NÃO É TODO DIA QUE SE COMEMORA 300 ANOS, GLUCK E SUA
IPHIGÉNIE EM TAURIDE. CRÍTICA DE ALI HASSAN AYACHE NO BLOG DE ÓPERA EBALLET.
A comemoração dos
300 anos do nascimento de Christoph
Willibald Gluck pelo Theatro São
Pedro se deu com um título menos conhecido do compositor. Um melômano mais
atento esperava ver uma de suas óperas mais famosas: Orfeu e Euridice ou
Ifigénie en Aulide. Corretamente o teatro da Barra Funda muda o foco e apresenta
Iphigénie en Tauride, última ópera
composta por Gluck e com certeza uma das mais completas musicalmente.
Compositor
revolucionário e com estilo próprio, Gluck consegue em Iphigénie em Tauride uma
fusão de estilos: o dramático, o sensual e o lírico se juntam em árias de força
extraordinária, com uma escrita orquestral de rara beleza onde a coesão das
cenas se encontra com música de qualidade ímpar. Teatro e canto unidos em cenas
na medida exata sem os exageros do passado barroco. A ópera é um resumo de
todas as virtudes musicais do compositor. Esses motivos enaltecem a ideia da
direção do teatro de dar vida a esse título, uma raridade nas terras brasilis.
A direção cênica de Gustavo
Tambascio usa elementos modernos da dramaturgia atual, explora o palco em
sua plenitude deixando quase sempre e ação com dois níveis. Transpõe o libreto
para o século XX e ao fundo mantém elementos da Grécia clássica. Usa painéis
para realçar o cenário e os figurinos estão a contento. Tudo sintonizado com o
que há de mais moderno na ópera mundial do século XXI. O problema é o público
entender o enredo, quando a cortina sobe muito da ação já ocorreu, a história
de Iphigénie en Tauride é apenas um trecho de um longo ciclo mitológico. O
espectador menos informado fica perdido e a direção não ajuda em nada na
descrição dos fatos. A montagem consegue ser harmônica: visagismo, luz,
figurinos e cenários estão em harmonia onde ninguém aparece mais que ninguém.
As vozes oscilaram, a protagonista Monica Ferracani mostrou desequilíbrio vocal, soprano com agudos
sem brilho que pecou e muito no fraseado e sempre apresentou um timbre áspero.
Sua Iphigénie consegue fazer uma interpretação cênica mediana, vocalmente se
mostra menor que a personagem desfilando uma voz opaca que não empresta
credibilidade e que vai cansando com o tempo.
O Orestes de Luciano
Garay teve bons momentos vocais, manteve a postura do início ao fim com
graves e médios satisfatórios. Uma voz limpa e estável nas passagens complexas.
Pena não poder dizer o mesmo de Flávio
Leite, o rapaz penou para fazer Pílades, conseguiu pouco em suas
intervenções com técnica deficiente e agudos fracos. Até no pequeno Theatro São
Pedro sua voz se mostrou pequena e com um timbre abafado que assusta pelas
emissões irregulares.
O personagem Thoas para Lício
Bruno foi uma barbada, o calejado barítono tirou de letra e mais uma vez
mostrou enorme talento vocal e cênico. Outra que não teve a menor dificuldade
foi Luciana Bueno, sua Diana é um
arraso, ela encarna a deusa grega em todos os sentidos. Em sua curta
apresentação desfilou graves portentosos em timbre que sempre encanta pelo
brilho.
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