(review in English below)
Tannhäuser é uma das óperas de
Richard Wagner que mais vezes tive oportunidade de ver. O enredo pode ler-se
aqui.
No seu centro estão os torneios poéticos trovadorescos medievais. Grande parte da obra wagneriana está imbuída da redenção pelo amor, tema dominante nesta ópera, apesar de a sua magnitude ultrapassar largamente o confronto entre o amor carnal (simbolizado por Vénus) e o espiritual (por Elisabeth).
A belíssima abertura da ópera é, talvez, a primeira grande página sinfónica do compositor e inclui os temas principais da ópera com valor simbólico. Os leitmotive virão a ser uma marca indelével nas partituras de Wagner.
Sir Mark Elder dirigiu a Orquestra e Coros da Ópera Nacional de Paris. Apesar da magnífica sonoridade alcançada, acho que nunca conseguiu ser empolgante. Nunca me canso de salientar as cordas (em particular os violoncelos e, sobretudo, as harpas), para as quais Wagner escreveu páginas de uma beleza sublime. Os coros estiveram bem, mas quando cantavam fora de cena o som perdia-se um pouco na imensidão do teatro.
A encenação de Robert Carsen, que já tinha visto em Barcelona em Abril de 2008, é polémica mas, para mim, interessante. A acção centra-se na pintura.
A ópera abre com Tannhäuser a pintar Vénus, que surge nua, como modelo. A cena do bacanal está bem imaginada, apesar de uma abordagem pouco convencional. Subitamente entram dezenas de bailarinos vestidos de negro, cada um com uma tela (todas viradas para os bastidores). As telas são pousadas ao longo de todo o fundo do palco, os bailarinos despem-se e começam uma dança frenética em que se vão “sujando” progressivamente de tinta vermelha, à medida que se intensificam a musica e os movimentos. Quando terminam estão totalmente “sujos”. O eleito visual é marcante. Mas, comparado com o que vi em Barcelona, onde esta cena foi muito mais ousada e de um erotismo acentuado, aqui em Paris foi tornada mais “soft”.
No segundo acto há um concurso de pintura numa galeria de arte (o concurso poético sobre o amor). O público (o coro) e os solistas entram pela plateia, como se de espectadores se tratassem. São servidos de champanhe e canapés. As telas estão frequentemente colocadas em cavaletes com rodas mas nunca viradas para o público.
A última cena passa-se numa grande sala pejada de quadros de grandes pintores, com um espaço vago, onde Tannhäuser vai pendurar o seu. No momento em que, finalmente, a tela se veria, apagam-se as luzes e a ópera termina.
O tenor britânico Christopher Ventris foi um Tannhäuser notável. Começou algo nervoso, com hesitações, mas depois melhorou muito. A voz é potente, cheia e afinada. O papel é exigente e esteve sempre à altura. Confesso que gostei muito mais do seu Parsifal, mas este Tannhäuser também foi de grande qualidade.
Sophie Koch, mezzo francesa, foi uma Vénus excepcional. É uma cantora com uma voz muito bonita, forte, redonda e sempre afinada. A sua presença cénica foi marcante, muito ajudada pela figura esbelta que possui e pela forma como apareceu em cena (a Vénus que surgiu inicialmente nua era uma dupla muito parecida com Sophie Koch).
Stéphane Degout, jovem barítono francês, foi um Wolfram aceitável. A voz é bem timbrada, quase sempre bem audível, mas não teve a suavidade exigida à personagem. No canto à estrela da noite (O du, mein holder Abendstern), talvez o momento musical mais belo da personagem, não conseguiu transmitir a emoção esperada.
Deixo para o fim Elisabeth, interpretada pelo soprano sueco Nina Stemme, que se estreava em Paris. Já referi várias vezes neste blogue a minha profunda admiração por esta cantora. É, para mim, o melhor soprano wagneriano da actualidade. Mais uma fez esteve ao seu mais alto nível. A voz é avassaladora e foi, de todos os cantores que ouvi na Bastilha, a única que parecia estar a cantar num teatro de ópera de dimensões “convencionais”. Mas, para além da potência, a beleza tímbrica e a emotividade vocal são únicas. A presença em palco faz o resto. Fabulosa!
