(Este foi o único cartaz com que a Bayerische Staatsoper anunciou espectáculo!)
(This was the only poster used by the Bayerische Staatsoper announcing the opera!)
(Review in English below)
Lucrezia Borgia é uma ópera de Gaetano Donizetti com libreto de Felice Romani, segundo Lucrèce Borgia de Victor Hugo.
Lucrezia Borgia, uma mulher conhecedora de venenos, adúltera e assassina, faz o que pode para viver com uma imagem como concebida pelos homens e empenha-se em encontrar novas identidades. O seu filho Gennaro encanta-se por ela à primeira vista, sem saber que é sua mãe. O círculo de amigos denigre o seu nome. Don Alonso, marido de Lucrezia, convencido que Gennaro é seu rival, decide matá-lo, envenenando-o. Contudo, é salvo por Lucrezia que lhe dá um antídoto. Mais tarde são todos envenenados por ela uma segunda vez. Quando Lucrezia se apercebe que o filho está no grupo dos homens envenenados, confessa-lhe que é sua mãe e oferece-lhe novamente o antídoto. Ele recusa e morre também.
A encenação, de Christof Loy, é moderna e simples. O palco está despido e tem em fundo o nome LUCREZIA BORGIA que, com o desenrolar da acção, vai desaparecendo pela esquerda, muito lentamente, sem que antes Genaro arranque o B de Borgia, ficando ORGIA, com as conotações da nova palavra também constantes do libretto. De resto, umas cadeiras simples, ocasionalmente uma mesita e pouco mais. Mas, sem deslumbrar, funciona.
(Some photos are from Bayerische Staatsoper website or programme)
O maestro foi o italiano Paolo Arrivabeni.
O dificílimo papel de Lucrezia Borgia foi interpretado pelo soprano eslovaco Edita Gruberova. Apesar da presença de vários cantores de elevada qualidade, diria que Edita Gruberova é, quase 200 anos depois de o compositor ter escrito a obra, a Lucrezia Borgia de Donizetti. A voz é bela, os pianíssimos são de uma qualidade, frequência e altura inultrapassáveis, o legato perfeito e a coloratura sublime.
Na sua cena inicial Com’è bello! Qualle incanto, no prólogo, consegue transmitir uma afectividade tocante, em total contraste com cenas posteriores. No 2º acto em que Gennaro está prestes a apunhalá-la, depois de cantar uma nota sobreaguda em fortíssimo, faz um momento de silêncio e diz num registo grave un Borgia sei!. O efeito cénico é arrepiante e o diálogo seguinte, com Gennaro, transborda tristeza. Depois da morte do filho, transmite de forma marcante dor e culpa na ária Era desso il figlio mio. Termina expressando raiva e revolta, numa sequência alucinante de cascatas de notas graves a sobre-agudas, finalizando com uma prolongada nota estratosférica (penso que um mi sobreagudo) em fortíssimo. Avassaladora!
Gennaro foi interpretado pelo jovem tenor norte-americano Charles Castronovo. O papel é exigente e extenso. Castronovo (que nunca tinha visto ao vivo) deu-nos uma interpretação marcante. A voz é encorpada e de grande beleza tímbrica. O artista tem uma excelente presença em palco. Pertence à nova geração de cantores que, nas suas apresentações, junta a representação ao canto, com grande efeito tanto para o espectáculo como para o público.
Don Alfonso foi interpretado pelo baixo-barítono canadiano John Relyea. Possuidor de uma voz grande, bonita e expressiva, a presença em palco foi também muito boa. Foi mais um grande artista da noite, não deixando por mãos alheias a representação da personagem.
A jovem mezzo-soprano de coloratura espanhola Sílvia Tro Santafé foi um Maffio Orsini, amigo de Gennaro, de excepcional qualidade. O papel, aparentemente secundário, é enorme e a artista teve garra e presença para o colocar sempre no centro da acção. Ofereceu-nos uma voz cheia, escura e quente, de grande extensão e beleza. A presença cénica esteve ao mais alto nível. Apesar da figura franzina, foi outra das grandes da noite.
Terminada a ópera, o público aplaudiu como nunca havia visto na Alemanha. Exuberante e de forma efusiva, com gritos de bravo e outras expressões, sobretudo dirigidos a Edita Gruberova. A cantora teve que voltar ao palco inúmeras vezes.
Existe uma gravação recente desta produção com Edita Gruberova.
Houve magia nesta noite gloriosa de ópera em Munique!
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Lucrezia Borgia, Bayerische Staatsoper, Munich, April 2011
Lucrezia Borgia is an opera by Gaetano Donizetti with libretto by Felice Romani, according to Victor Hugo's Lucrèce Borgia.
Lucrezia Borgia, an adulterous assassin woman knowledgeable of poisons, does what she can to live with an image as conceived by men, and strives to find new identities. His son Gennaro was well impressed by her at first sight, not knowing that she is his mother. His circle of friends reject and say the worst about her. Don Alonso, Lucrezia's husband, is convinced that Gennaro is his rival and decides to kill him by poisoning him. However, he is saved by Lucrezia that gives him an antidote. Later they are all poisoned by her a second time. When Lucrezia realizes that her son is poisoned within the male group, she confesses to him that she is her mother and gives him the antidote again. He refuses and dies.
