quarta-feira, 17 de abril de 2013

LA TRAVIATA – Teatro de São Carlos, Lisboa, Abril de 2013


 La Traviata, de G. Verdi com libretto de Francesco Maria Piave é uma das óperas mais conhecidas e populares. A música é de grande beleza e crescente intensidade dramática. A história pode ler-se aqui.




A encenação, de Francesco Esposito, é perfeitamente aceitável para os actuais tempos de crise. A acção é trazida para o presente, o cenário está rodeado de camarotes de teatro que se vão progressivamente esvaziando até ficarem apenas as estruturas de base. É um espectáculo dentro do espectáculo.Talvez este seja o aspecto mais interessante, muito ajudado pelos eficazes jogos de luz.
Tem também algumas incoerências e situações disparatadas. Dou apenas um exemplo de cada. Não fosse o Dr Grenvil dizê-lo, ninguém perceberia que Violetta estava a morrer tuberculosa. No 3º acto, quando Alfredo reaparece, não encontra melhor local para pôr os sapatos do que sobre as almofadas do leito de morte de Violeta, com ela lá!  


 A Orquestra Sinfónica Portuguesa esteve bem e o Coro do Teatro de São Carlos também. Até o maestro Martin André conseguiu dirigir fazendo poucos ruídos, por oposição à sua postura no Trovador, mas nunca conseguiu o dramatismo exigido.

O soprano Daniela Schillaci interpretou a Violetta Valéry. A voz é cheia, bem audível mas agressiva e com tendência para a estridência, sobretudo no registo mais agudo. A cantora tem uma boa figura e foi credível na interpretação cénica. Não se notou grande desespero na leitura da carta (e não olhou para ela enquanto a leu) mas logo a seguir, na ária Addio del passato, esteve bem, sem encantar.


 Andrés Veramendi, tenor, foi Alfredo Germont. Uma tristeza! Não tem voz nem postura em palco para um papel desta envergadura. A emissão foi irregular, frequentemente desafinada e sem emotividade.


 Giorgio Germont foi interpretado pelo barítono Damián del Castillo. Tem uma voz agradável mas a projecção não foi a melhor. A figura é excelente, a interpretação cénica foi decente mas é demasiado jovem para a personagem e parecia ser ele o filho e não o pai.


 Nos papéis secundários tivemos curtas mas boas interpretações. Joana Seara foi uma Aninna de voz segura e bem afinada, Luís Rodrigues foi um Doutor Grenvil muito convincente, Mário Redondo foi um excelente Barão Douphol  e Marco Alves dos Santos e João Merino deram boa presença a Gastone e ao Marquês d’Obigny.






A razão para não serem escolhidos cantores portugueses para os protagonistas é, para mim, incompreensível. Será só provincianismo e aquela ideia de que tudo o que vem de fora é necessariamente melhor? Não posso aceitar, seria mau de mais.

Não espero ouvir em São Carlos os melhores cantores estrangeiros da actualidade, sei que nos tempos que correm não é possível trazê-los ao nosso único teatro nacional de ópera (ao contrário do que aconteceu no passado), mas há um mínimo de qualidade que deveria ser garantido, mínimo esse que, na minha opinião, é suplantado por vários cantores portugueses que são incompreensivelmente arrastados para os papéis secundários.

Partilho a minha perplexidade com os meus amigos que escrevem neste blogue. Quem o lê pode constatar que, felizmente, temos tido muitas oportunidades de ver ópera, muito boa e muito má, cá e, sobretudo, fora. Por isso sentimos que o podemos dizer com algum conhecimento de causa (perdoem-nos a imodéstia).

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LA TRAVIATA - Teatro de São Carlos, Lisbon, April 2013

 La Traviata by G. Verdi with libretto by Francesco Maria Piave is one of the best known and popular operas. The music is of great beauty and increasing dramatic intensity. The story can be read here.

The staging of Francesco Esposito, is perfectly acceptable for the current times of crisis. The action is brought to the present, the stage is surrounded by theater boxes that will become progressively faded until only the basic structures remain. Perhaps this is the most interesting aspect, greatly helped by efficient light projections.
It also has some inconsistencies and nonsense situations. I give just one example of each. If Dr Grenvil had not said it, no one would notice that Violetta was dying of tuberculosis. In the 3rd act, when Alfredo reappears, there was no best place to put his shoes than on the cushions of the deathbed of Violet, with her there!

The Portuguese Symphony Orchestra played well and Choir of Teatro São Carlos too. Even maestro Martin André managed to direct without making a lot of noise, as opposed to his performance in Il Trovatore, but he never achieved the required dramatic intensity.

Soprano Daniela Schillaci was Violetta Valéry. The voice is full, loud and clear but aggressive, with a tendency to stridency, especially in the top register. The singer has a good figure and she was credible in her scenic interpretation. She did not reveal great despair while reading the letter (and she did not look at it while reading) but the aria Addio del passato was fine.

Andrés Veramendi, tenor, was Alfredo Germont. A sadness! He has no voice or posture on stage for a role of this magnitude. The singing was irregular, often tuneless and unemotional.

Giorgio Germont was interpreted by baritone Damian del Castillo. He has a pleasant voice but the projection was not the best. The figure is excellent, his artistic interpretation was decent but he is too young for the character. He seemed to be the son and not the father.

