sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

ADRIANA LECOUVREUR – Royal Opera, Londres, Dezembro de 2010


(review in english below)

Ópera de Francesco Cilea com libretto de Arturo Colautti, segundo Scribe e Legouvé.

A actriz Adriana Lecouvreur diz a Michonnet, director da Comédie Française, que ama o conde Maurizio da Saxónia. Michonnet fica muito desapontado porque há muito que está apaixonado por ela, sem nunca o ter confessado. Antes de subir ao palco Adriana dá um ramo de violetas a Maurizio. O príncipe de Bouillon ama também uma actriz, a Duclos, rival de Adriana e teme ser enganado por esta ao interceptar um bilhete para Maurizio, pedindo um encontro. Na verdade, é a sua própria mulher que o engana.
Maurizio encontra-se com a princesa de Bouillon na casa da Duclos e oferece-lhe o ramo de violetas. Mantém com ela uma relação de conveniência política, mas rejeita o seu amor, confessando amar outra. Quando chegam convidados do príncipe para uma festa, a princesa esconde-se e é ajudada a fugir por Maurizio e por Adriana. As duas mulheres suspeitam serem rivais. Numa festa no palácio da princesa a voz de Adriana é reconhecida como a mulher que a ajudou a fugir. Jura vingança, sobretudo depois de esta recitar um texto sobre a infidelidade. Manda à actriz um ramo de violetas envenenadas, como presente de aniversário. Adriana pensa que as flores foram enviadas por Maurizio, cheira-as e inspira o veneno. Morre nos braços do amante.
É uma história desinteressante de romance, ciúme, intriga, vingança e morte (pela inalação de um veneno num ramo de violetas).
(Fotografia de Catherine Ashmore)

A encenação de David McVicar é esplêndida e conseguiu tornar muito agradável a apresentação da obra. Coloca a acção no período em que o autor a concebeu, dando-nos o esplendor da Comédie Française do Século XVIII em Paris. A produção é rica e bem concebida. Os cenários rotativos de Charles Edwards proporcionam-nos a acção atrás do palco e no palco no 1º acto, na casa da Duclos no 2º, no palácio do príncipe no 3º e na casa de Adriana no 4º.

Já há muito que considero que a Orquestra da Royal Opera House é talvez a melhor de entre as dos grandes teatros de ópera. Mais uma vez teve uma actuação de excelência, muito ajudada pelo Maestro Mark Elder que conseguiu extrair dela um desempenho de elevada qualidade, com momentos de grande expressividade lírica.

O soprano espanhol Angeles Blancas interpretou Adriana Lecouvreur. Teve uma interpretação aceitável, a voz era um pouco agreste, mas não conseguiu transmitir as diferentes emoções da personagem. Na belíssima ária inicial Io son l’humile ancella esteve aquém do que esperaria. Fazia um ruído audível a inspirar e cantou com dureza. Tenho como referência uma interpretação de Angela Gheorghiu há oito anos num concerto aqui em Londres com o Maestro Ion Marin. Aí sim, uma interpretação de um lirismo insuperável. E a Gheorghiu foi quem cantou a personagem em quase todas as outras récitas…
Já na ária final do primeiro acto Poveri fiori melhorou e manteve o nível, tendo estado bastante bem no 3º acto. Cenicamente não conseguiu transmitir o menor entrosamento amoroso com Maurizio.

Maurizio foi interpretado pelo grande tenor alemão Jonas Kaufmann. Foi um dos grandes da noite. Apesar de a actuação em palco ter sido irrepreensível, mesmo sem a correspondência de Adriana, foi o canto o que mais marcou. Voz de uma beleza única, timbre belíssimo e musicalidade impar. Nunca cantou em esforço e, em mezza voce, foi sempre audível. Entrou logo bem com a ária La dolcissima effigie em que declara a sua paixão por Adriana e manteve a qualidade interpretativa, vocal e cénica.

(Fotografia de Catherine Ashmore)

Cada vez que o oiço mais me convenço que é o melhor tenor que está actualmente no activo. E ainda há quem diga que o sucesso de Kaufmann se deve ao seu bom aspecto. É verdade que o tem, mas esta apreciação é profundamente injusta porque o mais importante é a voz e a forma como a usa que, actualmente, é do melhor que se pode ouvir.

O mezzo russo Olga Borodina foi também uma intérprete impressionante. A sua Princesa de Bouillon destilou raiva, ciúme e agressividade sempre que necessário. A voz é de grande beleza, sobretudo no registo mais grave. A potência é esmagadora e a emissão parece feita sem esforço. A ária Acerta volluta no início do 2º acto foi colossal.