Estiveram também muito bem o baixo alemão Christof Fischesser como Hermann e os trovadores Walther (o tenor francês Stanislas De Barbeyrac), Heinrich (o tenor francês Eric Huchet), Biterolf (o baixo barítono polaco Tomasz Konieczny) e Reinmar (o baixo polaco Wojtek Smilek).
Um Tannhäuser de qualidade em Paris onde brilharam, sobretudo, as senhoras.
****
TANNHÄUSER, Bastille, Paris, October 2011
Tannhäuser is one of the Richard Wagner’operas that I had the opportunity to see more often. The plot can be read here.
At its center are the poetic troubadour medieval tournaments. Much of the work is imbued with Wagnerian redemption through love, a dominant theme in this opera, although its magnitude largely overcome the conflict between carnal love (symbolized by Venus) and spiritual love (Elisabeth).
The beautiful opening of the opera is perhaps the first composer's great symphonic page and includes the main themes of the opera with symbolic value. The leitmotive will become an indelible mark in the scores of Wagner.
Sir Mark Elder directed the Orchestra and Chorus of the Opéra National de Paris. Despite the superb sound achieved, it was never exciting. I always point out the strings (particularly the cellos, and especially the harps), for which Wagner wrote sublime beautiful pages. The choruses were fine, but when they sang offstage the sound was a little lost in the vastness of the theater.
I had seen this staging by Robert Carsen before, in Barcelona, in April 2008. It is controversial but interesting. The action focuses on the painting.
The opera opens with Tannhäuser painting Venus, who appears naked, as a model. The orgy scene is well concieved, though an unconventional approach. Suddenly dozens of dancers appear dressed in black, each with a painting (all facing backstage). The paintings are left throughout the back of the stage, the dancers undress and begin a frenzied dance that will be "messing" progressively red ink, as the music intensifies. When they finish they are totally "dirty." The visual effect is striking. But compared with what I saw in Barcelona, where this scene was much more erotic here in Paris it was made more "soft".
In the second act there is a painting contest in an art gallery (the poetry contest about love). The public (the choir) and the soloists enter through the audience, as if they were members of the audience. Champagne and appetizers are served. The paintings are often placed on easels with wheels but never face the public.
The final scene is in a large room filled with well-known paintings, with a vacant space, where Tannhäuser will hang his painting. Finally, when we are about to see the painting, the lights go off and the opera ends.
British tenor Christopher Ventris was a remarkable Tannhäuser. He started somewhat nervous, with hesitations, but he improved greatly. The voice is powerful, sound and refined. The role is demanding and he was always well. I confess that I liked his Parsifal more than his Tannhäuser but this was also of great quality.
Sophie Koch, French mezzo, was an exceptional Venus. She is a singer with a beautiful strong and round voice, and she is always in tune. Her stage presence was remarkable, aided by her very slender figure and by the way she appeared on the scene. (the first naked Venus was a double, looking like to Sophie Koch).
Stéphane Degout young French baritone, was an acceptable Wolfram. The voice has a nice timbre and was almost always audible. However, he could not express the smoothness required. In the song to the star of the night (O du mein holder Abendstern), perhaps the most beautiful musical moment of Wolfram, he failed to convey the expected emotion.
I leave Elizabeth to the end, interpreted by Swedish soprano Nina Stemme, who premiered in Paris. I have already mentioned several times in this blog my profound admiration for this singer. She is, for me, the best wagnerian soprano of our days. Once again, she was at her best. The voice is overwhelming, and from all the singers I heard in the Bastille, she was the only one who seemed to be singing in a "conventional" size opera house. But beyond the power, the vocal beauty and emotional timbre are unique.
Her presence on stage does the rest. Fabulous!
We had also good performances from German bass Christof Fischesser Hermann, and the troubadours Walther (French tenor Stanislas De Barbeyrac), Heinrich (French tenor Eric Huchet) Biterolf (Polish bass baritone Tomasz Konieczny) and Reinmar (Polish bass Wojtek Smilek).
A Tannhäuser of good quality in Paris where the stars were, above all, the ladies.
****