domingo, 17 de abril de 2011

THOMAS HAMPSON - MAHLER - Fundação Calouste Gulbenkian - 16 e 17 Abril 2011



(review in english below)

O barítono Thomas Hampson, um dos melhores interpretes mahlerianos de sempre, presenteou-nos, no sábado, com algumas das canções do ciclo Des Knaben Wunderhorn. É visível que Hampson já interpretou estas canções milhares de vezes. A sua postura em palco e as suas expressões faciais transparecem um profundo conhecimento da obra. Mahler é já uma parte de Hampson. Quase com 56 anos, o timbre permanece bonito, a voz sai sem esforço, com dinâmica perfeita, aliado a um charme galã que lhe é bem conhecido. Para mim, a mais emblemática das canções deste ciclo é o “Wo die schönen Trompeten blasen” e foi com grande pena que, depois de uma interpretação brilhante, o público da Gulbenkian abalou por completo o silêncio celestial com um bafo de tosse e limpar de gargantas... Embora compreenda que não teria tido muito nexo por pertencer a outro ciclo, gostaria de ter ouvido, como extra, o “Ich bin der Welt” dos Rückert Lied e não outra canção do ciclo presenteado.

Mas se a qualidade da primeira parte foi um risco de causar um enfarte agudo do miocárdio, a segunda, com a 1ª Sinfonia de Mahler, a Titã, foi de arrasar por completo a sala. O som mahleriano produzido esteve digno do que de melhor se tem assistido na Gulbenkian. A direcção de Philippe Jordan foi de uma plasticidade emotiva no gesto, digna do mais virtuoso bailarino. O corpo seguindo a linha melódica, vibrava ao mesmo tempo que pedia da Orquestra uma resposta que foi, nos seus jovens elementos, dada com a expressividade e alegria de quem ama Mahler.



No domingo, o adagio da 10ª sinfonia, a inacabada, foi interpretado com a mesma qualidade orquestral e de direcção. Não posso dizer que considere este andamento ao nível de muitos outros que Mahler escreveu sem a presença da voz (como por exemplo o final da 3ª, da 5ª e da 9ª) mas talvez ainda não o tenha ouvido vezes suficientes para que reconheça o seu valor.

Este fim-de-semana Mahleriano terminou com Das Lied von der Erde, onde o tenor Burkhard Fritz se juntou a Thomas Hampson. Fritz esteve bem, embora abafado pela orquestra durante várias passagens do primeiro andamento. Hampson brilhou novamente com qualidade interpretativa superlativa, principalmente em Der Abschied.



Na passagem dos 100 anos sobre a sua morte, mais uma vez, na Fundação Calouste Gulbenkian, a sua memória foi elevada com um fim-de-semana de qualidade invejável.

Pedido desculpa aos intérpretes, dirijo agora algumas palavras aos expectadores da Gulbenkian: evitem as tosses e catarros desnecessários entre andamentos e, principalmente, durante as interpretaçóes; acabem com os comentários sussurados entre andamentos e, principalmente, durante as interpretações; senhoras: não levem brincos que chocalham nem pulseiras que tilintam; senhores: não passem com frequência as mãos sobre as calças de bombazine, de ganga ou outro tecido, ou sobre as gabardines e casacos; pousem o programa no chão durante o espectáculo e não façam um ruído de virar de página principalmente porque, com a luminosidade da sala, não se consegue ler nada; em resumo: procurem passar ao lado do “Síndroma da Pacovice Intelectual” e elevem-se, respeitando cantores e expectadores que vão ao concerto para ver a verdadeira estrela da sala: a Música.

Quem quiser explorar mais um pouco Thomas Hampson cantando Mahler, recomendo a clássica gravação com Bernstein e o seu recente CD, ambos com ciclos de canções do compositor.







THOMAS HAMPSON - MAHLER - Calouste Gulbenkian Foundation - April 16 & 17, 2011



The baritone Thomas Hampson, one of the best interpreters of Mahler of all times, presented us on Saturday, with some of the songs from Des Knaben Wunderhorn cycle. It is apparent that Hampson has sang these songs a thousand times. His posture on stage and his facial expressions are apparent in-depth knowledge of the work. Mahler is already a part of Hampson. Almost 56 years-old, the tone remains beautiful, the voice comes out effortlessly with perfect dynamics, coupled with his unique charm. For me, the most iconic song of this cycle is "Wo die schönen Trompeten blasen" and it was with great sadness that, after a brilliant interpretation, the audience broke the ending silence with a heavenly breath of coughing and clearing of throats ... I would have liked to hear, as an extra, "Ich bin der Welt" instead of another song of the Des Knaben Wunderhorn cycle but I understand that it would not have been suitable, because it belongs to another song cycle.

