sábado, 28 de setembro de 2019

AGRIPPINA, Royal Opera House, Setembro / September 2019



 (review in English below)

A ópera Agrippina de G.F. Handel com libreto de Vicenzo Grimani esteve em cena na Royal Opera House de Londres, numa produção de Barrie Kosky.

O imperador Claudio é dado como morto no mar e a sua mulher Agrippina tenta colocar no trono o filho Nerone (Nero). Mas os planos frustram-se quando o imperador aparece, salvo pelo comandante militar Ottone, a quem prometeu a coroa como recompensa. Agrippina tenta minar a confiança entre os dois através da bela Poppea, que ambos desejam (e também Nerone). Engendra vários esquemas onde inclui outros dois personagens, Pallante e Narciso, para levar o seu desejo adiante. Poppea, convencida que Ottone é inocente, provoca um encontro nos seus aposentos com Ottone, Nerone e Claudio em que inicialmente se escondem uns dos outros e ouvem as juras de amor, mas depois encontram-se. A ópera termina com um final feliz em que Poppea casa com Ottone, Claudio coroa Nerone imperador e Agrippina vê todos os seus desejos concretizados.


A encenação de Barrie Kosky (que fez um trabalho miserável na Carmen também aqui na Royal Opera) é sui generis e melhora ao longo do espectáculo. A acção foi trazida para o final do século passado. O palco é ocupado por uma estrutura metálica móvel com dois andares, umas escadas a meio e estores nas periferias. Ao longo da ópera vai-se movendo e assumindo diversas formas, os estores vão abrindo e fechando e as personagens vão andando à sua volta ou no interior. Metaforicamente poderá representar os corredores do poder. A cena em que há o encontro dos 3 pretendentes da Poppea é muito engraçada, aparece um alçapão e um sofá, um bar e uns bancos que permitem uma acção cénica mais interessante. Contudo, a forma como são expressos os comportamentos das personagens principais, nomeadamente a capacidade manipuladora e maquiavélica da Agrippina, é muito bem conseguida.



A Orchestra of the Age of Enlightenment foi um sonho, dirigida energicamente pelo jovem maestro russo Maxim Emelyanychev.


Os cantores foram deslumbrantes na interpretação cénica e vocal. A Joyce DiDonato foi arrasadora como Agrippina. Para além da interpretação vocal de referência, coloratura fantástica, potência impressionante e afinação sempre perfeita, a interpretação cénica foi de referência! Uma actriz que canta (fabulosamente)! Foi manipuladora, pérfida, mas também muito cómica e com momentos de grande espectáculo que lhe foram proporcionados pela encenação, destacando-se um em que canta como uma actriz de music hall com microfone na mão.


Outra interpretação excepcional foi a do contratenor Franco Fagioli. Fez um Nerone jovem, tatuado e algo louco, bem caracterizado e aparentemente desinteressado, com movimentações cénicas muito ágeis e adequadas à personagem. A cena em que tem o encontro sexual com a Poppeia é hilariante. A voz poderosa enche facilmente a sala, é de grande beleza e na coloratura foi brutal!



Outro contratenor de qualidade superior foi Iestyn Davies (Ottone), mais lírico, a quem cabem as árias mais dramáticas e de maior beleza. Foi particularmente tocante na ária Voi che udite com que terminou a primeira parte.



A soprano Lucy Crowe, de que muito gosto, esteve ao mais alto nível como é seu hábito. A voz é límpida, ampla, ágil e fresca e interpretou a Poppea de forma irrepreensível.



O baixo Gianluca Burato fez um Claudio notável, de voz encorpada e de grande beleza.


O jovem baixo Andrea Mastroni (Pallante) o contratenor Eric Jurenas (Narciso) e o baixo José Coca Loza (Lesbo) completaram um elenco superior que nos proporcionou um óptimo espectáculo de ópera.







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AGRIPPINA, Royal Opera House, September 2019

G.F. Handel's opera Agrippina with libretto by Vicenzo Grimani was on stage at London's Royal Opera House, produced by Barrie Kosky.

