segunda-feira, 13 de outubro de 2014

WAR REQUIEM, Benjamin Britten, Fundação Calouste Gulbenkian, Outubro de 2014 - Crítica de Francisco Casegas

(imagem - Fundação Calouste Gulbenkian)
No passado dia 3 de Outubro tive a oportunidade de assistir na Fundação Calouste Gulbenkian ao War Requiem, composto pelo britânico Benjamin Britten em 1961-62 e interpretado pela Orquestra e Coro Gulbenkian, pelo Coro infantil da academia de música de Santa Cecília e por 3 solistas. O baritono Hanno Müller Brachmann, o tenor John Mark Ainsley e a soprano Tatiana Pavlovskaya.
O War Requiem foi escrito para ser estreado nas cerimónias de inauguração da nova catedral de Coventry em 1962. Podem ser lidas mais informações sobre a obra no programa de sala disponibilizado no seguinte link:
http://www.musica.gulbenkian.pt/2014_2015/files/00000000/00000025_0015.pdf
A orquestra Gulbenkian dirigida por Paul McCresh esteve num nível muito bom. Sempre muito bem afinada e entrosada com os solistas.
O coro Gulbenkian esteve como sempre, imaculado, oferecendo-nos de novo uma exibição de luxo.
O coro infantil da academia de Santa Cecília também esteve muito bem e destaco o facto de ter estado sempre nos bastidores para simular as vozes distantes das crianças. Ideia muito inteligente e bem conseguida
Os solistas estiveram todos em muito bom nível mas destaco o barítono Hanno Müller Brachmann que tem um timbre muito agradável e que nos ofereceu em conjunto com o tenor John Mark Ainsley um “Let us sleep now” (para muitos o ponto alto da obra) de extraordinária qualidade e beleza. Destaque também para a soprano Tatiana Pavlovskaya que demonstrou uma excelente projecção de voz nas poucas mas exigentes intervenções.
Infelizmente houve também pontos menos positivos durante esta récita totalmente por culpa do público. Apesar do aviso constante da FCG no início dos espetáculos para os espectadores desligarem o telemóvel, houve quem conseguisse que o seu telemóvel tocasse 2 vezes, levando o maestro a virar-se para o público, mostrando um ar profundamente reprovador. Como se isto não bastasse também houve quem demorasse 15 minutos a abrir um rebuçado, sempre com aquele barulhinho estridente do pacote o que também levou a alguns olhares furiosos por parte de alguns elementos da orquestra. Como se não bastasse isto, no silêncio posterior ao término da obra houve quem se assoasse estridentemente, fazendo parecer que o grupo de percussão da orquestra ainda estava a actuar.

No geral faço um balanço muito positivo da récita e o público confirmou isso aplaudindo entusiasticamente no seu final, mas penso que já está mais do que na altura de algumas pessoas se começaram a comportar de forma minimamente decente num ambiente destes, visto não estamos a falar propriamente de crianças ou adolescentes.
Em nome dos "Fanáticos da Ópera" agradecemos ao Francisco Casegas esta sua primeira (e óptima) contribuição para o blogue.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

MACBETH, METropolitan OPERA, Outubro de 2014 / October 2014


(review in english below)

Iniciei a minha temporada de 2014/2015 com a opera Macbeth de G. Verdi, na METropolitan Opera de Nova Iorque, onde assisti a duas récitas. Já há dias escrevi aqui uma pequena nota sobre o fabuloso desempenho de Anna Netrebko.


A encenação de Adrian Noble é minimalista mas muito eficaz e de belo efeito. A acção foi transportada para o período pós segunda guerra no século XX. Árvores ao fundo integram a floresta e umas grandes colunas negras e móveis dão corpo ao palácio. Apenas cadeiras, lustres e uma toalha completam os cenários. As bruxas vêm vestidas de vagabundos.





Dirigiu o actual maestro principal, Fabio Luigi. Coro e Orquestra ao mais alto nível. E, quanto aos solistas, seria muito difícil oferecer melhor:


 Macbeth foi magnificamente interpretado pelo barítono sérvio Zeljko Lucic. Um verdadeiro barítono verdiano com voz poderosa, bonita e muito expressiva. O cantor conseguiu transmitir toda a angustia da personagem e foi insuperável nas cenas das visões. Fantástico!


Anna Netrebko arrasou! Surge numa cama, lê a carta do marido e canta magistralmente a primeira ária Vieni, t’affretta! Daí em diante domina todo o espectáculo. Transborda sensualidade, malvadez e domínio. O canto é de uma beleza ímpar, aqui e acolá ornamentado com notas estratosféricas, sempre bem audíveis e em perfeita afinação. A famosa cena do sonambulismo culmina uma actuação inesquecível!





O baixo René Pape foi outro excelente intérprete. Esteve muito bem tanto vocal como cenicamente. Como morre relativamente cedo, a interpretação vocal não é muito longa (nesta encenação continua a aparecer em cena depois de morto) mas chega para que o cantor nos brinde com a sua magnífica e sempre afinada voz.


O tenor Joseph Calleja completou o rol de solistas, no papel de Macduff. Também esteve ao mais alto nível, cantando sempre de forma expressiva e bem audível. O timbre é algo peculiar, mas esteve em grande forma.