The staging by Christof Loy is modern and simple. The stage is empty and has written in the background the name LUCREZIA BORGIA that, along the performance disappears very slowly by the left side. Prior Gennaro destroys the B of Borgia, getting ORGIA, with the connotations of the word also contained in the libretto. Simple chairs and occasionally a small table complete the scenary.. But, without a great scenic impact, it works.
The conductor was Italian Paolo Arrivabene.
The difficult role of Lucrezia Borgia was interpreted by the Slovak soprano Edita Gruberova. Despite the presence of several high-quality singers, Edita Gruberova, almost 200 years after the composer had written the piece, is Donizetti's Lucrezia Borgia. The voice is beautiful, the frequent pianissimi are of an exquisite quality, associated to a perfect legato and sublime coloratura.
In its opening scene Com'è bello! Qualle incanto in the prologue, she transmits a kind affection, in stark contrast to later scenes. In Act 2 in which Gennaro is about to stab her, after singing a top note in fortissimi, a moment of silence comes and then she says in low register un Borgia sei!. The scenic effect is amazing and the following dialog, with Gennaro, overflows with sorrow. After the death of her son, she transmits markedly pain and guilt in the aria Era desso il figlio mio. She ends the opera expressing anger and outrage in an impressive sequence of low to top notes, finishing with a prolonged stratospheric note in fortissimi. Overwhelming!
Gennaro was interpreted by American young tenor Charles Castronovo. The role is demanding and long. Castronovo (who I had never seen live) gave us a remarkable interpretation. The voice is full-bodied and has a beautiful timbre. The artist has a great stage presence. He belongs to the new generation of opera singers who, in their presentations, joint artistic acting to singing, with an excellent effect both for the performance and the audience.
Don Alfonso was sung by Canadian bass-baritone John Relyea. A great voice, beautiful and expressive, and also very good acting. He was another great artist of the night.
The young Spanish coloratura mezzo-soprano Silvia Tro Santafe was a Maffio Orsini, friend of Gennaro, of exceptional quality. The role is remarkable and the artist had the strength and presence to always be in the center of the action. She offered us a full voice, dark and warm, with great beauty and length. Artistically she was also excellent.
After the opera, the audience applauded as I had never seen in Germany. Exuberant and effusive applauses, with shouts of bravo and other expressions, mainly directed at Edita Gruberova. The singer had to come to the stage numerous times.
There is a recent recording of this production with Edita Gruberova
There was magic in this glorious night at the opera in Munich!
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Silvia Tro Santafé também já cantou em São Carlos, na versão de concerto de "La Donna del Lago". Deixou uma óptima impressão.
ResponderEliminarObrigado pela opinião que aqui nos deixa.
Adoro essa ópera do Donizetti, mas só conheço o vídeo com a Sutherland.
ResponderEliminarAbout the BSO debutant charles Castronov the critic here wrote quite positiv as well: Castronovo has a beautiful timbre with a radiant high gloss. He's a handsome guy and a highly committed, authentic performer. with the Gruberova he provided for poignant moments.
ResponderEliminarHopefully we are going to hear of him more.
Caro FanaticoUm
ResponderEliminarParece que, mais uma vez, assistiu a um espectáculo de excelência.
Eu tive a oportunidade de ouvir Gruberova na sua estreia em Lucrezia Borgia no Liceu de Barcelona e fiquei deveras impressionado com a sua interpretação, mesmo em versão concerto, a cantora conseguiu imprimir uma carga dramática à personagem verdadeiramente fora do comum.
Dos outros cantores do elenco, apenas conheço a Tro Santafé e, tal como o Paulo, fiquei com uma óptima impressão da cantora em "La Donna del Lago" no S. Carlos, ao lado de Rockwell Blake numa das últimas récitas da carreia do cantor. Voltei a ver a cantora em "L'Italiana in Algeri" no Real em 2009.
Cumprimentos musicais
@ Paulo,
ResponderEliminarObrigado pela informação. Confesso que o cancelamento do Florez (se é que alguma vez chegou a ser mesmo contratado, dado que é um cantor que, habitualmente, não cancela)me deixou de tal forma desapontado que nem reparei convenientemente nos outros cantores. Mea culpa!
@ Ali,
Há mais gravações em video. Esta que refiro tem a fabulosa interpretação de Edita Gruberova (numa abordagem semelhante à da também fabulosa Sutherland) mas, para mim, tem um ponto fraco - o tenor Jose Bros.
@ lotus-eater,
Yes, Castronovo had a great interpretation in Munich and he fits well the role, as he is young and good looking. But the absolute queen of the night was Gruberova!
@ Alberto,
É verdade, mais um pitéu de belcanto, numa das óperas que mais desafios dev e colocar à protagonista. E Gruberova não joga à defesa, vai a todas e encanta-nos! Fantástica.
Ao vivo é muitíssimo melhor que nas gravações quando, frequentemente com outros cantores, acontece o contrário.
Treo Santafé e Castronovo também estiveram inexcedíveis.
Uma noite de glória em Munique.
Cumprimentos
Não conheço a obra... Mas é o território de Gruberova, de certeza. Pelo que nos transmite e temos lido em outros posts, a mulher é o Domingo em versão feminina...
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