem trazido nestas críticas, as encenações são sempre particulares. Quem me tira uma boa produção clássica ou uma que altere de forma inteligente a concepção original da obra, tira-me tudo e, algumas vezes, o prazer de ver a própria récita.

    Conheço mal esta ópera e só a vi uma vez no São Carlos. A ideia com que fiquei é que é uma obra com sonoridade muito sombria (como se espera pela temática) onde o predomínio vocal é por vozes com tessitura mais grave. Mas, na altura até gostei, não ficando contudo totalmente apaixonado.

    Obrigado por mais uma excelente crítica e boa continuação operática!

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