quarta-feira, 14 de maio de 2014

CARMEN, Teatro Ademir Rosa, Florianópolis, Abril e Maio de 2014


 Lucas Andrade de Florianópolis  (https://www.facebook.com/lucasandradesilva) volta a presentear-nos com um magnífico texto sobre a Carmen. Os "Fanáticos da Ópera" agradecem novamente a contribuição, que muito enriquece este blogue.

(Fotos de Deise Rathge)

Há pouco mais de cinco meses, A Cia Ópera de Santa Catarina e a Camerata Florianópolis estrearam sua produção da ópera Carmen de Bizet na capital do estado de Santa Catarina, com grande sucesso de público nas quatro noites de apresentação. O Fanáticos da Ópera resenhou o espetáculo em novembro passado. Atendendo à solicitações, a montagem tomou, novamente, o palco do Teatro Ademir Rosa nos dias 30 de abril e 2 de maio passados, com praticamente o mesmo elenco principal. A saber, Fernando Portari no papel de Don José, Luciana Bueno interpretando o papel principal, Masami Ganev (30 de abril) e Claudia Ondrusek (2 de maio) mais uma vez alternaram o papel de Micaëla e o barítono Douglas Hahn cantou  Escamillo no lugar de Sebastião Teixeira do espetáculo no ano anterior. Assisti à ambas apresentações, sendo, pois, meus comentários relativos as duas noites.


 Na resenha da produção anterior elogiei a iniciativa de todos os envolvidos em montar um espetáculo deste porte em Florianópolis e quero aqui, publicamente, parabenizar, mais uma vez, toda a produção, a equipe técnica e o elenco que proporcionaram duas noites da mais alta qualidade musical.


 Vocalmente o que era bom ficou ainda melhor! Fernando Portari esbanjou segurança em todos os agudos com um timbre que casa perfeitamente ao papel. Sua atuação é sempre impressionante, extremamente concentrado e profissional. Seu Don José enciumado é assustador! Quem deveria cantar “si je t'aime prend garde à toi” era ele! Prova da qualidade de sua performance vocal e dramática são os comentários de quem assistiu a uma ópera pela primeira vez!


 Luciana Bueno esteve ainda melhor do quem em 2013. A familiaridade com o palco do teatro permitiu que fosse um pouco mais solta cenicamente, o que me agradou ainda mais. Sem querer me repetir, tem beleza, físico e sensualidade de sobras para o papel! Seus graves foram penetrantes em Carreau, pique...la mort! e sua química com Fernando Portari foi ainda maior!


 Douglas Hahn, barítono catarinense, tem uma excelente emissão em todo o registro e um belíssimo timbre. Projetou muito bem todas as notas na acústica pouco favorável à ópera do teatro. Gostaria de ouvi-lo em um papel verdiano, como Renato de Un Ballo in Maschera, por exemplo, parte que cantou na Argentina. Como curiosidade, assisti a sua estreia há dezoito anos atrás e fui uma grande satisfação ouvir seu Escamillo.


 Claudia Ondrusek, mais uma cantora local, no papel de Micaëlla do dia 2 de maio, também esteve melhor do que no ano passado, mais envolvida com o papel, mais tranquila, talvez e com agudos belos e potentes. O teatro não ajudou sua região grave quando se colocava na parte de trás do palco, infelizmente. No dia 30 de abril, a japonesa Masami Ganev foi uma Micaëlla impressionante. Muita potência e qualidade vocal. Uma rocha de segurança e uma força dramática que me levou às lágrimas em um papel que nunca havia me chamado a atenção do ponto de vista teatral. Tive o prazer de conhecê-la no ano passado, mas não tive a chance de ouvi-la. Meu espanto com seu talento só me faz querer ouvir urgentemente sua Madame Butterfly, papel com que vem conquistando os amores do público e da crítica. Aliás, o soprano que adotou o Brasil desde o final dos anos 90 cativa a todos por onde passa. Sua Micaëlla passou-me uma impressão inovadora de sofrimento ao invés de coitada que geralmente tenho. 


 As companheiras de Carmen, Frasquita e Mercédès, foram muito bem reprisadas por Grasiele Fachini e Débora Almeida, respectivamente. Grasiele venceu a orquestra e o coro facilmente em todas as vezes exigidas com seus agudos cortantes e Débora tem além de um belo timbre grave, muita postura no palco. Foram duas parceiras de competência para a excelente Carmen.


 O coro foi, mais uma vez, excelente. Difícil destacar as vozes masculinas ou femininas com cantores muito jovens e envolvidos em cada cena.


 O maestro Jeferson Della Roca tem todo o meu respeito pelo seu bom gosto e uso dos tempos. Destaquei as madeiras na resenha anterior e merecem novamente a citação! A orquestra esteve um pouco inconsistente nos Atos I e II da primeira noite, com uma pequena falha de comunicação no dueto “Parle-moi de ma mère”, mas não comprometeu a experiência final. Os intermezzos nas duas noites foram prejudicados pelas conversas do público que ainda não sabe que estas breves peças instrumentais fazem parte da partitura. Precisamos ter mais espetáculos para que a audiência também seja instruída, não é mesmo?



 Mais duas noites fundamentais para o currículo operístico da capital catarinense e que já deixou saudades no público! Aguardemos agora que venha a montagem de Le Nozze di Figaro no final do ano! Bravi tutti!

1 comentário:

  1. As Américas a mostrarem à Europa que a ópera é essencialmente um espectáculo cénico. Senza scena a ópera perderá o público, não tenho dúvidas. Há muito que digo que foi uma asneira D. João VI ter retornado a Portugal. Ele que fez algo inédito no mundo, ser rei com assento no Novo Mundo, deveria ter mudado a capital, como fez Constantino, e hoje seríamos todos portugueses orgulhosos da nossa metrópole americana e do nosso país transatlantico.

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