(Review in english below)
A quinta ópera de Guiseppe
Verdi — Ernani — foi
estreada a 9 de Março de 1844 no teatro La Fenice em Veneza e é uma das obras
do período jovem do compositor.
Tem como curiosidade
ter sido a primeira ópera completa a ser gravada em 1904 em 40 discos de lado
único pela HMV em Inglaterra.
Não sendo umas das
óperas mais representadas de Verdi, tem sido, ultimamente, representada em
diversos teatros importantes e é a partir de hoje levada à cena numa produção
para o Metropolitan Opera de Nova Iorque a que tivemos oportunidade de
assistir, uma vez mais integrada no programa MetLiveHD ao qual a Fundação
Gulbenkian se associou.
O libreto é de Francesco
Maria Piave e baseia-se na obra Hernani do romancista francês Vitor Hugo.
Foi o primeiro libreto que o compositor teve a liberdade de escolher, e com o
qual o compositor e libretista italianos iniciaram uma estreitíssima e profícua
colaboração que traria às óperas de Verdi a profundidade dramática e os
entrelaçados jogos psicológicos que as caracterizam.
Sendo a primeira ópera de temática espanhola de Verdi, enquadra-se,
claramente, no período romântico e poderão encontrar uma breve sinopse, por
exemplo, no programa de sala que a FCG disponibilizou: http://www.musica.gulbenkian.pt/2011_2012/files/00000000/00000098_0015.pdf
(algumas fotografias/photos Met Opera)
A encenação esteve a cargo de Pier-Luigi Samaritani. Foi simples e clássica, não introduzindo
nenhum elemento interpretativo tendente a gerar diversas interpretações. Foi,
isso sim, bonita e muito eficaz.
A New York Metropolitan Opera
Orchestra esteve sob a batuta do maestro italiano Marco Armiliato. O maestro conduziu bem uma orquestra madura e bem
preparada, tendo a orquestra estado em bom nível com uma interpretação viva e
verista, tal como o Coro.
O tenor Marcello Giordani foi
Ernani. Ao nível da dicção esteve sublime (nem sempre os italianos a têm). Em
termos cénicos foi eficaz, porque nem sempre suficientemente expressivo. Já a
sua voz não esteve a um nível óptimo, nem pouco mais ou menos: esteve muito
esforçada nos registos mais agudos, o que se notou diversas vezes (por exemplo,
no final da primeira cena do primeiro acto).
Angela Meade (Elvira) foi um soprano
de enorme qualidade. Dotada de uma técnica assombrosa, a jovem soprano
norte-americana encheu a sala do MET com a sua voz poderosa e muito harmoniosa
e conseguiu cativar-nos. Pena que a sua presença pesada não acompanhe a beleza
tímbrica. Esteve perfeita na sua ária do primeiro acto e é, certamente, um nome
a considerar por muitos anos.
O barítono russo Dmitri Hvorostovsky
foi um Don Carlo com uma excelente presença em palco. Dotado de uma excelente
figura, foi um rei altivo e confiante, a que aliou uma voz de qualidade
inquestionável. Apresentou-se a muito bom nível e destacou, como o próprio
papel exige, no terceiro acto.
Ferruccio Furlanetto (baixo) foi um Don
Silva espectacular. Tem uma voz única de raríssima beleza e, tal como sempre
nos habituou, esteve a um nível excelente. Somos sempre capazes de sentir todas
as nuances expressivas nas diferentes tonalidades da sua voz que está perfeita
para este papel. O melhor elemento da récita!
Mary Ann McCormick (mezzo-soprano) como
Giovanna, Jeremy Gaylon (baixo) como
Iago e Adam Laurence Herskowitz
(tenor) como Don Riccardo estiveram, apesar dos seus papéis de menor relevo, em
bom plano, não tendo nenhum deles destacado por ter uma voz particularmente
interessante.
Em suma, é uma ópera cujo enredo não é de interesse particular. Todavia, não
sendo uma das óperas mais famosas de Verdi e, logo, menos conhecida do grande
público, foi uma boa oportunidade para desfrutar de uma música de muito boa
qualidade.
