terça-feira, 20 de março de 2018

IDOMENEO de W. A. MOZART — Teatro Nacional de São Carlos, 16.03.2108


A ópera em 3 actos Idomeneo, K. 366, foi estreada em Munique no ano de 1781 sob a direcção do próprio compositor: o jovem de 24 anos Wolfgang Amadeus Mozart. O libreto foi da responsabilidade de Giambattista Varesco a partir do texto de Antoine Danchet.

A acção decorre em Creta depois da Guerra de Tróia e trata do amor e do ciúme, da ambivalência entre as promessas divinas e os deveres de amor filial.

É uma ópera séria em italiano cujo drama é apresentado numa sequência de quadros dramáticos sublime e com uma música complexa, rica, ritmada, opulenta e harmoniosa típica de Mozart. É, por tudo isso, uma ópera muito bonita e agradável de seguir.

O Teatro Nacional de São Carlos apresentou uma nova produção de Yaron Lifschitz que, globalmente, permitiu o desenrolar da acção sem percalços ou perplexidades. A acção decorre em torno de uma cratera central à volta da qual as personagens se deslocam sem grande sentido. Depois, as diferentes árias vão sendo apresentadas, por regra, à boca de palco, por vezes com o pano fechado, o que nos transporta para o interior da personagem. No final, Idomeneo comunica ao povo a sua decisão sentado numa cadeira em frente a um microfone, sendo a sua imagem projectada numa tela que ocupa todo o palco, como se de uma transmissão televisiva se tratasse, no mais vistoso efeito de uma encenação cinzenta.

O pior elemento da récita foi, infelizmente, a Orquestra Sinfónica Portuguesa sob a direcção de Christian Curnyn que se viu “grega” para soar Mozart. Foi sofrível em todos os naipes e valeu-nos a capacidade de imaginar que era Mozart.

O Coro do Teatro Nacional de São Carlos também não esteve particularmente bem, sobressaindo algumas estridências que se disfarçavam em tutti e o falhanço total dos elementos masculinos no primeiro acto.


As vozes solistas, por regra, salvaram a récita.

Com grande destaque esteve a Illia de Ana Quintans. A voz é muito bonita, com o tamanho certo para estes papéis, sempre bem projectada a que associa um fraseado lindíssimo, muito elegante, e uma dicção perfeita. À óptima interpretação vocal juntou uma capacidade expressiva intensa que nos transportou para o mundo da personagem de forma exemplar, nomeadamente em Zeffiretti lusinghieri.

O Idamante de Caitlin Hulcup foi muito consistente, com uma voz agradável, sempre bem audível e com uma expressividade adequada ao papel. A caracterização e figura tornaram Idamante muito credível.

Sophie Gordeladze foi Elettra. A voz é bonita e tem uns agudos cristalinos e seguros que se sobrepuseram a uma interpretação algo apática, nomeadamente em D’Oreste, d’Ajace.

O Idomeneo de Richard Croft também esteve muito bem do ponto de vista cénico e a sua interpretação vocal foi globalmente agradável com um timbre e fraseado adequados a Mozart.

Marco Alves do Santos foi um Arbace regular. A voz é grande e bonita, mas denota algumas dificuldades neste registo mozartiano, tendo estado francamente abaixo das suas muito boas interpretações em Britten e Strauss.

O sumo-sacerdote de Bruno Almeida esteve bem no seu pequeno papel e a voz de Netuno de Rui Baeta destacou-se por ter sido um falhanço total.

A récita foi, pois, agradável porque a música de Mozart é sublime e porque a Ana Quintans esteve em São Carlos. 

Nota: É uma pena que a direcção do Teatro se preocupe tanto em impedir que se tirem fotografias durante os aplausos… Dever-se-iam preocupar mais em garantir o conforto dos espectadores melhorando as cadeiras da sala e diminuindo a temperatura digna de uma sauna…

4 comentários:

  1. Já não vou ao S. Carlos desde a Anna Bolena, excelente, e fartei-me de fotografar nos aplausos. Livrem-se de me dizer seja o que for.

    Ana Quintans é uma voz preciosa, puro diamante, mas mesmo ela não me conseguiria fazer esquecer um Mozart mal tocado. É uma vergonha. Gastam o dinheiro todo em papel, folhetos, livretos, anúncios, e más produções, antes tivessem duas boas produções por ano e mais uma de luxo importada com orquestra. maestro e tudo. Até o modesto teatro de Valadollid, ou o auditório de Oviedo, consegue melhores récitas.

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    1. Tomo o atrevimento de concordar consigo,caro Mário Gonçalves. Menos óperas por temporada,com mais récitas e à altura duma capital europeia,como é Lisboa.

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  2. No geral estou de acordo com o SR.Camo_Ópera. Eu assisti à última récita. Achei os cantores portugueses muito bem,destacando também,pela excelência,ANA QUINTANS. Gostei igualmente da Caitlin Hulcup e do Croft,contudo não gostei dos seus recitativos pela sua deficiente dicção no italiano.Não gostei nada da Gordladze. Na maior parte das areas achei a voz extridente,desafinada e em esforço. Achei a encenação pobre mas gostei do guarda-roupa.Apesar do que se tem assistido nos últimos tempos no São
    Carlos,foi uma récita agradável. Vamos esperar pelas próximas. Por último: também achei a parte da proibição das fotos extra-espectáculo um axagero. Eu quis tirar uma foto durante o intervalo e veio logo um arrumador chamar-me a atenção.

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  3. Também assisti à última récita e concordo globalmente com as opiniões aqui referidas. Os cantores foram bons para o que temos tido, mas tudo o resto foi fraco ou mau. Não gostei da encenação, não por ser simples, mas por ser pouco clara para mim. Os 4 bailarinos foram uma distração dispensável e as intervenções cénicas do coro também não foram interessantes. Contudo, de todos os espectáculos que vi este ano, foi o primeiro que não pareceu tanto uma versão concerto disfarçada!
    A orquestra esteve particularmente mal, não se ouviu Mozart na sala.
    E o calor era insuportável.
    Também me parece no mínimo risível que, depois do espectáculo terminar, quando decorrem os aplausos, não permitirem fotografias, havendo tantas coisas mais importantes com que os responsáveis pelo nosso único teatro de ópera se deveriam preocupar! Pelo mundo fora, mesmo nas grandes catedrais da ópera, não é permitido (e bem) tirar fotografias durante o espectáculo, mas quando acaba, ninguém diz nada. Aqui, num teatro que, infelizmente, oferece espectáculos de 3ª categoria, esta parece ser uma grande preocupação. Ridículo!!

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