Assisti no passado domingo, dia 14, a um concerto na Casa
da Música, integrado no ciclo “Música para o Natal”.
Composta entre Julho de 1899 e
Agosto de 1800 em Maiernigg-am-Wörthersee, na Caríntia, onde Mahler havia
mandado construir uma casa de Verão, a 4ª Sinfonia foi estreada a 25 de
Novembro de 1901, em Munique, sob a regência do compositor, tendo alcançado
pouco sucesso.
A 4ª Sinfonia marca uma ruptura
com a evolução no sentido no gigantismo sinfónico que Mahler vinha trilhando.
Em contraste com a anterior, a 4ª Sinfonia regressa à duração da Titã, aos
quatro andamentos e a uma orquestração menos complexa, com supressão dos
trombones, da tuba e do próprio coro, mantendo apenas a voz solista no 4º
andamento.
A razão da escolha desta sinfonia
para um programa de Natal foi desvendada por Mário Azevedo, a quem coube o
comentário musical com que começou o concerto. Como referiu, a ideia desta
sinfonia prende-se com a infância e a descoberta progressiva do mundo, com a
entrada num Paraíso que é apenas entrevisto nos três primeiros andamentos e que
é cantado no quarto pelo mais miraculoso instrumento musical: a voz humana.
No 4º andamento a soprano canta o
poema “Das himmlische Leben” (A vida
celestial), extraído dos Knaben Wunderhorn, em que os prazeres bucólicos
e gastronómicos dos Céus são descritos de forma entusiástica, tendo Mahler
recomendado que fossem cantados com uma expressão alegre e infantil,
completamente desprovida de paródia.
O maestro Christoph König concebeu uma interpretação
bastante sóbria, sem excessos expressivos, embora salientando bem as variações
dinâmicas e os diferentes ambientes sonoros criados por Mahler. As vozes
interiores foram evidenciadas, mas sem se sobreporem ou criarem desequilíbrios.
No 2º andamento faltou talvez um pouco de verve, mas o 3º andamento, para mim
um dos mais belos de Mahler, foi muito bem conseguido. A sonoridade das cordas
foi belíssima e a construção do crescendo até ao conflito central foi bastante
eficaz.
A orquestra esteve sempre bastante
bem, sem falhas que eu tenha notado e mantendo elevados padrões de acerto entre
os diversos naipes. Destacaria a concertina, tocando os solos de violino
desafinado com vigor, bem como o quarteto de trompas, em grande destaque. Penso
que os naipes de cordas ganhariam se tivessem um maior número de instrumentistas,
em especial nos graves, para ganhar alguma espessura.
Devido ao lugar onde estava
sentado, no coro, a minha percepção da actuação da soprano ficou muito
prejudicada, pois a voz era praticamente inaudível. Ficou apenas a sensação de
um timbre claro e jovial e de uma boa integração no tecido orquestral.
Duas notas mais sobre outros
aspectos do concerto.
Tratou-se de um concerto pelas
12:00, com um público bastante heterogéneo e com a presença de bastantes
crianças e jovens, o que é de registar com bastante agrado. Naturalmente que
tal implicou um nível acrescido de ruído e movimentações na sala, mas nada que
tivesse perturbado a fruição da música. Todavia, verifiquei muitos adultos a
entrar e sair da sala durante o concerto, o que já me pareceu pouco admissível.
Outra nota para o atraso no
início do concerto, que foi de cerca de um quarto de hora. Parece-me pouco
admissível, mesmo para um concerto com as características apontadas. A
circunstância de só ser dado um sinal sonoro a chamar o público a menos de 5
minutos da hora marcada para o início do concerto, embora não justifique o
atraso do público a tomar os seus lugares, também não ajuda.
Em suma, foi um excelente
concerto de Natal e uma oportunidade para ouvir a belíssima 4ª Sinfonia de
Mahler, numa sala de concertos de excepção.
Por acaso assisti ao concerto da véspera, à noite. Suponho que era mais formal, porque não houve atrasos nem gente a sair da sala.
ResponderEliminarConcordo com alguns pontos que salienta - o quarteto de sopros esteve muito bem, o 2º andamento foi algo falhado (muito lento e mortiço), em contrapartida no Ruhevoll König conseguiu uma bela interpretação, dinâmica e contrastada. Em geral pareceu-me uma 4ª desconsoladita, pouco alegre, a tender mais para a 'gravitas', mas sempre com uma sonoridade bonita e fluente. Gosto mais de ouvir esta sinfonia de Mahler com algum entusiasmo festivo.
Já a soprano cipriota foi totalmente desastrosa. Tem voz de soubrette para ópera buffa - fininha, sem qualquer espessura, de afinação mal controlada e expressividade nula. E ouvi-a de frente e relativamente próximo.
Portanto, se esta é "a escolha de König", não se pode dizer que tenha sido totalmente convincente. Esperava mais. Mesmo assim espero também que, depois dele partir, a OSP/CdM conheça outro dirigente pelo menos do mesmo nível.