sábado, 28 de setembro de 2013

GIULIO CESARE, METropolitan OPERA, Nova Iorque, Maio de 2013 / New York, May 2013 – Primeira Récita / First Performance

(in english below)

Giulio Cesare é uma ópera de G. F. Haendel com libreto de Nicola Francesco Haym. Esta produção da Metropolitan Opera foi vista numa transmissão directa MetLive e comentada neste blogue aqui, pelo camo_opera que foi o único de nós que viu a transmissão. O seu texto refere o enquadramento histórico e muitas outras informações interessantes.
Eu tive o privilégio de ver, ao vivo, duas récitas.


 A encenação de David McVicar é muito vistosa, variada, colorida e cheia de acção. Nem os cantores são poupados. Cantam nas mais diversas posições e a movimentação em palco é muito exigente e, no caso do Tolomeo, acrobática. A acção atravessa diversas épocas históricas. No fundo do palco há 4 cilindros que giram continuamente simulando o movimento do mar, efeito usado no passado mas com grande impacto visual. Por lá vão passando, ao longo da récita, navios de diversas épocas históricas, outra opção muito interessante e de grande beleza estética.



 Mas ainda mais importante que a encenação foi a música. A Orquestra barroca foi dirigida pelo maestro inglês e cravista Harry Bicket. Em palco, no 2º acto, o excelente solo de violino foi tocado por David Chan. Toda a interpretação musical foi excelente. E os solistas não poderiam ter sido melhores:


Romanos:
O contratenor norte americano David Daniels foi Giulio Cesare. Já o ouvi ao vivo várias vezes e, mais uma vez, gostei. Tem uma voz bem audível, de timbre agradável e bem colocada. Esteve bem cenicamente, a interpretação é exigente mas, dada a concorrência, não sobressaiu.


 Cornelia, viúva de Pompeu, foi interpretada pelo mezzo irlandês Patricia Brandon. A voz é ampla, bem audível, expressiva e sempre afinada, e a cantora teve uma interpretação muito convincente.


 O mezzo inglês Alice Coote foi o Sesto Pompeo, filho de Cornelia. Foi uma das melhores intérpretes da noite, embora seja difícil a escolha. Coote tem uma voz com invulgar qualidade e projecção em toda a sua extensão. Foi insuperável. Já a vi várias vezes, quase sempre a fazer papéis masculinos, que lhe assentam muito bem, dadas as suas características físicas e vocais.


 Egípcios:
Cleópatra foi interpretada pelo soprano francês Natalie Dessay. Foi assombrosa. Já há muito tempo que não assistia a uma interpretação de Dessay com esta qualidade. É uma actriz que canta e fá-lo como poucas outras cantoras. Tem uma figura excelente, as suas qualidades dramáticas são insuperáveis e a voz esteve ao seu mais alto nível, sem denotar qualquer sinal de desgaste que já lhe ouvi em outras interpretações. E a exigência cénica do papel não é para uma qualquer. Uma grande Senhora da ópera!


 O contratenor francês Christophe Dumaux foi o seu irmão Tolomeu, rei do Egipto e um dos vilões da ópera. Não o conhecia e fiquei boquiaberto com a interpretação. Vocalmente foi o melhor dos contratenores, com uma voz de beleza assinalável, sobretudo no registo mais agudo que é sempre perfeitamente audível e manteve qualidade insuperável ao longo de toda a récita. Não bastasse a voz, o homem é também um atleta e fez de tudo em palco com uma agilidade estonteante e aparente facilidade (até um salto mortal). McVicar tirou o maior partido das invulgares capacidades físicas do cantor, que nos proporcionou uma interpretação como raramente se vê em ópera.


 O terceiro contratenor em cena foi o marroquino Rachid Ben Abdeslamm que interpretou o Confidente de Cleópatra Nireno. Foi outra boa interpretação, cénica e vocal, apesar de o papel ser relativamente pequeno.


 Finalmente o barítono italiano Guido Loconsolo foi um Achilla à altura dos restantes intérpretes. A voz é bem timbrada e o cantor interpretou o papel de forma firme e segura. Também tem uma figura muito adequada à personagem, algo que foi uma constante em todos os solistas.


 Um Giulio Cesare de luxo que, ao contrário do que tinha planeado, me fez ver a ópera duas vezes nesta semana em que estive em Nova Iorque.









 Dentro de dias publico fotografias da segunda récita.