O baixo / barítono italiano Alessandro Corbelli foi outro excepcional artista no papel de Michonnet. Deu-nos uma personagem cativante, atraído por Adriana mas resignado por não ser correspondido. Transmitiu grande humanismo e simpatia na interpretação, sem ser piegas. A voz esteve à altura da personagem, tanto na qualidade como na potência da emissão.






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E na Stage Door:



(Autógrafos de Olga Borodina e Jonas Kaufmann)


(Olga Borodina)



Adriana Lecouvreur - Royal Opera, London, December 2010

Adriana Lecouvreur is an opera by Francesco Cilea with libretto by Arturo Colautti, after Scribe and Legouvé.

Actress Adriana Lecouvreur tells Michonnet, director of the Comédie Francaise, that she loves Maurizio, Count of Saxony. Michonnet is very disappointed because he is secretly in love for her for a long time. Before going onstage Adriana gives a bunch of violets to Maurizio. The Prince of Bouillon also loves an actress, Duclos, Adriana's rival and fears to be cheated by her by intercepting a written note to Maurizio, requesting a meeting. In fact, it is his own wife who betrays him. Maurizio meets the Princess of Bouillon in Duclos’ house and offers her the bunch of violets. He maintains a relationship with her for political reasons, but rejects her love, confessing his love for another woman. When guests arrive for a party organized by the prince, the princess hides and is helped to escape, in disguise, by Maurizio and Adriana. The two women suspect they are rivals. At a party at the palace of the prince, Adriana’s voice is recognized by the princess as the woman who helped her escape. She promises revenge, specially after Adriana recite a text about infidelity. She sends her a poisoned bunch of violets as a birthday present. Adriana thinks that the flowers were sent by Maurizio, smells them and inhales the poison. She dies in the arms of Maurizio.

The plot is an uninteresting story of romance, jealousy, intrigue, revenge and death (by inhalation of poison from a bank of violets).

The staging by David McVicar is splendid and managed to make a very nice presentation of the work. He put the action in the period in which the author conceived it, giving us the splendor of the eighteenth century Comédie Française in Paris. The production is rich and well designed. The action is backstage and onstage in the 1st act, in Duclos's home in the 2nd, in the prince's palace in the 3rd and at Adriana’ home in the 4th.

For a long time I consider that the Orchestra of the Royal Opera House is perhaps the best among the orchestras of the major opera houses. Once again it had an excellent performance, much helped by conductor Mark Elder who managed to extract from it a high quality performance, with moments of great lyric expressiveness.

Spanish soprano Angeles Blancas played Adriana Lecouvreur. She had an acceptable interpretation, the voice was a little rough, but failed to convey the different emotions of the character. In the initial beautiful aria Io son l'humile ancella she was not as good as I expected. She made an audible noise when inspiring and sang with no lyricism. As a reference, I have the interpretation of Angela Gheorghiu in concert eight years ago here in London with the conductor Ion Marin. That was an interpretation of an unsurpassed lyricism! And to know that Gheorghiu was the artist that interpreted the role of Adriana in almost all other performances ...
At the final aria in the first act Poveri fiori she was better and kept the same level throughout. She was quite well in the 3rd act. Artistically, she was not able to transmit that she was in love with Maurizio.

Maurizio was interpreted by the great German tenor Jonas Kaufmann. He was one of the best of the performance. Artistically he was flawless, even without the effective counterpart of Adriana, but the singing was really the thing. His voice is of unique musicality and beauty, and the tone is fantastic. He never sang in effort and, in mezza voce, he was always audible. He started well with the aria La dolcissima effigie declaring his love for Adriana and maintained the quality of interpretation, both vocal and artistic throughout the performance.
Every time I hear him the more I am convinced that he is the greatest performing tenor of our days. And still some say that his success is due to Kaufmann's good looks. Indeed he has good looks, but this view is deeply unfair because the most important is the voice and how he uses it. He is probably the best one can hear live at present times.

Russian mezzo Olga Borodina was also an impressive performer. Her Princess of Bouillon was angry, jealous and aggressive whenever necessary. The voice is of great beauty, especially in low register. The vocal power is overwhelming and she seems to sing without effort. The aria Acerta volluta at the beginning of Act 2 was colossal.

Italian bass / baritone Alessandro Corbelli was another exceptional artist in the role of Michonnet. He gave us a captivating character, attracted by Adriana but resigned for not being corresponded by her. He conveyed sympathy and great humanism in the interpretation, without being ridiculous. The voice was effective for the character, both in quality and potency of the issue.


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14 comentários:

  1. Sim, fui à stage door, algo que habitualmente não faço, mas desta vez tinha uma boa razão, que revelarei num próximo "post" que escreverei neste blogue.

