quinta-feira, 4 de abril de 2019

LA FILLE DU RÉGIMENT, METropolitan Opera, Fevereiro / February, 2019


(review in English below)


La Fille du Régiment de Donizetti é uma ópera verdadeiramente “da treta”, com uma história ridícula e sem interesse. Contudo, para os amantes de belcanto e do fogo de artifício vocal é um pitéu. A produção da Metropolitan Opera de Nova Iorque é em parceria com a Royal Opera de Londres e com a Ópera estatal de Viena e já foi comentada neste blogue várias vezes porque, para além destes teatros, também tem sido apresentada noutros, incluindo Barcelona e Paris.


A encenação de Laurent Pelly é muito bem conseguida, situa a acção na altura da primeira guerra mundial e é cheia de momentos cómicos que ajudam a relativzar o ridículo do argumento. O 1º acto passa-se nas montanhas do Tirol (feitas de uns mapas gigantes) e o 2º numa sala do castelo da Marquesa de Berkenfield. A Marie é a única rapariga, uma maria-rapaz que veste calças e marcha no meio de um grande regimento. É levada pela “tia” (que é a mãe) para o seu castelo para ser educada como uma verdadeira senhora e casar com o filho da Duquesa de Krakentorp, por conveniência familiar. Nada disto acontece e a ópera acaba com um elogio à França. Só visto se consegue avaliar um espectáculo a qualidade cénica do espectáculo.


Fui com as expectativas em alta e, apesar de vários condicionantes, não saí defraudado.
Os condicionantes:
- Já vi esta produção umas 3 vezes, por isso não haveria grande surpresa na componente visual e cénica.

- É cantada e falada em francês. Estava ao meu lado um casal de franceses a quem, no intervalo, perguntei se estavam a perceber o que se dizia ou cantava no palco. Disseram-me que não, que tinham que ler as legendas (!). Nenhum dos cantores era francês e até eu percebi que o que se falava não soava a francês decente.

- Vi duas récitas com o Juan Diego Florez (talvez o meu tenor ligeiro favorito de sempre) como Tonio e com a Natalie Dessay como Marie. Para mim, ela é a referência absoluta no papel de Marie, uma actriz que cantava e que terá sido a intérprete que Donizetti, quando escreveu a ópera, sabia que um dia surgiria. Nunca haverá melhor e, possivelmente, nem igual. É pena que já se tenha retirado.


Mas..., apesar disto, foi um espectáculo deslumbrante, graças aos dois cantores solistas e ao Laurent Pelly:

- O tenor mexicano Javier Camerana tem uma voz arrepiante, fabulosa, com um registo agudo maravilhoso em beleza, intensidade e afinação. Tivemos não 9 mas 18 dós de peito pois bisou o Pour mon ame… E se o público do Met é muito generoso para com todos os cantores, bons e maus, nesta récita a casa veio abaixo com os aplausos e outras manifestações de apreço! Reconheço que foi melhor que o Florez quando o vi no mesmo papel.





- A soprano sul-africana Pretty Yende. é actualmente a melhor cantora neste registo. Tem uma voz limpa e cristalina, com um timbre lindíssimo, e de qualidade homogénea no registo médio e agudo. A desafinação forçada na lição de canto do 2º acto foi do mais hilariante que tenho visto. E as áreas dramáticas são de um lirismo arrepiante. Mas tem que se ouvir, não se consegue descrever por palavras. Como referi, a Natalie Dessay é passado porque já não canta ópera, muito menos estas que são extremamente exigentes.




- Apesar de ser uma ópera cómica, tem árias de grande lirismo e intensidade dramática, primorosamente interpretadas pelos dois solistas, mas sobretudo pela Yende.


- Os momentos de comicidade são muito bem concebidos e têm realmente muita graça. Na parte falada do 2º acto atingem o expoente máximo com a mistura de algumas expressões inglesas no francês e até com a evocação da Flauta Mágica (zu hilfe, zu hilfe) num momento de apuros do Hortensius, o mordomo da Marquesa. Mas é preciso ver. A Yende nos ensaios do 2º acto é também brilhante neste aspecto e quando se abraça ao Tonio com a condecoração e se magoa nela, também os dois são espectaculares.

O maestro Enrique Mazzola esteve bem, a Orquestra da Metropolitan Opera óptima e o Coro fantástico.