Emperor Claudio is pronounced dead at sea and his wife Agrippina tries to place her son Nerone (Nero) on the throne. But plans fail when the emperor appears, saved by military commander Ottone, to whom he promised the crown as a reward. Agrippina tries to undermine the trust between the two through the beautiful Poppea, which both desire (and also Nerone). She engenders various schemes in which she includes two other characters, Pallante and Narcissus, to further her wish. Poppea, convinced that Ottone is innocent, causes a simultaneous encounter with Ottone, Nerone and Claudio in which they initially hide from each other and hear the vows of love, but then meet. The opera ends with a happy ending in which Poppea marries Ottone, Claudio crowns Nerone emperor and Agrippina sees all her wishes come true.

The production by Barrie Kosky (who did a miserable job at Carmen also here at the Royal Opera) is sui generis and improves throughout the show. The action was brought to the end of the last century. The stage is occupied by a movable metal structure with two floors, stairs in the middle, and blinds on the outskirts. Throughout the opera it moves and takes various forms, the blinds open and close and the characters walk around or inside. Metaphorically it may represent the corridors of power. The scene where Poppea's 3 lovers meet is very funny, there is a sofa, a bar and benches that allow for a more interesting stage action. However, the manner in which the behaviors of the main characters are expressed, namely Agrippina's manipulative ability, is very well achieved.

The Orchestra of the Age of Enlightenment was a dream, energetically directed by the young Russian conductor Maxim Emelyanychev.

The singers were stunning in scenic and vocal interpretation. Joyce DiDonato was fabulous as Agrippina. In addition to the reference vocal interpretation, fantastic coloratura, impressive power and always perfect tuning, the scenic interpretation was a reference! An actress who sings (fabulously)! It was manipulative, perfidious, but also very comical and with moments of great show that were provided by the production, standing out one in which she sings like a music hall actress with microphone in hand.

Another exceptional interpretation was that of countertenor Franco Fagioli. He made a young, tattooed and somewhat crazy Nerone, well-characterized and apparently disinterested, with very agile and character-appropriate scenic moves. The scene where he had a sexual encounter with Poppeia was hilarious. The powerful voice easily fills the room, is of great beauty and in coloratura was brutal!

Another superior countertenor was Iestyn Davies (Ottone), more lyrical, to whom the most dramatic and most beautiful arias belong. He was particularly touching in the aria Voi che udite with which the first part ended.

Soprano Lucy Crowe, which I love, was at the highest level as usual. The voice is clear, wide, lithe and fresh and has interpreted Poppea in a blameless manner.

Bass Gianluca Burato was a remarkable Claudio, with full-bodied voice of great beauty.

Young bass Andrea Mastroni (Pallante), countertenor Eric Jurenas (Narciso) and bass José Coca Loza (Lesbo) completed a superior cast that gave us a great opera performance.

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Luiz-Ottavio Faria no Teatro Cólon, na Coruña, Espanha



Dia 28 de setembro, o baixo brasileiro Luiz-Ottavio Faria será o Grande Inquisidor da ópera Don Carlo de Verdi, em forma de concerto, no Teatro Colón, na Coruña, Espanha. A direção musical e regência será de Kamal Khan, com a Orquestra Sinfônica de Galícia e Coro Gaos.
Essa apresentação terá a presença de um dos maiores baixos da atualidade, o italiano Ferruccio Furlanetto.




O Grande Inquisidor da ópera Don Carlo é um dos recorrentes personagens interpretados por Luiz-Ottavio Faria, em mais de 80 apresentações, como no Teatro Municipal da Bolonha, na Itália, na Ópera de Tenerife, na Espanha, em Oviedo, no Theatro Municipal de São Paulo e entre muitos outros países.
Vídeos
Don Carlo, Duet Filippo II e Il Grande Inquisitore, Dmitry Belossesky e Luiz-Ottavio Faria: https://youtu.be/J4et-srqGAQ
Don Carlo Duet Filippo II e Il Grande Inquisitore Roberto Scandiuzzi e Luiz Ottavio Faria: https://youtu.be/-IcfxOJFb04
Felipe Bou, Luiz Ottavio Faria, Don Carlo, Filippo II e il Grande inquisitore duet: https://youtu.be/76opXGW5L68

