quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

GÖTTERDÄMMERUNG / O CREPÚSCULO DOS DEUSES, Royal Opera House, Novembro / November 2018



 (review in English below)

A última ópera do Anel de Londres foi talvez a melhor. A encenação manteve a linha desinteressante. As Nornas no início vão manipulando as cordas vermelhas do destino já vistas anteriormente, numa abordagem muito convencional.



A sala dos Gibichung está enquadrada por paredes que imitam o Tarnhelm, mas nada mais há digno de nota. Aparecem umas estátuas douradas dos deuses evocados, Freia, Fricka, Froh e Donner.
Na cena de caça, é morto um antílope que é posteriormente desmembrado e distribuído por vários figurantes, mas o animal continua intacto quando sai de cena. O Siegfried, depois de morto pelo Hagen, fica caído no palco, sozinho, e durante a marcha fúnebre nada acontece, para além de o palco recuar um pouco. Depois é totalmente embrulhado em panos brancos e assim permanece num barco.
No final os 3 quadrados que aparecem na base do cenário (onde anteriormente era o Reno) incendeiam-se e as estátuas dos deuses já referidas são içadas por cordas e neles introduzidas. A Brünhilde atira-se às chamas e a ópera termina com ela a ser içada numa estrutura metálica, depois de tudo ser consumido pelo fogo.



A Orquestra esteve quase sempre muito bem, mas achei que a marcha fúnebre, talvez o momento mais belo e solene da ópera, esteve aquém do desejável. Houve algumas entradas tardias dos metais e o andamento imposto pelo Antonio Pappano não foi o melhor. E foi uma pena.



Já o Coro esteve ao mais alto nível. Quanto aos solistas, houve de tudo, desde o aceitável ao transcendental.

As 3 Nornas foram muito uniformes e vocalmente irrepreensíveis (Primeira Norna, Claudia Huckle; Segunda Norna, Irmgard Vilsmaier; Terceira Norna, Lise Davidsen).



Também as 3 Filhas do Reno estiveram muito bem, Lauren Fagan (Woglinde),
Christina Bock (Wellgunde) e Angela Simkin (Flossilde). 



O Siegfried do Stefan Vinke teve boa presença cénica mas foi irregular na linha de canto, alternando períodos em que quase se não ouvia com outros em que cantava muito alto. O 3º acto foi a sua melhor prestação em todo o Anel.



Johannes Martin Kränzle manteve uma óptima actuação como Alberich, embora o papel seja pequeno nesta ópera, mas ainda assim foi suficiente para o encenar de forma ridícula, num barco e com máscara de oxigénio.



Karen Cargill foi uma excelente Waltraute de voz grave e poderosa, e timbre bonito e cativante.



O Gunter do Markus Butter esteve muito aquém do desejável num elenco destes. O desempenho cénico até foi bom, mas o cantor tem uma voz pequena, mal projectada e foi frequentemente afogado pela orquestra.



Também a Emily Magee (Sieglinde na Valquíria) voltou a decepcionar como Gutrune. Muito exuberante em palco mas a voz ouviu-se mal e foi algo monocórdica em toda a actuação.



Fantástico foi o baixo Stephen Milling como Hagen. Voz muito bonita, forte, sempre audível sobre a orquestra e uma presença cénica irrepreensível no papel cínico e malévolo da ópera. O melhor de entre os homens.



Finalmente a Brünhilde da Nina Stemme. Foi excelente nos dois primeiros actos, o diálogo com a Waltraute foi marcante, mas no final da ópera foi arrasadora! Os últimos 20 minutos foram os melhores de todo o Anel. A Stemme esteve ao nível da sua compatriota Birgit Nilsson e cantou com uma intensidade dramática comovente, como raramente se tem oportunidade de ver e ouvir. Não tenho palavras para descrever com fidelidade aqueles momentos transcendentais a que assistimos.










