segunda-feira, 30 de abril de 2012

Eugene Onegin, Bayerische Staatsoper, Março de 2012






Eugene Onegin é uma ópera de P I. Tschaikowsky com libretto do compositor e de Konstantin Schilowsky, segundo uma obra de Puskin. O enredo pode ler-se aqui.


 A encenação de Krzysztof Warlikowski trouxe a acção para as décadas de 60 do século passado e assentou num relacionamento homossexual entre Eugene Onegin e Lenski. A abordagem prestava-se à apresentação de cenas de mau gosto (como presenciei na ópera Macbeth que vi no dia anterior), mas tal não aconteceu em excesso.
O que ficou desajustado foi toda a história original, o amor das irmãs Olga e Tatiana por Lenski e Onegin, com particular ênfase na cena final entre Onegin e Tatiana que, neste enquadramento, não fez qualquer sentido.
No início estamos numa grande sala de jogos e está uma televisão ligada, a emitir a preto e branco um campeonato de patinagem artística. Nessa mesma televisão aparecerá mais tarde a chegada do Homem à lua, a mira técnica e até o “granulado” da falta de emissão a meio da noite, quando Tatiana não consegue dormir. Na célebre cena da carta, Tatiana dita-a para um gravador em vez de a escrever e manda a gravação num envelope a Onegin.



Na festa de Tatiana, um dos números para divertimento dos convidados é uma cena de striptease masculino. O duelo entre Onegin e Lenski (mortal para o último) é um disparo à queima-roupa na cama onde ambos dormem.
O início da segunda parte abre com cowboys dispersos pelo palco, alguns em tronco nu. O mau gosto surge enquanto Lenski canta a famosa e belíssima ária Kuda kuda. antes de ser morto e, no fundo do palco, os cowboys, numa bomba de gasolina, divertem-se sexualmente com uma boneca insuflável. Já perto do final, entram em palco vestidos de mulher e de saltos altos. Opções de gosto muito discutível e que não trazem nada de inovador.




 A direcção musical foi do maestro finlandês Pietari Inkinen, responsável por uma interpretação correcta e equilibrada ao longo de toda a récita.

 A Tatiana do soprano russo Ekaterina Scherbachenko foi, de longe, a melhor interpretação da noite. A voz é de uma beleza invulgar, muito melodiosa, forte quando necessário e sempre de elevada qualidade. Em cena a cantora teve uma presença irrepreensível. Transmitiu angustia, desespero e resignação sempre que necessário. A figura magra e alta também ajudou muito.





O tenor eslovaco Pavol Breslik interpretou Lenski com grande nível. A voz tem um timbre bonito, ouve-se bem sobre a orquestra e não perde qualidade quando sobe às notas mais agudas. O cantor também tem uma boa figura, o que o ajudou na parte cénica.


 O baixo estónio Ain Anger cantou bem a ária no 3º acto, mostrando uma voz poderosa, grave e de timbre muito agradável.


 Os papeis secundários de Olga (Alisa Kolosova), Larina (Heike Grötzinger), Filipjewna (Elena Zilio) e Triquet (Guy de Mey) foram todos bem interpretados.

Deixei para o fim o Eugene Onegin do barítono inglês Simon Keenlyside. É um cantor de que gosto muito mas, aqui, foi a sua interpretação que menos me impressionou. Achei que esteve sempre tenso e inseguro. O seu barítono é de elevada qualidade mas não o demonstrou nem brilhou. E, cenicamente, também ficou muito aquém do habitual. Esteve sempre estático, não demonstrou a agilidade e as excelentes qualidades cénicas que o caracterizam.











***



Eugene Onegin, Bayerische Staatsoper, March 2012


Eugene Onegin is an opera by P. I. Tchaikovsky with libretto by the composer and Konstantin Schilowsky, a text of Pushkin.
The plot can be read here.

The staging of Krzysztof Warlikowski brought the action to the decades of 60-70 of the last century and was centered in a homosexual relationship between Eugene Onegin and Lenski. This approach could be prone to the presentation of scenes of vulgar content (as witnessed in the opera Macbeth I saw the day before), but this has not happened in excess.
All that was the original story was misfitted, the love of sisters Olga and Tatiana by Onegin and Lenski, with particular emphasis on the final scene between Onegin and Tatiana. In this scenic option, it made no sense at all.
But there were some interesting scenic details: At the beginning we are in a large game room and a television is on, broadcasting  a figure skating championship in black and white. Later will appear, in the same television, the arrival of man to the moon, the television test card and even the "grainy" of the lack of emission at the middle of the night, when Tatiana can not sleep.
In the famous letter scene, Tatiana dictates the text to a tape recorder instead of writing and puts the recording in an envelope to be sent to Onegin.
At Tatiana´s party, one of the entertainment moments is male striptease performance. The duel between Onegin and Lenski (deadly for the latter) is a gunshot on the bed where they both sleep.
The beginning of the second part opens with cowboys scattered across the stage, some bare-chested. Another bad scenic option comes as Lenski sings the famous and beautiful aria Kuda kuda before being killed. In the background, the cowboys are in a gas station, playing sexually with an inflatable doll. Toward the end, they come on stage dressed as women with high heels. Questionable options that do not bring anything new to the stage.

 Musical direction was of Finnish conductor Pietari Inkinen who was responsible for  a correct and balanced interpretation throughout the performance.

Tatiana was Russian soprano Ekaterina Scherbachenko. She was, by far, the best singer of the night. The voice is unusually beautyful, very melodious, strong when needed and always high quality. On stage the singer had an irrepressible presence. SShe conveyed anguish, despair and resignation whenever necessary. The slim, tall figure of the singer also helped a lot. Fantastic.

