sábado, 3 de março de 2018

OPERA, Paixão, Poder e Política, Museu Victoria & Albert, Londres / OPERA, Passion, Power and Politics, London


(Text in English below)

O Museu Victoria and Albert, em colaboração com a Royal Opera House de Londres apresentaram uma fabulosa exposição designada “Opera: Paixão, Poder e Política”.

Nela são abordados, de forma não exaustiva, os 400 anos de história da ópera, recorrendo a sete óperas e cidades onde foram pela primeira vez apresentadas, salientando os aspectos culturais, sociológicos e políticos da época.
São-nos fornecidos auscultadores que nos permitem ouvir extractos de cada uma das óperas em cada sala temática, que reproduzem automaticamente os trechos musicais adequados ao local da exposição onde nos encontramos, sem haver necessidade de qualquer manipulação do dispositivo.



Para além do canto (ouvido nos auscultadores), essencial na exposição e a essência da ópera, é-nos oferecida a possibilidade de vermos instrumentos musicais da época, partituras, trajos, filmes, cartazes, pinturas, cenários e outros objectos que marcaram as óperas e as cidades retratadas.

A exposição inicia-se em Veneza com a ópera de Claudio Monteverdi L’incoronazione di Poppea. Ouve-se o dueto final. Para além de instrumentos da época, há um modelo de uma cortesã veneziana em tamanho natural, vestida de escarlate. Enquanto ouvimos o som característico, vemos um cravo em que as superfícies reproduzem os padrões dos tetos dos palácios renascentistas venezianos de então.






Segue-se Londres e a ópera Rinaldo de George Frideric Handel. Um dos pontos altos da exposição é uma réplica de um teatro barroco onde uma caravela atravessa o mar tempestuoso, vendo-se também as sereias, enquanto se ouve o seu coro (Il vostro maggio, por Catherine Bott e Ana-Maria Rincon). Ainda nesta sala, ouvem-se árias magníficas, incluindo o lamento Lascia ch’io pianga mia cruda sorte numa interpretação superlativa de Cecilia Bartoli como Almirena, e a ária de bravura Venti, turbini, prestate também numa interpretação marcante de David Daniels como Rinaldo, um contra-tenor (na ausência de um castrato).




Viena é a cidade para a ópera As Bodas de Fígaro de Wolfgang Amadeus Mozart. Num ecran é projectado o belíssimo sexteto do 3º Acto, que também ouvimos. Salienta-se a importância da ópera, um espelho da sociedade da época, onde Mozart e o libretista Lorenzo da Ponte, pela primeira vez, colocam criados e patrões ao mesmo nível, questionando os privilégios dos últimos na Viena pujante de então.






A ópera Nabucco de Giuseppe Verdi é a escolha para Milão e constituiu um hino à luta pela independência de Itália, no palco e fora dele, aqui bem ilustrada. O belo coro dos escravos hebreus Va pensiero sull’ali dorati domina mas temos também a oportunidade de ouvir Maria Callas como Abigaille, terminando com disparos de canhão enquadrados por objectos visuais. Outro ponto alto da exposição é a fotografia de 150 teatros de ópera italianos, vistos do palco.





Para Paris, com belos quadros de Degas e Manet, foi escolhida a ópera Tannhäuser de Richard Wagner estreada na cidade em 1861 (já havia sido apresentada em Dresden anteriormente). A mudança do balanço convencional entre recitativos e árias para melodia contínua, a introdução de temas musicais (leitmotive) que identificam personagens e emoções, e a ruptura com a tradição da Grand Opera que obrigava a 4 ou 5 actos e a um ballet longo foram algumas das convenções quebradas por Wagner, que chocaram a elite parisiense. Outro momento bem conseguido é a apresentação simultânea em 8 ecrans televisivos de várias produções recentes da ópera, nomeadamente a orgia (e música) do Venusberg, de cariz sexual marcada.





A Salome de Richard Strauss é a ópera para Dresden, onde foi estreada em 1905. Entre outros, são apresentados estudos de Freud sobre histeria, nus de Ernst Kirchner, anotações originais de Strauss e a afirmação do feminismo. A ópera é só de um acto, o que quebra a tradição, e tem uma conotação sexual violenta e chocante ainda nos dias de hoje. É apresentado uma proposta de um fato surrealista para o carrasco, da autoria de Salvador Dali. Em mais um ecran de grandes dimensões vê-se o final da produção em cena na Royal Opera House, em que a Salome (interpretada por Nadja Michael) meia despida, totalmente coberta de sangue e enlouquecida, abraça a cabeça de João Baptista e beija-lhe a boca. A música (Ah! Ich habe deinen Mund geküsst, Jochanaan) é, mais uma vez, brutal!






A sétima cidade é Leninegrado e a ópera Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk, de Dmitri Shostakovich, que foi censurada posteriormente por Estaline. De novo há uma conotação sexual marcada. As ilustrações na sala são muito interessantes e incluem vários cartazes e outras peças alusivas ao modernismo soviético, partituras anotadas de forma caótica pelo compositor e um filme dele a fumar e tocar uma passagem da obra no piano.





A exposição termina numa sala com vários ecrans de grande dimensão onde são projectadas imagens de teatros de ópera modernos e icónicos (Sidney, Copenhaga e Oslo entre muitos outros) e pequenos excertos de óperas recentes, todas associadas a uma temática, incluindo Porgy and Bess de Gershwin – integração,  Peter Grimes de Britten – homossexualidade, Dialogues des Carmélites de Poulenc – amor, Written on Skin de Benjamin – violência domestica, The Death of Klinghoffer de Adams – terrorismo.

