sábado, 21 de abril de 2012

Idomeneo, Theatro Municipal de São Paulo


AS SURPRESAS DE IDOMENEO NO THEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO.

Theatro Municipal de São Paulo

Mais um texto de Ali Hassan Ayache do blogue Música, Ópera & Ballet que agradecemos e publicamos na íntegra:

O anúncio oficial, do nobre Theatro Municipal de São Paulo, informa que a apresentação da ópera Idomeneo de Mozart como "concerto cênico". Não foi o que aconteceu, a surpresa foi ver a ópera com montagem completa. Tomei um susto quando entrei no teatro e vi a orquestra no alto e na frente, imaginei qual era a surpresa? Depois da abertura ela desceu suavemente para seu devido lugar.

Surpresa amarga: Diretores de ópera tem a mania de querer transportar a ação para tudo quanto que é lugar. Alguns adoram o atemporal, outros gostam de avançar algumas décadas e os mais ousados falam em séculos. Não tenho nada contra esse tipo de ideia. O perigo das transposições é cair no ridículo em algumas cenas, é o exagero na "concepção". O Idomeneo apresentado no último dia 14/04/2012 teve direção cênica de Regina Galdino, a nobre diretora extrapolou no direito de viajar na ação. Transpôs tudo para a atualidade onde deuses da mitologia grega viram banqueiros inescrupulosos, o povão se manifesta contra os altos juros cobrados e a bolsa de valores cai. Concepção que não combina com o tema, a mitologia greco-romana.

Conversas por computador e presos oprimidos tentam mostrar o lado atual da concepção, fica tudo embolado. É complicado adequar mitologia aos dias atuais. Figurinos normais, o deus Netuno aparece com roupas estampadas em reais e dólares. A ideia de colocar o deus em cena não é nenhuma novidade, já foi utilizada em Salsburg/2006. O deus tinha roupas mais adequadas a um ser celeste.


 Defendo a apresentação da obra conforme escrita pelo compositor, sou purista nesse ponto. A ideia de tirar os longos e muitas vezes cansativos recitativos e colocar uma narradora deu uma bela dinâmica e reduziu o tempo da ação, uma surpresa interessante. Para quem não conhece a obra e não tem contato com a mitologia grega é uma mão na roda. Quem conhece a obra fica com a sensação que faltou alguma coisa.
A Orquestra Sinfônica Municipal regida por Rodolfo Fisher mostrou sonoridade volumosa e andamentos interessantes, o problema foi a falta do estilo mozartiano na apresentação da obra. A regência de Rodolfo Fisher toca Mozart como uma ópera romântica, como se ele tivesse vivido uns cem anos depois. O Coral Lírico se mostrou eficaz como sempre. Sua sonoridade foi muitas vezes atrapalhada pelas maluquices da direção.

 Gabriella Pace 
 
 Os solistas arrebentaram, a maioria em noite inspirada e digna de um verdadeiro canto mozartiano. O mezzo-soprano Luisa Francesconi mostrou uma voz uniforme, um timbre escuro e uma bela atuação cênica. Um Idamante empolgante. Sua voz está tinindo, no ponto certo para interpretar outros papéis do repertório. Outra surpresa foi Gabriella Pace, o soprano cantou com maestria, detentora de uma técnica perfeita, agudos brilhantes, vivos e empolgantes. Seu timbre mudou de acordo com os sentimentos da personagem, áspero nos momentos de desespero e lírico nas partes animadas. Gabriela Pace acertou em cheio, compôs uma grande Ilia, digna de sentar ao lado do deus Netuno e cantar uma longa ária para acalmá-lo.

 Luisa Francesconi

 O tenor Miguel Geraldi mostrou uma voz pequena, isso não é nenhum demérito, seu timbre é puro lirismo. Empolga e se mantém constante do começo ao fim da apresentação. Fez um Idomeneo completo. A baixa ficou por conta de Claudia Riccitelli, com uma virose não pode se apresentar. Em seu lugar entrou o soprano Janete Dornelas, chamada de última hora, chegou as duas da manhã no dia da apresentação e às sete horas já estava ensaiando. Cantou Electra cinco anos antes, relembrou as árias e conseguiu um belo timbre de soprano dramático. Tirou leite de pedra.

Quem não acertou a mão foi Marcos Liesenberg, sua voz não tem a solidez necessária de um Mozart. Emissão quase sempre áspera e irregular, que troca agudos por gritos agressivos. Será que Mozart compôs isso? Duvido, seu Arbace/Sacerdote foi o elo fraco entre os solistas, fez uma interpretação contida com troca qualidade melódica transformando-se em gritos.

 As surpresas mostram a organização e a desorganização do grande teatro paulistano: A direção conseguiu um sorprano de última hora , que cantou com dignidade e salvou a récita. O desagradável vem quando anuncia-se concerto cênico e se monta uma ópera completa. Todos os meios de comunicação divulgaram conforme o anunciado, algumas pessoas nas redes sociais reclamaram do erro e culparam a imprensa. O Theatro Municipal de São Paulo deve saber o que vai fazer, programar com antecedência o espetáculo e anunciar o correto. Todos os grandes teatros líricos do mundo divulgam suas programações com meses ou anos de antecedência, esse é o exemplo a ser seguido.

Theatro Municipal de São Paulo

2 comentários:

  1. Parabéns pela crônica! É interessante ressaltar que este blog tem uma linha que todos os colaboradores seguem, e com grande categoria!
    Um abraço

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  2. Péssima direção cênica. Estragou a apresentação. Essa gente será que não percebe o quanto é retrógada a ideia que eles tentam propagandear? Um bando de malucos.

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