Slovak tenor Pavol Breslik was a high quality Lenski. The voice has a beautiful tone, is heard over the orchestra and does not loose quality when singing top notes. The singer also has a good figure, which helped in the artistic part.

Estonian bass Ain Anger sang very well his aria in Act 3, showing a powerful voice with a and very nice tone.

Secondary roles of Olga (Alisa Kolosova) Larina (Heike Grotzinger), Filipjewna (Elena Zilio) and Triquet (Guy de Mey) were all ok.

I left English baritone Simon Keenlyside’s  Eugene Onegin for the end. Keenlyside is a singer that I like very much but here his interpretation did not impressed me. I found him always tense and insecure. His baritone is high quality but he did not show it and he was not brilliant. And, artistically, he also also not as well as he usually is. He was always very static, and he did not show the agility and the outstanding artistic qualities that characterize him.

***

***

8 comentários:

  1. Caro Fanático_Um,

    Eugen Onegin é uma das minhas óperas preferidas. Acho que nada fica a dever aos grandes trios trágicos de uma La Traviata, Otelo ou Tosca. Tem realmente aquela música belíssima de Tchaikovsky e um excelente texto.
    Pelo que relata, a encenação deve ter sido de gritos! Estragar a ópera com uma visão homossexual do par Oneguin-Lensky não faz qualquer sentido, além de que inviabiliza todo o pano de fundo do enredo: o amor de Tatiana por Onegin.
    Quanto a Ekaterina Scherbachenko: não me impressiona nada do que disse. Via e ouvia como Iolanta em Madrid no mês de Janeiro. Não só tem uma figura e uma presença invulgares — muito adequada a uma Tatiana — como tem uma voz belíssima. É uma artista de mão cheia!
    Saudações

    ResponderEliminar
  2. Hello my friends, thanks for the complete info!
    Greetings from Gent,Willy

    ResponderEliminar
  3. blergh, que péssimo gosto. Por menos, já tenho lido comentários do género "vou preparar o saco de enjoo para a Turandot da Guleghina". A encenação deve ter estragado completamente a apaixonante atmosfera romantica de Oneguin!

    ResponderEliminar
  4. Vi a transmissão directa online da Bayerische Staatsoper e penso que entendi mais ou menos a encenação, o que não quer dizer que tenha gostado dela.

    Não me parece mal a proposta de uma ligação homossexual entre Onegin e Lenski, sobretudo se nos lembrarmos que Tchaikovsky era gay e quais as consequências disso na época dele. Por isso mesmo a descoberta de Lenski da sua atracção por Onegin pode levar à sua atitude de confronto com este, e julgo que os cow-boys representam os medos, desejos e angústias dos dois homens, o que fica razoavelmente claro depois do assassínio.
    Uma homossexualidade não aceite por Onegin pode justificar também a sua vida instável e a recusa do casamento que apresenta no sermão a Tatiana.

    Note-se ainda que a homossexualidade e o travestismo aparecem como nota de sofisticação na festa do último acto, em contraste com as actividades e festas provincianas em casa das irmãs no primeiro e segundo actos.

    Em relação aos intérpretes, gostei de Breslik e de Scherbachenko, e Keenlyside pareceu-me em baixo de forma, cansado ou gasto. Interessante comparar com as impressões do Fanático_um que viu a ao vivo.

    ResponderEliminar
  5. @ camo_opera, Plácido Zacarias e Gi,

    Obrigado pelos vossos comentários, Também eu sou um grande apreciador desta ópera magnífica, mas a encenação pareceu-me, de facto, desajustada. Poderia ter sido muito pior no mau gosto mas, para mim, foi suficientemente má para não me deixar usufruir plenamente a magnífica obra de Tchaikovsky.
    Gi, eu talvez seja um pouco mais conservador. Aceitaria a ideia da encenação baseada numa ligação homossexual entre Lenski e Onegin (e acho que a sua interpretação é muito plausível), mas para quê a cena do sexo simulado com a boneca insuflável? E como justificar a declaração de amor, a sós, entre Onegin e Tatiana no final, sendo Onegin gay? Para mim não faz sentido.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Fanático_Um, não reparei na boneca insuflável (não sei se a focaram na transmissão). Quanto à declaração de amor final de Onegin a Tatiana, repare que ela própria não acredita muito na sinceridade dele... Ela ama-o, mas ele?
      Em todo o caso, toda a encenação é muito in your face, como se os espectadores não fossem capazes de entender subtilezas.

      Eliminar
  6. Caro Fanático,
    o debate sobre a obra abre um novo prisma crítico. Quando falo 'obra' estou me referindo a essa montagem de gosto discutível, mas interessante justamente por abalar os parâmetros convencionais. Resta saber se a história julgará bem ou mal! Nada escapa ao julgamento do tempo - bom, ruim ou esquecido...
    Um grande abraço e mais uma vez parabéns pela excelente crônica!

    ResponderEliminar
  7. I watched it on live stream. The director seems to suffer from paranoid schizophrenia. He is not able to see the things what they are. In his mind every man should have some homoerotic inclination. A man falls in love with a woman, only to hide his homosexuality. Marriage is just a good excuse.
    Many gay opera fans find this staging wonderful. They call it "Broke Back Onegin". It's not a secret that there're not less gay managers in the theater. They don't care if the staging fits the original text or not. Main issue is: Onegin, Lensky and all other men are gays!

    ResponderEliminar