Luiz-Ottavio Faria, radicado nos Estados Unidos, esteve em julho no Brasil, interpretando Sparafucile, na ópera Rigoletto de Verdi, sob regência de Roberto Minczuk e direção de Jorge Takla, no Theatro Municipal em São Paulo. Essa montagem foi realizada em outubro, no Teatro Solis de Montevideo, no Uruguai, sob regência do maestro uruguaio Martin Jorge.
Em abril esteve no XXII Festival Amazonas de Ópera interpretando Don Ruy Gomes na versão em concerto da ópera Ernani de Giuseppe Verdino Teatro Amazonas, sob regência Luiz Fernando Malheiro.
Na carreira internacional, em março de 2020, vai cantar a Missa Solemnis opus 123 de Beethoven com a Sinfônica de Lahti na Finlândia, regência de Dima Slobodeniuk. Em abril, será Trinity Moses, na ópera Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny, de Kurt Weill com texto de Bertold Bretcht, no Teatro Regio de Parma, na Itália sob regência do americano Christopher Franklin e direção do alemão Henning Brockhaus.
Em janeiro de 2019, foi Timur, em Turandot na Ópera de Toulon, na França. Em 2018, interpretou Jacopo Fiesto, da ópera Simon Boccanera, no Teatro Massimo de Palermo, na Itália. E em maio de 2018, foi Zaccharie na ópera Nabucco, no Teatro Le Corum, na França.



 (Foto de Devon Cass)

O baixo brasileiro Luiz-Ottavio Faria, natural do Rio de Janeiro, estudou canto com professores consagrados no mundo lírico, tais como Fernando Teixeira, Nilze Mirian Vianna, Simon Estes e Benjamin Mathews.  Formado pela prestigiada ‘The Juilliard 
School of Music’, de Nova Iorque, também foi aluno da ‘Escola de Música Villa-Lobos’, do ‘Conservatorio Brasileiro de Música’ e da ‘Universidade do Rio de Janeiro’, além de frequentar o ‘American Institute of Music Studies’, AIMS, na Áustria.

A estreia mundial de Luiz-Ottavio Faria se deu na ópera “Un Ballo in Maschera”, de Verdi, no papel de Tommaso, ao lado do legendário tenor Carlo Bergonzi e do grande barítono brasileiro Fernando Teixeira, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, 
com temporada estendida para o Theatro Municipal de Sãoo Paulo. Mais tarde, Commendatore (Don Giovanni), Ramfis (Aida), Sparafucile (Rigoletto), Sarastro (Die Zauberflute), Colline (La Boheme), Banquo (Macbeth), Oroveso (Norma) Zaccaria (Nabucco) e Timur (Turandot).
Site: http://www.ottavio-faria.com/
Facebook: @LuizOttavioFariaBass
Instagram: @luizottaviofariailbasso
 Assessoria de imprensa do artista
Miriam Bemelmans

terça-feira, 24 de setembro de 2019

DON CARLO, Wiener Staatsoper, Setembro / September 2019



(text in English below)

A versão italiana da magnífica ópera de Verdi Don Carlo esteve em cena na ópera estatal de Viena em Outubro. Foi com ela que iniciei a minha temporada operática 2019-2020.

O maestro Jonathan Darlington não fez um trabalho perfeito, sobretudo no início em que houve desencontros na orquestra.



A encenação de Daniele Abbado é interessante, escura, despida e opressiva, como a própria ópera. Os trajos são convencionais mas só há paredes e plataformas móveis escuras. Nas laterais frequentemente abrem-se espaços por onde os cantores e coro entram e saem. Para além de um crucifixo, os únicos adereços só aparecem no início do 3º acto e são uns 4 grupos de velas no chão (o efeito é magnífico) e a cadeira onde o Filipe II está sentado, antes de cantar a sua fantástica ária, uma das mais marcantes da ópera.



