segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

RIGOLETTO, Royal Opera House, Londres / London, Dezembro / December 2017

(review in English below)

A opera Rigoletto de G Verdi esteve em cena na Royal Opera House de Londres, numa reposição da encenação polemica de David McVicar. A récita a que assisti foi dedicada à memoria do grande baritono russo Dmitri Hvorostovsky (originalmente anunciado para o papel de Rigoletto) que morreu em Londres há poucas semanas. E que falta fez no espectáculo, mas já lá iremos.




A encenação de McVicar mostra a profunda corrupção, opulência e crueldade na corte de Mântua, em contraste com a casa muito modesta, uma barraca, onde vive o Rigoletto com a filha. O mesmo cenário é usado para a pensão do Sparafucile. A ópera abre com uma enorme orgia com nus integrais, que apenas servem para chocar o público, não trazendo nenhuma mais valia à obra.


A direcção musical foi de Alexander Joel.

A grande maioria dos solistas foi de qualidade superior, mas o principal não esteve à altura do papel.

O barírono grego Dimitri Platanias esteve muito aquém das exigências da personagem. Bem caracterizado, limitou-se a cantar sem sentimento ou alma e, mesmo o canto, não impressionou. Baixa potencia, algo monocórdico ao longo de toda a récita, não viveu nem transmitiu as emoções da personagem. Foi uma pena. Para além de outros solistas de primeira categoria (que o foram), um bom Rigoletto é essencial para o sucesso desta ópera e tal não aconteceu. Como se homenageava Hvorostovsky (esse sim, excelente neste papel), ainda foi pior. Mas Platanias terá feito o seu melhor, mas não chega para catedrais da ópera como a Royal Opera House.


No extremo oposto esteve a soprano russa Sofia Fomina que foi uma Gilda espectacular. Cantou sempre afinada, voz muito bonita sobre a orquestra, com agudos de qualidade superior e emitidos aparentemente sem esforço. Também com uma excelente presença em palco.



Outros dois cantores de topo foram o baixo italiano Andrea Mastroni que fez um Sparafucile assustador de imponente voz cavernosa e a irmã Maddalena, a mezzo búlgara Nadia Krasteva, muito habituada ao papel e que tem vindo a evoluir positivamente na sua interpretação.



O tenor norte americano Michael Fabiano foi um Duque globalmente bom, com desempenho cénico decente e com uma voz de grande nível embora não tenha mantido regularidade de emissão em toda a récita, nomeadamente no início.


Nos papéis secundários ouvimos Luís Gomes (Matteo Borsa), Simon Shibambu (Conde Ceprano), Francesca Chiejina (Condessa Ceprano), Dominic Sedgwick (Marullo) James Rutherford (Conde Monterone) e Sarah Pring (Giovanna).





Um Rigoletto quase sem Rigoletto!

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RIGOLETTO, Royal Opera House, London, December 2017

G Verdi's opera Rigoletto was on stage at the Royal Opera House in London, reviving David McVicar's controversial production. The performance I attended was dedicated to the memory of the great Russian baritone Dmitri Hvorostovsky (originally scheduled for the role of Rigoletto) who died in London a few weeks ago. And how he was missed in the performance, but we will go to it later on.

The staging of McVicar shows the deep corruption, opulence and cruelty in the court of Mantua, in contrast to the very modest house, a hut, where Rigoletto lives with his daughter. The same scenario is used for Sparafucile's pension. The opera opens with a huge orgy with nudes, which only serve to shock the audience, bringing no added value to the work.

The musical direction was by Alexander Joel.

The great majority of the soloists was of superior quality, but the main one was not up to the paper.

Greek baritone Dimitri Platanias fell far short of the character's demands. Well characterized, he simply sang without feeling or soul and even the singing did not impress. Down powered, somehow monotonous throughout the performance, he did not live nor transmitted the emotions of the character. It was a pity. In addition to other top-class soloists, a good Rigoletto is essential to the success of this opera and such has not happened. As the performance was a tribute to Hvorostovsky (excellent in this role), it was even worse. But Platanias should have done his best, but it is not enough for opera cathedrals like the Royal Opera House.

At the opposite extreme was Russian soprano Sofia Fomina who was a spectacular Gilda. She always sang in tune, a very beautiful voice and always over the orchestra, with high quality top notes, seemingly effortlessly. She had also an excellent presence on stage.

Two other top singers were Italian bass Andrea Mastroni who made a frightening Sparafucile with an imposing cavernous voice and his sister Maddalena, Bulgarian mezzo Nadia Krasteva, very used to the role and who has been developing positively in its interpretation.

