terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

SIEGFRIED, Bayerische Staatsoper, Munique, Janeiro de 2013 / Munich, January 2013




(review in English below)

Siegfried é a terceira ópera do ciclo do Anel do Nibelungo de Richard Wagner. A encenação é de Andreas Kriegenburg.

No Anel esta é a ópera em que a natureza é dominante. Toda a acção se passa em grutas, floresta e montanhas. E as abordagens de Kriegenburg são, mais uma vez, impressionantes. Os elementos cénicos são construídos pelos figurantes, resultando num efeito surpreendentemente eficaz.

No 1º acto, a gruta do nibelungo Mime é montada em palco pelos figurantes que transportam, cada um, uma grande placa rectangular que, no seu conjunto, formam a gruta. No centro está a bigorna.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

Mime criou Siegfried para o usar na recuperação do anel que está na posse de Fafner, agora transformado em dragão por efeito do elmo. Só alguém que não saiba o que é o medo, como Siegfried, o poderá enfrentar. Mime tenta reconstruir a espada Nothung, mas não consegue.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

Conta a Siegfried a sua história e, sempre que refere um pormenor relevante, a gruta desfaz-se e vêem-se os figurantes representar o que Mime relata. Por exemplo quando diz que a mãe, Sieglinde, morreu de parto, vê-se no fundo do palco Sieglinde a parir.
Wotan surge disfarçado de viajante e propõe a Mime que ambos coloquem três perguntas um ao outro. Quem não acertar, morre.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

 Wotan responde facilmente às perguntas de Mime: quem vive no interior da terra, à superfície e nas alturas. Em cada resposta, a gruta é retirada e, no fundo do palco, vêem-se os figurantes a representar os nibelungos escravizados, depois os gigantes sobre os cubos humanos e, finalmente, Walhall. O efeito cénico é magnífico. Mime não acerta na 3ª pergunta: quem voltará a forjar a espada Nothung.
Siegfried reconstrói a espada e os figurantes representam na perfeição todos os utensílios de uma fundição.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

 No 2º acto Alberich está próximo da gruta de Fafner, na expectativa de recuperar o anel.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

Mime pede a Siegfried para matar o dragão. A representação do dragão é fantástica. Aparece suspenso, de cor vermelha, constituído por um conjunto de figurantes que formam a enorme cabeça.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

 Não sabendo o que é o medo, Siegfried enfrenta-o e mata-o com a espada.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

Ao provar acidentalmente o seu sangue, percebe o que lhe diz uma ave. A cantora tem um leque em cada mão que movimenta simulando o bater de asas

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

. Diz-lhe que se deve apoderar do anel e do elmo e que Mime o pretende matar. Siegfried mata-o.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

A ave leva-o pela floresta até ao rochedo onde está Brünhilde e diz-lhe que a deverá acordar. As árvores são formadas por figurantes suspensos, noutro efeito cénico de invulgar eficácia e beleza.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

O 3º acto inicia-se com o aparecimento de Erda, totalmente vestida e pintada de branco, assim como o grupo de figurantes que a acompanham. Volta a dizer ao viajante (Wotan) que o fim dos deuses está próximo. Siegfried reconhece nele o assassino do pai e quebra-lhe a lança com a espada Nothung.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

No que, para mim, é a parte menos conseguida da encenação de todo o Anel, Siegfried atravessa o rio (?), efeito representado por um grande e ruidoso plástico que cobre todo o palco e, depois, o fogo, e vê pela primeira vez uma mulher, Brünhilde.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

Acorda-a com um beijo e os dois apaixonam-se. A última cena passa-se num cenário em que há uma cama no centro e todo o palco está coberto por um pano encarnado, simbolizando o fogo. Mas o efeito final é desinteressante.

(fotografia / photo Wilfried Höse, Bayerische Staatsoper)

O tenor canadiano Lance Ryan foi Siegfried. Cantou bem o papel embora a voz, apesar de grande, não seja particularmente imponente. Uma voz mais heróica seria melhor, mas onde estão elas nos dias de hoje? Ryan manteve a qualidade interpretativa ao longo da récita e, mesmo no final do 3º acto, no diálogo com a recém chegada (ao palco) Brünhilde, esteve ao mais alto nível. O cantor tem uma excelente figura, tem corpo de Siegfried, e movimenta-se muito bem em palco, o que ajudou muito.


 Ulrich Ress, tenor alemão, foi um Mime marcante. O timbre é perfeito para o papel, a voz sempre bem projectada e sob absoluto controlo. Foi um dos melhores da noite e, cenicamente, esteve também superlativo.


 O barítono alemão Thomas J Mayer foi um Wanderer de grande classe, tanto vocal como cénica. Foi sempre audível sobre a orquestra, tem uma voz encorpada e foi muito expressivo na interpretação.



 Tomasz Konieczny, baixo-barítono polaco, fez do Alberich um verdadeiro gangster (como a encenação pede). Vocalmente é extraordinário mas gostei mais do seu Wotan na Valquíria.


 Foram também intérpretes de grande categoria o baixo norte-americano Steven Humes como Fafner, o soprano russo Anna Virovlansky que deu voz à ave e o contralto chinês Qiulin Zhang como Erda.



