sexta-feira, 18 de março de 2022

LA BOHÈME – Teatro Nacional de São Carlos


(review in English below)

Foi com satisfação que finalmente voltei a ver uma ópera devidamente encenada no Teatro de São Carlos, a popular La Bohème de G. Puccini

E começo pela encenação, de Emilio Sagi, que gostei muito. Foi uma abordagem clássica sem grandes inovações (para além de ter sido aproximada da actualidade), muito vistosa e bem conseguida. Esteve ao nível das boas encenações de qualquer grande teatro de ópera internacional.  Como quase sempre, há pormenores discutíveis mas na globalidade gostei muito, não foi uma encenação minimalista ou pindérica, como tantas vezes vemos entre nós.

No extremo oposto esteve a direcção musical de Domenico Longo. Foi muito má, a orquestra tocou quase sempre "à bruta", abafando frequentemente os cantores. A grande beleza de várias das magníficas partes musicais mais líricas não pode ser realçada. Lamentável.

Os dois protagonistas, o tenor Gianluca Terranova (Rodolfo) e a soprano Natalia Tanasii (Mimi) também estiveram muito aquém do desejável. Terranova tem um timbre feio e revelou grande dificuldade no registo mais agudo, que cantou em falsete e soava mais gritado que cantado. A voz de Tanasii era bem audível mas foi sempre dura e sem qualquer lirismo. E a interacção dos dois amantes não funcionou de todo, não houve a mínima expressão de cumplicidade amorosa.


Christian Luján
(Marcello) esteve muito bem. Tem uma voz grande, bem colocada, e boa presença em palco. A Museta de Bárbara Barradas foi exuberante, como acontece frequentemente com esta personagem. Foi notável em palco e também cantou bem, em forte, mas penso que propositadamente.

Os restantes cantores tiveram participações mais apagadas, Diogo Oliveira (Schaunard), João Merino (Benoit/Alcindoro), Miguel Reis (Parpignol) e André Henriques (Colline), o último com um tipo de voz pouco adequada à personagem. O programa diz que é um baixo, mas não tem graves.



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LA BOHÈME – Teatro Nacional de São Carlos, Lisbon

It was with satisfaction that I finally returned to see an opera properly staged at the Teatro de São Carlos, the popular La Bohème by G. Puccini.

And I start with the staging, by Emilio Sagi, which I really liked. It was a classic approach without major innovations (in addition to turning the action close to the present), very showy and well done. It was at the level of the good stagings of any major international opera house. As almost always, there are debatable details but overall I really liked it, it wasn't a minimalist or kitsch staging, as we so often see between us.

At the opposite end was the musical direction of Domenico Longo. It was very bad, the orchestra almost always played "gross", often drowning out the singers. The great beauty of several of the more lyrical musical parts could not be appreciated. Regrettable.

The two soloists, tenor Gianluca Terranova (Rodolfo) and soprano Natalia Tanasii (Mimi) were also far from acceptable. Terranova has an ugly timbre and showed great difficulty in the higher register, which sang in falsetto and sounded more shouted than sung. Tanasii's voice was quite audible but it was always harsh and without any lyricism. And the interaction of the two lovers did not work at all, there was not the slightest expression of loving complicity.

Christian Luján (Marcello) did very well. He has a big nice voice, and good stage presence. Bárbara Barradas' Museta was exuberant, as is often the case with this character. She was remarkable on stage and also sang well, loudly, but I think on purpose.

The other singers had lesser participation, Diogo Oliveira (Schaunard), João Merino (Benoit/Alcindoro), Miguel Reis (Parpignol) and André Henriques (Colline), the last one with a type of voice that was not suitable for the character. The program says he's a bass, but the lower register was nonexistent.

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5 comentários:

  1. Espero que tenha mais sorte com a Valentina Naforniţa no Cosi da Gulbenkian. Uma brava Moldava, a Valentina.

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    1. Estou com boas expectativas para o Cosi da Gulbenkian no Domingo. Mas não será difícil ter melhores cantores que estes no São Carlos...

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  2. Completamente de acordo com a apreciação supra. Para mim o melhor cantor da noite foi o barítono que fez de Marcello. A Orquestra tocou por vezes muito alto abafando os cantores. A melhor interprete ou seja a melhor actriz foi Bárbara Barradas se bem que a sua voz para mim não seja muito agradável. Gostei muito da encenação. Mas o mais desagradável foi o desempenho do tenor italiano. A soprano que fez a Mimi teve um bom desempenho nas não me fez vibrar. Mas enfim é o que temos no São Carlos. O que me consolou foi ter assistido a um Cosi fan Tutte na Gulbenkian muito bom uns dias depois.

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    1. Obrigado Manuel Mourato. Acabei de chegar da Gulbenkian, onde também hoje assisti a esse excelente Cosi fan tutte. Estou de acordo consigo. Amanhã ou depois tentarei escrever algo aqui sobre este magnífico espectáculo.

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  3. No que à prestação de Gianluca Terranova se reporta, o extrato disponibilizado na plataforma YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=D3krop8f8hM) denota uma emissão laboriosa aliada a uma frequente segmentação da linha de canto, redundando num entrecorte das frases musicais. Avultaria, ainda, a surpreendentemente equívoca atribuição de Colline a um intérprete cuja tipologia vocal, enformando, grosso modo, o registo baixo-baritonal, não se coadunará com a tessitura do papel.

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