*****



GIULIO CESARE Metropolitan Opera, New York, May 2013

Giulio Cesare is an opera by G. F. Handel with libretto by Nicola Francesco Haym. This production of the Metropolitan Opera was seen in a direct MetLive transmission and was commented on this blog, by camo_opera. In his text you can find the historical background and many other interesting information.
I had the privilege to see, live, two performances.

The staging by David McVicar is very showy, varied, colorful and full of action. Not even the singers are spared. They sing in various positions and the movement on stage is very demanding and, in the case of Tolomeo, acrobatic. The action passes through different historical periods. In the back of the stage there are 4 cylinders that rotate continuously simulating the motion of the sea, an effect used in the past but with great visual impact. There navigate, along the performance, ships from various historical eras, another very interesting option of great aesthetic beauty.

But even more important that the staging was the music. The Baroque Orchestra was directed by British conductor and harpsichordist Harry Bicket. On stage, in the 2nd act, the excellent violin solo was played by David Chan. All musical performance was excellent. And the soloists could not have been better:

Romans:
North American countertenor David Daniels was Giulio Cesare. I've heard him live several times, and once again I enjoyed. His voice has a broad, pleasant timbre and is well projected. The singer was well on stage, the performance is demanding, but given the competition, he did not excelled.

Cornelia, widow of Pompey, was interpreted by Irish mezzo Patricia Brandon. Her voice is very audible, expressive and always in tune, and the singer had a very convincing performance.

English mezzo Alice Coote was Sesto Pompeo, son of Cornelia. She was one of the best performers of the night. Coote has an amazing voice with an unusual quality in all its extension. She was unsurpassed. I've seen her several times, almost always doing male roles that fit her very well, given her physical and vocal characteristics.


Egyptians:
Cleopatra was interpreted by French soprano Natalie Dessay. She was astonishing. It was one of the best interpretations of Dessay I have attended. She is a singing actress and she performs like few other singers. She has an excellent figure, her dramatic qualities are unsurpassed and her voice was at its highest level without any sign of fatigue that I have heard in other interpretations.
And the staging demand of the role is remarkable. A great Lady of the opera!

French countertenor Christophe Dumaux was his brother Tolomeo, king of Egypt and one of the villains of the opera. I did not know him and I was awestruck by the interpretation. He was vocally the best of countertenors with a noticeable beautiful voice, especially in the high register that was always well audible. He maintained the top quality throughout the performance. Besides the voice, the man is also an athlete and did everything on stage with a dizzying speed and apparent ease (even a somersault). McVicar took the most of the unusual physical abilities of the singer, who gave us an interpretation rarely seen in opera.

The third countertenor was Moroccan Rachid Ben Abdeslam who played Cleopatra's confidant Nirenus. He was another good performer, artistic and vocal, though the role is relatively small.

Finally, Italian baritone Guido Loconsolo was an Achilla at the same level of the other soloists. The voice has a pleasant timbre and the singer was firm. He also has a very suitable figure for the character, something that was constant in all the soloists.

A luxury Giulio Cesare that, contrary to what I had planned, I saw twice in the week I was in New York.

In a few days I will post some pictures of the second performance.

*****

sábado, 21 de setembro de 2013

GÖTTERDÄMMERUNG, METropolitan OPERA, Nova Iorque Maio de 2103 / May 2013



 Como já referi anteriormente, conto-me entre os apreciadores desta encenação de Lepage, pela originalidade e eficácia conseguidas.


 Nesta última ópera do Anel, mais uma vez a encenação foi muito bem conseguida. De entre as partes mais interessantes incluo a encenação das Nornas a tecerem a corda do destino, Grane, o fantástico cavalo de Brünhilde (fabuloso), a chegada de Siegfried no Reno ao palácio dos Gibichung e, depois da morte de Siegfried, Gunther lava a mão suja de sangue na água cristalina que corre e, toda ela, vai ficando progressivamente vermelha. Também a construção da pira funerária para o Siegfried é interessante, mas o incêndio final nem tanto. Contudo, outro efeito bem conseguido é a destruição de Valhalla, com o aparecimento das estátuas às quais, caem sucessivamente as cabeças.


 O coro, que só intervém nesta ópera, foi absolutamente excepcional. A orquestra, sob a batuta de Fabio Luisi, óptima.





 As três Nornas Ronnita Miller, Michaela Martens e Heidi Melton também tiveram interpretações vocais superiores e de grande homogeneidade.


