(Review in English below)
A ópera Porgy and Bess de George
Gershwin foi composta e estreada em 1935. O libreto é de George e Ira
Gershwin, DuBose e Dorothy Heyward.
Estreou com bastante polémica, não só por ser
uma história cujos protagonistas são pessoas de raça negra, como pela inovação
musical que introduzia, numa aproximação clara ao jazz e com uma muito marcada influência folclore. Gershwin,
um compositor judeu, foi acusado (e ainda hoje o é) de racismo e de uma visão
sectária e demasiado preconceituosa. Mas o que é facto é que, independentemente
das críticas que se possam consubstanciar em algo (?), a ópera de Gershwin tem
múltiplas melodias extremamente famosas de onde se destaca Summertime
que, hoje em dia, é mais famosa através do jazz.
A nova encenação da escocesa Liz Ascroft
é, do ponto de vista visual, muito interessante. Baseia-se numa enorme
estrutura em madeira com aspecto deteriorado, mas que representa a comunidade
muito familiar em que aquele povo vivia. O cenário existe em 3 planos: uma
espécie de pátio e um rés-do-chão e primeiro andar. A acção passa-se nesses 3
planos, sem nenhuma ordem especial e sem qualquer incoerência com o libreto.
Pode dizer-se que em todos os aspectos a encenação é clássica: cenário,
guarda-roupa, iluminação, direcção de actores. A única coisa que não percebi e
que me intrigou foi a presença de Clara com o bebé nos braços do início até que
parte em busca de salvar Jake do temporal. Mas foi uma encenação muito bem feita
e agradável de seguir.
A orquestra da Royal Danish Opera dirigida por Michael Boder
apresentou um bom nível de entrosamento e de interpretação, sem qualquer falha
importante e tendo em conta os cantores. Excelente!
No que respeita aos cantores, há a destacar
uma óbvia diferença de qualidade entre os elementos dos elencos feminino e
masculino: a vantagem foi, claramente, para o primeiro.
Bess foi interpretada pelo soprano americano Lisa
Daltrius. A voz é pujante, sobretudo no registo agudo, fazendo ecoar as
notas mais altas com facilidade, mas mantendo o timbre agradável. Não podemos
dizer o mesmo do registo mais grave onde não esteve tão forte. Mas teve uma boa
interpretação vocal. Quanto às capacidades cénicas foi uma intérprete que
conseguiu transmitir a densidade da personagem.
Clara foi interpretada pelo soprano Jeanine
de Bique. O timbre da voz é bonito, a técnica eficaz e as capacidades
expressivas de qualidade. Ofereceu-nos um excelente Summertime e em
termos cénicos esteve muito bem.
Sabrina Carten, Serena mulher de assassinado Robins, foi a voz que
mais me impressionou. É um mezzo de voz com ampla tessitura que sabe moldar
bem. Os seus agudos são brilhantes e vívidos e os graves cheios. As suas
capacidades cénicas são também assinaláveis. Talvez, a par da orquestra, a
melhor da noite.
Judith Skinner foi Maria tem uma voz de mezzo-soprano muito
adequada, com uma postura e sotaque da Carolina do Sul muito interessante e que
muito contribuiu pra a construção da personagem.
Porgy foi o baixo-barítono Kenneth Overton.
A voz tem um timbre agradável, mas não é um cantor particularmente dotado em
qualquer registo: grave, médio ou agudo. Cenicamente, cumpriu com destreza as
exigências de andar com uma canadiana improvisada. Foi, pois, melhor actor do
que cantor. Teria preferido ao contrário.
Também Sporting Life, aqui interpretado pelo
tenor Robert Mack, esteve, vocalmente, muito abaixo do que a personagem
exige. O seu problema era que, muitas vezes, se tornava praticamente inaudível,
uma vez que a projeção não é o seu forte. Poder-se-ia pensar que foi da
orquestra, mas não. Outros cantores conseguiam ouvir-se perfeitamente. Já
cenicamente foi o mais empenhado e capaz de todo o elenco. Desse ponto de
vista, foi um Sporting Life perfeito.
Crown foi o baixo Ntobeko Rwanga. A
voz não tem um timbre particularmente agradável, mas foi sempre audível. Em
termos cénicos cumpriu bem, sem entusiasmar.
O Coro esteve em excelente nível,
mostrando-se muito entrosado entre si e também com a orquestra.