The fifth opera by Guiseppe Verdi — Ernani — was premiered at March 9, 1844 at La Fenice theater in
Venice and it is one of the youth period works by the composer.
By curiosity, Ernani was
the first complete opera to be recorded in 1904 in 40 single-sided discs for
HMV in England.
Being not one of the most
represented Verdi’s operas, it has been lately, represented in several major
opera theaters and is now taken to the scene in a production for the
Metropolitan Opera in New York that we had the opportunity to watch integrated
on MetLiveHD program the Gulbenkian Foundation joined.
The libretto is of Francesco Maria Piave and it is based
on the work Hernani by french novelist Victor Hugo. It was the first libretto
Verdi had the freedom to choose, and with which the Italian composer and the
librettist began an extremely close and fruitful collaboration that would bring
to Verdi’s operas the dramatic depth and the intertwined psychological games
that characterize them.
As the first
Spanish-themed opera by Verdi, it falls clearly in the Romantic period and you
could find a brief synopsis, for example, in the program provided by the FCG:
http://www.musica.gulbenkian.pt/ 2011_2012/files/00000000/00000098_0015.pdf
Pier-Luigi Samaritani directed
the staging. It was simple and classic, not introducing any element of
interpretation designed to generate various interpretations. It was, yes,
beautiful and very effective.
The New York Metropolitan Opera Orchestra was under the baton of
Italian conductor Marco Armiliato.
The conductor led a mature and well-prepared orchestra, being at a good level
and giving us a vivid and veristic interpretation, as the Chorus.
The tenor Marcello Giordani was Ernani. At the level of diction he was
sublime (not always the Italians have it). In scenic terms he was effective,but
he was not expressive enough. His voice was not at an optimal level, neither
more or less: it was very strenuous in the upper registers, which noted several
times (eg. at the end of the first scene of Act I).
Angela Meade (Elvira) was a
soprano of great quality. Endowed with an amazing technique, the young American
soprano filled MET house with her powerful and very smooth voice, and she captivate
the audience. It is a pity that her heavy presence does not accompany her timbre
beauty. She was perfect in his first act aria and she is certainly a name to
consider for many years.
The Russian baritone Dmitri Hvorostovsky was a Don Carlo
with a great stage presence. Endowed with an excellent figure, as King he was
proud and confident, which combined a voice of unquestionable quality. He presented
at very good level and highlighted, as the role requires, in the third act.
Ferruccio Furlanetto (bass) Don
Silva was a spectacular. He has a unique voice of rare beauty and, as always
accustomed us, was at an excellent level. We are always able to feel all the
expressive nuances in the different tones of his voice that is perfect for this
role. He was the best performer of the afternoon!
Mary Ann McCormick
(mezzo-soprano) as Giovanna, Jeremy
Gaylon (bass) as Iago and Adam Laurence
Herskowitz (tenor) as Don Riccardo were, despite their secondary roles, on
good plan, none of them having an outstanding or particularly interesting voice.
In short, Ernani is an opera whose plot is not of particular
interest. However, being not one of the most famous operas of Verdi, and
therefore less known to the general public, it was a great opportunity to enjoy
very good quality music.
In Germany unfortunately the cinema didn't present Ernani. The cast is amazing!
ResponderEliminarHello friends,nice info, to start the breakfast on a late sunday morning!!
ResponderEliminarGreetings,Willy
Caro camo_opera,
ResponderEliminarTambém assisti ontem ao Ernani no MetLive e concordo quase pelnamente com a sua interpretação. Não gostei do Marcello Giordani (voz quase sempre em esforço, agudos agressivos, má presença cénica).
Angela Meade tem uma voz fantástica e poderá vir a tornar-se numa das grandes intérpretes do futuro. É pena a figura não ajudar. Nesta encenação até "passa", mas noutros papéis notar-s-á mais. Mas como é muito jovem, poderá ainda esforçar-se para perder peso.
Ferrucio Furlanetto, apesar de sexagenário, continua a ser um baixo de qualidade excepcional. Também para mim foi o melhor da tarde.