Uma exposição notável, que ilustra bem que a ópera inclui música, canto, narrativa, representação, dança, encenação e muito mais -  é a obra de arte total - Gesamtkunstwerk!, como também ilustrado na exposição, a propósito de Wagner.





OPERA, Passion, Power and Politics, Victoria & Albert Museum, London

The Victoria and Albert Museum, in collaboration with the Royal Opera House in London, presents a fabulous exhibition called "Opera: Passion, Power and Politics".

It covers, in a non-exhaustive way, the opera's 400 years of history, using seven operas and cities where they were first performed, highlighting the cultural, sociological and political aspects of the period.
We are provided with headphones that allow us to listen to excerpts from each of the operas in each thematic room, which automatically reproduce the musical excerpts appropriate to the location of the exhibition where we are, without the need for any manipulation of the device.

In addition to the singing (heard in the headphones), essential in the exhibition and the essence of opera, we are offered the possibility of seeing musical instruments, scores, costumes, films, posters, paintings, scenery and other objects that marked the operas portrayed.

The exhibition begins in Venice with the opera of Claudio Monteverdi L'incoronazione di Poppea. We hear the final duet. In addition to instruments of that period, there is a model of a life-size Venetian courtesan, dressed in scarlet. While we hear the characteristic sound, we see a harpsichord in which the surfaces reproduce the patterns of the ceilings of the Venetian renaissance palaces.

It follows London and George Frideric Handel's opera Rinaldo. One of the highlights of the exhibition is a replica of a Baroque theater where a caravel crosses the stormy sea, the mermaids are seen, while their chorus is heard (Il vostro maggio, by Catherine Bott and Ana-Maria Rincon). Still in this room, magnificent arias are heard, including the lament Lascia ch'io pianga mia cruda sorte in a superlative interpretation of Cecilia Bartoli as Almirena, and the aria of bravery Venti, turbini, prestate also in a striking interpretation of David Daniels as Rinaldo, a counter-tenor (in the absence of a castrate).

Vienna is the city for the opera The Marriage of Figaro by Wolfgang Amadeus Mozart. On a screen is projected the beautiful sextet of the 3rd Act, which we also hear. The importance of opera, a mirror of the society of the time, is emphasized by Mozart and librettist Lorenzo da Ponte, for the first time, placing servants and masters on the same level, questioning the privileges of the latter in the puissant Vienna.

The opera Nabucco by Giuseppe Verdi is the choice for Milan and it was a hymn to the fight for the independence of Italy, on stage and outside it, well illustrated here. The beautiful chorus of the Hebrew slaves Va pensiero sull'ali dorati dominates but we also have the opportunity to hear Maria Callas as Abigaille, ending with cannon shots framed by visual objects. Another highlight of the exhibition is the photograph of 150 Italian opera houses, seen from the stage.

For Paris, with beautiful paintings by Degas and Manet, was chosen the opera Tannhäuser of Richard Wagner premiered in the city in 1861 (had already been presented in Dresden previously). The change of the conventional balance between recitatives and arias for continuous melody, the introduction of musical themes (leitmotive) that identify characters and emotions, and the break with the Grand Opera tradition that required 4 or 5 acts and a long ballet were some of the conventions broken by Wagner, which shocked the Parisian elite. Another successful moment is the simultaneous presentation in 8 TV screens of several recent productions of the opera, namely the orgy (and music) of Venusberg, of marked sexual inprint.

Richard Strauss's Salome is the opera for Dresden, where it was premiered in 1905. Among others, are presented studies of Freud on hysteria, nudes of Ernst Kirchner, original notes of Strauss and the affirmation of feminism. The opera is only an act, which breaks the tradition, and has a violent and shocking sexual connotation still today. A surrealistic dress proposal is presented for the executioner, by Salvador Dali. On another large screen we see the final moments of the production on stage at the Royal Opera House, where Salome (interpreted by Nadja Michael) half-naked, totally covered in blood and crazed, embraces the head of John the Baptist and kisses him in the mouth. The music (Ah! Ich habe deinen Mund geküsst, Jochanaan) is once again brutal!

The seventh city is Leningrad and the opera Lady Macbeth of the Mtsensk, by Dmitri Shostakovich, who was subsequently censored by Stalin. Again, there is a marked sexual connotation. The illustrations presented are very interesting and include several posters and other pieces allusive to Soviet modernism, scores chaotically annotated by the composer and a film of him smoking and playing a passage of the work on the piano.

The exhibition ends in a large multi-screen room where images of modern and iconic opera houses (Sidney, Copenhagen and Oslo among many others) are projected and small excerpts from recent operas, all associated with a theme, including Porgy and Bess by Gershwin - Integration, Peter Grimes by Britten - Homosexuality, Dialogues des Carmélites by Poulenc - Love, Written on Skin by Benjamin - Domestic Violence, The Death of Klinghoffer by Adams - Terrorism.

A remarkable exhibition that illustrates well that opera includes music, singing, narrative, representation, dance, staging and much more - is the total work of art - Gesamtkunstwerk!, as also illustrated in the exhibition, on Wagner.

3 comentários:

  1. Excelente apontamento critico sobre uma exposição que também muito me interessava, Obrigado pela informação,

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  2. Magnífico ! Excelente reportagem, Fanático_Um, deixou-me a salivar. Mas já terminou a 25 ... não tive hipótese de ver. Só sugiro que corrija "apresentam" para "apresentaram" :(
    Obrigado pela muito boa informação.

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