Os cantores secundários também nos ofereceram muito boas interpretações.




Um elenco de luxo numa magnífica produção da Metropolitan Opera.







Mas a noite foi de Anna Netrebko!

*****


MACBETH, Metropolitan Opera, October 2014

I started my 2014/2015 season with the opera Macbeth by G. Verdi, at the Metropolitan Opera in New York, where I attended two performances. Some days ago I already wrote here a little note about the fabulous performance of Anna Netrebko.

The production by Adrian Noble is minimalist but very effective and of beautiful effect. The action was transported to the post second war in the twentieth century. Trees in the background are part of the forest and large black columns represent the palace. Only chairs, chandeliers and a towel complete the scenarios. The witches come dressed as bums.

The performance was directed the current principal conductor, Fabio Luigi. Choir and Orchestra were at the highest level. And as for the soloists, it would be very difficult to offer better:

Macbeth was magnificently interpreted by Serbian baritone Zeljko Lucic. He has a powerful, beautiful and very expressive voice. The singer managed to convey all the anguish of the character and was unsurpassed in the scenes of visions.

Anna Netrebko smashed! She appears on a bed, reads a letter from her husband, and masterfully sings the first aria Vieni, t'affretta! Thereafter she dominates the entire opera. Overflowing sensuality, wickedness and dominance. The singing is of a unique beauty, here and there ornamented with stratospheric notes, always very audible and in perfect pitch. The famous sleepwalking scene culminates an unforgettable performance!

Bass René Pape was another outstanding performer. He was good vocal and onstage. As he dies relatively early in the opera, the singing is not very long (in this staging he continues to appear on stage after death) but enough for the singer to offer us his magnificent voice, always in tune.

Tenor Joseph Calleja completed the roster of soloists, in the role of Macduff. He was also at the highest level, always singing expressively and well audible. The timbre is something peculiar, but he was very good.

Secondary singers also offered us very good performances.
An all-star cast in a magnificent production of the Metropolitan Opera.

But the night was Anna Netrebko’s!

*****

domingo, 5 de outubro de 2014

LADY (Macbeth) NETREBKO na METropolitan OPERA – a não perder! / Lady (Macbeth) Netrebko at the Met – do not miss!

Fotografia / Photo Marty Sohl (Met Opera)

 (text in english below)

Macbeth, de G. Verdi, está em cena na METropolitan Opera. Será transmitida para todo o mundo no MetLive dentro de dias. Escreverei novamente sobre toda a produção em breve mas não quero deixar esta nota desde já.




O papel mais relevante na opera é o da Lady Macbeth. Provocadora, sensual, pérfida e dominadora do seu atormentado marido, Anna Netrebko encarna a personagem de forma notável! A não perder.

                                     Fotografia / Photo Marty Sohl (Met Opera)

                                    Fotografia / Photo Marty Sohl (Met Opera)


Com a acção transportada para o Séc XX no pós guerra, a cantora oferece-nos uma Lady Macbeth loira e descalça, mas é a sua interpretação vocal que mais impressiona. Se não tem todos os graves, nos outros registos é fabulosa e enche completamente o gigantesco teatro com a sua belíssima voz quente, sem nunca gritar e alcançando notas agudas estratosféricas com uma qualidade marcante! Apesar de cantar agora os papéis de soprano dramático, a voz ainda é muito lírica e de uma qualidade ímpar. Os  outros solistas são de primeira água, mas ela supera-os todos!


Grande Netrebko!



Lady (Macbeth) Netrebko at the Met - do not miss!

Macbeth by G. Verdi, is on stage at the Metropolitan Opera. It will soon be broadcast around the world in MetLive. I will write again about the whole production soon but I do want to leave this note now.

The most important role in the opera is the one of Lady Macbeth. Provocative, perfidious and dominating her tormented husband, Anna Netrebko embodies the character remarkably well! Not to be missed.

With the action moved to the postwar twentieth century, the singer offers us a blonde and barefoot Lady Macbeth, but the most impressive is her vocal performance. If she does not have all low notes, in all other registers she is fabulous and completely fills the gigantic theater with her beautiful warm voice, never screaming and reaching stratospheric high notes with an outstanding quality! She moved recently to dramatic soprano roles, but her voice still sounds very lyric. The other soloists are top quality, but she overcomes them all!

Great Netrebko!

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

RIGOLETTO, Opera de Zurique, Fevereiro de 2014 / Zurich Opernhaus, February 2014


(review in english below)

Mais uma vez tive oportunidade de ver o Rigoletto de Verdi, numa deslocação à Suiça. Das três óperas que vi em Zurique, esta era aquela que me despertava menor interesse e vi-a apenas porque estava em cena na altura. Mal imaginava a surpresa que iria ter.

Foi uma Volksvorstellung, uma récita popular, com preços muito abaixo do habitual, mas com elenco idêntico ao das récitas “normais”.

