quarta-feira, 4 de junho de 2014

CARMEN, Theatro Municipal de São Paulo

CARMEN, ACERTOS E MAIS ACERTOS NO THEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO. CRÍTICA DE ALI HASSAN AYACHE NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
   


Carmen de Bizet é sucesso há mais de 100 anos por diversos fatores. Usa tema exótico, a Espanha onde desfilam toureiros, contrabandistas, ciganas, mocinhas indefesas, bêbados e soldados. A música de Bizet é do início ao fim da ópera contagiante, uma miscelânea de temas que tem a cor espanhola como a Habanera, a Seguidilha, o Quinteto dos Contrabandistas e a música da Plaza dos Touros. Empolgante também é o lirismo da ária de Micaëla e a força da Canção do Toreador. Avança no tempo ao mostrar uma mulher independente que segue seus princípios de liberdade, mais que volúvel Carmen é uma mulher que vive intensamente sempre buscando novas aventuras e amores.

Opéra-comique é um gênero de ópera que mistura diálogos falados com recitativos cantados, cuidado leitor, nem toda Opéra-comique é engraçada ou cômica. Carmen de Bizet é uma Opéra-comique completamente trágica. Existe versão de Carmen, feita após a morte do compositor, somente com recitativos que exclui os diálogos, esta versão descaracteriza a ópera. Acertadamente o Theatro Municipal de São Paulo utiliza a versão original com os diálogos falados em francês e mantém quase toda a estrutura da ópera.

Dito isso o que dizer da estreia da Carmen apresentada no Theatro Municipal de São Paulo. Uma sucessão de acertos e mais acertos. A começar pelo elenco, a escalada para dar vida a cigana que adora excitar a macharada foi Rinat Shaham. O mezzo-soprano mostrou excelentes dotes vocais: Voz quente, sensual com graves profundos e encorpados. Atuação que esbanja na sensualidade e deixa os homens de queixo caído, uma Carmen na medida com qualidade vocal do início ao fim da récita. Desempenho dramático espetacular que mostra todas as facetas da personagem.



                                                Cena Carmen , foto Internet
  
Thiago Arancam mostrou o porquê de seu sucesso internacional. Tenor com técnica refinada de agudos com brilho e de extrema beleza em uma voz bem projetada e penetrante. Pode ter pecado no fraseado, mas nada que atrapalhasse em demasia. Exibição cênica que prima pela qualidade onde sua melhor participação se concentrou no terceiro e quarto atos. Na cena final colocou intensidade ao personagem mostrando um homem desesperado pela paixão arrebatadora da cigana. Grande Don José.

O Escamillo de Rodrigo Esteves não mostrou graves a altura do personagem, na falta deles colocou bons médios e abusou dos agudos. Soltou um bom agudo no final da canção do Toreador inexistente na partitura que levanta o público. Atuação cênica correta que demonstra a valentia e o caráter conquistador do personagem.



                                                   Cena Carmen, foto Internet

Quando se fala em Micäela se pensa em uma personagem doce e apaixonada e por isso os sopranos que a interpretam costumam ter voz lírica com pouco peso. Eu fazia parte desse grupo, agora vejo que Micäela é uma personagem forte que tem a coragem de enfrentar o perigo de se aventurar nas matas correndo o risco de ser trucidada por contrabandistas inescrupulosos, tudo isso atrás de Don José, para lhe dizer que sua mãe está morrendo. Lana Kos faz uma Micäela forte vocal e cenicamente, seu dueto no primeiro ato e sua ária no terceiro são um primor de canto. Voz forte, encorpada e quente com um timbre que atinge vigor nas notas médias. Uma Micäela que não estamos acostumados a ver e que nos surpreende pelo talento vocal.

Os personagens Frasquita, Mercedes, Dancaïre, Remendado, Zuniga e Morales mostraram boas vozes em suas pequenas intervenções, isso não justifica a vinda deles de diversos países do mundo. Cantores brasileiros fazem o que eles fizeram igual ou melhor, sou capaz de lembrar sem consulta uns 3 ótimos solistas para cada papel citado.

Em uma rede social John Neschling faz uma crítica de sua própria montagem (até crítico ele virou agora, no que será que ele é formado?) sobram palavras de elogios a todos: Excelência, qualidade superior, pronuncia impecável e fenomenal interpretação são termos que utiliza para elogiar a ópera que ele mesmo produziu. Diz que os comprimários de fora são importantíssimos para uma Carmen de qualidade, cita escritores e compositores (ele adora uma citação, se for em inglês melhor ainda). Tudo conversa para justificar o injustificável.

A Orquestra Sinfônica Municipal dirigida por Ramón Tebar mostrou ótima sonoridade com tempos e sonoridade perfeitos. Toda a beleza melódica da partitura foi explorada em diversas cores e nuances. Tebar exibiu respeito aos cantores fazendo com que música e voz estivessem em harmonia. O Coro Lírico Municipal nas mãos de Bruno Greco Facio mostrou vozes afinadas e sincronizadas, destaque para a petizada do Coral da Gente, Silmara Drezza extraiu ótima afinação dos guris.



                                               Carmen, foto Internet
  
A direção cênica de Filipo Tonon opta pelo tradicional, não inventa soluções mirabolantes e consegue dar dinâmica a ação. Sua Carmen explode em sensualidade e em paixões arrebatadoras, o diretor caracteriza os personagens conforme o libreto até nos pormenores. O cenário de Juan Guillermo Nova todo em madeira exibe grande beleza visual e se apresenta adequado a ideia da direção. Os figurinos confeccionados por Cristina Aceti elevam ainda mais o nível da produção com acertos. O único senão é a Carmen estar vestida igual a todas as moças do coro no primeiro ato. Pode-se dizer que ela é igual as outras, trabalhadora na fábrica de cigarros como elas e tem que estar com a mesma roupa. O problema é que no palco essa saída não funciona, devido ela estar igual as demais gera confusão no espectador, Carmen é protagonista e tem que se destacar na multidão.


Bizet compôs uma abertura para a ópera que é conhecida do grande público e compôs uma pequena abertura para cada ato. Não entendi por que colocaram a cena do coro na abertura do quarto ato primeiro e depois a abertura original. O Balé da Cidade de São Paulo mostrou excelente coreografia com passos que mostram o calor da música espanhola.

3 comentários:

  1. Que pena S. Paulo não ser já ali! Saudades imensas da passagem de John Neschling por Lisboa.

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  2. Não estou de acordo. Por exemplo, eu escutei perfeitamente os graves do baritono.

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  3. Caro anônimo, diga-nos em qual dia vc assistiu a ópera?

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