Os cantores foram globalmente muito bons, como era expectável.
A melhor foi a Elena Zhidkova como Eboli. Foi a primeira vez que a vi ao vivo e fiquei deveras impressionado com tudo, voz, interpretação, figura, tem tudo bom! O poderio vocal é fantástico, sempre afinada e agudos incríveis.



Os baixos também foram marcantes, o René Pape como Filipe II, muito emotivo na interpretação, mantém uma voz fantástica.



O russo Dmitry Ulyanov foi espectacular como Grande Inquisidor, com um vozeirão de fazer tremer o chão.



E o sul-coreado Jongmin Park (Frade / Carlos V) também muito bom, apesar de ter um papel pequeno.


O Simon Keenlyside é um Rodrigo meu conhecido há muitos anos e continua a fazer um bom papel. A voz, não sendo o que foi, continua boa, bonita e ele usa-a com grande mestria. Tem uma óptima figura, o que ajuda muito na interpretação e na agilidade em palco,



contrastando em absoluto com o Carlos desta noite, o italiano Fabio Sartori que, cantando bem, com voz de timbre bonito, tem uma figura horrível. É muito gordo e é baixo. Sempre que tem que interagir mais de perto com outro cantor (e com quem acontece mais vezes é com o Posa / Rodrigo), a coisa torna-se quase ridícula (os braços não têm comprimento suficiente para um abraço).


A Elisabetta foi cantada por uma azeri, Dinara Alieva, em estreia aqui. A Anja Harteros cancelou, algo que faz frequentemente (para mim está no 2º lugar do pódium dos cancelamentos: 1º a Angel Gheorghiu e 3º o Jonas Kaufmann). Começou mal, o timbre não é bonito e a voz parecia não ter cor. Contudo, foi melhorando ao longo da récita e, na ária principal do último acto, esteve muito bem.


Começou muito bem a minha temporada!




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DON CARLO, Wiener Staatsoper, October 2019

The Italian version of Verdi´s magnificent opera Don Carlo could be seen at the Vienna State Opera in October. It was the first opera of my 2019-2020 season.

Conductor Jonathan Darlington did not do a perfect job, especially in the beginning with some light problems with the orchestra.

Daniele Abbado's production is interesting, dark, austere and oppressive, like the opera itself. The costumes are conventional but there are only dark moving walls and platforms. On the sides often open spaces where the singers and choir enter and leave. Apart from a crucifix, the only props appear only at the beginning of the 3rd act and are about 4 groups of candles on the floor (the effect is magnificent) and the chair where Philip II is sitting, before singing his fantastic aria, one of the most remarkable of the opera.

The singers were overall very good, as expected. The best was Elena Zhidkova as Eboli. It was the first time I saw her live and I was really impressed with everything, voice, interpretation, figure, everything is good! The vocal power is fantastic, always tuned and incredible top notes.

The bass singers were also striking: René Pape as Philip II, very emotional in interpretation, maintains a fantastic voice.

Russian Dmitry Ulyanov was spectacular as the Great Inquisitor, with a ground-shaking voice.

And south-corean Jongmin Park (Frate / Carlos V) was also very good, despite having a small role.

Simon Keenlyside has been a Rodrigo known to me for many years and continues to play a good role. The voice, not what it was, remains good, beautiful, and he uses it with great mastery. He has a great figure, which helps a lot in interpretation and agility on stage,

in sharp contrast to Carlos tonight, Italian Fabio Sartori, who, singing well, with a voice of beautiful tone, has a horrible figure. He's very fat and he's short. Whenever he had to interact more closely with another singer (and that happens more often with Posa / Rodrigo), it becomes almost ridiculous (the arms are not long enough for a hug).

Elisabetta was sung by Azeri Dinara Alieva, debuting here. Anja Harteros has canceled, something she does often (for me she is in 2nd place on the cancellation podium: 1st is Angela Gheorghiu and 3rd is Jonas Kaufmann). She started badly, the tone is not pretty and the voice seemed to have no color. However, she improved throughout the performance and, in the main aria of the last act, she was very well.

My season had a good start!

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