Lucas Andrade de
Florianópolis (https://www.facebook.com/lucasandradesilva) volta a
presentear-nos com um magnífico texto sobre a Carmen. Os "Fanáticos da
Ópera" agradecem novamente a contribuição, que muito enriquece este
blogue.
(Fotos de Deise Rathge)
Há pouco mais de cinco meses, A Cia Ópera de Santa Catarina e a
Camerata Florianópolis estrearam sua produção da ópera Carmen de Bizet na
capital do estado de Santa Catarina, com grande sucesso de público nas quatro
noites de apresentação. O Fanáticos da Ópera resenhou o espetáculo em novembro
passado. Atendendo à solicitações, a montagem tomou, novamente, o palco do Teatro Ademir Rosa nos dias 30 de abril
e 2 de maio passados, com praticamente o mesmo elenco principal. A saber, Fernando Portari no papel de Don José, Luciana Bueno interpretando o papel
principal, Masami Ganev (30 de
abril) e Claudia Ondrusek (2 de
maio) mais uma vez alternaram o papel de Micaëla e o barítono Douglas Hahn cantou Escamillo no lugar de Sebastião Teixeira do
espetáculo no ano anterior. Assisti à ambas apresentações, sendo, pois, meus
comentários relativos as duas noites.
Na resenha da produção anterior elogiei a iniciativa de
todos os envolvidos em montar um espetáculo deste porte em Florianópolis e
quero aqui, publicamente, parabenizar, mais uma vez, toda a produção, a equipe
técnica e o elenco que proporcionaram duas noites da mais alta qualidade
musical.
Vocalmente o que era bom ficou ainda melhor! Fernando Portari esbanjou segurança em
todos os agudos com um timbre que casa perfeitamente ao papel. Sua atuação é
sempre impressionante, extremamente concentrado e profissional. Seu Don José
enciumado é assustador! Quem deveria cantar “si je t'aime prend garde à toi”
era ele! Prova da qualidade de sua performance vocal e dramática são os
comentários de quem assistiu a uma ópera pela primeira vez!
Luciana Bueno
esteve ainda melhor do quem em 2013. A familiaridade com o palco do teatro
permitiu que fosse um pouco mais solta cenicamente, o que me agradou ainda
mais. Sem querer me repetir, tem beleza, físico e sensualidade de sobras para o
papel! Seus graves foram penetrantes em Carreau, pique...la mort! e sua química
com Fernando Portari foi ainda maior!
Douglas Hahn, barítono
catarinense, tem uma excelente emissão em todo o registro e um belíssimo
timbre. Projetou muito bem todas as notas na acústica pouco favorável à ópera
do teatro. Gostaria de ouvi-lo em um papel verdiano, como Renato de Un Ballo in
Maschera, por exemplo, parte que cantou na Argentina. Como curiosidade, assisti
a sua estreia há dezoito anos atrás e fui uma grande satisfação ouvir seu
Escamillo.
Claudia Ondrusek,
mais uma cantora local, no papel de Micaëlla do dia 2 de maio, também esteve
melhor do que no ano passado, mais envolvida com o papel, mais tranquila,
talvez e com agudos belos e potentes. O teatro não ajudou sua região grave
quando se colocava na parte de trás do palco, infelizmente. No dia 30 de abril,
a japonesa Masami Ganev foi uma
Micaëlla impressionante. Muita potência e qualidade vocal. Uma rocha de
segurança e uma força dramática que me levou às lágrimas em um papel que nunca
havia me chamado a atenção do ponto de vista teatral. Tive o prazer de
conhecê-la no ano passado, mas não tive a chance de ouvi-la. Meu espanto com
seu talento só me faz querer ouvir urgentemente sua Madame Butterfly, papel com
que vem conquistando os amores do público e da crítica. Aliás, o soprano que
adotou o Brasil desde o final dos anos 90 cativa a todos por onde passa. Sua
Micaëlla passou-me uma impressão inovadora de sofrimento ao invés de coitada
que geralmente tenho.
As companheiras de Carmen, Frasquita e Mercédès, foram muito
bem reprisadas por Grasiele Fachini
e Débora Almeida, respectivamente.
Grasiele venceu a orquestra e o coro facilmente em todas as vezes exigidas com
seus agudos cortantes e Débora tem além de um belo timbre grave, muita postura
no palco. Foram duas parceiras de competência para a excelente Carmen.
O coro foi, mais uma vez, excelente. Difícil destacar as
vozes masculinas ou femininas com cantores muito jovens e envolvidos em cada
cena.
O maestro Jeferson
Della Roca tem todo o meu respeito pelo seu bom gosto e uso dos tempos.
Destaquei as madeiras na resenha anterior e merecem novamente a citação! A
orquestra esteve um pouco inconsistente nos Atos I e II da primeira noite, com
uma pequena falha de comunicação no dueto “Parle-moi de ma mère”, mas não
comprometeu a experiência final. Os intermezzos nas duas noites foram prejudicados
pelas conversas do público que ainda não sabe que estas breves peças
instrumentais fazem parte da partitura. Precisamos ter mais espetáculos para
que a audiência também seja instruída, não é mesmo?
Mais duas noites fundamentais para o currículo operístico da
capital catarinense e que já deixou saudades no público! Aguardemos agora que
venha a montagem de Le Nozze di Figaro no final do ano! Bravi tutti!
As Américas a mostrarem à Europa que a ópera é essencialmente um espectáculo cénico. Senza scena a ópera perderá o público, não tenho dúvidas. Há muito que digo que foi uma asneira D. João VI ter retornado a Portugal. Ele que fez algo inédito no mundo, ser rei com assento no Novo Mundo, deveria ter mudado a capital, como fez Constantino, e hoje seríamos todos portugueses orgulhosos da nossa metrópole americana e do nosso país transatlantico.
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