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  2. Calculo que sim, já dei umas indicações, mas é esperar para ver...

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  3. Hi,
    Thank you for the detailed posting about Adriana.
    You got an autograph of Kaufmann, but didn't take a picture of him? Or you're hiding it?

    I've planned to go to Munich in order to watch "Fidelio" in which Kaufmann has a main role. However, thanks to the intransparent ticket purchasing system of Bayerische Staatsoper München I've got no chance to get a ticket! You can imagine how much I hate the management of this opera house.

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  4. Dear lotus-eater,
    Yes, I took a picture with Kaufmann. This was the main reason why I wnet to the stage door after the performance. But I have a simple but nice and unexpected story to tell about that, so I will do it in an independent post within a few days.
    The first time I saw Kaufmann was in a smaching Fidelio in Zurich. I can imagine what you feel, because you do miss a unique and outstanding representation of Florestain.
    I hope I will not have an unpleasant surprise with Bayerische Staatsoper and my reservations for April there. When I will have the news (beginning of January I think), I will tell you.

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  5. Obrigado pelos seus comentários sempre tão elegantes e estimulantes!
    Parabéns pelo belíssimo blog. Estou ansioso para levar a minha esposa para conhecer o teatro Municipal do Rio de Janeiro. Ela quer ver Carmina Burana...
    Um feliz Natal e ótimo 2011!

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  6. Caro António Machado,
    Muito obrigado pelo seu generoso comentário. Agradeço e retribuo os votos de Feliz Natal e Óptimo ano de 2011.
    E espero que disfrutem de um excelente espectáculo no Teatro Munincipal do Rio de Janeiro, que ainda não conheço. A Carmina Burana é uma obra notável.
    Cumprimentos de Portugal

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  7. Dear JJ,
    Thank you for your message. We also wish you a Merry Christmas and an excellent New Yera of 2011.
    Regards from Portugal

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  8. Caro FanáticoUm,

    Vive Kaufmann como um verdadeiro Fanático! Realmente o tenor alemão é um artista a 100% - "voice and looks".

    Excelente crítica. Não conheço muito bem esta Ópera mas a seu tempo estas e outras não-wagnerianas vão entrando no meu imaginário.

    Cumprimentos musicais.

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  9. Caro wagner_fanatic,
    Todos nós, neste blogue, temos as nossas preferências de Fanáticos.
    Poderão ser parcialmente irracionais, mas o estímulo que a voz humana é capaz de causar em cada um de nós é algo de subjectivo, que a Neurofisiologia (ou outra área das Neurociências) ainda não conseguiu explicar na totalidade, mas que realmente existe.
    E é da diversidade que tudo se enriquece.
    Estou a justificar, por antecipação, o meu próximo "post". Se acha que este foi de Fanático em relação ao Kaufmann, não sei o que dirá do seguinte...

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  10. Caro FanaticoUm

    Obrigado por mais um excelente comentário. Não era esta Adriana que era para ser cantado pela Angela Georgiu? Pelo que sei, a senhora é a rainha actual dos cancelamentos.

    Não conheço o soprano espanhol Angeles Blancas que parece ter sido o ponto mais fraco da récita. Gosto particularmente da Borodina.

    Cumprimentos

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  11. Caro Alberto,
    Sim a Angela Gheorghiu foi quem cantou a maioria das récitas (só cancelou uma, o que é muito invulgar nela) mas aquela a que assisti tinha a Angeles Blancas programada desde o início. Para mim que sou um apreciador confesso da Georghiu (apesar da "cancelite" aguda de que sofre e nos faz sofrer, para alé da "primadoíte excessiva") tive muita pena de não a ter visto, mas foi a récita possível na data em que estive em Londres.
    Angeles Blancas foi e elo mais fraco mas, em contrapartida, todos os outros foram soberbos e ainda não escrevi tudo sobre eles, pois reservo o Kaufmann para uma nova entrada, dentro de um ou dois dias, pois aconteceu-me algo de inesperado que aqui quero relatar.
    Cumprimentos

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  12. Caro FanaticoUm

    Vejo agora que me esqueci dos "h" no nome da Gheorghiu. Acho que a senhora não me perdoaria! Também eu sou um apreciador da sua voz, espacialmente do timbre. Não simpatizo no entanto, com os seus ares de prima donna de "nariz empinado" e com o facto de recorrentemente cancelar as récitas que tem programadas.

    Aguardo ansiosamente a surpresa do Kaufmann. Não me diga que teve direito a interpretação exclusiva do cantor!

    Cumprimentos

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