A encenação de Tatjana Gürbaca foi caricata. Do início ao fim do espectáculo o palco tinha no centro uma grande mesa rectangular, coberta por uma toalha branca e rodeada por cadeiras. Toda a acção se passou à volta, em cima ou por baixo da mesa e das cadeiras, com os cantores em trajos informais actuais. O Rigoletto não é corcunda, o Duque aparece inicialmente de calções e ténis, e os outros todos vestidos de forma semelhante. Penso que não é necessário descrever mais nada.


 A direcção musical foi do maestro Stefan Blunier e, não tendo sido isenta de pequenas falhas e desencontros, na globalidade esteve bem.


 Verdadeiramente sensacional foi a qualidade interpretativa de todos os cantores! Foi talvez o melhor Rigoletto que ouvi ao vivo e esta é das óperas que já devo ter visto umas dezenas de vezes. Como dizia a minha companheira, com este nível interpretativo, nem se repara na encenação. Não partilho totalmente desta opinião mas, hoje, confesso que também o senti.

 Rigoletto foi cantado pelo barítono polaco Andrzej Dobber. Tem uma voz belíssima, muito expressiva, emotiva e de uma potência avassaladora. É um papel em que já o tinha ouvido, mas nesta récita achei a sua interpretação superlativa.


 O tenor albanês Saimir Pirgu que, finalmente, voltei a ouvir ao vivo depois das duas óperas que cantou em Lisboa há anos, foi o melhor Duque que vi nos últimos tempos. Tem uma excelente presença física, a voz é forte e de uma beleza invulgar, os agudos são fáceis, luminosos e emitidos aparentemente sem esforço.



 A Gilda foi interpretada pelo soprano russo Olesya Golovneva, uma substituição de última hora. A cantora tem uma figura magra, pequena e frágil, parece uma adolescente de 15 anos, mas a voz é arrasadora. Canta fabulosamente em todos os registos, deve ouvir-se até fora do teatro e, contudo, sempre que quer, é de uma suavidade tocante.



 O baixo italiano Andrea Mastroni impôs-se como Sparafucile, com um vozeirão de fazer tremer o chão e, também, de timbre invulgarmente agradável.


 Outra voz de qualidade muito acima do habitual foi a do barítono ucraniano Valery Murga como Conde Monterone.


 A Maddalena do mezzo suíço Judith Schmid foi, vocalmente, a menos espectacular mas, ainda assim, não destoou.


 Merecem também uma palavra de apreço as óptimas interpretações dos cantores secundários, Júlia Riley como Giovanna, Cheyne Davidson como Marullo, Yuriy Tsiple como conde Ceprano e Deanna Breiwick como condessa Ceprano.






 Numa encenação deplorável, um Rigoletto de luxo na ópera de Zurique, para ver de olhos fechados!

****

Rigoletto Zurich Opera, February 2014

Again I had the opportunity to see Verdi's Rigoletto during a recent trip to Switzerland From the three operas I attended in Zurich, this was the one in which I had less interest. I saw it just because it was on at the time. I could not anticipate the surprise I would have.

It was a Volksvorstellung, a performance with prices far below the usual but with the cast identical to the " normal " performances..

The staging by Tatjana Gürbaca was ridiculous. From start to finish the stage had in the center a large rectangular table covered with a white cloth and surrounded by chairs. All the action happened around, over, or under the table and chairs, with the singers in current informal costumes. Rigoletto was not hunchback, the Duke appears initially in shorts and tennis shoes, and all others dressed similarly. I think it is not necessary to describe anything else

Musical direction of conductor Stefan Blunier has not been free of small flaws but, on the whole, it was good.

Truly sensational was the quality of all singers! This was perhaps the best Rigoletto I've heard live, and this is an opera that I have already seen many many times.

As my companion said, with this interpretive level, we even do not notice what is happening on stage. I do not fully share her view but, this night, I confess I also felt that.

 Rigoletto was sung by the Polish baritone Andrzej Dobber  He has a very expressive, emotive and with an overwhelming powerful and beautiful voice. It's a role in which I had already heard him, but in this performance I found his interpretation superlative.

Albanian tenor Saimir Pirgu that I finally could hear live after the two operas he sung in Lisbon several years ago, was the best Duke I've seen in recent times. Has an excellent stage presence, the voice is strong and of an unusual beauty, the top notes are easy, bright and seemingly effortless issued .

Gilda was interpreted by Russian soprano Olesya Golovneva a last minute replacement. The singer has a thin, small, frail figure, looks like a 15 year old adolescent, but her voice is overwhelming. She sings fabulously in all registers, must have been hear even outside the theatre and yet, whenever necessary, she was of a touching softness.

Italian bass Andrea Mastroni was Sparafucile, with a booming voice “to shake the ground” and with an unusually pleasant timbre.

Another voice of much higher quality than usual was Ukrainian baritone´s Valery Murga as Count Monterone.

Swiss mezzo Judith Schmid was Maddalena, vocally the less spectacular but still very good.


A final word of appreciation for the good performances of the other singers, Julia Riley as Giovanna, Cheyne Davidson as Marullo, Yuriy Tsiple as Count Ceprano, and Deanna Breiwick as Countess Ceprano .

A deplorable staging but luxury Rigoletto at the Zurich Opera, to see eyes wide shut!

****