If the quality of the first part was a risk of causing an acute myocardial infarction, the second with the 1st Symphony by Mahler, the Titan, was to blaze the way through the room. The mahlerian sound produced was worthy of the best that there has been at the Gulbenkian. The direction of Philippe Jordan was of such an emotional plasticity in the gesture, that it would have been worthy of the most virtuoso dancer. The body, following the melodic line, vibrated at the same time calling for a response from the Orchestra which was in its youth elements, given with the expressiveness and joy of one who loves Mahler.



On Sunday, the Adagio of the 10th symphony, the unfinished, was interpreted with the samequality. I can not say I consider this adagio to be of the same level of many others that Mahler wrote without the presence of the voice (eg: the end of the 3rd, the 5th and the 9th symphonies) but maybe I have not heard it often enough to recognize its value.

This Mahler weekend ended with Das Lied von der Erde, where the tenor Burkhard Fritz joined Thomas Hampson. Fritz was good, though muted by the orchestra for several passages during the first movement. Hampson shone again with an interpretation of superlative quality, especially in Der Abschied.



On the celebration of 100 years since his death, once again, at the Calouste Gulbenkian Foundation, Mahler’s memory was elevated with a weekend of enviable quality.

Those wishing to explore Thomas Hampson singing Mahler, I recommend the classic recording with Bernstein and his recent CD, both with the composer's song cycles.




7 comentários:

  1. Curioso, também o wagner_fanatic gostou do Adagio... eu não, lol, mas em breve escreverei mais aprofundadamente as minhas opiniões...

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  2. Caro wagner_fanatic,

    Desta vez não pude ir à Gulbenkian, com grande pena minha. O seu relato é elucidativo e ainda me fez ficar mais triste porque acho que perdi uns espectáculos de grande qualidade.

    Não sei o que se passa actualmente com o público da Gulbenkian. Em Janeiro, quando assisti à 9ª de Mahler, também houve um comportamento vergonhoso de muitos espectadores no sublime último andamento, parecia uma competição a ver quem conseguia tossir mais e mais alto!

    Os programas trazem instruções sobre como minimizar os efeitos da tosse (falta dizer que devem cobrir a boca com um lenço, para abafar o som, que novidade!) mas ninguém os deve ler ou, pior, estão-se "nas tintas".

    Apesar de ir muito frequentemente à Gulbenkian, esta temporada tem-me parecido a pior neste aspecto (talvez esteja mais atento e intolerante...).
    Enfim, uma vergonha e um desrespeito pelos músicos e outros espectadores.

    Ainda no início do mês assisti em Munique a um concerto e a três óperas e, como também escrevi neste blogue... que diferença no civismo do público!

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  3. Caro Placido,

    Eu não disse que tinha gostado do adagio...

    Achei-o bem interpretado (não se pode comparar com a explosão sinfónica que foi a Titã, claro, e aí fica a perder sempre) mas não acho, como disse, entre as melhores criações de Mahler.

    Aguardarei os seus comentários no seu blog.

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  4. Eu gostei muito do adágio da 10ª sinfonia. As entradas das cordas emocionaram-me muito e fizeram-me lembrar Bruckner. Em relação a pousar o programa no chão durante o concerto, penso que quem gosta de seguir o texto e tem boa vista como eu, o consegue ler sem dificuldade. Procuro ter extremo cuidado na viragem das páginas para não incomodar as outras pessoas.

    Felicidades para este blog muito interessante.

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  5. Eu gostei do Adagio e também d'A Canção da terra.
    Concordo com o Wagner_fanatic quanto ao tenor. No início parecia estar a cantar com a voz para dentro, sem projecção. Depois melhorou significativamente. O Abschied de Hampson foi magnífico.

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  6. It was more than 2 years ago that I heard him as Scarpia(Kaufmann as Cavaradossi) in Zürich. Recently he sang Mahler in heidelberg. Unfortunately on account of the cold I couldn't go to the concert. Frankly I have no idea about Mahler, because I'm not a fan of symphonies. It sounds odd, but everybody has got a different taste.

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  7. @Anónimo:
    Obrigado pelos seus comentários ao blog e obrigado por ser um daqueles que respeitam os outros nos concertos.

    @Paulo:
    Caro Paulo, fico feliz por as suas opiniões serem semelhantes às minhas. Que final da Canção da Terra...

    @lotus-eater,
    If you do not know Mahler try to listen to his second symphony (if not all, at least the final movement). There is a recent and quite powerfull Rattle recording but to me, Bernstein still rules in his DG recording. Mahler is one of my favourite composers (along with Wagner and Brahms), although I haven't got into more than general details on his quite difficult emotional life.

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