quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

DIE MEISTERSINGER VON NÜRNBERG – Royal Opera House – 19 Dezembro 2011


(review in english below)

Os Mestres voltaram a Londres e a noite de estreia na Royal Opera foi um momento de grande qualidade.

A encenação de Graham Vick, revista por Elaine Kidd, é uma encenação clássica, sem inovação conceptual embora cheia, colorida, e criando um ambiente acolhedor. Talvez o momento mais espectacular seja o final do 2º acto onde além do alvoroço de bulhas habitual em palco, surgem de pequenas janelas, várias pessoas, algumas delas até suspensas de cabeça para baixo, em agitação profunda.







Os fatos das personagens são de extremo bom gosto com a excepção do facto de a maioria das personagens masculinas terem uma espécie de protetor genital de forma fálica, hirta e curvada...



A Orquestra, sob a direção de um apaixonado Antonio Pappano, esteve a um nível como eu acho que nunca a ouvi em Wagner nos meus 6 anos de Royal Opera. Grande paixão, grande entrega, e sem falhas nos metais. Perfeita!



Em Julho de 2010, após os Mestres Cantores de Cardiff, e sabendo que esta Ópera voltaria a Covent Garden nesta Temporada, ousei sugerir um elenco celestial. Só acertei em Simon O’Neill…

Simon O’Neill foi um Walther de excelente qualidade. A voz está com uma clareza e projeção invejável, com agudos seguros. Do ponto de vista cénico esteve igualmente muito bem, embora, fruto de uns quilinhos a mais, tenha sido difícil esconder-se com Eva de Sixtus, debaixo de um banco… um momento que esboçou risos e sorrisos na plateia.





Emma Bell fez uma Eva especial. A voz é de timbre bonito e com capacidade para se exprimir em força mas sem gritar. Gostei da forma algo adolescente como encarou a personagem.





John Tomlinson tem escolhido muito bem as personagens que interpreta neste seu final de carreira. A sua fisionomia, com a barba e cabelos longos brancos, personifica a imagem ideal para a personagem de Pogner. Quando canta e interpreta, então o quadro está finalizado e de forma perfeita. Mais um daqueles cantores que, quando entram em palco, mostram e fazem-nos sentir que estão a um nível muito acima da média.





Toby Spence foi um David dinâmico e incansável. Muito bom actor e com o timbre perfeito para o papel.



Peter Coleman-Wright fez um Sixtus Beckmesser muito bom, num estilo de altivez snobista, roçando a descaracterização sexual masculina.







Robert Lloyd demonstrou que ainda tem aquela voz profunda de baixo, a qual tanto admiramos, e fez um guarda-nocturno impecável. Heather Shipp cumpriu bem como Madalena e os Mestres estiveram em muito bom nível.




O grande papel desta ópera é o de Hans Sachs. Confesso que senti uma grande desilusão quando soube que Bryn Terfel não iria cantar nesta produção. Em vez disso preferiu cantar um Leporello em Milão, numa produção que não o realça e numa personagem que já devia fazer parte do seu passado interpretativo… A sensação com que fiquei de Wolfgang Koch é que é muito novo para o papel. Bem sei que é praticamente da idade de Terfel mas quando digo novo, digo em termos interpretativos. Terfel, em Cardiff e nos Proms, conseguiu trazer um Sachs grave, introspectivo, sábio, vivido e sofrido. Koch parece demasiado jovial na sua abordagem ao papel, não conseguindo transmitir o peso do passado da personagem e da sua visão filosofal da arte e da vida. Fui gostando mais ao longo da récita e devo dizer que, desde o batismo da canção de Walther e até ao final da ópera, me surpreendeu bastante mas isso não é suficiente para o considerar um Sachs magnífico. A voz é muito boa, embora por vezes falte a força para se sobrepor a uma Orquestra wagneriana em dose completa. Isto foi visível em Wahn! Wahn! Uberall Wahn! Aqui quase não se ouvi o seu “mein liebes Nürnberg”, o ponto alto desta passagem. O seu “Euch macht ihr’s leicht” também foi pouco grave e sentido, depois de receber a grande ovação coral dos habitantes de Nuremberga. Terfel teria sido brutal, de certeza.









