Crítica de Ali Hassan Ayache do blog Ópera & Ballet
O Theatro Municipal de São Paulo
apresentará em 2015 uma temporada repleta de óperas conhecidas do grande
público, sendo assim é possível incluir na programação uma ou outra raridade
exótica. A direção escolheu duas óperas curtas para sair do lugar comum. Um Homem Só de Camargo Guarnieri e a inédita por essas
terras Ainadamar de
Osvaldo Golijov. Duas óperas
completamente diferentes e que tem em comum a opressão do indivíduo como tema
central. De um lado um brasileiro simplório e do outro Frederico Garcia Lorca,
homossexual e crítico do fascismo.
A composição musical de Um Homem Só de Camargo
Guarnieri é banal, não sai do lugar comum, sem impacto e carece de inspiração.
Passeia entre trechos românticos do século XIX e tenta ser moderna como no
século XX. Não consegue nem uma coisa nem outra. O libreto de Gianfrancesco
Guarnieri tem qualidades, mostra as dores e mazelas do Homem Só, embora as
cenas não saiam da banalidade. Ainadamar lembra um musical
americano melhorado, música de inspiração espanhola, quente e emotiva. O
compositor Osvaldo Golijov consegue cores e contrastes dramáticos nas partes
agitadas e também em cenas densas. O problema da ópera é a longa duração, um
final que parece não terminar. Morre o personagem central e música e libreto
continuam com quase meia hora de choro contínuo.
Um Homem Só e Ainadamar são excelentes devido a uma pessoa, Caetano Vilela assina a concepção,
encenação e iluminação. Trabalha com diversos elementos modernos do teatro,
mostrando agilidade e esbanjando criatividade. Em Um Homem Só distorce
o cenário fazendo desfilar nele todo tipo de ambiente. A movimentação ágil dos
cantores e uma luz que dialoga com as cenas só enriquecem a apresentação.
Neurótico e repleto de dramas pessoais, assim é retratado José, um brasileiro
simples que vive perdido entre seus dramas pessoais.
Ainadamar tem menos elementos, um tablado e dez portas são o cenário e mais
uma vez a luz é comovente e faz parte das cenas. A leitura de Vilela é repleta
de representações, onde o subjetivo toma conta das cenas e provoca a analise do
espectador. Um relógio enorme, a lua e papéis que caem e o homem que anda e não
vai a lugar algum são cenas que cada indivíduo pode fazer uma leitura pessoal e
dizem muito. Vilela é um grande diretor, antenado com o mais moderno teatro em
uma leitura que provoca sem perder a essência do texto.
As vozes foram no geral eficientes, na ópera Um Homem Só, Rodrigo Esteves mais uma vez arrasou,
desfilou qualidades vocais e cênicas para compor o personagem José. O barítono
sempre acerta em fazer tipos transtornados, vide seu Iago da ópera Otelo
excelentemente composto em Belém e em São Paulo. Luciana Bueno é uma excelente mezzo-soprano, perdi a conta das
inúmeras vezes que a vi cantando em alto nível. Como Mariana/Rita e Velha não
mostrou o melhor. Sua voz esteve fria e sem o brilho e volume que lhe é
característico. Saulo Javan e Miguel Geraldi mantiveram o alto padrão
vocal e cênico que lhes é característico nos seis personagens que
interpretaram.
Ainadamar teve vozes microfonadas, fato esse que torna difícil uma avaliação
vocal. Posso afirmar que o volume esteve excessivamente alto para quem sentou
nas poltronas próximas ao placo, Marisú
Pavon tem uma bela voz, Camila
Titinger continua em ascensão vocal e cênica e Carla Cottini esbanja a beleza de sempre. As cenas dançantes
mostram coreografias adaptadas à obra com figurinos exagerados. A Orquestra
Sinfônica Municipal de São Paulo regida Rodolfo Fischer defendeu a partitura
com musicalidade adequada a linguagem da ópera.
Ali Hassan Ayache
Fotos: Cenas de Ainadamar e Um Homem Só, foto Internet.
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