 A Brünhilde da noite foi o soprano norte-americano Catherine Naglestad que cantou com grande poderio vocal, sobretudo no registo mais agudo. Teve uma boa presença cénica, ao nível do Siegfried de Lance Ryan.



Um Siegfried sensacional!







*****


SIEGFRIED, Bayerische Staatsoper, Munich, January 2013

Siegfried is the third opera of the Nibelung’s Ring cycle of Richard Wagner. The staging was by Andreas Kriegenburg.

This is the opera where nature dominates. All the action takes place in caves, forests and mountains. And Kriegenburg’s approaches are again striking. The scenic elements are constituted by supernumeraries resulting in a surprisingly good way.

In the 1st act, the cave of the Nibelung Mime is built on stage by supernumeraries, each carrying a large rectangular plate which, taken together, form the cave which has in the center, the anvil.
Mime grew up Siegfried to use him in the recovery of the ring that is in possession of Fafner, now transformed into a dragon, by the effect of the helmet. Only someone who does not know what fear is, as Siegfried, may face the dragon. Mime tries to rebuild the sword Nothung, but can not. He tells his history Siegfried and wheneverhr refers to a relevant detail, the cave disassembles and the supernumeraries perform backstage what Mime reports. For example when he says that his mother, Sieglinde, died in childbirth, we see backstage Sieglinde giving birth.
Wotan appears disguised as a traveler and proposes Mime to put three questions to each other. Who fails, dies. Wotan responds readily to Mime’s questions: who are those who live within the earth, on the surface and above in a castle. In each response, the cave is disassembled and backstage, the supernumeraries are seen to represent the enslaved Nibelungs, the giants on human cubes and finally Walhall.
The scenic effect is magnificent. Mime misses the 3rd question: who will again forge the sword Nothung.
Siegfried reconstructs the sword and the supernumeraries represent perfectly all the utensils of a foundry.

In 2nd act Alberich is near Fafner's cave, hoping to recover the ring. Mime asks Siegfried to slay the dragon. The representation of the dragon is fantastic. It appears suspended, in red, comprising a set of supernumeraries forming the massive head. Not knowing what fear is, Siegfried kills him with the sword. When accidentally he tastes his blood, he understands what a bird sings. The singer playing the bird has a fan in each hand that moves simulating the flapping of bird wings. The bird tells him he should grab the ring and the helmet and that Mime intends to kill him. Siegfried kills Mime. The bird takes him through the forest to the cliff where Brunhilde is and tells him to wake her up. Trees are formed by suspended extranumeraries, another effect of unusual scenic beauty and effectiveness.
The 3rd act begins with the appearance of Erda, painted in white, like the group of supernumeraries that come with her. She tells again the traveler (Wotan) that the end of the gods is near. Siegfried recognizes him as the murderer of his father and breaks his spear with the sword Nothung.
In the least effective part of the staging of the entire Ring, Siegfried crosses the river (?) an effect represented by a large and noisy plastic that runs through the stage and then the fire, and sees a woman (Brünhilde) for the first time. He wakes her with a kiss and the two fall in love. The last scene is set in a scenario where there is a bed in the center and the entire stage is covered by a red cloth, symbolizing the fire.
But the final effect is uninteresting.
Canadian tenor Lance Ryan was Siegfried. He sang the role well although the voice, though large, is not particularly beautiful. A more heroic voice would be better, but where are they today? Ryan maintained the vocal quality along the performance and even at the end of the 3rd act, in the dialogue with the fresh (for singing) Brünhilde. The singer has a good figure, he has a body of Siegfried, and moves well on stage, which helped a lot.

Ulrich Ress, German tenor, was a remarkable Mime. His timbre is perfect for the role, the voice always well projected and under absolute control. He was one of the best of the night, and artistically he was also superlative.

 German baritone Thomas J Mayer was a great class Wanderer, both vocal and on stage. He was always audible over the orchestra, has a voluminous voice and was very expressive throughout the performance.

Tomasz Konieczny, Polish bass-baritone, played Alberich as a real gangster (as the staging called). Vocally he was extraordinary but I prefered his Wotan in Die Walküre.
Also excellent were North-American bass Steven Humes as Fafner, Russian soprano Anna Virovlansky as the bird, and Chinese contralto Zhang Qiulin as Erda.

The Brünhilde the evening was North-American soprano Catherine Naglestad who sang with great vocal power, especially in the higher register. She had a good stage presence, to the level of Lance Ryan’s Siegfried.
A sensational Siegfried!

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2 comentários:

  1. Obrigado pelo seu detalhado retrato de Siegfried. A encenação deste Anel foi, pelo que aqui deixa contado de modo tão detalhado, muito rica em pormenores. Pena que o 3.° acto não tenha sido tão bem conseguido.
    O seu relato deste Anel tem sido muito estimulante para quem, como eu, é um conhecedor básico. Espero pelo seu epílogo!

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  2. Excelente crónica e excelente fotos!

    A encenação parece-me muito interessante (o ver a Sieglinde a parir e tudo o que se pode imaginar do passado relevante para a história também esteve presente no Anel de Londres).

    Thomas J Mayer é brutal e sou fã da sua voz!

    É visível, pela forma empolgante como relata, que foi um Anel para não mais esquecer! Ainda bem que Wagner se começa a entranhar :)

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