 A Brünhilde de Deborah Voight esteve muito bem, embora algo contida no início. Talvez a cantora se estivesse a poupar para o final que foi de grande categoria.


 O tenor sueco Lars Cleveman, foi um Siegfried diferente daquele que nos ofereceu na ópera anterior. Esteve muito bem no primeiro acto, quando se ouviu perfeitamente e emprestou emotividade interpretativa ao papel. Quebrou muito no segundo, onde teve um interpretação ao nível da que fez na ópera Siegfried e, esteve bem novamente no terceiro acto. O cantor não é ajudado pela figura porque é baixo e magro, não deixando a imagem do herói fisicamente forte que associamos à personagem.


O baixo-barítono escocês Iain Paterson interpretou um Gunther correcto mas sem nada de excitante a salientar.


 Já o baixo alemão Hans-Peter König foi, mais uma vez, insuperável como Hagen. Para mim o melhor cantor da noite e não há melhor para este papel na actualidade. Tem uma voz lindíssima e gigante. Foi magistral!


O soprano norte americano Wendy Bryn Harmer, foi óptima como Gutrune, sempre perfeitamente audível e afinada, para além de também ter tido uma prestação cénica acima da generalidade dos outros solistas.


 O mezzo norte americano Karen Cargill foi uma Waltraute muito competente. O Alberich de Richard Paul Fink voltou a não impressionar positivamente e as filhas do Reno, Dísella Làrusdóttir, Jennifer Johnson Cano, Renée Tatum estiveram, novamente, muito bem.









  
Terminou da melhor forma este Anel da METropolitan Opera.

*****


Götterdämmerung, Metropolitan Opera, New York May 2103

As I mentioned earlier, I am among the admirers of this staging by Lepage due to the originality and effectiveness achieved. In the latter opera of the Ring cycle the staging was again very effective. The most interesting parts include the staging of the Norns weaving the rope of destiny, Grane, the fantastic Brunhilde’s horse (fabulous), Siegfried's arrival through the Rhine at Gibichung’s palace, and after the death of Siegfried, Gunther washing his bloody hand in the clear water flowing, and all of it becoming progressively red. Also the construction of the funeral pyre for Siegfried is interesting, but not so the fire. Yet another aspect is very effective, the destruction of Valhalla, with successively falling heads of the statues.

The choir, which only appears in this last opera, was absolutely outstanding.

The three Norns, Ronnita Miller, Michaela Martens and Heidi Melton had superior vocal performances and great homogeneity.

Deborah Voight´s Brunhilde was very good, although somewhat contained in the beginning. Perhaps the singer was saving her voice for the end, which was great.

Swedish tenor Lars Cleveman was a different Siegfried from that offered in the opera before. He did very well in the first act, when he was heard perfectly and sang with emotion. He broke in the second lot, where he had a level of interpretation similar to his interpretation in the opera Siegfried, but he did well again in the third act. The singer is not helped by his figure because he is short and thin, which is not the expected for the physically strong hero we associate with the character.


Scottish bass-baritone Iain Paterson sung a correct Gunther but he did nothing exciting to note.

In contrast, German bass Hans-Peter König was, once again, unsurpassed as Hagen. For me he was the best singer of the night and there is no better than him for this role in present times. He has a beautiful giant voice. Masterful!

North American soprano Wendy Bryn Harmer was great as Gutrune. She was always perfectly audible and tuned, besides also having had an artistic performance well above most other soloists.

North American mezzo Karen Cargill was a very competent Waltraute. Richard Paul Fink’s Alberich again failed to impress positively, and the daughters of the Rhine, Dísella Lárusdóttir, Jennifer Johnson Cano, and Renee Tatum were, again, very well.

This Metropolitan Opera Ring ended in the best way.

*****

domingo, 15 de setembro de 2013

SIEGFRIED, METropolitan OPERA, Nova Iorque, Maio de 2013



 A ópera do Anel em que a natureza está sempre presente beneficia muito da abordagem cénica de Lepage. O primeiro acto tem um efeito visual marcante, com a cabana de Mime de um lado do palco e, do outro, a floresta com um riacho em que a água corre pelo palco e onde as folhas das árvores esvoaçam ao sabor do vento.
No segundo acto o dragão é o objecto menos conseguido, parece uma bóia de criança. Mas tudo o resto é de belo efeito, nomeadamente as várias intervenções da ave que Siegfried ouve.
O terceiro acto também começa com imagens de forte impacto visual e quer o diálogo de Wotan com Erda, quer com Siegfried são muito bem conseguidos. Já a cena final do despertar de Brünhilde é muito estática, apesar de eficaz.


