José António Miranda, mais uma vez, colabora
activamente no blogue com mais este texto que, como sempre, agradecemos.
16/06/2016
Teatro Nacional de São Carlos (Lisboa)
NABUCCO
(Giuseppe Verdi)
Ópera em quatro Actos
(1842)
Libreto: Temistocle Solera,
a partir de Nabuchodonosor, de A.Bourgeois e
F.Cornue.
Direção musical: Antonio
Pirolli
Encenação: André
Heller-Lopes
Cenografia: Renato
Theobaldo
Roupas: Marcelo Marques
Luzes: Fabio Retti
Nabucco: Àngel Òdena
Abigaille: Elisabete Matos
Zaccaria: Simon Lim
Fenena: Maria Luísa de
Freitas
Ismaele: Carlos Cardoso
Grande Sacerdote: Mário
Redondo
Anna: Carla Simões
Sacerdote: André Henriques
Abdallo: Pedro Rodrigues
Orquestra Sinfónica
Portuguesa
Coro do Teatro Nacional de
São Carlos Dir: Giovanni Andreoli
Produção: Theatro Municipal
do Rio de Janeiro (2011), Recriação TNSC
(2016)
Para um encenador que
queira hoje dar-nos a ver esta produção do jovem Verdi abrem-se em princípio
duas portas possíveis.
A primeira, a mais fácil de
abrir, será contar-nos a história tal e qual, numa perspectiva conservadora e
tradicionalista, concebendo portanto mais uma versão literal da narrativa
bíblica e assim acrescentando (se para tal tiver engenho) mais um ícone à
extensa galeria do folclore que ilustra o mito para consumo popular.
A segunda porta, para cuja
abertura se requer um pouco mais de trabalho e alguma ousadia (ou se possível
uma centelha de génio), será deslocar de algum modo aquela narrativa para fora
dos estritos limites da sua leitura literal, conseguindo desse modo contar-nos
uma história cujos referentes, com ou sem transposição temporal, nos sejam
familiares hoje.
No caso presente, em que o
libreto de Solera nos conta uma complexa história de conflitos entre sírios e
hebreus, com violentas guerras nos territórios da Palestina, da Síria e do
Iraque, cruéis deslocações de refugiados em confrontos de religiões sectárias e
antagónicas, com o habitual cortejo de intolerância e de crueldade, de
massacres e escravatura, de imolações, martírios e santificações prometidas em
paraísos a conquistar, parece óbvio que a opção por referentes
familiares aos nossos dias
estaria facilitada. Nada de mais vulgar nos dias de hoje...
Em qualquer dos casos o
trabalho de encenação consistiria em tornar operacional a narrativa, ou seja,
contar-nos a história com a fluência mínima necessária para nos levar atrás
dela com maior ou menor encantamento e reflexão.
Esse trabalho mínimo não
foi porém conseguido desta vez no palco do Teatro Sâo Carlos
O que vimos não foi a
narração textual de uma aventura bíblica recheada de instrutivas peripécias
compondo o mito para consumo recreativo popular.
Também não nos foi
apresentada nenhuma narrativa pedagógica, que por extracção da aventura bíblica
nos fizesse de algum modo reflectir sobre a sua contingência e intemporalidade.
De facto o que o encenador
nos propôs no palco do São Carlos não foi nem um peplum nem um filme de arte e
ensaio, mas apenas um conjunto de cromos, como imagens de Épinal, vagarosamente
apresentados como num velho diaporama em três dimensões para nosso inocente
saborear.
E o público do teatro,
perdida de há longa data a convivência regular com as dinâmicas próprias da
narrativa dramática, contentou-se com a proposta e reagiu em consonância. Um
exemplo flagrante desse padrão
reactivo foram os aplausos
intempestivos irrompendo por cima dos últimos compassos do coral mais
emblemático da obra, Va pensiero.
Na realidade neste caso não
era necessário esperar pelo fim para ter já tudo visto e apreciado. Os
derradeiros momentos orquestrais, que numa perspectiva dinâmica concentram em
si e resolvem toda a emoção desenvolvida na peça coral, não eram já
necessários, logo podiam ser abafados pelos aplausos.
Expliquemo-nos. De facto, o
que nos fora mostrado para ver antes, mero conjunto de cromos com momentos de
súbita animação (nesta cena a frenética e brusca escalada do cenário) estava há
muito concluído, e portanto a dinâmica da partitura, sem a necessária
correspondência dramática e visual, foi naturalmente ignorada.
Como todos sabemos e este
exemplo ilustra, os públicos conquistam-se ou perdem-se, educam-se ou
desperdiçam-se, e cada teatro tem portanto o público que merece.
Tal como os espectadores do
nosso teatro, o coro e a orquestra continuam a evidenciar os resultados da
desastrada gestão das últimas temporadas, neste caso porém um pouco atenuados
pela gravitas da obra: “noblesse oblige”…
Dos cantores, pobres seres
animados colocados em locais predefinidos dos quadros apresentados, apenas
destacarei André Henriques, pela inteligência da composição que conseguiu fazer
para o seu pequeno papel: qualidade e segurança vocais enxertadas num
desempenho dramático simultaneamente fluido e profundo, um ser vivo deambulando
num jardim de estátuas cantantes….
JAM 17/06/2016
Estava com a impressão de que as críticas estavam todas demasiado simpáticas.
ResponderEliminarCan't translate - is this available for download? Thank you.
ResponderEliminarDear Mr Berger,
EliminarI will be very happy to send you the translation of this text if you send me an email contact.
Regards
fanatico.um@gmail.com