In supporting roles we heard short but good interpretations. Joana Seara was a secure and finely tuned voice Aninna, Luís Rodrigues was a very convincing Doctor Grenvil, Mário Redondo was an excellent Baron Douphol and Marco Alves dos Santos and João Merino were well as Gastone and the Marquis d'Obigny.
The reason why Portuguese singers are not chosen for leading roles is, to me, incomprehensible. Is this only parochial and that idea that everything that comes from abroad is necessarily better? I can not accept that, it would be too bad.

I do not expect to hear today the best foreign singers in Teatro de São Carlos, I know that these days we can not afford to bring them to our unique national opera theater (unlike what happened in the past). But there is a minimum quality that should be guaranteed and, in my opinion, that is offered by several Portuguese singers that are incomprehensibly dragged to supporting roles.

I share my amazement with my friends who write on this blog. Those who read it can see that, fortunately, we have had many opportunities to see very good and very bad operas here, and especially abroad. So we feel that we can say this with some knowledge of the facts (forgive the immodesty).

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8 comentários:

  1. Muito obrigado por partilhar esta crítica. Não fui ver e ouvir e não irei por impossibilidade.
    Em regra gosto de "actualizações" de encenação quando fazem sentido. Gostei muito das modernizações do Graham Vick no Anel e comovi-me com o seu Werther. No caso das histórias clássicas ou de quase todas do Wagner, não há problemas e no Werther houve muito cuidado para ser credível. Mas não consigo entender uma modernização da Traviata. Não faz sentido. Aquilo é uma história e um contexto absolutamente datado.

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  2. That is truly a pity. Especially with such a terrific opera as La Traviata, it does not make sense that the lead would not be powerful. If and when I get there, I would love to attend that teatro.

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  3. Caro FanaticoUm,

    Como sabe, assisti à récita de dia 12 e partilho da mesma opinião geral.

    Tenor fraquinho... mas a postura no final é tão humilde que custa desancá-lo com críticas. Não tem constância nos agudos, canta-os com a língua de fora como se fosse vomitar, tenta modular a voz para transmitir sentimentos mas o que sai não são mais que grunhidos que ainda prejudicam mais a sua prestação. O início do 2º acto foi visual e vocalmente hilariante... E estamos a ver uma tragédia...

    A Soprano tem uns agudos estridentes e no primeiro acto, os seus maneirismo faziam imaginar que estava como que a cantar música ligeira tipo Mónica Sintra. Mas ao longo da récita fui gostando mais. O dueto com o Pai Germont e o final foram melhores do que antevia ao ver o primeiro acto. Menos mal...

    O Barítono foi talvez o mais consistente. Cenicamente o coxear ou andamento mais lento não é totalmente convincente nele que não é velho mas a voz é talvez a melhor dos três.

    Os papéis menores, feitos por portugueses, no global foram muito bons e talvez os mais impressionantes.

    A encenação é básica mas aceitável para os padrões habituais do São Carlos.

    Pelo que li sobre o Trovador que só vou ver em Maio, mais uma vez o São Carlos a não compreender uma coisa: o que é "nacional é bom". Ponham os cantores nacionais a cantar os principais papéis!!! O Luís Rodrigues não fazia um bom Giorgio Germont, por exemplo?! Acordem e não afundem a Ópera em Portugal!!!

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Caro Fanático,
    eu entendo bem o que seja privilegiar o estrangeiro. Isso também ocorre aqui.
    É uma pena que a ópera tenha sido prejudicada pela má escalação do elenco. A sorte fica por conta da sua excelente crônica que parace sempre melhor quando a encenação não é das melhores1
    Um grande abraço de todos do atelier

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  6. Joana Seara canta FLORA, Leila Moreso canta ANNINA.

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  7. As críticas anteriores fazem sentido.Assisti à récita da Traviata de 28/04. Infelizmente o comentário que fiz à récita do Tovador mantem-se. O tenor um desastre. A soprano, correcta mas com uma voz estridente. O barítono foi o que teve a melhor prestação.Fez-me pena ver o Luís Rodrigues fazer um papel menor. Contudo, ouvindo-se os aplausos do público presente,para quem não tenha assistido, pode ficar-se com a sensação que foi um espectáculo maravilhoso.Desde a tetralogia do Wagner, não mais assisti no São Carlos a uma récita de ópera da qual tenha saído com a sensação que o dinheiro do bilhete foi bem empregue. Uma pena o Teatro Nacional de Ópera deste país ter chegado a esta situação.
    Lisboa, 29/0472013, Manuel Mourato

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  8. Assisti à récita do dia 28 e confesso que nunca tinha saído do São Carlos tão desiludido como desta vez.

    Violetta com uma voz muito esforçada, bastava estar a meio do palco ou desviar a cara da plateia que o som perdia-se… Dificuldade nas notas mais agudas, não fez o Eb6 do “Sempre Libera”. Foi crescendo após o primeiro acto e esteve melhor na cena final.

    Alfredo parecia um Mariachi saído de uma telenovela Mexicana. Representação medíocre, desafinado com agudos num esforço colossal. O pior da ópera!

    Orquestra por vezes fora de tempo como por exemplo no “Che e Cio”.

    Dentro do mau, realço o George Germont como a melhor performance da noite e o grande João Merino (apesar de ter tido um papel menor). O Coro, como sempre, esteve muito bem.

    O TNSC merecia uma La Traviata melhor, ou não fosse esta uma ópera cantada pela Maria Callas no TNSC… Aumentem lá os preços dos bilhetes mas tragam qualidade.

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