American tenor Michael Fabiano was an overall good Duke with a regular stage presence and with a top level voice although he did not maintain regular emission throughout the performance, namely at the beginning.

In the secondary roles we heard Luís Gomes (Matteo Borsa), Simon Shibambu (Count Ceprano), Francesca Chiejina (Countess Ceprano), Dominic Sedgwick (Marullo) James Rutherford (Count Monterone) and Sarah Pring (Giovanna).

A Rigoletto almost without a Rigoletto!


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quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

RIGOLETTO, Teatro Regio di Parma, Janeiro / January 2018



(text in English below)


Depois de um avião e dois comboios, cheguei a Parma para o Rigoletto (Verdi) do Leo Nucci, mais um marco atingido na minha “melomanoloucura”. E que emoção!! A noite de hoje transpôs a vivencia de Bayreuth de há uns meses e não sei se alguma vez me senti tão emocionado com um cantor como hoje.





Os cantores solistas foram Stefan Pop (Duque),  Jessica Nuccio (Gilda), Giacomo Prestia (Sparafucile), Rossana Rinaldi (Maddalena), Carlotta Vichi (Giovana), Carlo Cigni (Monteroni) e Enrico Marabelli (Marullo).

Com algumas produções vibrei quase da mesma maneira, como com o Parsifal do Guth em Madrid em 2016, mas hoje foi um Homem de 75 anos que canta como se tivesse 40 e transmite uma emoção tão forte que, na minha individualidade de sentimento, gostava de a conseguir transmitir a todos com quem falo sobre isto, sobre ópera. Este Homem é uma lenda!! Leo Nucci é um fenómeno de verdadeira longevidade vocal porque é, sempre foi, e continua a ser um barítono.



Viajo há 13 anos para ver opera e só agora o vejo… sinto isto como uma falha pessoal astronómica e um insulto ao grande artista, e penso que também ao grande homem que ele é… Foi o meu embaixador num teatro novo – o Teatro Regio de Parma, é lindo por dentro, e voltará a sê-lo em mais dois novos teatros ao longo desta temporada.




Texto de wagner_fanatic


RIGOLETTO, Teatro Regio di Parma, January 2018

After one flight and two train trips, I arrived in Parma for Leo Nucci's Rigoletto (Verdi), another milestone reached in my "opera crazyness". And what a thrill!! This night supplanted the experience of Bayreuth a few months ago, and I do not know if I ever felt so moved with a singer like today.

Other soloists were Stefan Pop (Duque),  Jessica Nuccio (Gilda), Giacomo Prestia (Sparafucile), Rossana Rinaldi (Maddalena), Carlotta Vichi (Giovana), Carlo Cigni (Monteroni) and Enrico Marabelli (Marullo).

With some productions I vibrated in almost the same way, as with Guth’s Parsifal in Madrid in 2016, but today it was a 75 year old man who sings as if he was 40 and conveys an emotion so strong that, in my individuality of feeling, I liked to be able to transmit to everyone with whom I speak about this, about opera. This Man is a legend!! Leo Nucci is a phenomenon of true vocal longevity because he is, has always been, and continues to be a baritone.

I travel for 13 years to see opera and only now I see him ... I feel this as an astronomical personal fault and an insult to the great artist, and I think also to the great man that he is ... He was my ambassador in a new theater - Teatro Regio de Parma, it's beautiful inside, and he will be again in two more new theatres throughout this season.


Text by wagner_fanatic

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

THAÏS, METropolitan Opera, Nova Iorque / New York, Novembro / November 2017

(review in English below)

A opera Thaïs de Jules Massenet foi apresentada na Metropolitan Opera numa encenação de John Cox. Os vestidos da Thais foram desenhados pelo estilista Christian Lacroix.

A história passa-se em Alexandria e no deserto que a envolve, no Séc IV e retrata o confronto ente a paixão humana e o fervor religioso.
Thaïs é uma cortesã que vive luxuosamente em Alexandria à custa de homens ricos. Athanael é um monge que na juventude foi seduzido pela Thaïs mas está decidido em convencê-la a mudar de vida e comportar-se como uma cristã. Procura-a na casa do seu amigo de infância Nicias, actualmente um homem muito rico que a sustenta e é seu amante. Depois de alguma resistência e humilhação, ela acaba por decidir partir com o Athanael, incendiando a sua casa e destruindo tudo o que nela guardava.
Após uma passagem difícil pelo deserto chegam a um convento, onde ela ficará definitivamente enclausurada. O Athanael não a consegue esquecer e, meses depois, tem um sonho erótico e ouve vozes dizendo-lhe que a Thaïs vai morrer. Resolve ir ao convento resgatá-la, mas chega tarde. As freiras consideram-na uma santa pelo seu comportamento virtuoso e puro. Ela morre com uma visão dos anjos.