A mezzo norte-americana Stephanie Blythe foi uma Marquesa de Berkenfield de peso (em todos os sentidos) 




o barítono italiano Alessandro Corbelli foi um óptimo Sulpice, o protector da Marie, 




o papel falado da Duquesa de Krakenthorp foi interpretado pela norte-americana Kathleen Turner de voz marcadamente grave, 



e o mordomo Hortensius (baixo norte-americano Paul Corona) não destoou.


Um espectáculo fantástico!








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LA FILLE DU RÉGIMENT, METropolitan Opera, February, 2019

La Fille du Régiment by Donizetti is a truly "trash" opera, with a ridiculous and uninteresting story. However, for lovers of belcanto and the vocal firework is a “must see”. The production of the Metropolitan Opera of New York is in partnership with the Royal Opera of London and with the State Opera of Vienna and has already commented previously and several times on this blog because it has also been seen in other cities such as Paris and Barcelona.

The staging by Laurent Pelly is very well concieved, situates the action at the time of the first world war and is full of humorous moments that help to relativize the ridiculous of the argument. The first act takes place in the mountains of Tyrol (made of giant maps) and the 2nd in a room of the castle of Marquise of Berkenfield. Marie is the only girl, a wearing trousers and marching girl in the middle of a great regiment. She is taken by her "aunt" (who is in fact her mother) to her castle to be brought up as a true lady and to marry the son of the Duchess of Krakentorp for family convenience. None of this happens and the opera ends with a compliment to France. To appreciate the real quality staging of the opera you have to see it.

I went with high expectations and, despite several conditions, I was not disappointed.
The conditions:
- I've seen this production about 3 times, so there would be no big surprise in the visual and scenic component.

- It is sung and spoken in French. I was standing next to a couple of French people who, at the interval, told me that they could not understand what was being said or sang on the stage, they had to read the subtitles in French (!). None of the singers was French and I even realized that what was being said did not sound decent French.

- I saw two performances with Juan Diego Flórez (perhaps my favorite light tenor ever) as Tonio, and with Natalie Dessay as Marie. For me, she is the absolute reference in the role of Marie, an actress who sang and who would have been the interpreter that Donizetti, when he wrote the opera, knew that one day would arise. There will never be better and possibly not even as good as. It's a shame she's already retired.

But ... despite these, it was a dazzling performance, thanks to the two soloist singers and to Laurent Pelly:

- Mexican tenor Javier Camerana has an amazing, fabulous voice, with a marvelous register of beauty, intensity and tuning. We had not 9 but 18 high Cs because he gave an encore of the most famous aria Pour mon ame ... And if the audience of the Met is very generous to all the singers, good and bad, in this performance the house came down with the applause and other manifestations of appreciation! I admit he was better tonight than Flórez when I saw him in the same role.

- South African soprano Pretty Yende is currently the best singer in this register (liric coloratura soprano). She has a clean and crystalline voice, with a beautiful timbre, and of homogeneous quality in the mid and top registers. The detuning in the second act's singing lesson was the most hilarious thing I've ever seen in the several performances of this opera. And the dramatic areas are of a touching lyricism. But you have to listen, I can not describe it in words. As I mentioned, Natalie Dessay is past because she no longer sings opera, in particular these extremely demanding roles.

- Although it is a comic opera, it has Arias of great lyricism and dramatic intensity, exquisitely interpreted by the two soloists, but mainly by Yende.

- The moments of comedy are very well designed and really have a lot of fun. In the spoken part of the 2nd act they reach the maximum with the mixture of some English expressions in tne French and even with the evocation of the Magic Flute (zu hilfe, zu hilfe) in a moment of trouble of Hortensius, the butler of the Marquise. But it has to be seen. Yende is also brilliant in the rehearsals of the second act, and when she embraces Tonio with the decoration that hurts her. Here the two are spectacular.

Maestro Enrique Mazzola was fine, the Orchestra and the Choir of the Metropolitan Opera were fantastic.

American mezzo Stephanie Blythe was a weight (in every sense) Marquise of Berkenfield, Italian baritone Alessandro Corbelli was a terrific Sulpice, Marie's protector, the spoken role of the Duchess of Krakenthorp was played by Kathleen Turner with a markedly bass voice, and the butler Hortensius (American bass Paul Corona) was also very good.

A fantastic performance!

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