A perfeição num
espectáculo de opera é muito rara mas existe. Foi o caso da récita do Don Giovanni de W.A.Mozart em Setembro de 2019 na Royal Opera de Londres.
A encenação de Kasper Holten é moderna e sofisticada,
muito bem conseguida. Um complexo cubo central está em permanente rotação no
palco, sobre o qual se projectam diversas imagens e há aberturas constantes de
múltiplas portas que dão acesso a diversas salas em dois andares, ligados por
escadas interiores. Logo na abertura vão aparecendo projectados os milhares de
nomes das conquistas do Don Giovanni, uma imagem que aparecerá frequentemente
ao longo da récita em momentos adequados. A movimentação cénica dos cantores /
actores é também óptima. Magnífica!
A direcção
musical de Hartmut Haenchen foi
muito mozartiana e teve grande atenção aos cantores.
Os cantores, sem excepção, foram superlativos. Foi o
melhor elenco que alguma vez vi nesta ópera. E a origem dos cantores fez justiça
ao slogan da Royal Opera, a world stage,
tal como no público: só à minha volta ouvia-se falar espanhol, francês, alemão,
russo (e inglês!).
Roberto Tagliavini, um baixo italiano como
raramente se ouve actualmente e um artista exímio foi o melhor Leoporello que
alguma vez vi. Voz grave, poderosa, de belíssimo timbre e um actor fabuloso.
O Don Giovanni foi o Erwin Schrott
, baixo-barítono uruguaio, em noite de grande inspiração, sem irregularidades
de emissão, voz poderosa e sempre bem colocada. Cenicamente foi um Don
insuperável, sedutor descarado, também muito ajudado pela encenação.
A soprano sueca Malin Byström
foi uma Donna Anna brutal, com excelente presença em palco e um vozeirão que
muitas cantoras wagnerianas não têm. Mas quando foi necessário lirismo e
tristeza, elas estiveram lá!
Daniel Behle é um tenor alemão que nos
ofereceu uma interpretação muito emotiva e uma voz lírica pura de invulgar
beleza como Don Ottavio.
Mytrò Papatanasiu, soprano grega, foi uma
Dona Elvira de referência tanto na interpretação cénica como vocal. Voz
extraordinariamente viva, amplitude impressionante, afinação perfeita e poderio
invejável. Só vista e ouvida.
Leon Kosavic, barítono croata, foi um
Masetto cómico, desconfiado e de voz fresca e muito agradável,
e Louise Alder, soprano britânica, fez
uma Zerlina atrevida e magnífica em palco e no canto. Ambos cantores deliciosos,
muito jovens.
E o Comendador, Petros Magoulas,
baixo grego com um grande final.
Tudo fabuloso e magia na Royal Opera House!
*****
DON
GIOVANNI, Royal Opera House, London, September 2019
Perfection
in an opera performance is very rare but it does exist. This was the case of W.A.Mozart’s Don Giovanni in September 2019 at the Royal Opera in London.
The
production of Kasper Holten is modern,
complex and sophisticated and very efficient. A complex central cube is
constantly rotating on the stage, several images are projected on, and constant
openings of multiple doors giving access to several rooms on two floors, connected
by interior stairs. At the opening the thousands of names of Don Giovanni's
previous lovers are projected, an image that will often appear throughout the
performance at appropriate times. The scenic movement of the singers / actors
is also optimal. Magnificent!
Hartmut Haenchen's musical direction was very Mozartian and had
great attention to the singers.
The
singers, without exception, were superlatives. It was the best cast I've ever
seen in this opera. And the origin of the singers has done justice to the Royal
Opera's slogan, “a world stage”, as in the public: just around me I could heard
Spanish, French, German, Russian (and English!).
Roberto Tagliavini, an Italian bass with a quality that is rarely
heard today, and an expert artist, was the best Leoporello I have ever seen. He
has a powerful bass voice, beautiful tone, and is a fabulous actor.
Don
Giovanni was Erwin Schrott,
Uruguayan bass-baritone, in a night of great inspiration, without emission
irregularities, powerful voice and always well tuned. Scenically he was an
unsurpassed, brazen seductive Don, also greatly aided by the staging.
Swedish
soprano Malin Byström was a fabulous
Donna Anna, with an excellent stage presence and a strong voice that many
Wagnerian singers don't have. But when lyricism and sadness were needed, they
were there!
Daniel Behle is a German tenor who offered us a very
emotional interpretation and a pure lyrical voice of unusual beauty as Don
Ottavio.
Mytrò Papatanasiu, Greek soprano, was a reference Dona Elvira in
both scenic and vocal interpretation. Extraordinarily vivid voice, impressive
range, perfect pitch and enviable power. Just seen and heard.
Croatian
baritone Leon Kosavic was a comical,
suspicious, very pleasant Masetto and British soprano Louise Alder was a sassy and magnificent Zerlina on stage and in
singing. Both very young delicious singers.
And the
Commendatore, Petros Magoulas, a Greek
bass with a great ending.
All
fabulous and magic in the Royal Opera House!
*****
Esta sua temporada da Royal Opera House está a ser magnífica , parabéns. Nunca tive essa sorte. Desta vez não conheço nenhum dos cantores, nem sequer a Louise Alder, é uma surpresa boa saber que há novas vozes dessa qualidade. Também é notável que a encenação passe por uma boa movimentação no palco. Já as projecções vídeo são em geral dispensáveis, redundantes. Fico feliz de saber a ROH tão saudável !
ResponderEliminarÉ verdade Mário, tive a sorte de nesta deslocação a Londres ter visto 3 óperas. Infelizmente a que falta colocar no blogue - o Werther - foi uma decepção para mim porque estava à espera de uma interpretação de grande nível do Juan Diego Florez (um dos meus tenores favoritos) mas tal não aconteceu... A seu tempo aparecerá o relato.
EliminarEspectacular!
ResponderEliminarAinda não percebi bem como há melómanos e ou músicos que afirmam estar um pouco desiludidos com a programação , não só da ROH mas doutras como o MET , por só terem uma ou duas óperas de autores com menos de 60 anos neste momento...