DIE MEISTERSINGER VON NÜRNBERG - Royal Opera House - December 19, 2011




The Meistersingers returned to London and the opening night at the Royal Opera was of great quality.




The staging by Graham Vick, reviewed by Elaine Kidd, gives us a classical scenario, without conceptual innovation though filled, colorful, and creating a welcoming environment. Perhaps the most spectacular moment is the end of the 2nd act where besides the usual flurry of sounds on stage, there are small windows, where many people, some of them even hanging upside down in deep turmoil, complete de scene.





The costumes of the characters are of extremely good taste with the exception of the fact that most of the male characters have a sort of genital protection phallic shape device, rigid and curved…




The Orchestra, under the direction of a passionate Antonio Pappano, was at a level as I think I ever heard in my six years of Wagner at the Royal Opera. Great passion, great delivery, and flawless in the metals section. Perfect!




In July 2010, after the Meistersingers in Cardiff, and knowing that this Opera would return to Covent Garden this season, I dared to suggest a heavenly cast. Missed them all except Simon O'Neill ...


Simon O'Neill was a Walther of excellent quality. The voice is with an enviable clarity and projection, with secure high pitch notes. From the scenic point of view he was also very good, though, as the result of some extra pounds, it was difficult for him to hide with Eva of Sixtus, under a stall ... a moment that drew laughs and smiles in the audience.






Emma Bell made a special Eva. The voice is has a beautiful tone and ability to express itself in power but without shouting. I liked the teenager way she gave to the character.






John Tomlinson has chosen well his characters in the end of his career. His face, with long white hair and beard, embodies the ideal image for the character of Pogner. When he sings and performs, then the frame is finished and in a perfect form. He is one of those singers who, when they come on stage, show and make us feel they are at a level far above the average.






Toby Spence’s David was a dynamic and tireless one. A very good actor and with the perfect voice for the role.




Peter Coleman-Wright did a very good Sixtus Beckmesser, in a snobby pride way, confounding the male sexual characterization.








Robert Lloyd has shown that he still has that deep bass voice, which we admire so much, and made a flawless night watchman. Heather Shipp was a good Magdalene and the Masters were in a very good level.





The major role of this opera is that of Hans Sachs. I confess I felt a great disappointment when saw that Bryn Terfel would not sing in this production. Instead he chosed to singing Leporello in Milan, in a production that does not enhance him and in a role I believe it should belong to his interpretative past now... The feeling was that Wolfgang Koch is too young for the role. I know he is almost the age of Terfel but when I say this, I say it in terms of interpretation. Terfel, in Cardiff and at the Proms, managed to bring a serious, introspective, wise, experienced and suffered Sachs. Koch seems too youthful in his approach to the role, failing to transmit the background of the character and his philosophical vision of art and life. I began to enjoy his performance along the night but I must say, from the baptims of Walther song until the end of the opera, hesurprised me but not in an enough way to consider him a magnificent Sachs. The voice is very good, but sometimes lacks the strength to override a Wagnerian orchestra at full dose. This was visible in “Wahn! Wahn! Überall Wahn!” Here we could hardly hear his "Mein lieber Nürnberg," the high point of this passage. His "Euch macht ihr's leicht" was not serious and felt, after receiving the coral standing ovation from the inhabitants of Nuremberg. Terfel had been brutal, for sure.








sábado, 24 de dezembro de 2011

L'Elisir D'Amore – Opernhaus Zurich – 17 Dezembro 2011



(review in english below)

O Elixir do Amor de Donizetti, saindo do meu universo wagneriano e mozartiano, é uma das minhas óperas favoritas. A possibilidade de juntar o meu gosto com a possibilidade de ver ao vivo e pela primeira vez Rolando Villazon cumpriu-se nesta temporada, como esta produção de Zurique. E que produção!!... Devo dizer que foi uma das maiores récitas da minha vida!





