sábado, 20 de fevereiro de 2016

Tosses! e WINTERREISE, Fundação Gulbenkian. Fevereiro de 2016



Assisti ontem na Fundação Gulbenkian à Winterreise (Viagem de Inverno), ciclo de canções de F. Schubert com base em poemas de Wilhelm Müller, numa produção multimédia originária do Festival d’Aix-en-Provence, com encenação e criação visual de William Kentridge.



Imediatamente antes do início do espectáculo, entrou em palco o director do Serviço de Música da Gulbenkian, o finlandês Risto Nieminen que, num português muito aceitável, pediu ao público para desligar os telemóveis e para não tossir, o que quebraria a concentração do cantor!! (Até demonstrou como, em necessidade imperiosa, se deveria proceder). Repetiu em inglês, mas apenas pediu para desligar os telemóveis. Logo por detrás de mim uns estrangeiros comentaram que se podia tossir apenas em inglês... E, sabem que mais, o pedido foi eficaz!! Praticamente não se ouviram tosses e, as poucas que ouvi, foram nos intervalos das canções! Por favor Risto, volte sempre!!

Já muitas vezes eu e outros autores deste blogue salientámos a excessiva frequência com que o selecto público da Gulbenkian tosse nos concertos e, quando começam as tosses, propagam-se exponencialmente, como se de uma competição se tratasse, tipo “vamos ver quem tosse mais alto” ou “vamos ver quem consegue perturbar mais o espectáculo” ou “vamos estabelecer um diálogo tússico a muitas vozes”! Ter o director da Música da Gulbenkian a pedir para não se tossir só prova que, de facto, o desrespeito dos “tossidores” pelos outros é marcante! E a prova de que é um fenómeno que mereceria uma análise, no mínimo, comportamental e psico-sociológica, foi o que assistimos ontem, em pleno inverno e num dia de frio em que, depois do puxão de orelhas, não se tossiu! Repito o apelo – Risto, volte sempre!!

O espectáculo foi visualmente muito interessante, mas o que mais interessava era a música. A interpretação foi de elevado nível. Markus Hinterhäuser ao piano foi fabuloso na forma como interpretou as canções de Schubert e, para mim, foi o melhor de todo o espectáculo.



O conceituado barítono alemão Mathias Göerne não deixou os seus créditos por mãos alheias e também nos ofereceu uma interpretação marcante em sensibilidade e intensidade dramáticas, para as quais muito contribui a qualidade e beleza invulgar do timbre vocal. O único senão foi a inspiração ruidosa que ocasionalmente fez, que muito perturbou a beleza da interpretação vocal.

Foi um excelente espectáculo mas, o que mais o marcou, foi a eficaz intervenção de Risto Nieminen pedindo, apenas aos portugueses, para que não tossissem!!


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1 comentário:

  1. O espectáculo foi soberbo, quer vocal, quer musicalmente. E a encenação também. Criou-se um espectáculo intimista que foi mesmo muito bonito e um momento de exaltação artística. Já quanto ao aviso de Nieminen, por muito que tenha sido eficaz (foi-o, de facto), senti-o que estava a ser tratado como uma criança mal educada ou um inculto e selvagem, pelo que achei dispensável.

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