segunda-feira, 20 de junho de 2016

NABUCCO, Teatro Nacional de São Carlos, Junho de 2016



José António Miranda, mais uma vez, colabora activamente no blogue com mais este texto que, como sempre, agradecemos.

16/06/2016     Teatro Nacional de São Carlos (Lisboa)
NABUCCO    (Giuseppe Verdi)
Ópera em quatro Actos   (1842)
Libreto: Temistocle Solera, a partir de Nabuchodonosor, de A.Bourgeois e
F.Cornue.
Direção musical: Antonio Pirolli
Encenação: André Heller-Lopes
Cenografia: Renato Theobaldo
Roupas: Marcelo Marques
Luzes: Fabio Retti

Nabucco: Àngel Òdena
Abigaille: Elisabete Matos
Zaccaria: Simon Lim
Fenena: Maria Luísa de Freitas
Ismaele: Carlos Cardoso
Grande Sacerdote: Mário Redondo
Anna: Carla Simões
Sacerdote: André Henriques
Abdallo: Pedro Rodrigues

Orquestra Sinfónica Portuguesa
Coro do Teatro Nacional de São Carlos   Dir: Giovanni Andreoli
Produção: Theatro Municipal do Rio de Janeiro (2011), Recriação TNSC
(2016)


Para um encenador que queira hoje dar-nos a ver esta produção do jovem Verdi abrem-se em princípio duas portas possíveis.

A primeira, a mais fácil de abrir, será contar-nos a história tal e qual, numa perspectiva conservadora e tradicionalista, concebendo portanto mais uma versão literal da narrativa bíblica e assim acrescentando (se para tal tiver engenho) mais um ícone à extensa galeria do folclore que ilustra o mito para consumo popular.

A segunda porta, para cuja abertura se requer um pouco mais de trabalho e alguma ousadia (ou se possível uma centelha de génio), será deslocar de algum modo aquela narrativa para fora dos estritos limites da sua leitura literal, conseguindo desse modo contar-nos uma história cujos referentes, com ou sem transposição temporal, nos sejam familiares hoje.

No caso presente, em que o libreto de Solera nos conta uma complexa história de conflitos entre sírios e hebreus, com violentas guerras nos territórios da Palestina, da Síria e do Iraque, cruéis deslocações de refugiados em confrontos de religiões sectárias e antagónicas, com o habitual cortejo de intolerância e de crueldade, de massacres e escravatura, de imolações, martírios e santificações prometidas em paraísos a conquistar, parece óbvio que a opção por referentes
familiares aos nossos dias estaria facilitada. Nada de mais vulgar nos dias de hoje...

Em qualquer dos casos o trabalho de encenação consistiria em tornar operacional a narrativa, ou seja, contar-nos a história com a fluência mínima necessária para nos levar atrás dela com maior ou menor encantamento e reflexão.

Esse trabalho mínimo não foi porém conseguido desta vez no palco do Teatro Sâo Carlos

O que vimos não foi a narração textual de uma aventura bíblica recheada de instrutivas peripécias compondo o mito para consumo recreativo popular.

Também não nos foi apresentada nenhuma narrativa pedagógica, que por extracção da aventura bíblica nos fizesse de algum modo reflectir sobre a sua contingência e intemporalidade.

De facto o que o encenador nos propôs no palco do São Carlos não foi nem um peplum nem um filme de arte e ensaio, mas apenas um conjunto de cromos, como imagens de Épinal, vagarosamente apresentados como num velho diaporama em três dimensões para nosso inocente saborear.

E o público do teatro, perdida de há longa data a convivência regular com as dinâmicas próprias da narrativa dramática, contentou-se com a proposta e reagiu em consonância. Um exemplo flagrante desse padrão
reactivo foram os aplausos intempestivos irrompendo por cima dos últimos compassos do coral mais emblemático da obra, Va pensiero.

Na realidade neste caso não era necessário esperar pelo fim para ter já tudo visto e apreciado. Os derradeiros momentos orquestrais, que numa perspectiva dinâmica concentram em si e resolvem toda a emoção desenvolvida na peça coral, não eram já necessários, logo podiam ser abafados pelos aplausos.

Expliquemo-nos. De facto, o que nos fora mostrado para ver antes, mero conjunto de cromos com momentos de súbita animação (nesta cena a frenética e brusca escalada do cenário) estava há muito concluído, e portanto a dinâmica da partitura, sem a necessária correspondência dramática e visual, foi naturalmente ignorada.

Como todos sabemos e este exemplo ilustra, os públicos conquistam-se ou perdem-se, educam-se ou desperdiçam-se, e cada teatro tem portanto o público que merece.

Tal como os espectadores do nosso teatro, o coro e a orquestra continuam a evidenciar os resultados da desastrada gestão das últimas temporadas, neste caso porém um pouco atenuados pela gravitas da obra: “noblesse oblige”…

Dos cantores, pobres seres animados colocados em locais predefinidos dos quadros apresentados, apenas destacarei André Henriques, pela inteligência da composição que conseguiu fazer para o seu pequeno papel: qualidade e segurança vocais enxertadas num desempenho dramático simultaneamente fluido e profundo, um ser vivo deambulando num jardim de estátuas cantantes….

JAM    17/06/2016

3 comentários:

  1. Estava com a impressão de que as críticas estavam todas demasiado simpáticas.

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  2. Can't translate - is this available for download? Thank you.

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    Respostas
    1. Dear Mr Berger,
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      Regards
      fanatico.um@gmail.com

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