A encenação é de Grischa Asagaroff é fenomenal. Rica em cor e em imagens que nos transportam para um livro para crianças, em tudo clássica, consegue criar um efeito visual marcante. Do mesmo modo, o sentido de acção constante que cada personagem tem, seja principal ou secundária, ajuda a elevar esta ópera à ternura máxima que a história encerra. Encontro-lhe algum paralelismo com a encenação de Laurent Pelly (um dos meus encenadores favoritos), no carácter “infantil” dos cenários e também pela utilização de um animal a fugir em cena (igualmente em número excessivo de vezes). Se Laurent Pelly usa um cão branco verdadeiro a passar rapidamente em palco, salvo erro, durante uma das prestações de Dulcamara, aqui é um javali inerte, puxado de um lado ao outro do palco por uma corda, em vários momentos. Uma vez tem piada, duas também, à terceira passagem já começa a deixar de ter piada – é regra geral da comédia. Isto, obviamente, não diminui em nada a qualidade da encenação, sendo uma mera opinião pessoal de quem leva a comédia e o riso muito a peito.



Rolando Villazon foi fabulástico!!! Villazon é daqueles cantores que quando entra em cena nos transmite uma magia especial. E quando começa a cantar… a magia duplica! Se juntarmos a sua capacidade ímpar de comédia corporal… a magia triplica! Os pormenores cénicos foram espontâneos e altamente credíveis. No primeiro acto, para se aproximar de Adina, vai tocando no ombro de cada pessoa que está à sua frente, deslocando-se pelo lado oposto quando esta se vira para ver quem lhe tocou no ombro… Adina têm o cabelo formando dois cones laterais de cabelo e, ao tentar ler o livro, Villazon faz com que o vértice de um dos cones lhe entre pelo olho adentro… ele faz malabarismo com bolas em palco, sem as deixar cair e terminando a graça ao final de acorde… ele agita a garrafa do suposto Elixir de forma altamente jocosa… ele deixa escapar um soluço quando ninguém o espera após beber quase todo o Elixir e no meio de interação com as outras personagens… ele modula para um sofrimento credível quando Adina diz que se vai casar com Belcore antes do efeito do Elixir… ele senta-se em cima de uma das pontas da sua mala de viagem escutando e antevendo a declaração de amor de Adina, ao mesmo tempo que se vai progressivamente sentando na outra ponta deixando, de modo convidativo, vago lugar para Adina caso esta se quisesse sentar ao seu lado… Enfim… Não consigo transmitir-vos melhor estes aspectos através das minhas palavras…
Mesmo não tendo comparação ao vivo da sua voz antes da cirurgia, atrevo-me a dizer que nunca esteve melhor. Uma força de vida, uma expressividade imensa e uma entrega pessoal ao papel que é já o seu papel de assinatura. Fantástico!!!






O único senão que posso apontar foi o facto de, claramente, ter cantando a ária “Una furtiva lagrima” de um modo menos integrado de tudo aquilo que acabei de dizer. Claramente pareceu-me que esperava por aquilo que acabou por acontecer para poder “explodir”, ou seja, um forte e prolongado aplauso, convidando a um encore da ária, o qual ofereceu, não sem antes se emocionar (como se pode ver nas fotos). Aí então, viu-se o Villazon que esteve presente em toda a récita, embora com dois momentos de maior aspereza vocal que, se foram dramaticamente provocados foram excelentemente realizados, e que se foram pequenas quebras da voz, estas foram excelentemente disfarçadas como emoção.







Malin Hartelius foi uma excelente surpresa como Adina.



Havia visto a sua Donna Elvira no Don Giovanni da mesma casa de Ópera em Novembro (e que a seu tempo farei a crítica neste blog) e não esperava que viesse a estar à altura de Villazon. Mas esteve! Cenicamente uma magnífica atriz, com uma voz melodiosa, afinada e com agudos sobre a orquestra! A química corporal com Villazon foi deliciosa. Brutal!



Michele Pertussi foi um soberbo Dulcamara! Um timbre lindíssimo, igualmente exímio nos dotes de representação, apoiado pelo sublime actor Luigi Prezioso como seu ajudante.



Massimo Cavalletti foi talvez o menos impressionante do quarteto de personagens principais. Do ponto de vista vocal muito bom mas não tão naturalmente cómico como os outros, embora se tenha esforçado.



Regula Mühlemann foi uma Gianetta interessante, com uma voz bonita mas algo tímida, o que, de certo modo, se enquadrou bem com a personagem.



Nello Santi é um senhor maestro! Grande presença, direcção forte e coerente, com marcado respeito pelos cantores. Uma das grandes figuras da noite.

