Mais um texto de Ali Hassan Ayache do blogue Música, Ópera & Ballet que publicamos na íntegra:
O soprano estadunidense Deborah Voigt foi dispensada da
companhia britânica Royal Opera House em 2004 por estar acima do peso. Alguém
achou que a cantora não ficaria bem no figurino, um belo vestido preto, da
ópera Ariadne auf Naxos de Richard Strauss. A famosa companhia londrina
contratou na época um soprano menos "fofinha", a alemã Anne
Schwanewilms.
Deborah Voigt não se deu por vencida, fez uma operação no
estômago, perdeu 60 kilos e foi recontratada para a temporada 2007/2008 do
Royal Opera House. A voz não é mais a mesma de tempos pretéritos, mas a
silhueta combina bem melhor com as exigências atuais.
Outra que sofreu com o peso e levou uma bronca em público
foi Daniella Dessi. O soprano abandonou a ópera La Traviata de Verdi, em Roma,
após comentários pra lá de maldosos do afamado diretor Franco Zeffirelli: “Ela
não tem nada a ver com minha imagem de Violeta que, certamente, não era assim
tão corpulenta”. “Ela é velha demais para convencer o público em uma trama que
fala de paixão da juventude”. O soprano e o maridão Fabio Armiliato, que faria
o papel de Alfredo, pediram demissão e saíram soltando marimbondos africanos
por todos os lados.
Daniella Dessi-Foto Internet.
O advento do vídeo, primeiro em VHS, depois em DVD e mais
recentemente em BLU-RAY e ópera nos cinemas, fez a imagem ganhar grande
importância . Hoje diretores e público exigem cantores-atores que pareçam e
interpretem o personagem. Ficar estático e soltar o vozeirão não são
suficientes para se construir uma carreira lírica. Pavarotti, Caballé,
Alessandra Marc estariam desempregados.
Aconteceu também no Brasil, uma fonte me confidenciou e
pediu sigilo absoluto. Recentemente em uma produção nacional um soprano foi
dispensada por estar acima do peso e não combinar com a personagem. Chamaram
uma estrangeira, sendo bonzinho com ela, a moça não passou do convencional.
Errou entradas, antecipou compassos, esqueceu frases e se desencontrou com a
orquestra diversas vezes. Mas, sua silhueta se adequava com a personagem em
questão.
Será que vale a pena?
Caro Ali,
ResponderEliminarSe este tipo de medidas tivesse sempre sido aplicada, não teríamos apreciado algumas das maiores vozes do século passado, como Horne, Callas, Caballé, Bergonzi, Pavarotti, Gigli e tantos tantos outros!
Caminhamos para a ópera visual. A música e as vozes deixam de interessar o público, apenas ávido de cantores bonitos e produções vistosas (no sentido do nunca-antes-visto). É a ditadura dos todo-poderosos encenadores.
ResponderEliminarA Anna Netrebko disse uma vez numa entrevista (já não sei a quem, vi na televisão) que a beleza fornece contratos mas se a voz e a técnica não prestarem, não há beleza que os aguente.
EliminarNão sei, Gi. Acredito que a Netrebko esteja enganada.
EliminarActualmente acho que o que diz a Netrebko não estará muito distante da realidade em cada vez mais casos.
EliminarComo já escrevi aqui várias vezes, sou dos que acha que a ópera é também um espectáculo para se ver e, se as produções forem visualmente agradáveis, para mim é mais um factor de agrado. Mas daí a exigir-se que os cantores sejam bonitos, vai uma distância que não é para percorrer. "Bonitos", sim, mas na interpretação vocal!
Claro que sim, mas temo que os valores vocais e musicais estejam a tornar-se cada vez mais desvalorizados pelos espectadores em geral.
EliminarO Ali Hassan fala do DVD e dos outros suportes de vídeo que nos mostram grandes planos dos cantores. As transmissões em directo para grande ecrã também tendem a dar preferência a cantores que tenham boas relações com a câmara. Sabemos também que as vozes são amplificadas e, de certo modo, niveladas em estúdio. Penso que estas distorções não estão a fazer bem à Ópera enquanto espectáculo ao vivo.
Tem toda a razão Paulo.
EliminarDeborah Voigt: O Regresso do Pequeno Vestido Preto
ResponderEliminarhttp://www.youtube.com/watch?v=kQqPauyGiVU
Gostaria de ver uma rapariguinha, já não digo de 16 anos, mas mesmo de 20 a tentar cantar Madama Buterfly. Todos nos habituámos a ver "the fat lady sings", e ninguém deixou de perceber que Buterfly era quase uma criança e que Turandot era a mulher mais linda do mundo por quem valia a pena morrer (a última que vi temi que abrisse um buraco no palco de S. Carlos). Já agora, espero que não proibam cantoras de voz poderosa cantarem a Traviata ou a Boheme. É que não fica bem a quem está a morrer tísica.
ResponderEliminarComme d'habitude ,information comme il faut ,l'objectivitè
ResponderEliminarest toujours bien respectè!
Salutations,Willy
Creio que a presente ditadura exercida pela figura do encenador constituir-se-á, tão-somente, mais uma fase, ainda que assaz nefanda, no periclitante equilíbrio de forças que sustenta a Lírica internacional, sucedendo, historicamente, ao elemento puramente vocal e à direcção musical.
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