O tenor norte americano Robert Brubaker foi um Mime excepcional. Tem um timbre peculiar que se adapta perfeitamente à personagem. Nunca cantando em forte, foi sempre claramente audível pois a técnica de projecção vocal é exímia. Cenicamente foi irrepreensível. Um dos melhores da noite.


Siegfried foi interpretado pelo tenor sueco Lars Cleveman. Este deve ser um dos papéis wagnerianos em que mais difícil é, na actualidade, encontrar cantores à altura da elevada exigência interpretativa. Cleveman fez o que pôde mas não é o Siegfried ideal. Tem uma figura frágil e a voz, embora agradável, por vezes fica abafada pela orquestra. Ainda assim aguentou-se, sem quebrar, até ao final.


O Wanderer do baixo barítono norte americano Greer Grimsey foi muito bom, na continuação da excelente interpretação que o cantor já tinha tido como Wotan na Valquíria. Voz também de timbre peculiar mas bem domada pelo cantor e sempre audível e afinada. A interpretação cénica foi irrepreensível.




O baixo-barítono norte americano Richard Paul Fink confirmou que está aquém dos restantes solistas na interpretação que fez de Alberich. Foi o menos impressionante dos cantores da noite. Frequentemente não se ouvia e a voz não tem qualquer qualidade atractiva.

Excepcional foi o baixo alemão Hans-Peter König que, nesta ópera, foi Fafner. É um cantor de elite que está no auge das suas fabulosas potencialidades. A voz é de uma beleza invulgar e de uma potência avassaladora.


O soprano americano Lisette Oropesa foi um pássaro da floresta muito competente, de voz cristalina e muito agradável.


Repetiu uma boa actuação como Erda o mezzo americano Meredith Arwady. É detentora de uma voz potente e com um registo grave impressionante.




 Finalmente o soprano norte americano Deborah Voight voltou a interpretar a Brünhilde. Apesar de, nesta ópera, só cantar no final, achei que transpareceu algum cansaço vocal e foi ocasionalmente agreste, sobretudo nas notas mais agudas, que não soaram agradáveis.








****


SIEGFRIED, Metropolitan Opera, New York, May 2013

The Ring’s opera where nature is always present benefits a lot from the scenic approach of Lepage.
The first act has a remarkable visual effect with Mime's hut on one side of the stage and on the other, the forest with a stream where the water runs across the stage and where the leaves flutter in the wind.
In the second act the dragon is ridiculous but everything else is of fine effect, namely the various parts when Siegfried hears the bird.
The third act also begins with images of strong visual impact and both the dialogue between Erda and Wotan, and between Siegfried and Wotan wants are very good. The final scene of the awakening of Brunhilde is very static, although effective.

North American tenor Robert Brubaker was an exceptional Mime. He has a peculiar tone that fits the character. Never singing in forte, he was always clearly audible as the technique of vocal projection excels. Artistically he was blameless. One of the best of the night.

Siegfried was played by Swedish tenor Lars Cleveman. This must be one of the most difficult Wagnerian roles and, today, to find singers up to the high standards of interpretation is very difficult. Cleveman did his best but he is not the ideal Siegfried. He has a fragile figure and the voice, though pleasant, sometimes gets drowned out by the orchestra. Still, he held up without breaking until the end.

The Wanderer by North American bass baritone Greer Grimsey was very good, in the continuation of the excellent interpretation that the singer had had as Wotan in Valkyrie. His voice has a peculiar timbre but well controlled by the singer and always audible and tuned. The artistic performance was very good.

North American bass-baritone Richard Paul Fink confirmed that he lags behind other soloists in his interpretation of Alberich. He was the least impressive of the singers of the night. Often he was not heard and the voice does not have any attractive quality.

Exceptional was the German bass-baritone Hans-Peter König that in this opera was Fafner. He is an elite singer at the height of his fabulous potential. The voice is of an unusual beauty and an overwhelming power.


American soprano Lisette Oropesa was a very competent bird of the forest, with  a crystal clear and very nice voice.

American mezzo Meredith Arwady repeated her good performance as Erda. She has a powerful voice and impressive low record.

Finally, North American soprano Deborah Voight was Brunhilde again. Although, in this opera, she sings only in the end, I thought she revealed some vocal fatigue and was occasionally harsh, especially in the high notes, which did not sound pleasant.

****