Esta ópera marcou uma das melhores sequências a que tenho assistido, passando por uns Mestres Cantores e terminando numa La Traviata em Londres que foi esta também, uma das melhores récitas a que já assisti na Royal Opera. A seu tempo as minhas crónicas no blog…







L’Elisir d’Amore - Opernhaus Zurich - December 17, 2011




The Elixir of Love by Donizetti, leaving my Mozartian and Wagnerian universe, is one of my favorite operas. The possibility of joining my taste with the possibility to see live, and for the first time, Rolando Villazon was fulfilled this season, with this production of Zurich. And what a production !!... I must say it was of the greatest operatic nights of my life!





The staging by Grischa Asagaroff is phenomenal. Rich in color and images that transport us to a children's book, at all classical, can create a striking visual effect. Similarly, the sense of constant action of the characters helps to elevate this opera to its maximum tenderness. I found some parallels with the staging of Laurent Pelly (one of my favorite directors), the childish character of the scenarios and also by the use of an animal running from one point to the other of the stage. If Laurent Pelly uses a white dog who truly moves quickly on stage, if not mistaken in one of the Dulcamara entries, here is an inert boar, pulled from side to side of the stage by a rope, at various times. Once is funny, two is still funny, but on the third time the fun starts to fade out -
is a basic rule of comedy. This of course does not diminish the quality of the production, being a mere personal opinion of someone who takes the comedy very seriously.



Rolando Villazon was fabulous! Villazon is one of those singers that when enter the scene gives us a special magic feeling. And when he starts to sing ... he doubles the magic! If we add to these the unique ability to perform true body comedy, the magic triples...! The scenic details were spontaneous and highly credible. In the first act, to get closer to Adina, he taps on the shoulder of each person who is in front of him, moving to the opposite side when the person turns to see who touched her on the shoulder ... Adina have her hair arranged in two cones on the side of her hear and, when trying to read the book, Villazon puts the vertex of one of the cones inside his eye... he juggles balls on stage, without dropping them... he shakes the bottle of the elisir of the alleged in a highly humorous ... he lets out a hiccup when no one expects after drinking most of the elisir... he modulates superbly to a suffering mood when Adina says she will marry Belcore before the effect of the elisir... hr sits on top of one end of his suitcase listening and anticipating the declaration of love of Adina, while he gradually progress his boby to the other end, leaving a vacant space, inviting Adina as if inviting Adina to sit near him... Words are not enough to describe this...

Even without comparison with his voice previously to the surgery, I dare say it has never been better. A true force of life, great expression giving himself totally to a character that is now his signature role. Fantastic!







The only drawback I can point out was that, clearly, sang the aria "Una furtiva lagrima" in a less integrated way considering everything I have just said. Clearly it seemed to me that he was waiting for what happened in order to give himself at his best way, ie, a strong and prolonged applause, inviting an encore of the aria, which he offered, but not before being moved (as seen in photos). By then, we saw the Villazon who was present throughout the evening, but with two moments of a bit of vocal roughness. If they were a dramatically option then they were beautifully performed, if they were flaws, then they were excellently disguised as emotion.








Malin Hartelius was a great surprise as Adina.



I had seen her as Donna Elvira in the Don Giovanni at the same Opera house in November (soon reviewed in our blog) and did not expect she would be up to Villazon. But she was! A scenically beautiful actress with a melodious voice, sharp and refined over the orchestra! The body chemistry with Villazon was delicious. Amazing!



Michele Pertussi Dulcamara was superb! A beautiful tone, also a master in the the acting skills, he was supported by the sublime actor Luigi Prezioso as his assistant.




Massimo Cavalletti was perhaps the least impressive of the quartet of main characters. From the vocal standpoint he was very good but his acting was not as naturally funny as the others, although he has done a superb effort.



Regula Mühlemann was an interesting Gianetta, with a beautiful voice but somewhat shy, which somehow fits well with the character.



Nello Santi is a master in the art of conducting! Great presence, strong leadership and consistent, with a high respect for singers. One of the great performers of the night.
This opera marked one of the best sequences I have seen, passing through Die Meistersingers and ending in La Traviata in London that this was also one of the best performances I have ever seen at the Royal Opera. Soon you will be able to read on these in this blog...