A encenação é convencional e bonita, com um bom contraste entre as paisagens despidas do deserto e o ambiente luxuoso onde a Thaïs vive no início. A música é agradável e contém trechos muito interessantes mas, para mim, o momento superlativo da ópera é o interlúdio musical entre as duas cenas do segundo acto, com um solo de violino de uma beleza arrepiante, acompanhado discretamente pela harpa, outros instrumentos e o Coro em pianíssimo. No 3º acto o tema regressa várias vezes. Vale a ópera e foi magnificamente interpretado pelo violinista David Chan.



O maestro francês Emmanuel Villaume também esteve ao mais alto nível, tal como a magnífica Orquestra da casa.



A soprano norte-americana Ailyn Pérez fez uma Thaïs sedutora no início e determinada em mudar de vida no final. Tem uma voz cheia, agudos fáceis e afinados e foi sempre bem audível. Na ária Dis-moi que je suis belle foi marcante mas foi no final que a interpretação atingiu o auge.



O tenor francês Jean-François Borras tem uma voz bonita e fez um Nicias cenicamente banal, algo monocórdico e ocasionalmente afogado pela orquestra.



Também o barítono canadiano Gerald Finley não foi um Athanael de qualidade. Tem uma voz muito agradável, mas também se ouviu mal em diversas partes. O papel é grande e exigente mas, para um cantor desta craveira, esperava melhor.


Já o baixo barítono Bradley Garvin que substituiu Finley na 2ª récita que vi foi excelente tanto na interpretação cénica como vocal do Athanael. A voz é muito ampla, sempre bem colocada, timbre bonito e expressividade marcante.



Deixaram muito boa impressão a mezzo Sara Gouden como Madre Albine e o baixo-barítono David Pittsinger como Palémon.











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THAÏS, METropolitan Opera, New York, November 2017

Jules Massenet's opera Thaïs was performed at the Metropolitan Opera in New York in a performance directed by John Cox. Thais' dresses were designed by fashion designer Christian Lacroix.

The story takes place in Alexandria and in the desert that surrounds it, in the fourth century, and it portrays the confront of human passion and religious fervor.
Thaïs is a courtesan luxuriously living in Alexandria at the expense of wealthy men. Athanael is a monk who in his youth was seduced by Thaïs but is determined to convince her to change her lifestyle and behave like a Christian. He looked for her at the home of his childhood friend Nicias, now a very wealthy man who supports Thaïs and is his lover. After some resistance and humiliation, she decides to leave with Athanael, setting fire to her house and destroying everything in it.
After a difficult passage through the desert they arrive at a convent, where she will be definitively enclosed. Athanael cannot forget her, and months later he has an erotic dream and hears voices telling her that Thaïs is going to die. He decides to go to the convent to rescue her, but it is too late. The nuns consider her a saint for her virtuous and pure behaviour. She dies with a vision of the angels.

The staging is conventional and beautiful, with a good contrast between the bare desert landscapes and the luxurious surroundings where Thaïs lives at the beginning. The music is pleasant and contains very interesting passages but, for me, the superlative moment of the opera is the musical interlude between the two scenes of the second act, with violin solo of a chilling beauty, Meditation, discreetly accompanied by the harp, other instruments and the Chorus in pianissimo. In the 3rd act the theme returns several times. By itself, it worth the opera and was magnificently played by the violinist David Chan.

The French conductor Emmanuel Villaume was also at the highest level, just like the magnificent Orchestra of the house.

American soprano Ailyn Pérez was a seductive Thaïs at the beginning and determined to change her life in the end. She has a full voice, easy tuned top notes and always well audible. In the aria Dis-moi que je suis belle she was remarkable but it was in the end that the interpretation reached its peak.

French tenor Jean-François Borras has a beautiful voice and made trivial Nicias, somehow monotonous and occasionally drowned by the orchestra.

Also the Canadian baritone Gerald Finley was not a top quality Athanael. He has a very pleasant voice, but he has also been heard badly in several moments. The character is big and demanding but, for a singer of his quality, I was expecting better.

In contrast, bass baritone Bradley Garvin who replaced Finley in the 2nd recital I attended was excellent both in the scenic and vocal performance of Athanael. The voice is very wide, always well tuned, beautiful timbre and striking expressiveness.

Mezzo Sara Gouden as Mother Albine and bass-baritone David Pittsinger as Palémon left a very good impression in their small roles.


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