Foi uma noite muito agradável passada num dos
mais cativantes e modernos edifícios de ópera mundiais. É um edifício
lindíssimo situado junto ao rio e que faz lembrar um enorme barco. Está
decorado com extremo bom gosto e a sala interior tem excelente visibilidade de
qualquer ponto. No intervalo fiz um tour pelos vários pisos e até os
lugares de pé permitem uma visão completa do palco. Pena que a acústica não
seja espectacular. Esse foi o maior defeito que senti. Dias depois, um italiano
perguntou-me qual a minha opinião sobre a acústica: também ele vê aí o único
defeito da sala. Será, pois, uma experiência a repetir, até porque, apesar de a
Dinamarca ser um país muito caro, tem um povo muito simpático, educado e
prestável, além de uma gastronomia que, para mim, foi inesperadamente
surpreendente.
Deixo-vos fotos e vídeos do edifício.
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(Review in English)
Porgy and Bess by George Gershwin is an
opera that was composed and premiered in 1935. The libretto is by George and Ira Gershwin, DuBose and Dorothy
Heyward.
Debuted quite controversial,
not only because it is a story whose protagonists are black people, but also
because of the musical innovation introduced, in a clear approach to jazz and
with a very marked influence of folklore. Gershwin, a Jewish composer, was
accused (and still is) of racism and of a sectarian and too biased view. But
the fact is that regardless of the criticisms that may constitute something
(?), Gershwin's opera has many extremely famous melodies, which highlights Summertime that nowadays is more famous
by jazz.
A new staging of the Scottish
Liz Ascroft is, in the visual point
of view, very interesting. It builds on a huge wooden structure with
deteriorated aspect, but that is very familiar to the community in which these
people lived. The scenario exists in 3 planes: a kind of courtyard and ground
floor and first floor. The action takes place in these 3 plans with no
particular order and without any inconsistency with the libretto. You could say
that in all respects the scenario is classic: scenery, wardrobe, lighting,
actors directing. The only thing I did not understand and that intrigued me was
the presence of Clara with the baby in her arms until the start of searching to
save Jake from the temporal. But it was a performance well done and enjoyable
to follow.
The Orchestra of the Royal Danish Opera conducted by Michael Boder showed a good level of
rapport and interpretation without any major failure and taking into account
the singers. Excellent!
Regarding singers, we can
highlight an obvious difference in quality between the elements of female and
male casts: the advantage was clearly for the first.
Bess was interpreted by
American soprano Lisa Daltrius. The
voice is booming, especially in the high register, echoing the high notes with
ease, while maintaining the pleasant timbre. We cannot say the same of most low
register, which was not as strong. But had a good vocal performance. As for
scenic capabilities she was a performer who managed to convey the density of
the character.
Clara was played by a soprano
Jeanine Peck. The timbre of the
voice is beautiful, and of quality and effective technical and expressive
capacities. She was excellent in scenic terms and offered us a beautiful
Summertime.
Sabrina Carten as Serena, Robins’ widow, was the voice that impressed me most. She has
a mezzo voice with wide tessitura she knows well how to mold. Her treble is
bright and vivid and bass is full. Her scenic capabilities are also notable.
Perhaps, along with the orchestra, she was the best of the night.
Judith Skinner was Maria has a voice of mezzo-soprano quite adequate, with an attitude
and accent of South Carolina very interesting that contributed largely to the
building of character.
Porgy was the bass-baritone Kenneth Overton. The voice has a nice
tone, but he is not a particularly gifted singer in any register: low, medium
or high pitch. Scenically, he complied well with the disability Porgy has. He
was therefore better actor than singer. We would have preferred the opposite.
Sporting Life here played by
tenor Robert Mack was vocally far
below what the character requires. His problem was that often became almost
inaudible, since the projection is not his best characteristic. It might be because
of the orchestra, but it was not. Other singers could be heard perfectly. Scenically
he was the most committed and capable of the entire cast. From this point of
view, he was a perfect Sporting Life.
Crown was the bass Ntobeko Rwanga. The voice does not have
a particularly pleasant timbre, but he was always audible. In scenic terms he
fulfilled without enthusiasm.
The choir was in excellent level, being highly regarded among
themselves and with the orchestra.
It was a very nice evening in
one of the most captivating and modern buildings of opera world. It is a
beautiful building situated next to the river and resembles a huge boat. It is
decorated with exquisite taste and the interior room has excellent visibility
from any point. At halftime I made a tour of several floors and even the
standing room allow a full view of the stage. Too bad the sound is not
spectacular. That was the greatest flaw I felt. Days later, an Italian asked me
about my opinion on the acoustics: he also feels it as the only defect of the hall.
It will therefore be an experience to repeat, because even though Denmark is a
very expensive country, has a very friendly, polite and helpful people, and a
cuisine that, for me, was unexpectedly amazing.
I leave you photos and videos
of the building.
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