A Royal Opera só vendeu bilhetes para o Anel inteiro. No final, o público, maioritariamente conhecedor (um anel completo não é nem para curiosos, nem para amadores, nem para principiantes) brindou a Nina Stemme, e apenas ela, com uma explosão de aplausos que a casa quase veio abaixo. E esta expressão aqui aplica-se literalmente porque a pateada, gigantesca e demorada, é rara e apenas surge quando a coisa é excepcional, ao contrário do que se passa em Portugal (onde é sinal de desagrado). Estive no balcão e o chão literalmente tremeu durante uns largos minutos. Grande Stemme!!


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GÖTTERDÄMMERUNG / THE TWILIGHT OF THE GODS, Royal Opera House, November 2018

The last opera of the Ring of London was perhaps the best. The production kept uninteresting. The Norns at the beginning manipulate the red strings of fate previously seen in a very conventional approach.
The room of the Gibichungs is framed by walls that imitate the Tarnhelm, but nothing else is worth noting. Some golden statues of the evoked gods Freia, Fricka, Froh and Donner appear.
In the hunting scene, an antelope is killed and is later dismembered and distributed by several people, but the animal remains intact when it is removed from the scene. Siegfried, after being killed by Hagen, lies on the stage alone, and during the funeral march nothing happens, in addition to the stage retreating a little. Then he is totally wrapped in white cloths and so stays in a boat.
At the end the three squares that appear at the base of the scene (where previously it was the Rhine) are set fire and the statues of the already mentioned gods are lifted by ropes and introduced in them. Brünhilde throws herself into the flames, and the opera ends with her being hoisted into a metal frame, after everything is consumed by fire.

The Orchestra was almost always very well, but I thought that the funeral march, perhaps the most beautiful and solemn moment of the opera, was far from desirable. There were some late innings of the metals and the tempo imposed by Antonio Pappano was not the best. And it was a pity.

In contrary, the Choir was at the highest level. As for the soloists, there was everything from the acceptable to the transcendental.

The 3 Norns were very uniform and vocally irreproachable (First Norn, Claudia Huckle, Second Norn, Irmgard Vilsmaier, Third Norn, Lise Davidsen).

Also the 3 Daughters of the Rhine were very good, Lauren Fagan (Woglinde),
Christina Bock (Wellgunde) and Angela Simkin (Flossilde).

Stefan Vinke's Siegfried had a good stage presence but was irregular on the singing line, alternating periods when he almost was not listened to others in which he sang very loudly. The 3rd act was his best performance throughout the Ring.

Johannes Martin Kränzle maintained a great performance as Alberich, although the role is small in this opera, but was still enough to stage him ridiculously, in a boat and with an oxygen mask.

Karen Cargill was an excellent Waltraute with a powerful low voice, and a beautiful and captivating timbre.

Markus Butter's Gunter was far from desirable in a cast such as these. The scenic performance was even good, but the singer had a small voice, poorly projected and was often drowned by the orchestra.

Also Emily Magee (Sieglinde in Valkyrie) again disappointed as Gutrune. Very exuberant on stage but the voice was badly heard and was something monoric throughout the performance.

Fantastic was bass Stephen Milling as Hagen. Very beautiful voice, strong, always audible over the orchestra and an irreprehensible stage presence in the cynical and malicious role of the opera. The best singer among men.

Finally Nina Stemme’s Brünhilde. She was excellent in the first two acts, the dialogue with Waltraute was remarkable, but at the end of the opera she was devastating! The last 20 minutes were the best of the entire Ring. Stemme was at the level of her compatriot Birgit Nilsson and sang with dramatic intensity, as we rarely get a chance to see and hear. I have no words to faithfully describe those transcendental moments we have witnessed.

The Royal Opera only sold tickets for the entire Ring. In the end, the mostly knowledgeable audience (a complete ring is neither for the curious, nor for amateurs, nor for beginners) offered Nina Stemme, and only her, with an explosion of applause that the house almost came down. And this expression here applies literally because the gigantic and long foot kick is rare and only comes when the thing is exceptional, unlike what happens in Portugal (where it is a sign of displeasure). I was on the balcony and the floor literally shook for long minutes. Great Stemme!!

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