Nunca me tinha aventurado neste ópera e, depois de a ter visto ontem também, não é uma ópera que me agrade particularmente. É claro que tem o seu papel no repertório ocasional, até pela importância histórica verdiana que possa ter mas... não mais do que isso. Tem um final interessante e a primeira ária do Silva é de excelência.
ResponderEliminarEm relação aos cantores tenho que discordar com os meus dois companheiros de blog num ponto: Giordani canta habitualmente assim e se assim fosse num esforço marcado de agudos, a sua voz já tinha estoirado há muitos anos, atendendo ao que frequentemente canta. Mesmo nos agudos o timbre não se altera, o que revela que o esforço para estas notas saírem não é assim tão grande, e não desgostei da sua presença em palco, dentro do que o papel exige.
Ferrucio Furlanetto foi realmente a maior estrela. Está na idade perfeita para papéis verdianos como este, tal como Fiesco ou Filipe II... A sua voz é inconfundível e única - nem precisamos de o ver para saber que é ele que está a cantar e isso, sem haver relação especial ou cientificamente comprovada, é marca de grandes artistas do passado e do presente (Callas, Domingo, Pavarotti, Caruso, Salminen, Nilsson...).
Angela Meade tem uma voz de elevada qualidade mas não fiquei, desde já, rendido. Vou ter de esperar para a poder ver em papéis mais emblemáticos para aí ter uma opinião final.
Ernani exibe um Verdi fecundo no que à invenção melódica e sentido teatral concerne. Um dos meus títulos favoritos de entre os que compõe os denominados "anni di galera".
ResponderEliminarAngela Meade será, seguramente, um nome a reter. Voz redonda de amplo volume, com uma óptima projecção e suficiente plasticidade, traduzida num fraseado seguro e expressivo.
I also would like to watch this opera!
ResponderEliminarOlá amigos Fanáticos.
ResponderEliminarTodos concordamos em que Ferruccio Furlanetto foi a melhor presença da noite.
Por mim, não gostei nem um bocadinho da voz de Giordani, que achei agreste e feia. Hvorostovsky pareceu-me um bocadinho auto-convencido, e causou-me estranheza num cantor com a sua experiência a respiração ruidosa.
A voz de Meade soou-me metálica, mas pode ser da amplificação; de resto tecnicamente muito cuidada, e uma carreira que pode valer a pena seguir. Também acho que seria bom que perdesse peso.
O pior desta produção foi a direcção de actores, que não existiu.
Caros,
ResponderEliminarMuito obrigado pelos comentários de todos. Que pena a transmissão do MetHD Live não chegar a mais locais.
Vejo que a opinião sobre Ferruccio Furlanetto é unânime. Ele é um grandíssimo artista e esteve, uma vez mais, a um nível de excepção.
O FanaticoUm tem toda a razão: Meade é jovem, logo o tempo para pensar no peso. É que realmente noutros papéis a sua figura não combina de todo: imagine-se uma Turandot, uma Tosca, uma Violeta ou uma Mimí...
O wagner_fanatic já me tinha expresso a sua ideia sobre o tenor Giordani. Lamento não o acompanhar na sua avaliação quanto à sua qualidade, embora admita que tem razão relativamente ao facto de o timbre do tenor não se alterar nos agudos, o que não faz deles bons. E acho, realmente, que cenicamente não foi muito expressivo: aliás, exibiu um ar demasiado subserviente e, na cena final, quer Ernani, quer Elvira estiveram muito abaixo do que podiam (a título comparativo — e vou logo ao maior — veja-se a cena final de Otelo com Domingo no Scala sob a direcção de Muti: aquilo sim é morrer no palco!). Mas, como o conheço mal, admito poder estar a precipitar-me e poder, futuramente, rever a minha posição geral.
Concordo com o Hugo Santos. De facto, esta obra está cheia de momentos interessantes e é, sem dúvida, um momento de criação muito importante no repertório de Verdi. E se o libreto não é de qualidade elevada, a música é-o certamente.
O Gi tem toda a razão quanto ao narcisismo de Hvorostovsky: não sei se terá reparado no jeito que ele fez ao cabelo quando Don Riccardo revela o Rei a Don Silva e Ernani... Reparou? Foi um bom sinal deve auto-convencimento de que fala. Mas não deixa de ter uma voz muito boa. A respiração dele a mim não me pareceu ruidosa, não sei se por desatenção. E quanto à direcção de actores: a récita não primou, de facto, por uma grande intensidade cénica, mas também não creio poder dizer-se que não existiu. Talvez tenha existido de menos.
Caro camo_opera,
ResponderEliminarApenas quero esclarer que que a Gi, nossa leitora regular, é uma Senhora que partiha várias características connosco (depois lhe revelarei a principal pessoalmente) e que tem um blogue muitíssimo interessante, Garden of Philodemus, digno de visitas regulares. E já com um belo comentário ao Ernani.
Cumprimentos
Cara Gi,
ResponderEliminarQueira desculpar-me a incorrecção que se deve ao desconhecimento.
Já segui a recomendação do Fanático_Um e li o seu comentário sobre Ernani com o qual estou, globalmente, de acordo e a felicito.
Saudações.
Essa ópera estava programada para ser transmitida nos cinemas brasileiros. A empresa responsável cancelou as transmissões devido a "falta de salas digitais". Vai entender, sempre vi casa cheia nas transmissões do MET. Agora outra empresa transmite óperas do Covent Garden de Londres, a maioria gravadas e não ao vivo.
ResponderEliminarTambém assisti a esta récita e estou basicamente de acordo com a maioria. Giordani não me agradou. Não lhe aprecio o timbre e denoto-lhe esforço no agudo, mas, como diz o Wagner_fanatic o cantor interpreta sempre desta forma e a voz tem-se mantido intacta, pelo que o esforço que se lhe denota não deve existir. Poderá ser apenas uma questão tímbrica ou de interpretação.
ResponderEliminarMeade esteve muitíssimo bem. É uma cantora muito jovem e penso que terá uma carreira muito interessante. Não ser se reparam na entrevista que a cantora tem todas as potencialidades para se tornar uma interprete de referência no repertório de belcanto. A interpretação de Casta Diva no intervalo demonstrou bem as sua potencialidades. Emagrecer, far-lhe-ia bem, quer do ponto de vista cénico quer em termos de saúde. Esperemos no entanto que, caso decida fazê-lo, não entre em esquemas de deita rápida que podem danificar seriamente o seu aparelho vocal.
Hvorostovsky, foi um rei convincente. Confesso que não aprecio as suas respirações extremamente audíveis e alguns arrebatamentos vocais exagerados (mesmo para um barítono Verdiano).
Furlanetto foi extraordinário a todos os níveis. A voz continua intacta, redonda e potente. Do ponto de vista cénico fez um Silva perfeito. Na minha opinião divide com Meade o prémio de "melhor cantor da récita"
Cumprimentos
Como sempre uma excelente crônica. Aqui se ouve lendo e se vê por palavras!
ResponderEliminarUm abraço
FanaticoUm, agradeço a atenção e a gentileza :-)
ResponderEliminarCamo_opera, ora essa, "Gi" poderia ser qualquer coisa, só que no meu caso é mesmo um diminutivo.
Caro Opera&: é uma pena que não transmitam as óperas do Met. Têm de fazer pressão a ver se conseguem, porque, ao que parece, não há uma razão técnica real invocável para que não as transmitam. Aqui em Portugal as do Covent Garden não são transmitidas nem em directo, nem em diferido. Que seja do meu conhecimento, só houve uma transmissão da ROH no Cinema das Amoreiras (Lisboa): Carmen e em 3D!
ResponderEliminarCaro Alberto Grilo: também reparei nas potencialidades para belcanto da Angela Meade. Fez umas audições para o MET muito boas! Pareceu-me cantar a ária "Casta Diva" com muita qualidade técnica e se realmente tiver Caballé como referência poderá vir a ser um caso sério. Veremos o que o futuro lhe/nos reserva.
Caro António Machado: as suas palavras são sempre extremamente lisonjeiras. Muito obrigado. Ainda bem que gosta!
Cara Gi: ainda bem que está tudo devidamente esclarecido ;-)
Saudações a todos!
Adoro Ópera!!!! Brigado a todos pelos comentários no Blog.
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